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Patologia Humana Autora: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Belo Horizonte / 2014 Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 2 | P á g i n a ESTRUTURA FORMAL DA UNIDADE DE EDUCAÇÃO A DISTÃNCIA REITOR JOÃO PAULO BARROS BELDI VICE-REITORA JULIANA SALVADOR FERREIRA DE MELLO COORDENAÇÃO GERAL SINARA BADARÓ LEROY DESIGNER INSTRUCIONAL DÉBORA CRISTINA CORDEIRO CAMPOS LEAL EQUIPE DE WEB DESIGNER ANTÔNIO HENRIQUE RIBEIRO DALBEM FILIPE AFONSO CALICCHIO SOUZA LUCIANA REGINA VIEIRA ORIENTAÇÃO PEDAGÓGICA MARIA LUIZA QUEIROZ BRAGA REGINA MARCIA DE JESUS PAREDES AUXILIAR ADMINISTRATIVO JULIANA CECILIA CANIATO MAYER SIMONE DE SOUZA REVISORA DE TEXTO MARIA DE LOURDES SOARES MONTEIRO RAMALHO SECRETARIA LUANA DOS SANTOS ROSSI MARIA LUIZA AYRES MONITORIA MARIANA TAVARES DIAS RIOGA AUXILIAR ADMINISTRATIVO MIRIÃ NERES PEREIRA AUXILIAR DE TUTORIA FLÁVIA CRISTINA DE MORAIS JAQUELINE MARA DE VARGAS Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 3 | P á g i n a Sumário Unidade 1: Patologia Celular e da Matriz Extracelular .......................................................................6 Unidade 2: Distúrbios Circulatórios e Inflamação ........................................................................... 27 Unidade 3: Neoplasia .......................................................................................................................... 61 Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 4 | P á g i n a Comentários Reflexão Dica Lembrete Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 5 | P á g i n a Nosso Tema O corpo humano é constantemente exposto a inúmeras agressões e, ainda assim, a homeostasia1 é geralmente mantida. Contudo, em algumas circunstâncias, a incapacidade do organismo em se adaptar ao ambiente físico, psíquico ou social leva a um estado de desequilíbrio no qual o indivíduo se sente mal e/ou apresenta alterações orgânicas evidenciáveis. Esse estado representa a DOENÇA. A PATOLOGIA é a ciência que estuda as doenças, mais especificamente, quatro aspectos das doenças: suas causas (etiologia), os mecanismos que as produzem (patogênese), as alterações bioquímicas e estruturais induzidas sobre as células, tecidos e órgãos do corpo (alterações morfológicas e moleculares), e as consequências funcionais dessas alterações (manifestações clínicas). Tradicionalmente, a Patologia é dividida em Patologia Geral, que estuda os aspectos comuns às diferentes doenças; e em Patologia Sistêmica ou Especial, que se refere às alterações em órgãos e tecidos específicos. Nesta disciplina, serão abordados os princípios relativos à Patologia Geral. O conhecimento desses princípios é essencial para todos os profissionais da área de saúde, já que estabelecem as bases necessárias tanto para a prevenção e para o diagnóstico de doenças quanto para o tratamento dos indivíduos portadores. Portanto, é essencial que o conteúdo explicado nesta disciplina seja bem compreendido por você. Vamos iniciar nossos estudos? Para Refletir “A SAÚDE É O SILÊNCIO DOS ÓRGÃOS” René Leriche, famoso cirurgião francês nascido em 1879. O clamor dos órgãos é grito de socorro, que pode ser ouvido por muitos, mas que somente o bom profissional de saúde sabe interpretar e atender. (Fonte: Disponível em: <http://www.photo-clipart.ru/Artville/IL%20080%20Medical%20Humor/IL%20080_files/MED019.jpg> Acesso em: 19/12/2009) 1 ‘Homeostasia: lei dos equilíbrios internos que rege a composição e as reações físico-químicas que se passam no organismo e que, graças a mecanismos reguladores, são mais ou menos constantes. É o que acontece com o teor, no sangue, de água, sais, oxigênio, açúcar, proteínas e graxos, o mesmo se verificando com a reserva alcalina do sangue e temperatura interna.”(Fonte: Disponível em : >http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues-portugues&palavra=homeostasia> Acesso em: 10/12/2009). Você já considerou a importância do conhecimento de Patologia para a compreensão da voz do corpo? Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 6 | P á g i n a Unidade 1: Patologia Celular e da Matriz Extracelular 1. Conteúdo Didático Rudolf Virchow, conhecido como o pai da Patologia Moderna, dizia, ainda no século XIX, que praticamente todas as formas de doença começam com alterações estruturais nas células. Por isso, iniciaremos o estudo da Patologia com a descrição das causas, dos mecanismos e das alterações morfológicas e bioquímicas que acompanham as lesões celulares e as lesões intersticiais. A injúria às células e à matriz extracelular leva à formação de lesões nos tecidos e órgãos que, por sua vez, determinam os padrões morfológicos e clínicos das doenças. A figura abaixo descreve os estágios da resposta celular ao estresse a aos estímulos nocivos. A figura acima pode parecer para você um pouco complexa de ser compreendida nesse momento, mas não fique preocupado. No decorrer desta unidade, vamos estudar detalhadamente cada um dos aspectos dos estágios da resposta celular ao estresse e a estímulos nocivos. Dessa forma, você Adaptação Injúria Celular Célula Normal (homeostasia) Necrose Injúria Irreversível Apoptose Injúria Reversível ESTRESSE LEVE TRANSITÓRIO SEVERO E PROGRESSIVO MORTE CELULAR ESTÍMULO NOCIVO Figura 1: Estágios da resposta celular ao estresse e a estímulos nocivos Fonte: KUMAR,2010, p5. INCAPACIDADE PARA SE ADAPTAR Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 7 | P á g i n a entenderá como ocorre cada parte desse processo. Iniciaremos nossos estudos, tratando das adaptações celulares. Esteja atento ao conteúdo do próximo tópico. 1.1. Adaptações Celulares, Lesão Celular Reversível e Irreversível – Aspectos Gerais Adaptações constituem respostas funcionais e estruturais reversíveis a alguns estímulos patológicos ou mesmo ao estresse fisiológico. Nessas circunstâncias, é alcançado um novo estado de equilíbrio, que permite que a célula sobreviva e continue a desempenhar suas funções. Quando o estresse é eliminado, a célula retornará ao seu estado original sem ter sofrido consequências danosas. As lesões celulares podem ser reversíveis ou irreversíveis dependendo tanto da natureza do agente agressor quanto da intensidade e duração da agressão. Se os limites das respostas adaptativas forem excedidos, ou se as células forem expostas a agentes nocivos, privadas de nutrientes essenciais, ou se tornarem comprometidaspor mutações que afetam os constituintes celulares essenciais, uma sequência de eventos será desencadeada, o que é conhecido como injúria celular. O dano celular é reversível até um certo ponto. Se o estímulo for persistente ou muito intenso, a célula sofrerá injúria irreversível que culminará com a morte celular. Vamos entender melhor como esse processo ocorre no corpo humano? Adaptação, injúria reversível e morte celular podem representar estágios progressivos que se seguem a diferentes tipos de agressão. Por exemplo, em resposta ao aumento da carga hemodinâmica, o músculo cardíaco torna-se aumentado, o que representa uma forma de adaptação. Se o suprimento sanguíneo para o miocárdio estiver comprometido, inicialmente o músculo sofrerá injúria reversível, manifestada por algumas alterações intracelulares que serão discutidas posteriormente. Ao final, essas células poderão sofrer danos irreversíveis que levarão à sua morte. É muito importante que você conheça o que ocasiona a injúria celular. Por isso, a seguir vamos tratar desse assunto. 1.2. Causas de Injúria Celular As causas de injúria celular vão desde a violência física externa de um acidente automobilístico, até anormalidades internas sutis, tais como mutações genéticas que levam à falta de uma enzima vital. Os estímulos nocivos podem ser agrupados da nas seguintes categorias: REDUÇÃO DO SUPRIMENTO DE OXIGÊNIO conhecida como hipóxia causa lesão celular porque reduz a síntese de ATP a partir da respiração celular. Dentre as causas de hipóxia estão a isquemia; a oxigenação inadequada do sangue devido à falência cardiorrespiratória; a redução da capacidade de transportar oxigênio no sangue, como na anemia e em casos de hemorragias graves. Dependendo da intensidade da hipóxia, as células podem se adaptar, podem sofrer lesões reversíveis ou morrer. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 8 | P á g i n a Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 9 | P á g i n a AGENTES FÍSICOS trauma mecânico, temperaturas muito baixas ou muito altas, variações súbitas da pressão atmosférica, radiação e choque elétrico são exemplos de agentes físicos capazes de gerar lesão celular. AGENTES QUÍMICOS de natureza diversa podem gerar lesão celular. Concentrações hipertônicas de glicose e sal podem causar injúria celular. Até mesmo o oxigênio em altas concentrações é tóxico. Substâncias presentes na poluição ambiental, inseticidas, herbicidas, álcool e medicamentos podem, dependendo da dose, levar à lesão celular. RADICAIS LIVRES muito conhecidos por seus efeitos deletérios sobre as moléculas orgânicas, particularmente lipídeos, proteínas e ácidos nucléicos. Os radicais livres são muito reativos devido à presença de um elétron não-emparelhado no orbital externo. Alguns tipos de câncer estão associados à exposição exagerada aos radicais livres. AGENTES INFECCIOSOS que variam desde vírus submicroscópicos até grandes parasitas causam lesão celular por mecanismos diversos. REAÇÕES IMUNOLÓGICAS que, apesar de essenciais para a defesa contra patógenos infecciosos, podem gerar dano celular. As doenças autoimunes, por exemplo, surgem a partir da destruição imunológicas de autoantígenos. ANOMALIAS GENÉTICAS podem causar lesão celular devido à deficiência de proteínas funcionais, ao acúmulo de proteínas ou de DNA defeituoso e, em alguns casos, ao aumento da suscetibilidade outros agentes nocivos. DESEQUILÍBRIO NUTRICIONAL representado por redução significativa na ingestão de proteínas, por deficiências de vitaminas, ou mesmo por excesso de calorias ingeridas, é um importante fator de lesão celular, contribuindo para o desenvolvimento de diversas doenças. Agora que você já conhece os principais estímulos que podem ocasionar numa injúria celular, vamos considerar outro processo. A seguir, veremos como a célula normal reage ao estresse e se adapta promovendo algumas alterações. Vamos lá? 1.3. Adaptações Envolvendo a Proliferação e a Diferenciação Celular Adaptações são alterações reversíveis no tamanho, número, fenótipo, atividade metabólica ou funções das células em resposta a alterações em seu ambiente. Tais adaptações podem se Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 10 | P á g i n a manifestar de formas distintas. Serão descritos nesse tópico os quatro tipos mais importantes de adaptação celular – hipertrofia, atrofia, hiperplasia e metaplasia. Certamente, você já ouviu falar sobre alguns deles. Essa será a oportunidade de conhecê-los com mais detalhes, dando enfoque especial ao contexto patológico em que estas adaptações podem estar inseridas. Então vejamos... 1.3.1. Hipertrofia e Atrofia Vamos comentar inicialmente sobre a Hipertrofia. Você já ouviu falar nesse termo? Ele se refere ao aumento no tamanho das células resultando em aumento de tamanho do órgão, não pela presença de células novas, e sim de células maiores. O aumento do tamanho celular deve-se à síntese de mais componentes estruturais das células. A hipertrofia pode ser fisiológica ou patológica e é causada pelo aumento da demanda funcional ou pelo estímulo de fatores de crescimento e hormônios. Células musculares estriadas tanto esqueléticas quanto cardíacas respondem ao aumento da demanda metabólica predominantemente através de hipertrofia. Os músculos esqueléticos aumentados de indivíduos que praticam musculação resultam do crescimento de fibras musculares individuais em resposta a uma maior demanda. No coração, o estímulo para a hipertrofia é usualmente a sobrecarga hemodinâmica decorrente de hipertensão arterial ou de defeitos nas válvulas cardíacas (figura 2). Nos dois casos, as células musculares sintetisam mais proteínas e o número de miofilamentos aumenta. A hipertrofia de cada miócito aumenta a força e a capacidade de trabalho no músculo como um todo. O crescimento fisiológico do útero durante a gestação é um bom exemplo de hipertrofia induzida por hormônios (figura 3). O aumento do tamanho celular é estimulado pelo estrógeno, que se liga a receptores presentes nas fibras musculares lisas, resultando em maior síntese de proteínas nessas células e consequente aumento de tamanho. Figura 3: Hipertrofia fisiológica do útero durante a gestação. A, aspecto macroscópico de um útero normal (à direita) e de um útero gravídico removido devido a hemorragia pós-parto (à esquerda). B, células musculares lisas pequenas de um útero normal, comparadas com C, células grandes de um útero gravídico, sob a mesma magnificação. Fonte: KUMAR, 2010, p8. Figura 2: Hipertrofia do miocárdio. Corte transversal do coração de um indivíduo que apresentava hipertensão crônica mostrando hipertrofia concêntrica pronunciada do ventrículo esquerdo. (RUBIN, 2009, p5). B C Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 11 | P á g i n a Independentemente da causa e do mecanismo da hipertrofia de miocardiócitos, existe um limite a partir do qual o crescimento da célula não é mais o suficiente para tolerar a sobrecarga. Nesse estágio, várias alterações regressivas podem acontecer, incluindo a lise e a perda doselementos contráteis. Em casos extremos, pode ocorrer morte dos miocardiócitos. O resultado final é a falência cardíaca, uma sequência de eventos que ilustra como uma adaptação ao estresse pode progredir para uma alteração celular funcionalmente significativa caso o agente estressor não seja removido. Os anabolizantes são hormônios utilizados com o objetivo de promover hipertrofia muscular. Infelizmente, essas drogas ainda são muito consumidas por jovens. Você sabia que os anabolizantes podem provocar infertilidade, impotência, alterações hepáticas graves, vômitos, náuseas, hipertensão arterial, dentre outros? Agora, vamos aprender sobre a Atrofia. Esse processo se caracteriza pela redução do tamanho de um órgão devido à diminuição do tamanho e do número de células, podendo ser fisiológica ou patológica. A atrofia fisiológica é comum durante o desenvolvimento normal. Algumas estruturas embrionárias, tais como a notocorda e o ducto tireoglosso, sofrem atrofia durante o desenvolvimento fetal. O útero diminui de tamanho logo após o parto, o que também representa uma forma de atrofia fisiológica. A atrofia patológica pode ser localizada ou generalizada. Você sabe quais são as causas mais comuns de atrofia? Vamos conhecê-las a seguir: DESUSO Quando um osso fraturado é imobilizado, ou quando o paciente é mantido em repouso absoluto, rapidamente instala-se um processo de atrofia da musculatura esquelética. Inicialmente, a redução do tamanho das células pode ser revertida assim que a atividade for retomada. Com o tempo, passa a ocorrer apoptose das fibras musculares, com consequente redução no número de células. ( Fonte: Disponível em : < http://www.ccs.saude.gov.br/visa/cartuns/02_amorim05_m.jpg> Acesso em: 10/12/2009) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 12 | P á g i n a PERDA DE INERVAÇÃO O metabolismo e a função normais do músculo esquelético são dependentes do suprimento nervoso. O dano aos nervos leva à atrofia das fibras musculares supridas por esses nervos. REDUÇÃO DO SUPRIMENTO SANGUÍNEO – ISQUEMIA A isquemia que resulta da oclusão arterial de desenvolvimento lento leva à atrofia tecidual. Nas fases avançadas da vida, o cérebro pode sofrer atrofia progressiva principalmente como consequência da redução do suprimento sanguíneo devido à ateroslcerose (figura 4). Esta alteração é conhecida como atrofia senil, e também afeta o coração. NUTRIÇÃO INADEQUADA A desnutrição proteico-calórica grave leva à utilização do músculo esquelético como fonte de energia assim que as outras reservas, tais como o tecido adiposo, forem depletadas. Este fato leva a uma perda marcante de massa muscular, conhecida como caquexia, também encontrada em pacientes com doenças inflamatórias crônicas e câncer. PERDA DO ESTÍMULO ENDÓCRINO Muitos tecidos, tais como a mama e os órgãos reprodutores, são dependentes do estímulo endócrino para a manutenção de seu metabolismo. Após a menopausa, a perda do estímulo determinado pelo estrógeno resulta em atrofia fisiológica do endométrio, do epitélio vaginal e da mama. COMPRESSÃO A compressão tecidual determinada, por exemplo, pela expansão de um tumor benigno, pode causar atrofia dos tecidos vizinhos. Nesse caso, a atrofia é provavelmente decorrente de isquemia induzida pela compressão exercida pela massa tumoral sobre os vasos sanguíneos da região. Figura 4: Atrofia. A, Cérebro normal de um adulto jovem. B, Atrofia cerebral de um homem de 82 anos com doença aterosclerótica cerebrovascular, resultando em redução do fluxo sanguíneo. Note que a perda de substância cerebral torna os giros mais estreitos e os sulcos mais amplos. As meninges foram removidas da metade direita de cada espécimento para permitir a visualização da superfície do cérebro. (Fonte: KUMAR, 2010, p.9). Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 13 | P á g i n a Agora que você já conhece os principais aspectos da Hipertrofia e da Atrofia, vamos comentar sobre uma outra forma de adaptação celular – a Hiperplasia. 