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literatura brasileira iv 1360183915

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LETRAS�|��149�
LITERATURA 
BRASILEIRA IV 
LETRAS�|�150�
LETRAS�|��151�
 LITERATURA BRASILEIRA IV 
ELISALVA DE FÁTIMA MADRUGA DANTAS 
�
�
�
Caros�alunos,�
�
Nessa�nova�etapa�de�estudos,�vamos�mergulhar,�através�da�leitura�de�textos�literários�e�críticos,�nas�
águas� agitadas� de� um� dos� momentos� mais� ricos� e� importantes� da� nossa� literatura:� a� primeira� fase� do�
Modernismo�Brasileiro,�momento�conhecido�como�fase�heroica�desse�movimento,�por�conta�da�bravura�e�
da�ousadia�de�suas�propostas�no�que�concerne�à�ruptura�implementada�por�seus�mentores�à�maneira�como�
a� arte� vinha� sendo� realizada� no� Brasil,� tendo� como� meta� principal,� segundo� Oswald� de� Andrade,� no�
Manifesto�da�Poesia�PauͲBrasil,��“acertar�o�relógio�império�da�literatura�nacional”1.��
Antes,� porém,� de� adentrarmos� nas� veredas� modernistas� brasileiras,� faremos� um� breve� passeio�
pelos�principais�movimentos�da�Vanguarda�Europeia,�ocorridos�no�início�do�século,�devido�à�ressonância�de�
suas�propostas�em�nosso�movimento�Modernista,�marcadas�também��por�um�profundo�desejo�de�inovação,�
pela�necessidade�sentida�de�adequar�a�expressão�artística�às�mudanças�ensejadas�pelo�desenvolvimento�da�
tecnologia,�da�indústria�e�pelas�inquietações�políticas�que�eclodem�na�Europa�do�início�do�século�XX.�
Para� que� entendamos� também� como� se� deu,� dentro� da� literatura� brasileira,� a� transição� da�
concepção� artística� que� vigorava� no� início� do� nosso� século,� embasada� nos� princípios� ideoͲestéticos� do�
realismo,� do� naturalismo,� do� parnasianismo� e� do� simbolismo,� os� quais,� por� sua� vez,� se� nutriam,�
ideologicamente,�do�cientificismo�da�época,�sobretudo�do�determinismo�e�do�positivismo�e,�esteticamente,�
de�um�excessivo�rigor�formal�que�se�traduzia�na�preocupação�parnasiana�da�arte�pela�arte,�do�retoricismo�e�
do� rebuscamento�da� linguagem,�abordaremos,�ainda�que�de�passagem,�alguns� textos� literários�e�críticos�
configuradores�do�que�é�reconhecido,�dentro�de�nossa�história�literária,�como�momento�PréͲModernista.�
Assim� sendo,� para� melhor� consecução� do� que� pretendemos� trabalhar� junto� com� vocês,�
estruturamos�nosso�curso�em�três�unidades.�São�elas:�
�
I Unidade: Vanguarda Europeia 
 
Nessa,� como� já� frisamos� acima,� iremos� conhecer� as� propostas� dos� principais� movimentos� da�
Vanguarda�Europeia�que�tiveram�repercussão�entre�os�idealizadores�do�Modernismo�Brasileiro�e�que�dizem�
1�ANDRADE,�Oswald�de.�Manifesto�da�poesia�pauͲbrasil.�In:�Do�PauͲBrasil�à�antropofagia�e�às�Utopias..Rio�de�Janeiro:�Civilização�
Brasileira,�2.�ed.�1978,�p.9�
LETRAS�|�152�
respeito� ao� Futurismo,� Expressionismo,� Cubismo,� Cubofuturismo,� Dadaísmo,� Espiritonovismo� e�
Surrealismo.��
�
II Unidade: Pré-Modernismo Brasileiro 
 
Nesse� momento,� pelo� qual� passaremos,� como� já� assinalamos,� de� forma� muito� rápida,� veremos�
algumas� manifestações� literárias� e� críticas� indiciadoras� das� fissuras� que� começam� a� abalar� os� alicerces�
ideológicos�e�estéticos�que�fundamentavam�a�construção�artística.�
�
III Unidade: A Semana de Arte Moderna e seus desdobramentos 
�
Aqui,�entraremos�no�cerne�propriamente�dito�de�nosso�curso,�ou�seja,�em�seu�objetivo�principal,�
que�consiste�no�estudo�dos�anos�20�do�Modernismo�Brasileiro.�Começaremos�então�enfocando�o�evento�
que� �marca�o� início�desse�momento,�ocorrido�entre�os�dias�13�e�18�de�dezembro�de�1922.�Em� seguida,�
passaremos,�através�da�leitura�dos�manifestos�dos�diversos�grupos�surgidos�após�a�Semana�e�dos�principais�
textos� literários� e� críticos� produzidos� pelos�modernistas,� ao� estudo� da� poética� explícita� e� implícita� que�
assinala�uma�nova�visão�de�mundo�e�uma�nova�visão�de�arte.��
Para� que� o� aproveitamento� seja� o� melhor� possível,� desnecessário� se� faz� dizer� que� precisamos�
caminhar�juntos�na�mesma�direção,�em�contínuo�diálogo.�Assim�agindo,�certamente,�iremos�ampliar�nosso�
conhecimento�acerca�da�Literatura�Brasileira.�
Bom�proveito�para�todos�nós!�
LETRAS�|��153�
UNIDADE I 
 