1.3.2. Hiperplasia A hiperplasia é o aumento do número de células de um órgão ou tecido, usualmente resultando em aumento da massa desse órgão ou tecido. A hiperplasia pode ser fisiológica ou patológica e, obviamente, ocorre apenas quando a população celular for capaz de se dividir. Apesar de serem processos distintos, frequentemente hiperplasia e hipertrofia ocorrem simultaneamente, podendo ser desencadeadas pelos mesmos estímulos externos. A hiperplasia fisiológica pode ser dividida em HORMONAL, em que há aumento da capacidade funcional do tecido quando necessário; e COMPENSATÓRIA, que se segue a algum dano tecidual ou à ressecção parcial. A proliferação do epitélio glandular da mama durante a gestação representa um exemplo de hiperplasia fisiológica hormonal. Já a hiperplasia fisiológica compensatória pode ser ilustrada pela proliferação de hepatócitos após a doação de um lobo do fígado para transplante. A maioria dos casos de hiperplasia patológica deve-se ao excesso de hormônios ou fatores de crescimento atuando sobre as células-alvo. A hiperplasia prostática benigna induzida pela testosterona ilustra esse tipo de hiperplasia. Nas hiperplasias, a proliferação celular é controlada, já que não há mutações nos genes que regulam a divisão celular. Sendo assim, a hiperplasia regride assim que o estímulo hormonal é eliminado. Finalizamos esse assunto, a partir desse momento vamos considerar outra alteração celular. Fique atento às explicações a seguir. 1.3.3. Metaplasia A metaplasia é uma alteração celular reversível na qual um tipo celular diferenciado (epitelial ou mesenquimal) é substituído por outro tipo celular. Trata-se de uma adaptação na qual células mais sensíveis ao estresse são substituídas por outras capazes de tolerar o ambiente adverso. A forma mais comum de metaplasia epitelial é a que ocorre no trato respiratório em resposta à irritação crônica. Nesse caso, as células colunares ciliadas que compõem o revestimento da traquéia e brônquios são substituídas por células epiteliais escamosas estratificadas (figura 5). Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 14 | P á g i n a A deficiência de vitamina A também é capaz de induzir metaplasia escamosa no epitélio respiratório. Em todos os casos, o novo tecido é mais resistente e capaz de sobreviver ao ambiente inóspito. Contudo, o organismo paga um preço por esta adaptação. No caso do epitélio respiratório, por exemplo, importantes mecanismos de proteção contra infecções são perdidos, tais como a secreção de muco e a ação dos cílios presentes nas células colunares. Assim, a metaplasia epitelial é uma “faca de dois gumes” – se por um lado leva ao aumento da resistência tecidual local, por outro traz modificações indesejáveis. Além disso, os fatores que predispõem à metaplasia, se persistentes, podem levar à transformação maligna no epitélio metaplásico. Agora você já conhece as adaptações que envolvem a proliferação e a diferenciação celular. Iremos considerar, a partir desse momento, os acúmulos intracelulares. Dessa forma, você compreenderá mais uma particularidade dos estágios da resposta celular ao estresse e a estímulos nocivos. 1.4. Acúmulos IntracelularesO acúmulo intracelular de diversos tipos de substâncias representa uma das manifestações de distúrbios metabólicos nas células. Essas substâncias podem ser constituintes normais das células que, transitoria ou permanentemente, se acumulam em seu citoplasma; ou substâncias anormais exógenas ou endógenas. Ao longo desta disciplina, serão abordados diversos distúrbios que comprometem a distribuição de oxigênio para as células. Nessas circunstâncias, frequentemente se observa degeneração hidrópica, denominação empregada para o acúmulo intracelular de água e eletrólitos que será descrito detalhadamente a seguir. Outro importante tipo de acúmulo intracelular é Membrana basal Epitélio Colunar Nornal Membrana escamosa Figura 5: Metaplasia de epitélio colunar para escamoso. A, Diagrama esquemático. B, Metaplasia do epitélio colunar (esquerda) para epitélio escamoso (direita) em um brônquio. Fonte: KUMAR, 2010, p.10 Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 15 | P á g i n a a esteatose, caracterizada pela presença de grandes quantidades de triglicerídeos no citoplasma de células que normalmente não o armazenam. Como essa alteração é muito encontrada em indivíduos que apresentam distúrbios no metabolismo de lipídeos, em casos de desnutrição proteica, em etilistas crônicos, em obesos, dentre outros, certamente você estará diante de portadores de esteatose ao longo de sua carreira. Sendo assim, vale a pena entender como esta alteração se desenvolve e suas repercussões para o organismo. Aproveite! 1.4.1. Degeneração Hidrópica A degeneração hidrópica é a lesão não-letal mais comum diante de inúmeras agressões. Trata-se de uma alteração reversível caracterizada pelo acúmulo de água e eletrólitos no interior da célula, tornando-a tumefeita. Qualquer interferência no funcionamento dos canais iônicos presentes na membrana plasmática, tais como hipóxia, hipertermia e lesões provocadas por radicais livres, pode levar ao desequilíbrio hidroeletrolítico responsável pelo acúmulo intracelular de água e eletrólitos. Em geral, esse tipo de degeneração não traz consequências funcionais muito sérias para os órgãos afetados. Os aspectos morfológicos da degeneração hidrópica variam com a intensidade da lesão. Ao exame macroscópico, em geral, os órgãos apresentam aumento de volume e de peso, assim como coloração mais pálida. O exame microscópico revela células tumefeitas que, em estágios mais avançados, passam a apresentar pequenos vacúolos de água distribuídos pelo citoplasma. Esses vacúolos podem se fundir formando uma única vesícula intracelular (figura 6). 1.4.2. Esteatose Trata-se do acúmulo de gorduras neutras no citoplasma de células que normalmente não as armazenam. Vários tipos de agressão são capazes de gerar esteatose. A lesão aparece todas as vezes que um agente interfere no metabolismo dos ácidos graxos da célula, aumentado sua síntese ou dificultando sua utilização, transporte ou excreção. Agentes tóxicos, hipóxia, alterações dietéticas Figura 6: Degeneração hidrópica. Uma punção-biópsia do fígado de um paciente com injúria hepática tóxica mostra degeneração hidrópica severa na região centrolobular. Os hepatócitos afetados exibem núcleos centrais e citoplasma distendido (balonizado) pelo excesso de fluido. Fonte: RUBIN,2009, p9. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 16 | P á g i n a e distúrbios metabólicos de origem genética podem levar à esteatose. A ingestão abusiva de etanol e os distúrbios do metabolismo lipídico associados à obesidade são as causas mais comuns de esteatose hepática. A esteatose é mais comum no fígado porque este é o principal órgão envolvido no metabolismo lipídico. Contudo, miocardiócitos, células que revestem os túbulos renais, células do pâncreas e músculo esquelético também podem ser acometidos. As características macroscópicas do órgão acometido por esteatose são variáveis. Em geral, observa-se coloração amarelada associada ao aumento de peso e de volume. O aspecto microscópico típico de uma célula com esteatose em fase inicial é o aumento de volume e a presença vacúolos de tamanhos variados contendo triglicerídeos. Com a progressão da doença, esses vacúolos tendem a se fundir e a célula adquire características morfológicas semelhantes àquelas encontradas em adipócitos (Figura 7). Todas as alterações descritas até agora resultaram de estímulos nocivos não-letais. Será descrita agora a última fase dos estágios da resposta celular ao estresse e a estímulos nocivos, que culminará com a morte celular. Vamos lá? 1.5. Morte Celular Ao agirem nas células, os agentes lesivos causam lesões reversíveis ou morte celular. Se a morte celular ocorre no organismo vivo e é seguida de autólise, o processo recebe o nome de Necrose. Outro tipo de morte celular ocorre por processo ativo no qual a célula sofre contração e condensação de suas estruturas, fragmenta-se e é fagocitada por células vizinhas ou por macrófagos residentes, sem que haja autólise. Esse tipo de morte celular é denominado Apoptose. Vamos explicar a seguir esses dois processos detalhadamente. Fique atento! Figura 7: Esteatose hepática. Aspecto microscópico da esteatose hepática em aumento maior (400X). Na maioria das células, o núcleo encontra-se deslocado pelo vacúolo de triglicerídeos, sendo comprimido na periferia celular. (Cortesia do Dr. James Crawford, Department of Pathology, University of Florida School of Medicine, Gainesville, FL.) Fonte: KUMAR,2010, p36. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 17 | P á g i n a 1.5.1. Necrose Esse tipo de morte celular ocorre quando a agressão é suficiente para interromper as funções celulares vitais. Nessas circunstâncias, os lisossomos não conseguem conter suas hidrolases, que são liberadas para o citosol e ativadas pelos íons cálcio, levando assim à autólise. Os principais achados microscópicos são a condensação, a fragmentação e a digestão da cromatina, denominadas picnose, cariorrexe e cariólise, respectivamente. A alteração citoplasmática mais evidente é o aumento da eosinofilia. Com base nas causas e nos aspectos morfológicos, a necrose pode ser subdividida nos seguintes subtipos: Necrose por coagulação ou necrose isquêmica, na qual, além das alterações nucleares, as células necrosadas apresentam citoplasma com aspecto de substância coagulada. Nas fases iniciais, os contornos celulares são nítidos, permitindo a identificação da arquitetura do tecido afetado (figura 8). Macroscopicamente, a área atingida é esbranquiçada e faz saliência na superfície do órgão (figura 9). É também chamada de infarto ou necrose isquêmica por ser a isquemia a sua causa mais frequente. Necrose por liquefação: é aquela em que a zona necrosada adquire consistência semifluida ou liquefeita. Esse aspecto se deve à liberação de grande quantidade de enzimas lisossômicas (Figura 10). Figura 8: Necrose de coagulação. Fotomicrografia do coração de um paciente com infarto agudo do miocárdio. No centro, as células necróticas bastante eosinofílicas perderam os seus núcleos. O foco necrótico é rodeado por miócitos cardíacos viáveis, que apresentam coloração mais pálida.(Fonte: RUBIN, 2009, p.24) Figura 9: Necrose de coagulação. Infarto renal em forma de cunha (área amarela). (Fonte: KUMAR,2010, p, 21) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 18 | P á g i n a Necrose caseosa: nesse caso, a área necrosada apresenta aspecto macroscópico de massa de queijo (do latim caseum). A característica microscópica principal é a transformação das células necróticas em uma massa homogênea, acidófila, contendo alguns núcleos picnóticos e, principalmente na periferia, núcleos apresentando cariorrexe (figura 11). Este é o tipo de necrose encontrado na tuberculose (figura 12) e na paracoccidioidomicose. Necrose gomosa: é uma variante da necrose por coagulação em que o tecido necrosado apresenta aspecto borrachóide. Esse tipo de necrose é típico das lesões terciárias da sífilis. Esteatonecrose ou necrose enzimática do tecido adiposo ocorre pela ação de lipases sobre os adipócitos. É encontrada em casos de pancreatite aguda. Figura 10: Necrose de liquefação. Área de necrose no cérebro mostrando dissolução do tecido. (Fonte: KUMAR, 2010, p.21) Figura 11: Aspectos microscópicos da necrose caseosa e aumento pequeno (A) e em detalhe (B). Observa-se área central de necrose, com aspecto eosinofílico e amorfo, rodeada por células epitelióides e células gigantes multinucleadas. Adaptado de: KUMAR, V., ABBAS, A.K., FAUSTO, N., ASTER, J. Robbins and Cotran pathologic basis of disease. 8. ed. Philadelphia: Elsevier, 2010. 1464p. (Fonte: KUMAR, 2010, p.22) Figura 12: Necrose caseosa. Tuberculose pulmonar caracterizada por grande área de necrose caseosa com debris branco-amarelados semelhantes à queijo. (Fonte: KUMAR, 2010, p. 22) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 19 | P á g i n a Como o tecido necrosado comporta-se como um corpo estranho, é desencadeada uma resposta do organismo voltada para a reabsorção desse tecido e posterior reparo. As principais formas de evolução da necrose são: Regeneração, quando o tecido necrosado é substituído pelo mesmo tipo de tecido presente anteriormente; Cicatrização, quando o tecido necrosado é substituído por uma cicatriz conjuntiva; Eliminação, em situações de necroses próximas à parede de estruturas canaliculares que se comunicam com o meio externo. Nesses casos, o material necrosado é lançado nessa estrutura e daí eliminado originando uma cavidade; Gangrena, que resulta da ação de agentes externos sobre o tecido necrosado. A gangrena seca ocorre quando a região necrosada torna-se desidratada; as gangrenas úmida e gasosa são decorrentes de invasão por microrganismos (Figura 13). 1.5.2. Apoptose Inicialmente conhecida como morte celular programada, a apoptose é um fenômeno ATP-dependente no qual a célula é estimulada a acionar mecanismos que culminam com sua morte. Esse tipo de morte celular pode ocorrer tanto em estados fisiológicos quanto em estados patológicos. Um exemplo clássico de apoptose fisiológica é a que ocorre nas células das glândulas mamárias quando se encerra a fase de lactação. Inúmeros agentes tais como vírus, hipóxia, agressão imunitária, dentre outros são capazes de desencadear apoptose, nesse caso, com caráter patológico. Até agora, foram descritas lesões celulares resultantes da exposição a estímulos agressores. Contudo, muitas doenças são caracterizadas por distúrbios nos componentes localizados entre as células, ou seja, na matriz extracelular. O próximo tópico traz as principais alterações dos constituintes da matriz extracelular, que também são resultantes da presença de agentes nocivos. Figura 13: Gangrena seca em dois dedos de um paciente diabético com aterosclerose arterial severa. O espessamento da membrana basal dos vasos sanguíneos associado à redução do número de pequenas artérias contribui para a isquemia em indivíduos diabéticos. (Fonte: ROSE, 2008, p.568) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 20 | P á g i n a Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 21 | P á g i n a 1.6. Alterações da Matriz Extracelular A matriz extracelular (MEC) é composta por três grupos de macromoléculas: proteínas fibrosas, tais como colágeno e elastina; glicoproteínas adesivas; e proteoglicanos e glicosaminoglicanos, que formam um gel hidratado conhecido como substância fundamental. Essas moléculas se associam para formar duas formas básicas de MEC: matriz intersticial e membranas basais. A matriz intersticial é encontrada nos espaços entre as células epiteliais, endoteliais, células musculares lisas e tecido conjuntivo. Já as membranas basais são intimamente associadas às superfícies celulares. 1.6.1. Alterações das Fibras Colágenas As alterações das fibras colágenas podem ser decorrentes de defeitos genéticos ou de defeitos adquiridos. As doenças genéticas que envolvem defeitos no colágeno são raras e, em geral, manifestam-se na pele (alterações na elasticidade e resistência), nos vasos sanguíneos (aneurismas, por exemplo) e nos ossos. A síndrome de Marfan, a Osteogênese Imperfeita e a Síndrome de Ehlers- Danlos são exemplos de doenças genéticas que afetam o colágeno. Os defeitos adquiridos do colágeno são mais comuns que os genéticos. Dentre eles, pode-se citar: Escorbuto: deve-se à carência de vitamina C e suas principais manifestações estão relacionadas com a fragilidade vascular. A figura 14 mostra algumas das características clínicas do escorbuto. Figura 14: Principais consequências da deficiência de vitamina C causadas pela incapacidade na formação do colágeno. (Fonte: KUMAR, 2010, p. 460) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 22 | P á g i n a Latirismo: decorre da ingestão da semente da ervilha Latyrus oddoratus (ervilha-de-cheiro), onde são encontrados inibidores da enzima lisil-oxidase, uma enzima essencial para a formação das fibras colágenas. Os pacientes apresentam deformações ósseas e aneurismas. Fibroses: são condições em que há deposição anormal de colágeno e de outros componentes da MEC. Em geral, levam a transtornos funcionais nos órgãos acometidos. 1.6.2. Alterações das Fibras Elásticas As alterações das fibras elásticas também podem resultar tanto de defeitos genéticos quanto de defeitos adquiridos. A elastose e a elastólise são defeitos adquiridos das fibras elásticas, comumente encontrados. A elastose é encontrada nos vasos sanguíneos e no endocárdio de indivíduos com hipertensão arterial crônica ou outras alterações hemodinâmicas. O aumento da atividade da elastase leva à fragmentação das fibras elásticas e consequente elastólise. Esta alteração é encontrada na derme de indivíduos idosos e em indivíduos que se expõem excessivamente à luz solar. Portadores de enfisema também apresentam elastólise no tecido pulmonar. Finalizamos aqui a Unidade 1. Agora você já conhece os principais fatores relativos à patologia celular e da matriz extracelular. Todosos aspectos abordados nessa unidade serão essenciais para que você compreenda o conteúdo das próximas unidades e de outras disciplinas mais específicas do seu curso. Não deixe de ler o texto a seguir. Nele você verá como esse conteúdo está presente em nosso dia-a- dia. Em seguida, visite a seção Recapitulando, que traz uma breve revisão dos principais tópicos dessa unidade. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 23 | P á g i n a 2 Teoria na Prática O texto abaixo foi publicado na coluna Espelho Meu da revista Veja, em 12 de agosto de 2008. Observe os termos e expressões marcados em azul e note como eles se relacionam com várias alterações descritas nesta unidade. Sua pele também reclama do cigarro Lucia Mandel Este meu texto de hoje não vai explicar que o cigarro causa câncer de pulmão. Também não vai citar os outros tipos de cânceres mortais causados pelo fumo. Não vai falar sobre o risco aumentado de infarto nem sobre como esse veneno causa bronquite e enfisema. Tudo isso você já sabe e está cansado de ouvir. Mas se ainda assim os argumentos não foram suficientes para fazer um fumante parar, aqui vai mais uma tentativa. Dessa vez, da pele. Sim, porque entre os inúmeros males causados pelo cigarro, ainda há o envelhecimento da pele. Se ainda há quem pense que cigarro dá charme e glamour, a ciência prova que fumar não deixa ninguém mais bonito. Pouco a pouco, o cigarro agride, resseca, enruga e muda a cor da pele e dos dentes. Como o cigarro afeta a nossa pele? O cigarro provoca a contração de vasos sanguíneos que irrigam a pele. Com isso, ela recebe menor quantidade de nutrientes e oxigênio que o normal e fica em contínua desnutrição. Consequentemente, o colágeno, fibra que dá sustentação à pele, é danificado. A fabricação de colágeno novo também é prejudicada. Com o tempo, a pele enruga mais do que seria esperado se a pessoa não fumasse. Ela fica fina e se atrofia muito além do que a genética determina. A elasticidade também é afetada, pois há danos nas fibras elásticas da derme, a segunda camada da pele. A isso se soma o movimento facial, repetido tantas e tantas vezes num puxar e soltar a fumaça, que causa rugas profundas ao redor dos lábios. Rugas profundas aparecem também ao redor dos olhos, que se contraem quando a fumaça é exalada. O calor e a fumaça dia após dia em contato com a pele acabam deixando-a ressecada. Todas essas alterações, somadas a uma coloração pálida, amarelada, e às vezes cinzenta devido à má circulação, são descritas no meio médico como smoker’s face (face de fumante). Por mais injusto que pareça, a face de fumante é mais intensa nas mulheres. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 24 | P á g i n a Cigarro e o câncer de pele A incidência de carcinoma espinocelular de pele é maior nos fumantes. Além de maior incidência, o carcinoma é mais agressivo nesse grupo. Quanto ao melanoma, não se observa aumento na incidência em fumantes. Mas a agressividade da doença é maior em quem fuma. Cicatrização e fumo A má nutrição da pele prejudica a cicatrização após uma cirurgia. As cicatrizes ficam alargadas e há risco de necrose de enxertos e retalhos de pele, feitos em cirurgias. Se você fuma, ao menos colabore com seu cirurgião e suspenda o cigarro alguns dias antes e alguns dias depois da cirurgia. Aí colabore com você e pare para sempre. Viu? Dessa vez não foram o ofegante pulmão ou o sofrido coração que imploraram para você abandonar o cigarro. Foi sua linda e sensível pele. (Disponível em <http://veja.abril.com.br/blog/estetica-saude/arquivo/sua-pele-tambem-reclama-do-cigarro/> Acesso em:11/12/09) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 25 | P á g i n a 4. Recapitulando Finalizamos esta unidade sobre Patologia Celular e Matriz Extracelular. Portanto, este é o momento ideal para revermos alguns termos e processos que foram estudados. Caso você tenha alguma dúvida, retorne aos tópicos e reveja o assunto. Leia atentamente os principais aspectos que foram estudados nesta unidade: PATOLOGIA é a ciência que estuda as doenças sob os seguintes aspectos: a etiologia, a patogênese, as alterações morfológicas e moleculares, e as manifestações clínicas. Dependendo da intensidade e da duração, estímulos nocivos são capazes de lesar as células de forma transitória e recuperável (injúria reversível), ou de forma permanente (injúria irreversível), levando à morte celular. São causas de lesão celular: redução do suprimento de oxigênio e nutrientes, agentes biológicos, químicos e físicos, radicais livres, reações imunológicas desreguladas e anomalias genéticas. HIPERTROFIA se refere ao aumento no tamanho das células determinado pelo aumento da demanda funcional ou pelo estímulo de fatores de crescimento e hormônios. Pode ser fisiológica ou patológica. ATROFIA é a redução no tamanho de um órgão devido à diminuição do tamanho e do número de células, podendo ser fisiológica ou patológica. Desuso, perda de inervação ou de nutrição, isquemia, perda do estímulo endócrino e compressão podem levar à atrofia. HIPERPLASIA é o aumento do número de células de um órgão ou tecido, usualmente resultando em aumento da massa desse órgão ou tecido. Nas hiperplasias, tanto fisiológicas quanto patológicas, a proliferação celular é controlada, o que as diferencia das neoplasias. METAPLASIA é uma alteração celular na qual um tipo celular diferenciado (epitelial ou mesenquimal) é substituído por outro tipo celular. Trata-se de uma adaptação na qual células mais sensíveis ao estresse são substituídas por outras capazes de tolerar o ambiente adverso. O acúmulo intracelular de diversos tipos de substâncias representa uma das manifestações de distúrbios metabólicos nas células. A DEGENERAÇÃO HIDRÓPICA é caracterizada pelo acúmulo de água e eletrólitos no interior da célula, tornando-a tumefeita. Já a ESTEATOSE é caracterizada pelo acúmulo de gorduras neutras no citoplasma de células que normalmente não as armazenam. Vários tipos de agressão são capazes de gerar esteatose. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 26 | P á g i n a Ao agirem nas células, os agentes lesivos causam lesões reversíveis ou morte celular. Se a morte celular ocorre no organismo vivo e é seguida de autólise, o processo recebe o nome de Necrose. Outro tipo de morte celular ocorre por processo ativo no qual a célula sofre contração e condensação de suas estruturas, fragmenta-se e é fagocitada por células vizinhas ou por macrófagos residentes, sem que haja autólise. Esse tipo de morte celular é denominado Apoptose. Os constituintes da matriz extracelular também estão sujeitos a agressões. O escorbuto e a Osteogênese Imperfeita são exemplos de alterações nas fibras colágenas, enquanto a elastose e a elastólise representam distúrbios nas fibras elásticas. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton27 | P á g i n a Unidade 2: Distúrbios Circulatórios e Inflamação 1. Conteúdo Didático 1.1 Hiperemia, Edema e Hemorragia A nossa sobrevivência depende da manutenção de um suprimento sanguíneo adequado para todas as células, o que envolve o funcionamento eficiente do coração, a integridade dos vasos sanguíneos e a quantidade e qualidade do sangue, que é composto por água, sais, inúmeras proteínas, plaquetas, leucócitos e hemácias. O sangue distribui oxigênio, nutrientes, sais e hormônios às células, além de recolher os produtos finais do metabolismo celular que deverão ser excretados. O sangue também é importante nos processos de defesa contra agentes infecciosos, corpos estranhos e substâncias irritantes. Dessa forma, qualquer distúrbio que comprometa a distribuição de sangue para os tecidos pode desencadear alterações celulares de intensidade variável. Iniciaremos a descrição dos distúrbios circulatórios com duas importantes desordens hemodinâmicas – a HIPEREMIA e o EDEMA. 1.1.1 Hiperemia Este é o termo empregado para as situações em que ocorre aumento do volume de sangue dentro dos vasos de um determinado órgão ou região. Pode ser dividida em dois tipos: ativa e passiva. Na Hiperemia Ativa, ocorre dilatação arteriolar que leva ao aumento do fluxo sanguíneo. Esse tipo de hiperemia é encontrado em áreas de inflamação (hiperemia ativa patológica) e no músculo esquelético durante o exercício físico (hiperemia ativa fisiológica). Os tecidos afetados se apresentam avermelhados, o que é conhecido como eritema, e mais quentes que o habitual. Já a Hiperemia Passiva, também chamada Congestão, resulta de redução da drenagem venosa, provocando distensão das veias distais, vênulas e capilares. A congestão pode ser sistêmica, como na insuficiência cardíaca, ou local, como em obstruções venosas isoladas. Os tecidos que apresentam congestão têm aspecto azulado – conhecido como cianose – devido ao acúmulo de hemoglobina desoxigenada. Como resultado do aumento de volume sanguíneo e da pressão, a congestão frequentemente leva ao edema, que será descrito posteriormente. Fonte: Disponível em: > http://portal.saude.gov.br/port al/saude/visualizar_texto.cfm? idtxt=23615> Acesso em: 28/12/2009 Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 28 | P á g i n a O aspecto microscópico típico tanto da hiperemia ativa quanto da passiva é a presença de vasos sanguíneos apresentando a luz repleta de sangue, com predomínio esperado de hemácias (Figura 1). Para a distinção entre os dois processos, é essencial avaliar os dados clínicos do caso, bem como os outros constituintes teciduais encontrados no espécimen analisado. Em casos de congestão, por exemplo, é comum encontrar áreas de micro-hemorragias além de processos patológicos obstrutivos nas proximidades. 