VANGUARDA EUROPEIA 
�
�
�
Considerações Preliminares 
 
�
Abalada� em� suas� estruturas� socioeconômicas� e� políticas,� em� decorrência� dos� conflitos�
desencadeados�pela�1ª�Guerra�Mundial,�que�vai�de�1914�a�1918,�a�Europa�dos�anos�20�é�também�marcada�
por�uma�série�de�mudanças�implementadas�pelo�desenvolvimento�da�indústria�e�da�tecnologia.�O�início�do�
século� XX� é� tido� como� apogeu� da� época� industrial� e� técnica.� VerificaͲse,� nesse� período,� o� crescimento�
acelerado�da�indústria�automobilística,�que,�de�três�mil�carros�produzidos�no�ano�de�1900,�passa�em�1913�a�
mais�de�cem�mil;�o� surgimento�de�grandes� transatlânticos;�o�aeroplano,�a� realização�dos�primeiros�voos�
extensos,�um�sobre�o�canal�da�Mancha�e�outro�sobre�os�Alpes,�realizados,�respectivamente,�em�1909,�por�
Louis� Blériot� e,� em� 1910,� por� George� Chávez;� a� construção� de� grandes� estradas� de� ferro,� como� a�
Transsiberiana,�que� ligava�a�Rússia�Ocidental�à�costa�do�Pacífico,� finalizada�em�1905,�a�Transafricana�e�a�
Transandina,� a� qual,� ligando� Buenos� Aires� a� Valparaíso,� era� apontada� como� “uma� grande� proeza� da�
engenharia,�pois�os�trilhos�se�erguem�a�três�mil�metros�,�nos�Andes,�na�fronteira�argentina”2;�as�primeiras�
experiências� de� transmissão� radiofônica,� de� transmissão� de� imagens� e� da� radiotelegrafia,� entre� outras�
invenções,�que,�encurtando�distâncias,�agilizando�os�meios�de�comunicações,� imprimiram�ao�novo�século�
um�novo�ritmo�mais�veloz,�mais�dinâmico.��
Diante�desse�cenário�de� tanta�agitação,�os�artistas�e� intelectuais�europeus�da�época�começam�a�
sentir�a�necessidade�de�romper�com�os�padrões�estéticos�em�vigor,�por�consideráͲlos�não�mais�adequados�
para�expressar�esse�novo� tempo.�A�necessidade�de� inovar,�de� imprimir� também�às�artes�um� ritmo�mais�
dinâmico� levaͲos�a�uma�ruptura�muitas�vezes�bastante�radical�com�os�valores�estéticos�e� ideológicos�que�
norteavam�a�arte�até�então.�Surge,�assim,�em�vários�pontos�da�Europa,�uma�série�de�movimentos�a�cujo�
conjunto� se�dá�o� título�de�Vanguarda�Europeia,�do�qual� fizeram�parte�o�Futurismo,�o�Expressionismo,�o�
Cubismo,� o� CuboͲFuturismo,� o�Dadaísmo,� o� Espiritonovismo� e� o� Surrealismo,� e� sobre� os� quais� faremos�
2�In:�PERLOFF,�Marjorie.�O�movimento�futurista.�São�Paulo:�Editora�da�Universidade�de�São�Paulo,�1993,�p.�11.�
LETRAS�|�154�
algumas�considerações�em�função�de�sua�ressonância�nos�projetos� ideológico�e�estético�que�norteavam�a�
poética�explícita�(manifestos�e�textos�teóricos)�e�implícita�(textos�literários)�dos�nossos�modernistas.��
�
�
�Origem e significado do termo vanguarda 
�
Segundo�os�dicionários�etimológicos,�o� termo�vanguarda�provém�do� francês�–�avantͲgarde�–�e�é�
empregado�para�designar�a�tropa�de�frente�de�uma�unidade�militar.�Em�francês,�os�termos�avant�e�garde,�
entre�outros�significados,� indicam�também,�respectivamente,�“o�que�vem�antes�ou�primeiro”�e�“guarda”,�
no�sentido�de�corpo�militar.�Possui,�portanto,�esse�termo�um�sema�de�origem�bélica,�na�medida�em�que,�
dentro�de�um�contexto�militar,�remete�para�um�conflito,�para�quem�inicia�uma�ação,�uma�ofensiva.�Por�isso�
mesmo,�por�extensão,�vanguarda�passou�a�designar,�na�arte,�aqueles�movimentos�que�tinham�como�meta�
combater�as�velhas�formas�e�iniciar�uma�nova�concepção�artística.�
Como�tendências�inovadoras�da�arte,�os�movimentos�de�Vanguarda�são�impulsionados�pelo�desejo�
de�ruptura,�de�mudança,�de�choque,�de�abertura.�Daí�a�negação�dos�modelos�anteriores�e�dos�valores�que�
os�sustentam.��
Em�termos�bem�genéricos,�vanguarda�remete�a�“todo�e�qualquer�inovador�pregresso�–�de�Dante�a�
Cervantes,�de�Leonardo�a�Beethoven,�de�Cruz�e�Sousa�a�Oswald�de�Andrade”.3��
No�entanto,�“se� todas�as�épocas�conheceram�suas�“vanguardas”,�só�uma�conheceu�a� ´Vanguarda�
Histórica`�,�com�maiúscula,�título�forjado�para�designar�os�áureos�anos�de�1905�a�1935”.4��E�é�essa�a�que�nos�interessa.�
Imbuídos,�pois,�desse�espírito�de�inovação,�os�artistas�dessa�época�rompem�com�a�tradicional�ideia�
de�harmonia,�de�beleza�e�de�verossimilhança.�Para�combater�o�bloco�solidificado�das�concepções�artísticas�
vigentes,�advindas�da�herança�cultural� recebida,�partem�eles,�muitas�vezes,�para�a�agressividade,�para�o�
radicalismo.�“Acusação�precisa”,�“insulto�bem�definido”�estavam�na�base�de�seus�discursos�e�propostas.��
ContrapondoͲse� à� ideia� de� perenidade� que� norteava� a� concepção� clássica� da� arte,� eles,� em�
consonância�com�seu�desejo�de�abertura,�se�voltam�para�o�experimentalismo,�para�o�autogoverno,�para�a�
autorreflexão.�Não�é�por�outra�razão�que,�ao�falar�sobre�o�modernismo�brasileiro,�ou�melhor,�sobre�a�nossa�
Vanguarda,� Mário� de�Andrade� destaca� como� um� dos� grandes� ganhos� o� direito� permanente� à� pesquisa�
estética.�
�
�
3�PATRIOTA,�Margarida�de�Aguiar.�Vanguarda,�do�conceito�ao�texto.�Belo�Horizonte:�Itatiaia;�Brasília:�INL,�Fundação�Nacional�PróͲ
Memória,�1985,�p.�18.�
4�_____�Op.�Cit.�p.�18/19�
LETRAS�|��155�
Futurismo 
�
Em� 20� de� fevereiro� de� 1909,� Filippo� Tomasso� Marinetti� publica,� no� jornal� francês� Fígaro,� o�
manifesto� do� primeiro� movimento� vanguardista� europeu,� o� movimento� Futurista,� através� do� qual,� de�
maneira� bastante� violenta� e� precisa,� critica� a� forma� de� expressão� vigente,� presa� à� tradição� clássica.�
Segundo�ele,��
A� terra� se�estreita�pela� velocidade,�por�novos�meios�de� comunicação,� transporte�e� informação�e�
exige�uma�arte� verbal� completamente�nova,�que�pode� expressar�a� completa� renovação�da� sensibilidade�
humana�trazida�pelas�grandes�descobertas�da�ciência.�
�esse�entusiasmo�pela�velocidade,�pelo�dinamismo�advindo�dos�novos� inventos,�que�mobiliza�o�
projeto�ideológico�e�estético�do�futurismo.��
Para� imprimir�à�arte�esse�mesmo�ritmo�veloz�e�dinâmico,�Marinetti,�em�seu�Manifesto�Técnico�da�
Literatura�Futurista,�apresenta�como�propostas�estéticas:�abolição�do�adjetivo�e�do�advérbio,�considerados�
por�ele�amortecedores�do�discurso;�no�lugar�do�adjetivo,�propõe�o�uso�do�substantivo�para�imprimir�maior�
vigor�à�analogia�criada,�e�cita,�como�exemplos,�multidãoͲressaca,�homemͲtorpedeiro,�etc;�preferência�pelo�
verbo�no�infinitivo,�uma�vez�que�o�mais�importante�era�o�foco�na�ação;��quebra�da�sintaxe�tradicional�presa�
aos�moldes�clássicos,�inadequados�a�“essa�nova�linguagem�de�telefones,�fonógrafos,�aeroplanos,�cinema”;��
substituição�da�pontuação� convencional�por� sinais�da�matemática� e�da�música,� evitando� as�pausas�que�
atrapalham�a�vivacidade�do�discurso;� �palavras�em� liberdade�e� imaginação� sem� fios,�ou� seja,� criação�de�
imagens,� de� analogias� expressas� em� palavras� livres,� soltas,� totalmente� libertas� de� qualquer� convenção�
sintática�ou�lógica.�
O�entusiasmo�pela�tecnologia,�pela�máquina�refleteͲse�no�manifesto�pela�prioridade�dada�à�matéria�
na� poesia� em� detrimento� do� eu.� Para�Marinetti,� faziaͲse� necessário� “substituir� a� psicologia� do� homem,�
agora�exaurida,�pela�obsessão�lírica�da�matéria.”�5�
Esse� entusiasmo� exacerbado� leva,� por� outro� lado,� a� uma� rejeição� exagerada� do� passado,��
evidenciada�pela�proposta� radical�de�destruição�das�bibliotecas,�museus� e� academias,� considerados�por�
Marinetti�“cemitérios�de�esforços�perdidos”.�
�
Expressionismo 
 
Contemporâneo�do� Futurismo,�o� Expressionismo,�movimento�de�origem� alemã,� em� consonância�
com� o� vanguardismo� da� época,� também� se� encontra� norteado� pelo� mesmo� espírito� de� ruptura� e� de�
5�MARINETTI,�F.�T.��Manifesto�Técnico�da�Literatura.�In:�TELES,�Gilberto�Mendonça.�Vanguarda�Europeia�e�Modernismo�Brasileiro.�
Apresentação�e�crítica�dos�principais�manifestos�vanguardistas.�12.�ed.�Petrópolis,�RJ:�Vozes,�1994,�p.97��
LETRAS�|�156�
abertura�para� implementação�de�novas�formas�de�expressão,�vazadas�na�quebra�da�sintaxe�convencional,�
na� eliminação�das�palavras� supérfluas,� tendo� em� vista�o� enxugamento� e� a�precisão�da� linguagem,�para�
melhor�atingir�a�essência�do�que�se�quer�expressar.�Essa�preocupação�com�a�essência�advém,�sobretudo,�
do�viés�espiritualista�que�norteia�o�Expressionismo.��
Diferentemente� do� Futurismo,� cuja� motivação� tem� por� base� a� admiração� pela� máquina,� pela�
tecnologia,�o�Expressionismo�não�vê�com�o�mesmo�olhar�otimista�o�surgimento�desses�avanços�técnicos,�
sobretudo� no� que� tange� à� supremacia� dada� à� máquina� em� detrimento� do� homem.� Daí� a� necessidade�
sentida�de�apreender�o�movimento�interior�das�coisas�e�dos�seres.�Aos�expressionistas,�não�interessa�o�fato�
em�si,�mas�a�forma�como�o�artista�o�percebe,�como�ele�o�vê,�pois,�para�eles,�a�realidade�estaria�dentro�de�
nós,�e�cabeͲnos�expressar�o�que�percebemos,�vemos�e�sentimos.�Através�de�suas�produções�artísticas,�nos�
damos�conta�da�inquietude,�da�angústia�humana�frente�ao�vazio�com�o�qual�se�defronta,�ante�a�coisificação�
a� que� é� reduzido� o� homem� dentro� daquele� universo� tecnológico,� conforme� bem� o� demonstram� estes�
versos�do�poema�No� terraço�do�café� Josty,�do�alemão�Paul�Boldt,�que�assim�diz,� segundo� tradução� feita�
pelo�português��João�Barrento:�
�
Praça de Potsdam: eternos gritos 
Dos glaciares das lavinas febris 
Pelas ruas fora: carros em carris 
Os automóveis e os homens-detritos. 
�
ObserveͲse�que,�em�meio�à�agitação�nervosa,�frenética�e,�ao�mesmo�tempo,� indiferente�da�praça,�
assinalada�pelos�lexemas�gritos,�glaciares�e�febris,�quem�primeiro�assoma�ao�espaço�poético�são�os�carros,�
os�automóveis,�enfim,�as�máquinas,�como�a�demarcar�a�prioridade�destas�sobre�os�homens,�que,�além�de�
virem�nomeados�por�últimos,�aparecem�referidos�como�homensͲdetritos,�ou�seja,�como�restos,�coisas�sem�
valor.�
Ao�contrário,�pois,�dos�futuristas,�os�expressionistas�querem,�antes�de�tudo,�destacar�os�aspectos�
negativos�da�modernidade�sobre�os�homens.�Para�isso,�recorrem�à�estética�do�feio,�do�choque,�através�da�
deformação� das� imagens� e� da� utilização� de� palavras� abjetas.� A� tensão,� o� conflito� e� a� subjetividade�
presentes� em� suas� realizações� levam� os� críticos� a� ver� neles� aproximação� com� a� estética� barroca� e� a�
romântica.�Não�esqueçamos�que�o�feio�resultante�das�deformações�efetivadas�na�representação�também�
faz�parte�da�estética�do�grotesco,�explorada�pelos�barrocos�quando�“tudo�o�que�era�certo�se�contorce”.�Por�
outro� lado,� semelhantemente� ao� romantismo,� o� expressionismo,� como� já� vimos,� além� de� ter� a�mesma�
origem�alemã,�tem�como�veículo�de�suas�ideias�a�revista�Der�Sturm�(A�Tempestade),�o�que�lembra�o�espírito�
préͲromântico�da�Sturm�und�Drang�(ou�seja,�Tempestade�e�Ímpeto).��
�
LETRAS�|��157�
Cubismo 
 
O�termo�cubismo�surgiu�a�partir�do�quadro�“Casas�en� l´Estaque”,�de�Georges�Braque,�exposto�no�
Salão�de�Outono�de�1908,�qualificado�pelo�pintor�Matisse,�que�fazia�parte�do�júri,�como�“caprichos�cúbicos”�
pela� semelhança� de� suas� formas� com� elementos� geométricos� desmembrados� em� facetas� que� se�
superpõem�e�intervêm�umas�nas�outras.�Braque�e�Pablo�Picasso�são�considerados�os�criadores�do�Cubismo�
na� pintura.� Na� literatura,� Apollinaire� é� um� dos� responsáveis� por� sua� introdução,� cujo� texto� de� 1913,�
intitulado�Meditações� estéticas.�A� pintura� cubista,� segundo�Gilberto� Teles,� “pode� ser� tomado� como� um�
desses�manifestos”6.��
Como� já� foi� mencionado,� a� estética� cubista� privilegia� o� geometrismo,� mas� dele� também� fazem�
parte�a�descontinuidade,�a�decomposição�e�recomposição,�a�simultaneidade.�Nas�palavras�do�crítico�de�arte�
Jean�Cassou,�trazidas�por�Guillermo�de�Torre,�“o�cubismo�é�um�estilo�de�ruptura�intelectual,�e�as�sua�obras�
assumem�o�aspecto�de�uma�combinação�de�formas�descontínuas.�É�por� isso�que�se�aproximam�da�poesia�
moderna,�que� foge�ao�discurso,�à� regularidade�métrica,�à�pontuação�e�que�se�manifesta�sob�a� forma�de�
fragmentos�ou�instantâneos”�7.�É,� também�de�1913,�o� texto�A�antitradição� futurista,�de�Apollinaire,�cujo� título�por�si�só� já�deixa�
entrever�a�relação�do�cubismo�com�as�ideias�futuristas�de�ruptura�total�com�o�passado.�Para�além�disso,�o�
texto� se� encontra� em� profunda� consonância� com� as� propostas� cubistas,� sobretudo� no� que� tange� à� sua�
estruturação� pelo� fragmentarismo,� pela� simultaneidade� das� ideias� apresentadas,� quebrando� assim� com�
qualquer�sequência�lógica.�Logo�no�início�do�manifesto,�temͲse�uma�frase�constituída,�em�sua�maior�parte,�
por�palavras� sem� sentido,�cujas�primeiras� letras� terminam� formando�a�palavra�“passadismo”,�através�da�
qual�nos�é�apresentada�a�rejeição�ao�passado.�Eis�a�frase:�
�
 ABAIXO OPominir Aliminé SSkprsusu otalo ADIScramir MOnigme. 
�
Depois� disso,� o� texto� segue� estruturado� de� forma� justaposta,� com� palavras� grifadas� das� mais�
diversas� maneiras,� em� termos� de� tipos� ou� tamanhos� gráficos,� dispostas� na� horizontal� e� na� vertical,�
homologando� através� da� forma� de� expressão� o� que� apresenta� em� termos� de� destruição� e� construção.�
RegistreͲse� que,� no� bloco� no� qual� se� encontram� alocadas� as� propostas� de� destruição� das� formas�
consideradas�passadistas�de�expressão,�entre�os�vários�pontos�elencados,�temos�a�supressão�da�harmonia�
6�TELES,�G.�O�Cubismo.�In:�Op.�Cit.,�p.�109�
7�TORRES,�Guillermo.�Cubismo.�In:�_____�História�das�Literaturas�de�Vanguarda,�Lisboa:�Presença;�Santos,SP:�Martins�Fontes,�1972,�
p.�100�
TORRE,�G.�Op.�Cit.,�p.100�
LETRAS�|�158�
tipográfica,�das�sintaxes�já�condenadas�pelo�uso�em�todas�as�línguas�e�da�pontuação.�Aspectos�que�já�não�
fazem�mesmo�parte�do�manifesto.��
Por� sua�vez,�no�bloco�em�que� se�encontram�as�propostas�de� construção�de�uma�nova� forma�de�
expressão� artística,� encontramos� no� item� 1,� referente� a� Técnicas� ou� ritmos� renovados� sem� cessar,�
encabeçando�a�lista,�a�proposta�de�Literatura�pura�palavras�em�liberdade�Invenção�de�palavras,�seguida�das�
ideias,� entre� outras,� de� Plástica� pura� (5� sentidos),� Simultaneidade� em� oposição� ao� Particularismo� e� à�
divisão,� os� quais� são� perceptíveis� na� organização� textual� do� manifesto;� já� no� item� 2,� relacionado� com�
intuição,� velocidade� e� ubiquidade,� podemos� destacar� também� como� elementos� corroboradores� dessa�
relação,�entre�o�que�se�diz�e�o�que�se� faz,�proposições�como�Analogias�e� trocadilhos� trampolins� líricos�e�
única� ciência� das� línguas� calicó� Calicut� Calcutá� cachacia� Sofia� o� Sofos� suficiente� oficiar� oficial� ó� fios�
Aficionado� DonaͲSol� Donatello� Doador� dei� erradamente� topedeiro,� por� meio� da� qual� a� propositura�
apresentada�é�ao�mesmo�tempo�realizada�e,�ainda,�a�paródia�musical,�resultante�de�uma�analogia�sonora,�
da�frase�melódica�constituída�de�MER........DE......que�significa�Mar.....�de....�com�o�termo�MERDE,�que�em�
francês�é�Merda,�portanto,�excrementos.�E,� �na�sequência,�é� isso�que�é�oferecido�a�todos�os�guardiães�da�
tradição,�a�exemplo�de�pegadogos,�professores,�museus,�etc.,�em�contraposição�à�rosa�que�é�ofertada�aos�
responsáveis� pela� renovação� artística,� começando� por� Marinetti,� Picasso� e� o� próprio� Apollinaire,� entre�
tantos�outros.�Exaltação�com�a�qual�se�encerra�o�texto.��
�
Cubo-Futurismo 
 