1.1.2 Edema Edema é o acúmulo de fluido no interstício ou em cavidades do organismo2. O edema pode ser localizado ou sistêmico e, depedendo de sua composição, exsudato ou transudato. O exsudato é um fluido rico em proteínas e sua presença indica aumento da permeabilidade vascular, um fenômeno típico do processo inflamatório. Já o transudato é um líquido pobre em proteínas e se deposita nos tecidos em situações específicas que não envolvem o aumento da permeabilidade vascular. Antes de iniciarmos a descrição detalhada do Edema, vamos relembrar como a água é distribuída no organismo em situação de homeostase. A água contribui com cerca de 60% do peso corporal, descontando-se o tecido adiposo. Dois terços do volume de água encontra-se no meio intracelular. A quantidade remanescente localiza-se nos compartimentos extracelulares – a maior parte no interstício (entre as células) e apenas 5% do total no plasma sanguíneo. A compreensão da patogênese do edema depende do conhecimento dos fatores que regulam o transporte de líquidos na microcirculação. A diferença entre as pressões hidrostáticas (exercida pela água) e oncóticas (exercida pelas proteínas) é responsável pelo movimento do líquido do meio intra para o extravascular. Quando a diferença entre as pressões hidrostáticas intra e extravascular é maior que a diferença entre as pressões oncóticas intra e extravascular, ocorre saída de líquidos dos vasos. Quando a situação se inverte, ocorre reabsorção de líquidos. Duas teorias explicam a troca contínua de líquidos na microcirculação: (1) filtração do lado arterial e reabsorção do lado venoso de 2 O edema em cavidades recebe nomes particulares: hidrotórax, hidropericárdio, hidroperitônio (ou ascite). Quando o edema é generalizado, dá-se o nome de anasarca. Figura 1: Hiperemia Ativa - vasos sanguíneos na camada serosa do apêndice de indivíduo com apendicite aguda. Observe que os vasos apresentam luz repleta de hemácias (seta). Fonte: Disponível em:< http://anatpat.unicamp.br/lamdc2.html> Acesso em: 28/12/2009. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 29 | P á g i n a um mesmo capilar. No lado arterial, a diferença entre as pressões hidrostáticas ultrapassa a diferença de pressão oncótica, levando à saída de líquidos para o interstício. Com isso, a pressão hidrostática do lado venoso diminui, enquanto a pressão oncótica aumenta (devido à perda de água sem perda significante de proteínas), favorecendo a entrada de líquidos. (2) filtração e reabsorção em um vaso com motilidade rítmica. Durante a contração do vaso, a pressão hidrostática se eleva, o que promove a filtração ao longo de todo o capilar. Com a dilatação que se segue, a pressão hidrostática cai e há reabsorção no mesmo vaso. Conforme mostra a figura 2, normalmente, os capilares e vênulas reabsorvem apenas 85% do líquido que é filtrado para o interstício, sendo os 15% restantes drenados pelos vasos linfáticos. Seguindo esses princípios, o edema se forma pelos seguintes mecanismos: aumento da pressão hidrostática intravascular (figura 3); redução da pressão oncótica do plasma (figura 4); aumento da permeabilidade vascular com saída de líquidos e proteínas para o interstício - exsudato (figura 5); aumento da pressão oncótica intersticial; obstrução da drenagem linfática (figura 6). Figura 2: Em condições normais, o líquido filtrado na microcirculação é quase totalmente reabsorvido no lado venoso; o restante (cerca de 15%) é drenado pelos vasos linfáticos. Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p185. Figura 3: Quando existe aumento da pressão hidrostática no lado venoso (redução do retorno venoso), há diminuição da reabsorção do líquido filtrado; o sistema linfático não consegue drenar todo o líquido não-reabsorvido, surgindo o edema. Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p185. Figura 4: Se há redução da pressão oncótica intravascular, a reabsorção de líquidos é reduzida, provocando o edema. Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p185. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 30 | P á g i n a O quadro abaixo traz as causas mais comuns de edema organizadas de acordo com a patogênese. QUADRO 1 - ETIOPATOGÊNESE DOS EDEMAS Aumento da pressão hidrostática intravascular Insuficiência cardíaca congestiva (figura 7) Cirrose hepática (hipertensão porta) Obstrução do retorno venoso (trombos, compressãoexterna dos vasos, imobilização, efeito da força da gravidade) Alteração da pressão oncótica Diminuição da pressão oncótica plasmática Perda de proteínas (síndrome nefrótica; gastroenteropatias) Redução da síntese proteica (desnutrição – figura 8, cirrose hepática) Aumento da pressão oncótica intersticial Aumento da permeabilidade capilar (toxinas bacterianas, aminas vasogênicas, alterações metabólicas) Aumento de substâncias hidrofílicas no interstício (hipotireoidismo, mucopolissacaridoses) Obstrução linfática Inflamações Parasitas (filariose) Neoplasias em linfonodos Retirada cirúrgica de linfonodos Radioterapia (Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p.184) Figura 7: Edema na perna. A. Em um paciente com insuficiência cardíaca congestiva, o edema severo nas pernas é demonstrado quando se pressiona a região com um dedo. B. A depressão resultante reflete a ausência de eslaticidade do tecido quando preenchido por fluido. (Fonte: RUBIN 2009, p. 242) Figura 6: Com a obstrução do sistema linfático, o líquido não-reabsorvido pelos vasos sanguíneos acumula-se no interstício e origina edema. Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p185. Figura 5: Nas inflamações, ocorre agressão ao endotélio e aumento da permeablidade vascular, com saída de líquidos e macromoléculas para o interstício, resultando em edema. Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p185. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 31 | P á g i n a 1.1.3 Hemorragia A Hemorragia é definida como um extravasamento de sangue para o espaço extravascular. Como descrito acima, a ruptura de capilares pode ocorrer em casos de congestão crônica. Um aumento da tendência para Hemorragia (frequentemente após trauma insignificante) também pode ocorrer em várias desordens clínicas conhecidas como diáteses hemorrágicas. A ruptura de uma artéria ou de uma veia de grande calibre leva a um quadro de hemorragia severa e é quase sempre induzida por trauma, aterosclerose, ou erosão da parede vascular por processo inflamatório ou neoplásico. As Hemorragias podem apresentar padrões distintos e as repercussões clínicas são variáveis. Vamos entender melhor como acontece esse processo? Observe algumas particularidades sobre as hemorragias. A Hemorragia pode ser Externa ou Interna, quando permanece contida dentro do tecido. No último caso, o acúmulo é denominado Hematoma, que pode ser desde relativamente insignificante até potencialmente fatal. Pequenas lesões hemorrágias apresentando de 1 a 2 milímetros de tamanho localizadas na pele, nas membranas mucosas ou em superfícies serosas são conhecidas como Petéquias (Figura 9). Nesses casos, comumente existe associação com aumento da pressão intravascular local, baixa contagem de plaquetas ou deficiências na função plaquetária. Figura 8: Bebê apresentando Kwashiorkor, um quadro grave de desnutrição proteica. Notar edema generalizado, evidenciado por ascite, edema na face, mãos e pernas. Fonte: KUMAR 2010, p.448. Figura 9: Pequenos pontos hemorrágicos – petéquias – na mucosa intestinal como consequência de trombocitopenia. Fonte: KUMAR, 2010, p.124. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 32 | P á g i n a Hemorragias um pouco maiores (cerca de 3 mm de tamanho) são chamadas Púrpuras, e podem estar associadas às mesmas desordens que levam à formação de Petéquias, ou surgir em consequência de trauma, inflamação vascular ou aumento da fragilidade vascular. Hematomas subcutâneos maiores (de 1 a 2 centímetros) são denominados Equimoses. As hemácias dessas lesões são degradadas e fagocitadas por macrófagos. Nesses casos, a Hemoglobina (de cor vermelho-azulada) é enzimaticamente convertida em Bilirrubina (de cor azul-esverdeada) e posteriormente em Hemossiderina (coloração marrom). Esses pigmentos são responsáveis pelas mudanças na coloração das equimoses. Dependendo da localização, um grande acúmulo de sangue em uma cavidade do corpo é chamado Hemotórax, Hemoperitônio, Hemopericárdio (também chamado tamponamento cardíaco), ou Hemartrose (nas articulações). Pacientes com sangramentos extensos podem desenvolver Icterícia (acúmulo de bilirrubina nos tecidos) em função da destruição de grande quantidade de hemoglobina. Hemorragia Digestiva pode exteriorizar-se pela boca ou pelo ânus. Nos casos de hemorragia digestiva baixa, o sangue é eliminado com as fezes sem sofrer transformação e, por isso, tem cor vermelho-viva. Esse processo é denominado Enterorragia. Já nas Hemorragias Digestivas Altas, após contato com as enzimas digestivas os constituintes do sangue são modificados. A Hematina, que se forma a partir da digestão da Hemoglobina, tem aspecto negro. Sendo assim, o sangue eliminado com as fezes tem aspecto escuro. Esse sangramento é denominado Melena. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 33 | P á g i n a O quadro a seguir apresenta a lista dos nomes empregados para tipos diferentes de hemorragias. . O significado clínico da Hemorragia depende do volume de sangue perdido e da velocidade da perda. Uma perda rápida de até 20% do volume de sangue normal ou perdas crônicas de grandes quantidades de sangue pode não ter qualquer impacto clínico em adultos saudáveis. Entretanto, perdas de maior volume de sangue podem levar ao Choque Hemorrágico ou Hipovolêmico, que será descrito posteriormente. O local do sangramento também é importante. Por exemplo, sangramentos pequenos que são insignificantes se localizados no tecido subcutâneo representam risco de morte quando ocorrem no cérebro (figura 10). Como o crânio não sofre distensão, uma hemorragia intracraniana (conhecida como derrame) resulta em aumento da pressão suficiente para comprometer o suprimento sanguíneo e causar herniação do tronco cerebral. QUADRO 2 - NOMENCLATURA DAS HEMORRAGIAS Epistaxe Equimose Hemartrose Hematêmese Hematoma Hematúria Hemopericárdio Hemoperitônio Hemoptise Hemotórax Melena Menorragia Menstruação Metrorragia Otorragia Petéquia Púrpura Sufusão Hemorragia nas fossas nasais Sangramentos em pequenos focos, maiores que as petéquias Sangue nas articulações Vômito de sangue Sangramento circunscrito formado por coleção volumosa Sangue na urina Sangue na cavidade pericárdica Sangue na cavidade peritonial Expectoração de sangue Sangue na cavidade pleural Sangue “digerido” eliminado nas fezes Menstruação prolongada ou profusa, em intervalos regulares Sangramento uterino cíclico e fisiológico da mulher Sangramento uterino irregular entre os ciclos Sangramento pelo conduto auditivo externo Sangramento puntiforme Múltiplos pequenos focos de sangramento Sangramento plano, difuso e extenso em mucosas Figura 10: Hemorragia intracerebral fatal. (Fonte: KUMAR, 2010, p.124.) Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p.162. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidadede Educação a Distância | Newton 34 | P á g i n a Hemorragias crônicas ou recorrentes causam uma perda ferro que pode levar à anemia. Ao contrário, quando as hemácias extravasadas ficam retidas, como em hemorragias internas, o ferro pode ser recuperado e reciclado para utilização na síntese de novas moléculas de hemoglobina. Agora que você já conhece os aspectos mais importantes sobre a hiperemia, o edema e a hemorragia, vamos descrever dois importantes distúrbios circulatórios que certamente você já ouviu falar – a trombose e a embolia. 1.2 Trombose e Embolia Trombose e embolia representam distúrbios circulatórios obstrutivos relativamente comuns, que fazem parte da prática clínica de todos os profissionais da área de saúde. Como a maior parte dos casos de embolia representa uma evolução da trombose, descreveremos esses dois processos em um mesmo tópico. 1.2.1 Trombose Hemostasia é um processo fisiológico que ocorre como consequência de diversas reações que levam à formação de um coágulo de sangue em locais de lesão vascular. A contraparte patológica da Hemostasia é a Trombose, distúrbio que se caracteriza pela solidificação do sangue dentro dos vasos sanguíneos ou do coração no indivíduo vivo. Trombo é a massa sólida formada pela coagulação do sangue em situação intravascular. Tanto a hemostasia quanto a trombose envolvem três componentes: a parede vascular, em especial o endotélio; as plaquetas e a cascata de coagulação. A ativação patológica do processo de coagulação é responsável pela formação dos trombos. Existem três fatores capazes de desencadear a essa ativação patológica e, consequentemente, a Trombose. São eles: (1) lesão endotelial; (2) alterações do fluxo sanguíneo; e (3) hipercoagulabilidade do sangue. Descreveremos a seguir como cada um desses fatores participa da formação de trombos. 1- Lesão endotelial Tanto lesões estruturais quanto lesões funcionais das células endoteliais são capazes de levar à trombose já que a integridade endotelial é essencial para a manutenção da fluidez do sangue. A perda endotelial permite o contato direto do sangue com o conjuntivo subendotelial, levando à adesão e agregação plaquetárias (ativação da coagulação), e também à redução de fatores anticoagulantes. A perda do endotélio em áreas de infarto do miocárdio leva à formação de trombos dentro das câmaras cardíacas, chamados trombos murais. Perda endotelial pode ocorrer também sobre placas ateroscleróticas ulceradas e em locais de lesão vascular traumática ou inflamatória. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 35 | P á g i n a Lesões endoteliais que não resultam na perda das células também são capazes de levar à Trombose. Essa disfunção das células endoteliais pode ser induzida por diversos fatores, incluindo hipertensão, fluxo sanguíneo turbulento, endotoxinas bacterianas, radiação, hipercolesterolemia e toxinas presentes no cigarro. Em todos esses casos há redução na síntese de fatores anticoagulantes e alteração na superfície celular facilitando a adesão plaquetária. 2- Alterações no fluxo sanguíneo a. Aceleração do fluxo e turbulência O aumento da velocidade do sangue modifica o fluxo laminar, levando as plaquetas para a superfície interna dos vasos. A turbulência do fluxo lesa o endotélio, permitindo o contato das plaquetas com a parede vascular (Figura 11). O fluxo sanguíneo trubulento é encontrado em aneurismas, em bifurcações e em locais em que a direção do fluxo se modifica e a força de cisalhamento pode descolar as células endoteiais. b. Estase Trata-se do retardamento do fluxo, fator muito importante na gênese de trombos venosos. A estase é encontrada em casos de insuficiência cardíaca, dilatação vascular, aumento de hematócrito, aumento da viscosidade do sangue ou redução da contração muscular, especialmente em pacientes acamados. A estase contribui para a marginação plaquetária e aumenta a permanência de fatores de coagulação ativados no local, resultando assim na formação de trombos. 3- Hipercoagulabilidade Define-se como Hipercoagulabilidade qualquer alteração nas vias de coagulação que predispõe à trombose. A Hipercoagulabilidade pode ser genética (Primária) ou adquirida (Secundária). Entre as alterações genéticas, a mais importante é uma mutação no gene que codifica o fator V, molécula importante na formação do trombo e que não é degradada em portadores da mutação. Outra alteração genética relativamente comum é a mutação no gene da protrombina, mantendo elevados os seus níveis e tornando o risco de desenvolvimento de trombose cerca de três vezes maior. Figura 11: À esquerda, fluxo laminar com elementos celulares (inclusive plaquetas) no eixo central do vaso; na região marginal flui predominantemente o plasma. Turbulência do fluxo lesa o endotélio e aumenta o contato das plaquetas com a parede. (Fonte: BRASILEIRO FILHO, 2009, p.165.) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 36 | P á g i n a As condições adquiridas que resultam em Hipercoagulabilidade são: liberação de tromboplastina no plasma, encontrada em politraumatismos, queimaduras, cirurgias extensas, circulação extracorpórea, neoplasias malignas, descolamento prematuro da placenta e feto morto retido. Quando o paciente sobrevive à trombose inicial, durante os dias seguintes o trombo sofrerá uma combinação dos seguintes eventos, que poderão ser observados por meio da Figura 12. 1- Propagação ou crescimento, quando o processo de coagulação predomina em relação à fibrinólise, o que aumenta o grau de obstrução vascular. 2- Embolização, em que o trombo se destaca ou se fragmenta dando origem a êmbolos. Este processo será descrito posteriormente. 