O�CuboͲFuturismo�tem�sua�origem�na�Rússia,�mais�precisamente,�em�Moscou,�a�partir�de�1913.�Esse�
movimento�vanguardista,�como�se�depreende�do�próprio�título,�tem�como�subsídios�estéticos�e�ideológicos�
muito�do�que�foi�proposto�pelo�Futurismo�de�Marinetti�e�pelo�Cubismo�de�Picasso�e�Braque,�sobretudo,�no�
que� tange�ao�empenho�em� imprimir�à�arte�uma�maior�dinamização,�o�que,�em� termos�de�concretização�
artística,� leva� também� à� adoção� das� técnicas� futuristas� e� cubistas� de� libertação� total� da� palavra,�
fragmentação,�decomposição,�recomposição,�simultaneidade.�
Como� o� cubismo,� o� cuboͲfuturismo� começou� com� a� pintura.� Entre� os� pintores� cuboͲfuturistas,�
Kazimir�Malevich�é�apontado�como�responsável�pelo�desenvolvimento�desse�estilo�entre�os�russos,�tendo�
sido�o�primeiro�a�empregar�o�termo�Cubo�para�falar�de�suas�pinturas.�
Diferente,�porém,�dos�futuristas,�os�artistas�russos� investiam�mais�na�práxis�do�que�na�teoria�e�não�
compartilhavam� da� apologia� futurista� da� máquina� e� da� guerra.� AutoͲintitulandoͲse� de� “comunistasͲ
futurista,� se� encontravam� ideologicamente� vinculados� aos�movimentos� revolucionários� que� culminaram�
LETRAS�|��159�
com�a�Revolução�de�Outubro,�de�1917,�ocorrida�na�Rússia.�Para�eles,�a�palavra�era�vista� também� como�
instrumento�de�transformação�social.�
Em� seu� único� manifesto� coletivo,� assinado� pelos� poetas� David� Burliuk,� Krutchônikh,� Vladimir�
Maiakovski� e� Khlebnikov,� de� 1912,� os� cuboͲfuturistas� se� colocavam� como� arautos� do� novo� tempo� e� se�
insurgiam�contra�o�passado,�criticando�duramente,�sobretudo,�os�poetas�simbolistas,�cujas�obras�vazadas�
em�uma�“perfumada�sensibilidade”�não�traduziam�a�virilidade�do�seu�tempo.��
“A todos esses Kuprin, Block, Sologúb, Remizov, Avertchenko, Cherny, Kusmin, Bunin, et., etc.,* só está 
faltando uma casa uma casa à beira de um rio. Tal recompensa o destino reserva também para os alfaiates. 
Do alto dos arranha-céus discernimos sua nulidade!”8 
Realizado�de�forma�muito�sintética,�o�poema�Balalaica�,�abaixo�transcrito,�de�autoria�de�Maiakovski,�
traduz� bem� o� viés� estético� do� cuboͲfuturismo� no� que� diz� respeito� à� assimilação� dos� procedimentos�
futuristas�e�cubistas�e�o�vínculo�da�poesia�com�os�anseios�revolucionários�da�época.�
Vejamos�o�poema:�
BALALAICA 
 Vladimir Maiakóvski 
Balalaica 
[como um balido abala 
a balada do baile 
de gala] 
[com um balido abala] 
abala [ com balido] 
[ a gala do baile] 
louca a bala 
laica 
(1913) 
�
*�São�todos�nomes�de�poetas�simbolistas�russos�acusados�pelos�cuboͲfuturistas�de�misticismo,�abstração�e�artificialismo�da�
linguagem..�
8�BURLIUK,�D.�et�alii.�Bofetada�no�gosto�público.�In:�TELLES,�G.�Op.�Cit.�p.121�
LETRAS�|�160�
Para� início� de� conversa� sobre� este� poema,� registreͲse� que� o� termo� Balalaica� designa� � um�
instrumento� musical� de� cordas,� parecido� com� um� bandolim� ou� com� um� cavaquinho,� usado� na� música�
popular�russa.�
Para�além�de�intitular�o�poema,�o�termo�Balalaica�pode�também�ser�visto�como�matriz�geradora�do�
mesmo.�Através�de�um�processo�de�decomposição,�comum�aos�cubistas,�o�termo�se�desmembra�em�vários�
outros,�jogando,�sobretudo,�com�as�palavras�bala�e�laica�e�com�os�fonemas�nelas�presentes,�com�os�quais�
cria� o� poeta� outros� termos,� valendoͲse� � para� isso� das� analogias� e� trocadilhos� trampolins,� proposto� por�
Apollinaire�em�A�antitradição�futurista,�como�se�pode�perceber�em�bala,�baile,�gala,��abala,�balido,�balada,�
laica,�louca.�
�Em�termos�de�conteúdo,�o�poema�nos�fala�de�um�baile�de�gala,�ou�seja,�um�baile�da�nobreza,�uma�
vez�que�gala,�segundo�Aurélio,�remete�para� trajes�solenes,�ornamentação�ou�enfeites�ricos�e�preciosos,�o�
qual�foi�abalado�por�uma�bala�laica,�ou�seja,�uma�bala�que�veio�de�fora,�uma�bala�estranha�àquele�meio.�Em�
termos� sonoros,� os� últimos� vocábulos� do� poema� bala/laica� recompõem� o� termo� balalaica.� E,� se�
consideramos�que�este,�enquanto�instrumento,�se�liga�ao�povo,�podemos�inferir�que�veio�do�povo,�o�qual�
não� teria� vez� em� um� baile� de� gala,� a� bala� que� detona� esse� baile.� É� o� povo,� portanto,� que,� de� forma�
irreverente,�barulhenta�(como�um�balido/�com�um�balido,�termo�que�tanto�pode�ser� lido�como�barulho�e�
como�projetil),�abala�a�nobreza.�Isto�tudo,�porém,�nos�é�passado�através�dos�recursos�futuristas�e�cubistas�
adotados�pelo�poeta:�fragmentarismo,�decomposição,�recomposição,�liberdade�de�expressão,�criatividade,�
concisão�e�simultaneidade.�
Como�observação�final�em�torno�desse�movimento,�vale�a�pena�registrar�que,�apesar�de�sua�curta�duração,�o�CuboͲFuturismo�foi�de�grande�valia�para�a�arte�russa.�
�
Dadaísmo 
Considerado� o� mais� radical� de� todos� os� movimentos� que� constituíram� a� Vanguarda� Europeia,� o�
Dadaísmo� nasce� em� Zurique,� na� Suíça,� tendo� como� mentores� cinco� artistas� que� lá� se� encontravam�
refugiados�por� conta�da� guerra,� contra� a�qual� se� insurgiam,�pela� sensação�de�que� todo�um� sistema�de�
civilização�se�desmontava�bruscamente,�e�que�nada,�nem�Filosofia,�nem�Religião,�nem�Ciência,�nada�pôde�
impedir�a�catástrofe�da�guerra.�São�eles:�os�alemães�HUGO�BALL�e�RICHARD�HUELSEMBECK;�o�alsaciano�
HANS�HARP�E�OS�ROMENOS,�Marcel� Jango�e�Tristan�Tzara.�Posteriormente,�a�eles�se� juntaram�o� francês�
FRANCIS�PICCABIA�e�o�chileno�VICENTE�HUIDOBRO.�
LETRAS�|��161�
Em�decorrência�do�espírito�de�revolta,�de� frustração�que�norteava�o�grupo,�as�propostas�dadaístas�
são�marcadas�pelo�ceticismo,�pelo�nihilismo.�Para�eles,�DADA,�palavra�com�a�qual�batizaram�o�movimento,�
escolhida�por�acaso�em�um�dicionário,�não�significava�NADA.�O�objetivo�era,�segundo�Tristan�Tzara,�“criar�
uma�palavra�expressiva�que,�mediante�sua�magia,�fechasse�todas�as�portas�à�compreensão�e�não�fosse�um�
–�ismo�a�mais”9�Daí�a�valorização�do�nonͲsense,�do�absurdo,�da�contradição,�do�anarquismo,�da�destruição�
que�se�depreende�das� ideias�apresentadas�em�seus�manifestos,�sobretudo,�no�Manifesto�Dada�1918.�Eis�
algumas�delas:�
x Eu redijo um manifesto e não quero nada, eu digo portanto certas coisas e sou por princípio contra os 
manifestos, como sou também contra os princípios... 
x Assim nasceu DADÁ de um desejo de independência, de desconfiança na comunidade./.../ Nós não 
reconhecemos nenhuma teoria. 
x Nós rasgamos, vento furioso, o linho das nuvens e das preces, e preparamos o grande espetáculo do 
desastre, do incêndio, da decomposição. 
x Eu destruo as gavetas do cérebro e as da organização social: desmoralizar por todo lado e lançar a 
mão do céu ao inferno, os olhos do inferno ao céu, restabelecer a roda fecunda de um circo universal 
nos poderes reais e na fantasia de cada indivíduo. 
Em�termos�ideoͲestéticos,�assinaleͲse�ainda�que�o�Dadaísmo�em�sua�crítica�exacerbada�não�poupa�
nem�os�próprios�movimentos�vanguardistas�precedentes,�embora�seja�pela�crítica�visto�como�“um�vértice�
de�confluências�vanguardistas”10;�a� ludicidade,�o�humor�estão�na�base�das�suas�realizações�assim�como�a�
técnica� do� ready� made,� estratégia� que,� em� termos� gerais,� consiste� em� criar� em� cima� de� material� já�
existente,� sendo,� portanto,� de� grande� valia,� a� arte� dadaísta,� empenhada� na� desconstrução,� na�
dessacralização�da�arte,�em�consonância,�pois,�com�sua�proposta�de�antiarte,�antiliteratura.�Nesse�sentido,�
são�exemplares�as�criações�do�dadaísta�Marcel�Duchamp,�realizadas�com�objetos�como�bacia�sanitária,�roda�
de�bicicleta,�os�quais�são�por�ele,�irreverentemente,�transmudados�em�objetos�artísticos.��
Entretanto,�por�mais�paradoxal�que�pareça�toda�essa�negação�dadaísta,�ela�termina�se�revertendo�
em�positivo�para�a�arte.�Razão�pela�qual,�para�o�escritor�e�filósofo�André�Gide,� �“Dada�é�o�dilúvio�após�o�
qual�tudo�recomeça”11�
Parafraseando�Fernando�Pessoa,�acreditamos�poder�dizer�que�DADÁ�foi�o�nada�que�é�tudo.�
9�Apud�TELLES,�G.�Op.�Cit.�p.�124/125�
10�TORRES,�G.�Op.�Cit..�p.�254.�
11�TORRES,�G.�Dadaísmo.�In:�_____�Op.�Cit.�p.�237.�
LETRAS�|�162�
Espiritonovismo 
�
Conforme�sugere�o�próprio�nome,�bem�diferente�da�postura�iconoclasta,�destruidora�do�Dadaísmo,�
esse�movimento,�de�origem� francesa,� surge�em�1918,�portanto,�no� final�da� I�Guerra�Mundial,�motivado�
realmente� por� um� espírito� novo� de� reconstrução.� � Assim� sendo,� procedem� a� uma� verdadeira� revirada�
ideológica� na� medida� em� que� retomam� a� ordem,� o� bom� senso,� o� sentido� do� dever,� a� clareza,� a�
sistematização��e�o�equilíbrio.��
Ao�contrário�de�seus�predecessores,�reconhece,�de�modo�bastante�conciliatório,�a� importância�da�
tradição� clássica;� ao� mesmo� tempo,� exalta� as� mudanças� implementadas� nas� artes� pelos� movimentos�
anteriores,� referentes� às� rupturas� estéticas,� à� liberdade� de� expressão,� à� valorização� dos� artifícios�
tipográficos�responsáveis�pelo�nascimento�de�um� lirismo�visual�e�à�concisão�poética.�Vejamos,�em�termos�
ilustrativos,�um�trecho�da�conferência�O�Espírito�Novo�e�os�Poetas,�de�Apollinaire:�
�
As pesquisas relacionadas com a forma tomaram desde então uma grande 
importância. Importância legítima. 
Como poderia esta pesquisa não interessar ao poeta, ela que podia 
determinar novas descobertas no pensamento e no lirismo? 
A assonância, a aliteração, tanto quanto a rima, são convenções que têm, 
isoladamente, os seus méritos. Os artifícios tipográficos levados muito longe, com 
uma grande audácia, tiveram a vantagem de fazer nascer um lirismo visual que 
era quase desconhecido antes de nossa época. Estes artifícios podem ir muito 
longe ainda e consumar a síntese das artes, da música, da pintura, da literatura. 
Tudo isso não é mais que uma pesquisa para chegar a novas expressões 
perfeitamente legítimas. 
Quem ousaria dizer que os exercícios de retórica, as variações sobre o tema 
de: Eu morro de sede ao pé da fonte não tiveram uma influência determinante 
sobre o gênio de Villon? Quem ousaria dizer que as pesquisas de forma dos 
retóricos e da escola marótica não serviram para apurar o gosto francês até sua 
perfeita florescência no século XVII? 
�
�Ressaltam�ainda�os�espiritonovistas�a� importância�para�a�arte�do�riso,�que�“fornece�ao�poeta�um�
lirismo� novo”;� do� ridículo,� por� ser� inerente� à� própria� vida;� da� surpresa,� “grande�mecanismo� do�mundo�
moderno”,�que�advém�da�invenção,�da�imprevisibilidade,�do�estranhamento�provocado.�Segundo�eles,�“só�
devemos� chamar� de� poeta� àquele� que� inventa,� àquele� que� cria.� E,� ainda,� a� importância� da� alegria,�
LETRAS�|��163�
considerada�um�valor�característico�da�poesia�e�do�cotidiano,�das�coisas�prosaicas�como�matéria�de�poesia,�
pois�“um�lenço�que�cai�pode�ser�para�o�poeta�a�alavanca�com�a�qual�ele�levantará�todo�um�universo”.��
Além�desses�aspectos,�o�Espiritonovismo�vê�como�imprescindível�o�viés�nacionalista�nas�produções�
artísticas.�Para�eles,�
�
A arte só deixará de ser nacional no dia em que o universo inteiro, vivendo sob 
um mesmo clima, em casas edificadas sobre o mesmo modelo, falar a mesma 
língua, com o mesmo sotaque, ou seja, nunca. 
�
Nessa�perspectiva,�exaltam�por�demais�a�França,� conforme� se�pode�ver�em�afirmações� como�
estas�abaixo�transcritas:�
�
 O espírito novo que dominará o mundo inteiro não se evidenciou na poesia 
de nenhum país como na França. 
 Segundo o que podemos saber, não há quase poetas hoje que não sejam de 
língua francesa. 
Todas as outras línguas parecem fazer silêncio para que o universo possa 
escutar melhor a voz dos novos poetas franceses. 
Os franceses levam a poesia a todos os povos.12 
�
Embora�a�Vanguarda�Brasileira�dialogue�com�quase�todos�esses�movimentos�europeus,�é�com�o�
Espiritonovismo�que�seus�integrantes�mais�se�identificam,�sobretudo,�no�que�concerne�à�valorização�da�
tradição,�do�passado.�Mas�isso�veremos�depois.�
�
�
Surrealismo 
�
Insatisfeito�com�o�viés�anárquico�dos�dadaístas,�André�Breton,�que,�até�então,�se�vinculava�ao�
movimento,� terminou� rompendo� com�o�Dadaísmo� e� criando�o� � Surrealismo,� cujo�manifesto�data�de�
1924.�Daí�por�que�vamos�encontrar�na�história�do�movimento�afirmações�de�que�ele�“nasceu�de�uma�
costela�de�Dada”�ou�de�que�“nasceu�das�cinzas�de�Dada”13.�
Um�dos�pontos�principais�do�rompimento�diz�respeito�ao�ceticismo,�ao�niilismo�que�norteavam�
as�propostas�dadaístas.�Breton�concordava�com�o�pensamento�de�Rimbaud�de,�através�da�arte,�mudar�a�
vida.�E,�como�Marx,�ele�também�queria�contribuir�para�a�transformação�do�mundo.�Ao�niilismo�dadaísta,�12�Todas�essas�passagens�citadas�foram�extraídas�de�APOLLINAIRE,�G.�O�Espírito�Novo�e�os�Poetas.�In:�TELES,�G.�Op.�Cit.�p.�155/166.�
13�A�primeira�das�afirmações,�segundo�Guillermo�de�Torre�é�atribuída�a�RibemontͲDessaignes,�um�dadaísta�que�depois�se�torna�
também�surrealista��e�a�segunda�a�Tristan�Tzara�que�era�o�líder�do�Dadaísmo.�Cf.�TORRE,�G.�In:�Op.�Cit.�vol.�3,�p.�9�
LETRAS�|�164�
opunham�os�surrealistas�o�conhecimento�total�do�homem,�para�o�que�tanto�a�poesia�como�a�pintura�não�
passavam�de�meios�de� investigação�que� lhes�permitiam� como� “cientistas”�explorar�o� inconsciente,�o�
sonho,� o� maravilhoso.� Para� facilitar� seu� trabalho,� Breton,� tomando� por� base� as� teorias� freudianas,�
chegou� inclusive�a�criar�um� laboratório�destinado�a� investigações�oníricas�–�o�Bureau�des�Recherches�
Surrealistes�(Birô�de�pesquisas�surrealistas)�.��
Diferentemente�da�visão�escatológica,�apocalíptica�dos�dadaístas,�os�surrealistas,�acreditando�na�
vida,�na�possibilidade�de�mudança,�exaltavam�o�AMOR�e�o�EROTISMO.�
A�dissidência,�entretanto,�não� lhes� impediu�manterem�alguns� traços�dadaístas,�a�exemplo�do�
amor�ao�protesto,�da�valorização�do�improviso�e�da�espontaneidade�da�linguagem.��
Protesto�quanto�à�repressão�a�que�era�submetido�o�homem,�minando�a�sua�verdadeira�essência,�
impedindo�sua�ascensão�como�sujeito�de�si�mesmo,�da�sua�história.�Daí�a�valorização�da� infância,�fase�
também�privilegiada�pela�psicanálise�de� Freud,�por� remeter�para�um�período�de� liberdade,� em�que,�
segundo�os�surrealistas,�se�encontra�ausente�“todo�rigor�conhecido”;��
A�valorização�do� improviso�e�da�espontaneidade�da� linguagem�era�defendida�pelos�surrealistas�
por�acreditarem�ser,�através�do� improviso�e�da�espontaneidade,�que�o� inconsciente�afloraria.�Por�essa�
razão,�Breton�define�surrealismo�como�“automatismo�psíquico�pelo�qual�alguém�se�propõe�a�exprimir�
seja� verbalmente,� seja� por� escrito,� seja� de� qualquer� outra� maneira,� o� funcionamento� real� do�
pensamento.� Ditado� do� pensamento,� na� ausência� de� todo� controle� exercido� pela� razão,� fora� de�
qualquer�preocupação�estética�ou�moral.”14�
À� semelhança� dos� futuristas,� para� quem� as� imagens� mais� poderosas� são� aquelas� que� ligam�
realidades�distantes,�aparentemente�diversas�e�hostis,�os�surrealistas� também�definem�como� imagem�
forte�aquela�que�apresenta�o�maior�grau�de�arbitrariedade,�ou�seja,�aquela�que� leva�mais�tempo�para�
ser�compreendida.�
Outro�ponto�do� ideário�surrealista�que�o�aproxima�dos� futuristas�diz�respeito�à�valorização�da�
imaginação,�pela�liberdade�que�ela�propicia.�Para�Breton,�a�imaginação�dá�conta�do�que�pode�ser.�E�isso�
é� o� suficiente� para� suspender� um� pouco� a� terrível� interdição� a� que� está� sujeito� o� homem.� Por�
extrapolarem�o�nível�do�real,�são�também�valorizados�o�maravilhoso�e�a�loucura:�o�primeiro,�por�incidir�
no��sobrenatural,�e�o�segundo�pelo�comprazimento�no�delírio.�Enfim,�pelo�que�apresentam�de�ilógico,�de�
quebra�com�o�racional,�com�o�interdito.��
Como�o�cubismo,�o�surrealismo�se�apresenta�de�forma�vigorosa�na�pintura,�tendo�como�figuras�
expressivas�Salvador�Dali�e�Miró,�entre�outros.��
14�Apud�TELES,�G.�Op.�Cit.,�p.�191�
Na�
um�método
fenômenos�
Junt
levando� até
surrealismo
adotaram�e
nenhuma� id
cultural.��
Emb
Dali�por�seu
foram� se� re
próprias�de
advém�de�u
�
15�RegistreͲse�
impressionism
16�NÉRET,�Gille
17�Cf.�BERNÁR
linha�do�aut
o� espontâne
delirantes.16
tamente� co
é� ela� o� surr
o�no�cinema
eles�o�mesm
deia,�nenhum
bora�também
u�abstracion
eduzindo�a� f
e�um�desenh
uma�profund
que�a�pintura�d
mo,�do�cubismo,
es.�Salvador�Da
DEZ,�Carmen.�H
tomatismo�p
eo� de� conhe
6��
m� Luis� Buñ
realismo.� De
:�O�cão�anda
o�princípio�d
ma� imagem�
m�vinculado�
nismo.�Seus�
formas�míni
ho� infantil,�o�
a�introspecç
de�Salvador�Dal
,�do�fauvismo.��
li�1904Ͳ1989.�G
Historia�Del�Arte
SUGES
Leia�os
Procur
psíquico,�Salv
ecimento� irra
uel,� cineast
essa� atividad
aluz(1928)�e
da�escritura�
que�pudess
ao�surrealis
personagens
mas�e�a� sign
que� lhe�con
ção�e�de�sua�
i�não�se�prende
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e.�Primeras�Van
TÃO�DE�LEIT
s�manifestos
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LETRAS�|��16
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cional,�psicol
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tos�da�paisag
e�uma� impu
nua�que,�en
ubjetivo.17��
a�quadros�feitos
4,�p.�114.�
nessa�Unida
65�
,�ou�seja,�
crítica� de�
tográfica,�
cones� do�
películas,�
o�aceitar�
lógica�ou�
Salvador�
gem,�etc.�
ulsividade�
tretanto,�
s�à�luz�do�
ade.�
LETRAS�|�166�
UNIDADE II 
 
PRÉ-MODERNISMO BRASILEIRO 
 
Para� além� do� sentido� cronológico� indicador� do� que� ocorre� antes� do�Modernismo� propriamente�
dito,� o� vocábulo� préͲmodernismo,� criado� pelo� crítico� Tristão� de� Ataíde,� em� termos� ideoͲestéticos,� foi�
utilizado�para�designar�aquelas�obras�que�no�início�do�século�XX�apresentavam�sinais�de�ruptura�com�o�que�
norteava�o� fazer� literário�brasileiro�da�época.�AntecipavamͲse,�então,�como�afirma�Alfredo�Bosi,18�alguns�
aspectos� formais� e� temáticos� que� serão� propostos� e� implementados� pelos� modernistas.� São� obras,�
portanto,�que,�embora�ainda�vinculadas�às�correntes�estéticas�do�final�do�século�–�Realismo,�Naturalismo,�
Parnasianismo�e�Simbolismo�Ͳ,�sobre�as�quais�pairavam�o�cientificismo�e�o�rigor�formal,�problematizam�de�
maneira�mais� contundente� a� realidade�brasileira,�questionandoͲa� sob�o�ponto�de� vista� social,�político� e�
cultural.�Ao�procederem�assim,�conforme�bem�o�assinala�Alfredo�Bosi,�em�O�PréͲModernismo,�os�escritores�
estão�rompendo�com�a�cultura�oficial,�alienada�e�verbalista.��
�Contrariando�os�padrões�estéticos�vigentes,�percebeͲse�que�algumas�dessas�obras,�a�exemplo�das�
de�Lima�Barreto,�abandonam�o�viés�retoricista�predominante�na�época�em� favor�de�uma� linguagem�mais�
simples,�mais�próxima�do� falar�cotidiano,�por�se�achar�que�assim�se� torna� inteligível�a� todos.�Aliás,�Lima�
Barreto�vai� ser�um�dos�escritores�mais�críticos�do�que�ele� chama�de�grecoͲmania�da�época,�conforme�o�
reitera� a� afirmação� que� se� segue,� extraída� do� texto� Amplius!:� “Implico� solenemente� com� a� Grécia,� ou�
melhor,� implico�solenemente�com�os�nossos�cloróticos�gregos�da�Barra�da�Corda�e�pançudos�helenos�da�
praia�do�Flamengo.”19�Em�sua�obra,�vamos�encontrar�severas�críticas�ao�preconceito�racial,�ao�eruditismo�
da� época,� aos� pseudosͲintelectuais� da� época,� ao� academicismo� vigente,� entre� outros� pontos� que� mais�
adiante�também�serão�combatidos�pelos�modernistas.�Vale�a�pena�conferir�alguns�de�seus�textos�e�obras,�
como�os�romances�Recordações�do�escrivão� Isaías�Caminha,�Triste�Fim�de�Policarpo�Quaresma,�Clara�dos�
Anjos�ou�mesmo�os�contos,�sobretudo�os�reunidos�em�Bruzundangas�ou�Histórias�e�Sonhos,�e,�ainda,�seus�
textos�críticos�que�se�encontram�em�Impressões�de�Leitura.���
Outro� autor� considerado�préͲmodernista�por� alguns� críticos,�entre�eles,�Alfredo�Bosi,�na�obra� já�
referida,�bem�como�em�História�Concisa�da�Literatura�Brasileira,�é�Augusto�dos�Anjos,�em�decorrência�de�uma�série�de�procedimentos�por�ele�adotados�que�vão�de�encontro�aos�predominantes�na�época.�CitemͲse�
entre�eles�a�adoção�de�uma�sonoridade�áspera� (A�criptógama�cápsula�se�esbroa/�ao�contacto�de�bronca�
18�Cf.�BOSI,�Alfredo.�O�préͲModernismo.�5.�ed.�São�Paulo:�Cultrix,�s/d.�
19�BARRETO,�Lima.�Amplius!�In:�Histórias�e�Sonhos.�Contos.�São�Paulo:�Brasiliense,��1956.��
LETRAS�|��167�
destra�e� forte)20;�do� rompimento�com�a�estética�do�belo,�através�da�utilização�de�palavras�abjetas�como�
pus,� vermes,� larvas,� podridão� e� tantas� outras;� mistura� de� formas� coloquiais� e� eruditas,� introdução� de�
elementos�apoéticos,�de�frases�nominais�parecendo�mais�flashs�coordenados,�contrariando,�desse�modo,�o�
rigor� formal�que� imperava�no� fazer� literário�daquele�momento,�como�podemos�ver�nos�versos�de�vários�
poemas,�a�exemplo�do�poema�O�Morcego21:���
�
Meia noite. Ao meu quarto me recolho. 
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede: 
Na bruta ardência orgânica da sede, 
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho. 
 