3- Resolução ou Lise, quando a fibrina, importante componente estrutural do trombo é lisada. Nesses casos ocorre restabelecimento total ou parcial da luz do vaso sanguíneo afetado. 4- Organização e Recanalização, que ocorre em trombos antigos, que se tornam organizados pela migração e proliferação de células endoteliais, células musculares lisas e fibroblastos. Com isso, o trombo é transformado em um tecido conjuntivo bem-vascularizado. Em alguns casos, formam-se canais vasculares dentro do trombo, restabelecendo parcialmente o fluxo de sangue. Figura 12: Possíveis evoluções da trombose venosa (Fonte: Kumar 2005, p.134.) Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 37 | P á g i n a As consequências clínicas dos trombos são significantes porque eles causam obstrução de artérias e veias, além de serem fontes de êmbolos. A repercussão da trombose depende primariamente do local afetado. Trombos venosos podem causar congestão e edema em leitos vasculares distais à obstrução, o que é pouco importante quando se considera a sua capacidade de embolizar para os pulmões podendo chegar a ser fatal. Os trombos arteriais também são capazes de embolizar. Contudo, nesses casos, as consequências mais graves se devem ao efeito da obstrução no local de formação do trombo. A maioria dos trombos venosos ocorre nas veias superficiais ou profundas das pernas. Trombos venosos superficiais desenvolvem-se predominantemente nas veias safenas em áreas de varizes (figura 13).Apesar de causarem congestão local, edema e dor, esses trombos raramente embolizam. No entanto, o edema local e a dificuldade no retorno venoso predispõem a pele da região a infecções ao menor trauma e ao desenvolvimento de úlceras varicosas. A trombose venosa profunda nas veias maiores na região do joelho ou acima deste (veias poplíteas, femorais e ilíacas) representa um problema mais sério já que esses trombos frequentemente embolizam para os pulmões levando ao infarto pulmonar. A aterosclerose é a principal causa de trombose arterial porque está associada à perda da integridade endotelial e ao fluxo sanguíneo anormal. O infarto do miocárdio pode predispor a trombos cardíacos murais devido à contração discinética do miocárdio e ao dano ao endocárdio adjacente. Além das consequências obstrutivas locais, trombos cardíacos e aórticos também podem embolizar. Apesar de qualquer tecido poder ser afetado, cérebro, rins e baço são alvos particularmente comuns devido ao seu suprimento sanguíneo abundante. Figura 13: Trombose venosa profunda seguida de embolização. Fonte: Disponível em: < http://www.sirweb.org/images/patients/DVT_clot_illustration.gif > Acesso em 30/12/2009. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 38 | P á g i n a A coagulação intravascular disseminada (CID ou CIVD) consiste na coagulação do sangue em grande número de pequenos vasos, levando à formação de centenas ou milhares de microtrombos. Devido ao consumo rápido dos fatores de coagulação, o que levou esta condição a ser conhecida também como coagulopatia de consumo, os pacientes apresentam sangramento profuso em diversos locais. Inúmeros fatores podem desencadear a CID tais como complicações obstétricas, tumores malignos avançados e politraumatismos. 1.2.2 Embolia Embolia é a doença caracterizada pela presença de um ou mais êmbolos na circulação. Chama-se êmbolo qualquer massa intravascular sólida, líquida ou gasosa que é carreada pelo sangue até um local distante do seu ponto de origem, onde provocará uma obstrução. Mais de 90% dos êmbolos constituem-se de trombos que foram destacados da parede vascular – daí o termo tromboembolia. Êmbolos menos comuns incluem gotículas de gordura, bolhas de ar, fragmentos de placas ateroscleróticas e corpos estranhos. Inevitavelmente, os êmbolos se alojam em vasos que são pequenos o suficiente para impedir a sua passagem, causando assim oclusão da luz vascular. A principal consequência é o infarto do tecido irrigado pelo vaso afetado. As consequências clínicas estão na dependência do local do sistema circulatório em que os êmbolos irão se alojar - na circulação sistêmica ou na circulação pulmonar. Tromboembolia Pulmonar As veias profundas das pernas constituem a origem mais comum dos tromboêmbolos que se alojam nos pulmões. Os fragmentos de trombos passam por canais vasculares progressivamente maiores até chegarem ao lado direito do coração, de onde saem através da artéria pulmonar seguindo em direção aos pulmões. As consequências da tromboembolia pulmonar dependem do tamanho do êmbolo. Êmbolos grandes obstruem o tronco da artéria pulmonar causando bloqueio mecânico do leito arterial (figura 14A). Assim, há redução acentuada do volume de sangue que chega ao átrio esquerdo, o que pode levar ao choque (descrito posteriormente). Clinicamente, o paciente apresenta dispneia, tosse, dor torácica e hipotensão arterial. A tromboembolia pulmonar é letal quando mais de 60% do leito arterial pulmonar é obstruído. A maioria dos pacientes falece nos primeiros 30 minutos após tromboembolia maciça. Esse quadro ocorre no período pós-operatório - quando o paciente sai do leito pela primeira vez, os trombos são desalojados das veias dos membros inferiores e levados até os pulmões. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 39 | P á g i n a Em indivíduos saudáveis, êmbolos de médio calibre podem ser assintomáticos, já que ramos da artéria brônquica passam a irrigar o tecido evitando necrose no território que sofreu obstrução da artéria pulmonar. Entretanto, em pacientes com insuficiência cardíaca, a artéria brônquica não é capaz de compensar a obstrução instalando-se assim um quadro de necrose hemorrágica (figura 14B). O paciente apresenta fraqueza, dispneia, arritmias, dor torácica e hemoptise. Sinais de derrame pleural são encontrados ao exame radiográfico. Êmbolos pequenos e mútiplos podem causar hipertensão pulmonar e cor pulmonale3 quando afetam mais de 30% da circulação pulmonar (figura 14C). Tromboembolia Sistêmica ou Arterial Este tipo de tromboembolia é decorrente do deslocamento de trombos que se formaram nas câmaras cardíacas esquerdas ou em outros pontos das artérias do organismo. Cerca de 80% dos tromboêmbolos sistêmicos originam-se de trombos murais intracardíacos. Dois terços deles são associados a infartos do miocárdio do ventrículo esquerdo e um quarto com dilatação e fibrilação do átrio esquerdo. O restante origina-se em aneurismas de aorta, sobre placas ateroscleróticas ulceradas e em lesões de valvas cardíacas conforme pode se observar na figura ao lado. 3 O termo cor pulmonale foi definido pela Organização Mundial de Saúde como uma síndrome, caracterizada pela hipertrofia do ventrículo direito, resultante de doenças que afetam a função e/ou a estrutura dos pulmões. Figura 14: Tromboembolia pulmonar. A, Embolia maciça causando obstrução do fluxo sanguíneo pulmonar e sobrecarga ventricular direita (cor pulmonale agudo). B, Tromboembolia em ramo de médio calibre em paciente com insuficiência cardíaca causando infarto pulmonar. C, Múltiplos pequenos êmbolos provocando hipertensão pulmonar. Fonte: BRASILEIRO FILHO 2009, p170. Figura 15 : Principais origens de tromboêmbolos arteriais. Fonte: RUBIN 2009, p.237. Disciplina: Patologia Humana Autor: Júnia Noronha Carvalhais Amorim Unidade de Educação a Distância | Newton 40 | P á g i n a Ao contrário dos tromboêmbolos venosos que se alojam em um único leito vascular, os arteriais podem se direcionar para inúmeros locais. O local de instalação do tromboêmbolo depende da sua origem e da quantidade de sangue que o tecido recebe. Os principais locais de embolização arterial são as extremidades inferiores (75%), o cérebro (10%) e, mais raramente, intestinos, rins, baço e extremidades superiores. As consequências estão relaciondas com a vulnerabilidade do tecido à isquemia, com o calibre o vaso ocluído e com a existência de circulação colateral. Em geral, tromboêmbolos arteriais causam necrose do tecido afetado (figura 16). Embolia Gordurosa Glóbulos de gordura microscópicos – com ou sem elementos da medula hematopoiética associados – podem ser encontrados na circulação e impactados nos vasos pulmonares após fraturas de ossos longos (que têm medula amarela, composta por tecido adiposo) ou, mais raramente, em situações de trauma e queimadura do tecido adiposo (figura 16). Embolia gordurosa ocorre em cerca de 90% dos indivíduos que apresentam lesões ósseas graves, mas menos de 10% desses pacientes exibem sinais e sintomas que incluem insuficiência respiratória, distúrbios neurológicos, anemia e trombocitopenia (redução no número de
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