“Vou mandar levantar outra parede...” 
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho 
- E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho, 
- Circularmente sobre a minha rede! 
 
Pego de um pau. Esforços faço. Chego 
A tocá-lo. Minh’alma se concentra. 
Que ventre produziu tão feio parto?! 
 
A Consciência Humana é este morcego! 
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra 
Imperceptivelmente em nosso quarto! 
�
Vale� acrescentar� ainda� a� aproximação� da� poética� de� Augusto� dos� Anjos� com� a� estética�
expressionista�pelo�que�traz�de�uma�visão�apocalíptica,�negativa,�angustiante�da�vida.�
Outros� nomes� vistos� pelos� críticos,� entre� eles,�Alfredo� Bosi,� na� obra� já�mencionada,� como� préͲ
modernistas� são� Monteiro� Lobato� (Urupês),� Graça� Aranha� (Canaã),� Euclides� da� Cunha� (Os� Sertões)� por�
desenvolverem� temas� ligados� à� realidade� brasileira� cotidiana,� questionando� o� descaso� do� governo,� o�
anacronismo�da� sociedade�brasileira,� e,� ainda,�os� regionalistas�Valdomiro� Silveira� e� Simões� Lopes�Neto,�
cujas� obras,� respectivamente,� Os� caboclos� e� Lendas� Gaúchas,� focalizam� os� costumes� interioranos,� sem�
descaracterizáͲlos,� contribuindo,� assim,� para� o� conhecimento� do� Brasil� como� um� todo,� conforme� mais�
adiante� será�uma�preocupação� fundamental�da�Antropofagia�e�que�Mário�de�Andrade� com�maestria� irá�
consolidar�em�Macunaíma.�O�herói�sem�caráter.��
Os� sinais�de� ruptura�aos�quais�nos� referimos�quando� iniciamos�essas�considerações� sobre�o�préͲ
modernismo� não� se� restringem� apenas� a� obras� literárias.� Em� outros� campos� das� artes,� eles� também�
20�Versos�do�poema�Budismo�Moderno.�Cf.�ANJOS,�Augusto.�EU,�31ª�ed.�Rio�de�Janeiro:�Livraria�São�José,�1971,�p.�84.�
21�In:�ANJOS,�Augusto,�Op.�Cit.�,�p.�59�
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LETRAS�|�16
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LETRAS�|��169�
UNIDADE III 
 
A SEMANA DE ARTE MODERNA E SEUS DESDOBRAMENTOS 
�
�
A Semana de Arte Moderna 
 
Fruto,�como�dissemos,�desse�grupo�de� intelectuais�que�sentem�a�necessidade�de� imprimir�à�arte�
brasileira�uma�feição�mais�autêntica�e�mais�moderna,�a�Semana�de�Arte�Moderna�acontece�entre�os�dias�13�
e�18�de�fevereiro�de�1922,�no�Teatro�Municipal�de�São�Paulo,�espaço�da�elite�paulistana.�Sua�programação�
inclui� conferências,� palestras,� recitais� poéticos� e� musicais,� danças,� exposições� de� pintura,� escultura� e�
arquitetura.�As�exposições�permaneceram�durante�toda�a�semana�aberta�ao�público.��
As�conferências,�palestras�e�os�recitais�poéticos�e�musicais�aconteceram�durante�os�três�primeiros�
dias�–�13,�14�e�15�de�fevereiro� Ͳ�como�parte�do�chamado�Festival�da�Semana�de�Arte�Moderna.�CitemͲse�
entre�as�apresentações�as��conferências�e�palestra�proferidas�sobre�A�Emoção�Estética�na�Arte�Moderna,�de�
Graça�Aranha;�A�pintura�e�a�escultura�moderna�no�Brasil,�de�Ronald�de�Carvalho;�Arte�Moderna,�de�Graça�
Aranha.��
Entre�os�vários�poetas�e�músicos�participantes�do�festival,�se�encontravam�Mário�de�Andrade,�que�
recitou�Ode�ao�Burguês;�Ronald�de�Carvalho,�que�declamou�o�poema�Os� Sapos,�de�Manuel�Bandeira;�e�
Guilherme�de�Almeida,�que� recitou�Nós,�poema�de�sua�autoria;�o�maestro�e�compositor�Villa�Lobos,�que�
teve�sua�obra�musical�interpretada�por�vários�músicos,�sendo�inclusive�homenageado�na�terceira�noite�do�
festival,�que�foi�toda�dedicada�a�apresentações�de�músicas�de�sua�lavra;�e,�ainda,�entre�outros�músicos,��a�
pianista�Guiomar�Novais,�que�executou�várias�músicas�modernas.�Merece�também�registro�a�apresentação�
na�primeira�noite�do�espetáculo�Otteto,�constituído�de�três�danças�africanas,�do�maestro�VillaͲLobos;�e,�na�
segunda�noite,� da� dançarina� Yvonne� Daumerie,� que� interpretou� trecho� de� Debussy,� compositor�
responsável�pela�introdução�de�novas�e�estranhas�sonoridades,�portanto,�também�movido�pelo�espírito�de�
ruptura�que�presidia�os�realizadores�da�Semana�de�Arte�Moderna.��
Das�exposições�de�pintura,�escultura�e�arquitetura,�participaram�os�mais�representativos�artistas�da�
época,� empenhados� na� renovação� da� arte,� como� Victorio� Brecheret,� na� escultura,� Anita� Malfatti,� Di�
Cavalcanti�e�Vicente�do�Rego�Monteiro,�na�pintura�e�Antonio�Moya,�na�arquitetura.��
Para� termos� uma� ideia� mais� concreta� do� espírito� inovador,� questionador,� iconoclasta� dos�
idealizadores�da�Semana,�vejamos�alguns�comentários�feitos�por�deles:�
LETRAS�|�170�
x Para o pintor Di Cavalcanti, a Semana iria ser “de escândalos literários e artísticos, de meter os 
estribos na barriga da burguesiazinha paulistana”25 x Rubens Borba de Morais, sobre a semana, assim se pronuncia: “Nós, como o caboclo, ‘tacamos fogo 
na mataria’, porque não se planta sem derrubar. As chamas sobem altíssimas, fogem assoviando, 
serpentes fascinadoras. Só ficam os jequitibás, jacarandás, guajuçaras, cabreúvas, timburis. E à 
sombra das árvores enorme a plantação cresce. Felizes os que vierem depois de nós para colher o que 
plantamos.”26 x Segundo Oswald de Andrade, “qualquer apreciação das letras brasileiras deve ser hoje precedida do 
exame de revolta manifesta de 1922. Essa famosa Semana foi uma parada de conjunto, feita para 
protestar contra a decadência da literatura e da arte no Brasil em fevereiro daquele ano, no Teatro 
Municipal de São Paulo, com a presença de importante delegação do Rio de Janeiro.”27 x Comentando sobre os participantes da Semana, Mário de Andrade assim diz: “São moços de 
tendências múltiplas, às vezes contrárias, moços apenas iguais pela liberdade com que usam das 
possibilidades técnicas da música. Reuniram-se apenas porque união é força, e nestes tempos de 
sindicalismo, o ente solitário dispersa-se e empobrece. Assim somos os rapazes da Semana de Arte 
Moderna.”28 
�
Na�verdade,�naquele�momento,�o�que�importava�era�o�objetivo�comum�de�renovar�a�arte�brasileira�
libertandoͲa�do�passadismo�que�ainda�a�aprisionava.��
�
�
A poética de Bandeira: o São João do Modernismo brasileiro. 
 
OS SAPOS 
Enfunando os papos, 
Saem da penumbra, 
Aos pulos, os sapos. 
A luz os deslumbra. 
 
Em ronco que aterra, 
Berra o sapo-boi: 
- “Meu pai foi à guerra!” 
- “Não foi!” – “foi!” – “Não foi!”. 
 
 
25�Apud.�AMARAL,�Aracy.�Artes�Plásticas�na�Semana�de�22.�Subsídios�para�uma�história�da�renovação�das�artes�no�Brasil.�São�Paulo�:�
Perspectiva,�1979,�p.�123.�
26�Idem,�p.�99.�
27�ANDRADE,�Oswald.�O�divisor�das�águas�modernistas.�In._____�Estética�e�Política.�São�Paulo:�Globo,�1992,�p.�53�
28�Apud.�AMARAL,�Aracy.�Op.�Cit.,�p.�137.�
LETRAS�|��171�
O sapo-tanoeiro, 
Parnasiano aguado, 
Diz: - “Meu cancioneiro 
É bem martelado. 
 
Vede como primo 
Em comer os hiatos! 
Que arte! E nunca rimo 
Os termos cognatos. 
 
O meu verso é bom 
Frumento sem joio. 
Faço rimas com 
Consoantes de apoio. 
 
Vai por cinquenta anos 
Que lhes dei a norma: 
Reduzi sem danos 
A formas a forma. 
 
Clame a saparia 
Em críticas céticas: 
Não há mais poesia, 
Mas há artes poéticas...” 
 
Urra o sapo-boi: 
- “Meu pai foi rei” – “foi!” 
- “Não foi!” – “foi!” – “Não foi!”. 
 
Brada em um assomo 
O sapo-tanoeiro: 
- “A grande arte é como 
Lavor de joalheiro. 
 
 
LETRAS�|�172�
Ou bem de estatuário. 
Tudo quanto é belo, 
Tudo quanto é vário, 
Canta no martelo.” 
Outros, sapos-pipas 
(Um mal em si cabe), 
Falam pelas tripas: 
-“Sei!” – “Não sabe!” –“Sabe!” 
 
Longe dessa grita, 
Lá onde mais densa, 
A noite infinita 
Verte a sombra imensa; 
 
Lá, fugido ao mundo 
Sem glória, sem fé, 
No perau profundo 
E solitário, é 
 
Que soluças tu, 
Transido de frio, 
Sapo-cururu 
Da beira do rio.29 
�
Ausente� fisicamente� da� Semana� de�Arte�Moderna,�Manuel�Bandeira,� considerado� por�Mário� de�
Andrade�o�“São� João�do�Modernismo”,�nela�se� fez�presente,�por�meio�da�declamação�do�seu�poema�Os�
Sapos,� feita�por�Ronald�de�Carvalho,�através�do�qual�Bandeira� critica,�de� forma� irônica,�o� retoricismo,�o�
tecnicismo,�a�supremacia�da�forma,�aspectos�tão�decantados�pelos�poetas�parnasianos�em�detrimento�da�
poesia.�
�Aliás,� é� o� próprio� Bandeira� que,� em� comentário� sobre� esse� poema,� afirma� que,� embora� tenha�
parodiado�Olavo�Bilac�nos�versos�em�que�compara�o�trabalho�artístico�com�o�do�ourives�(versos�3�e�4�da�9ª�
estrofes),�o�poema�Os�Sapos�é�uma� sátira�dirigida�mais� “contra� certos� ridículos�do�postͲparnasianismo”,�
principalmente,�o�Hermes�Fontes�e�o�Goulart�de�Andrade.�O�primeiro,�por�chamar�atenção�no�prefácio�das�
29�Poema�extraído�de�BANDEIRA,��Manuel.�Estrela�da�vida�inteira.�Poesias�reunidas.�19.�ed.�Rio�de�Janeiro�:�José�Olympio,�1991,�p.�
46.�
LETRAS�|��173�
Apoteoses�para�o�fato�de�não�haver�em�seus�versos�rimas�de�palavras�cognatas.�O�segundo,�por�colocar,�sob�
o�título�dos�poemas,�a�declaração�entre�aspas:�“Obrigado�à�consoante�de�apoio.”30��
Contra�esse�retoricismo,�essa�vaidade�arrogante�dos�parnasianos,�recorre�Bandeira,�a�exemplo�do�
“sapoͲcururu”,�distanciado�de�toda�aquela�disputa,�à�simplicidade,�à�humildade�poética,�procurando�extrair�
dos� elementos�mais� simples� do� dia� a� dia,� seja� em� termos� de� linguagem,� seja� em� termos� de� conteúdo,�
material�para�sua�poesia.�Daí�a�insistente�defesa�da� linguagem�do�povo,�da�sua�forma�de�ser,�(�A�vida�não�
me�chegava�pelos�jornais�nem�pelos�livros/�Vinha�da�boca�do�povo�na�língua�errada�do�povo/�Língua�certa�
do� povo/� Porque� ele� é� que� fala� gostoso� o� português� do� Brasil� ...In:� Evocação� do� Recife);� a� rejeição� do�
retoricismo,�do�engessamento�poético�(Quero�antes�o�lirismo�dos�loucos/�O�lirismo�dos�bêbados/�O�lirismo�
difícil� e� pungente� dos� bêbados/� O� lirismo� dos� clowns� de� Shakespeare.� In:� Poética.);� a� crítica� ao�
aristocratismo�poético,�por�acreditar�que�“a�poesia�está�em� tudo�–� tanto�nos�amores�como�nos�chinelos,�
tanto� nas� coisas� lógicas� como� nas� disparatadas.”� Fazem�parte�dos� seus� textos� cantigas�de� roda,� trovas�
populares,�enfim,�tudo�que�se�relaciona�com�a�cultura�viva�do�povo.��
Embora�seu� ingresso�na� literatura� tenha�se�dado�via�parnasianismo,�mesmo�sem�dele�desligarͲse�
inteiramente,�percebeu�não�ser�esse,�pelas� limitações�que� impunha�à�criação�artística,�o�melhor�caminho�
para� chegar� à� poesia� propriamente� dita,� a� qual� necessitava,� antes� de� tudo,� de� liberdade� de� expressão.�
Motivo�pelo�qual�adere�às�defesas�do�verso�livre,�da�rima�livre,�do�ritmo�livre,�da�palavra�livre.�
Para�ele,�“no�verso� livre�autêntico,�o�metro�deve�estar�de� tal�modo�esquecido�que�o�alexandrino�
mais�ortodoxo�funcione�dentro�dele�sem�virtude�de�verso�medido.”31�
Contrariando�a�visão�tecnicista�do�parnasianismo,�valoriza�a�rima�pobre,�por�considerar�que�“�a�boa�
rima�é�a�que� traz�ao�ouvido�uma�sensação�de�surpresa,�mas�surpresa�nascida�não�da�raridade,�senão�de�
uma�espécie�de�resolução�musical...”32�Aliás,�musicalidade�é�outro�aspecto�poético�bastante�valorizado�por�
Bandeira� e� que� assoma� à� sua� poesia� através� das� aliterações,� das� assonâncias� e� do� que� ele� chama� de�
“ressonâncias�anteriores�e�posteriores”�provocadas�pelos�fonemas.���
Como�vemos,�a�concepção�poética�de�Bandeira� se�encontra�em�perfeita�consonância�com�o�que�
pensam� os� outros� dois� grandes� nomes� do� modernismo:� Mário� e� Oswald� de� Andrade,� cujas� poéticas�
comentaremos�a�seguir.�
Antes,�porém,�vale�a�pena�registrar�o�comentário�de�José�Guilherme�Merquior�acerca�dessa�tríade�
modernista.�Diz�ele:�
�Nossa�poesia�modernista�teve�um�batedor,�um�mentor�e�uma�fonte.�O�batedor�se�chamava�Oswald�de�Andrade.�O�mentor,�Mário�de�Andrade.�Bandeira�foi�a�fonte.�“Todos�bebemos�no�teu�canto”,�dele�disse�
Murilo� Mendes,� outro� modernista� com� quem� privei.� � que� Bandeira,� mais� moderno� que� modernista,�
30�Cf.�BANDEIRA,�Manuel.�Itinerário�de�Pasárgada.�3.�ed.�Rio�de�Janeiro:�Editora�do�Autor,�1966,�p.�59.�
31�Idem.�Ibidem,�p.�39�
32�Idem.�Ibidem,�p.�34.�
chegara�ma
literária:�a�e
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A poética
 
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33�MERQUIOR,
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357.�
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LETRAS�|�17
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Mário�de�Andra
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Paulicéia –
e os jorros
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Serpentina
 
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8.�Niterói:��Socie
de,�extraído�do
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a�sobre�a�Sem
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as cidades! 
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multuários da
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o�livro�Paulicéia
onte�:�Itatiaia;�S
mana�de�Arte
imples�despo
pida�da�pom
as retinas... 
rementes a se
 minhas visõe
ades... 
de poesia! Na
as ausências!
boca de mil de
ngua trissulca 
de distinção...
 baixos, mag
rementes a se
Paulo, 
is, 
dos meus olho
acos, uns mac
de�todos.�In:�CA
a�Silveira;�Rio�d
a�Desvairada.�In
São�Paulo:��Edit
e�Moderna.
ojamento�ao
mpa�verbal�pa
e desenrolar.
es! “Bom gior
ada de alegri
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dentes; 
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gros... 
e desenrolar.
hos tão ricos, 
cacos.34 
ARVALHO�E�SILV
e�Janeiro:�Mon
n:�ANDRADE,�M
tora�da�Univers
o� resultado�
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rno, caro”. 
ria! 
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VA,�Maximiano.
teiro�Aranha:�P
ário�de.�In:�___
idade�de�São�Pa
querido�pela
da�rica�orqu
.�(Org.)�Homena
Presença�Ediçõe
___�Poesias�Com
aulo,�1987,�p.�8
a� renovação
uestração�do
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agem�a�
es,�1989,�p.�
mpletas.�Edição
84.��
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LETRAS�|��175�
Participante�ativo�da�Semana�de�Arte�Moderna,�Mário�de�Andrade�foi,�ao�lado�de�Manuel�Bandeira�
e� Oswald� de� Andrade,� um� dos� maiores� nomes� do� modernismo� brasileiro.� Além� de� músico,� poeta,�
romancista,�contista,�crítico,�foi�também�um�grande�estudioso�do�nosso�folclore,�das�nossas�manifestações�
populares.��
No�mesmo�ano�da�Semana,�1922,�Mário,�lança,�bem�à�maneira�livre�e�irreverente,�defendida�pelos�
modernistas,� o� livro� de� poemas� intitulado� Paulicéia� Desvairada,� precedido� de� um� prefácio,� intitulado�
Prefácio� Interessantíssimo,� onde� expõe� suas� idéias� sobre� poesia,� revelando,� assim,� já� nessa� obra,� uma�
coerência�entre�concepção�e��práxis�poética.��
Logo� no� início� do� prefácio,� fica� evidenciado,� através� do� discurso� irônico� da� dedicatória� abaixo�
transcrita,�a�postura�antiacadêmica�que�presidirá�não�apenas�o�prefácio,�mas�toda�a�obra,�no�concernente�à�
rejeição�a�padrões,�a�escolas�literárias.�
�
A MÁRIO DE ANDRADE 
Mestre querido, 
 
Nas muitas horas breves que me fizestes ganhar 
a vosso lado dizíeis da vossa confiança pela arte 
livre e sincera... Não de mim, mas de vossa 
experiência recebi a coragem da minha Verdade 
 e o orgulho do meu Ideal. 
Permiti-me que ora vos oferte este livro que 
de vós me veio. Prouvera Deus! Nunca vos 
perturbe a dúvida feroz de Adriano Sixte... 
Mas não sei, mestre, se me perdoareis a distância 
Mediada entre estes poemas e vossas altíssimas 
Lições... Recebei no vosso perdão o esforço 
do escolhido por vós para único discípulo; 
daquele que neste momento de martírio muito 
a medo inda vos chama o seu Guia, o seu Mestre, 
o seu Senhor. 
 
Mário de Andrade 
14 de dezembro de 1921 
S. PAULO 
 
ObserveͲse�que�a�dedicatória�é�dele�para�ele�mesmo,� ressaltando�assim�uma�atitude�não�vazada�
nas� ideias�alheias,� conforme�ainda� reiteram�os�possessivos�empregados�em�primeira�pessoa.�RegistreͲse�
também�que�tudo�gira�em�torno�de�uma�“arte�livre�e�sincera.”�
LETRAS�|�176�
Outros�pontos�do�Prefácio�que�merecem�destaque�dizem� respeito� à� valorização�do�HUMOR,�da�
BLAGUE,�da�BRINCADEIRA,�aos�quais�os�modernistas�tanto�recorrem,�por�acreditarem�na�força�destruidora�
do�riso.�Para�Mário�de�Andrade,�a�BRINCADEIRA,�conforme�observa�em�A�Escrava�que�não�é� Isaura,�obra�
publicada� em� 1925,� por� meio� da� qual� apresenta� de� forma� mais� aprofundada� e� ampliada� suas� ideias�
estéticas,�entre�outros�benefícios,�traz�o�de�irritar�até�a�explosão�os�passadistas.”35�PronunciandoͲse�sobre�a�
sátira,� que� é� uma� outra� forma� de� riso,� Oswald� de� Andrade� afirma� que� “� a� sátira� é� sempre� a� defesa�
individual�ou�social�contra�a�opressão,�o�enfatuamento�e�as�usurpações�de�qualquer�espécie.”36��
Como�vemos,�o�riso�é,�pois,�uma�arma�eficaz�para�pôr�fim�a�ditadura�da�normatização,�dos�padrões�
impostos,�do�convencionalismo.�
Lembrando�os�surrealistas�que�preconizam�jogar�no�papel�tudo�o�que�vem�do�inconsciente,�Mário,�
ao�falar�sobre�a�criação�poética,�valoriza�a�“impulsão�lírica”,�dizendo�“escrevo�sem�pensar�tudo�o�que�meu�
inconsciente�me�grita.”37�Porém,�distanciandoͲse�dos�surrealistas,�fala�da�necessidade�de,�posteriormente,�
pensar,� corrigir,� uma� vez� que� para� ele� a� arte� consiste� em� “mondar�mais� tarde� o� poema� de� repetições�
fastientas,�de�sentimentalidades�românticas,�de�pormenores�inúteis�ou�inexpressivos.”38�
Daí�por�que�em�a�Escrava�que�não�é�Isaura,�fazendo�ressalvas�à�fórmula�criada�pelo�poeta�francês�
Paul�Dermée�para�simbolizar�a�poesia�que�consistia�em�Lirismo�+�arte�=�poesia,�Mário,�visando�a�uma�maior�
precisão,�a�reelabora�para�Lirismo�puro�+�Crítica�+�Palavra�=�Poesia.�Isto�porque�para�ele,�Paul�Dermée,�ao�
utilizar�o� termo�arte�no� lugar�de�crítica,�não�deixa�claro�o� trabalho�estético�que�o�poeta�deve� ter�com�a�
elaboração�do�seu�texto.�Além�disso,�para�Mário,�Paul�Dermée�também�falhou�por�não�fazer�referência�à�
matéria�prima�da�poesia�–�a�palavra�–��sem�a�qual�a�soma�obtida�não�teria�como�resultado�a�poesia,�mas,�
sim,�as�belasͲartes.�
�Outro�ponto� interessante�do�Prefácio�diz� respeito�à� contestação�que�Mário� faz�ao� futurismo�de�
Marinetti,�afirmando� “Não� sou� futurista� (de�Marinetti)”� 39�E�uma�das� razões�de�assim� se� colocar�é�que,�
diferentemente�dos� futuristas,�Mário� reconhece�a� importância�do�Passado.�Para�ele,� “O�passado�é� lição�
para�se�meditar�e�não�para�reproduzir”40�Aliás,�em�artigo�que�escreve�no�nº�3�da�revista�Klaxon,� falando�
sobre�os�pontos�que�discorda�de�Marinetti,�reitera�o�que�registra�no�Prefácio,�afirmando:�“Respeitamos�o�
passado�sem�o�qual�KLAXON�não�seria�KLAXON.”41�
35�ANDRADE,�Mário�de.�A�escrava�que�não�é�Isaura.�In:�_____�Obra�Imatura.�3.�ed.�São�Paulo:�Martins;�Belo�Horizonte:�Itatiaia,�
1980,�p.�231�
36�ANDRADE,�Oswald�de.�A�sátira�na�literatura�brasileira.�In:�_____�Estética�e�política.�São�Paulo:�Globo,�1922,�p.�82.����������������������������������������������������������
37�ANDRADE,�Mário�de.�Prefácio�Interessantíssimo.�In:�_____�Poesias�Completas.�Edição�Crítica�de�Diléia�Zanotto�Manfio.�Belo�
Horizonte:�Itatiaia;�São�Paulo:�Editora�da�Universidade�de�são�Paulo,�1987,�p.�59�
38�Idem.�Ibidem.,�p.�63.�
39�Idem.�Ibidem,�p.�61.�
40�Idem.�Ibidem.,�p.�75�
41�ANDRADE,�Mário�de.�O�Homenzinho�que�não�pensou.�In:�KLAXON.�Mensário�de�Arte�Moderna.São�Paulo,��Julho�de�1922,�nº�3,�
p.10.��
LETRAS�|��177�
Teorizando�sobre�o�Belo�artístico,�Mário�de�Andrade�estabelece�no�Prefácio�a�distinção�entre�o�Belo�
da�Natureza�e�o�Belo�da�Arte,�para� assinalar�que�este�último,�diferentemente�do�primeiro,�é�arbitrário,�convencional�e�transitório,�contrariando,�desse�modo,�a�visão�clássica�da� imutabilidade�do�belo�artístico�e�
do�caráter�mimético�da�arte.�Para�ele:�
Todos� os� grandes� artistas,� ora� consciente� (Rafael� das� madonas,� Rodin� do� Balzac,� Beethoven� da�
Pastoral,�Machado�de�Assis�do�Brás�Cubas),�ora�inconscientemente�(a�grande�maioria)�foram�deformadores�
da�natureza.�Donde�infiro�que�o�belo�artístico�será�tanto�mais�artístico,�tanto�mais�subjetivo�quanto�mais�se�
afastar�do�belo�natural”.42�
Nessa� linha�de�ruptura�com�o�tradicional,�merece�também�destaque�a�visão�de�Mário�de�Andrade�
relacionada� ao� assunto�poético,�bem� como� ao�que� confere�modernidade� à� literatura.�Questões�por� ele�
abordadas� tanto�no�Prefácio�como�em�A�Escrava�que�não�é� Isaura.�Segundo�ele,�“o�assunto�poético�é�a�
conclusão�mais�antiͲpsicológica�que�existe./.../�Pode�nascer�de�uma� réstia�de�cebolas�como�de�um�amor�
perdido.”43Com� isso,�na�verdade,�o�que�Mário�quer� sublinhar�é�que�o�poético�advém� �da� forma�como�o�
assunto� é� trabalhado.� Essa� � ênfase� na� elaboração� estética� norteia� também� a� sua� concepção� de�
modernidade,�conforme�podeͲse�ver�na�afirmação�abaixo:��
�
Escrever�arte�moderna�não�significa�jamais�para�mim�representar�a�vida�atual�no�que�tem�
de�exterior:�automóveis,�cinema,�asfalto�.�Si�(sic)�estas�palavras�requentamͲme�o�livro�não�
porque�pense�com�elas�escrever�moderno,�mas�porque�sendo�meu�livro�moderno,�elas�têm�
nele�sua�razão�de�ser.44�
�
O�alicerce�básico�dessa�modernidade�artística� reside�na�LIBERDADE�DE�EXPRESSÃO.�Na� recusa�às�
normas�premeditadas�pelos� limites�a�que�expõe�a�criação,�submetendo�o�poeta�a�um�verdadeiro� leito�de�
Procusto,45�pois�se�a�sua�ideia�não�cabia�dentro�da�metrificação�estabelecida,�ela�iria�sofrer�ou�um�processo�
de�alongamento�ou�uma�mutilação�para�se�inserir�na�norma.�Vejamos�como�ilustração�o�trecho�do�Prefácio�
em�que�Mário�se�expressa�sobre�isso:�“�Não�acho�mais�graça�nenhuma�nisso�da�gente�submeter�comoções�
a�um�leito�de�Procusto�para�que�obtenham�em�ritmo�convencional,�número�convencional�de�sílabas.”46�
Portanto,�VERSO�LIVRE,�RIMA�LIVRE,�RITMO�LIVRE,�VITÓRIA�DO�DICIONÁRIO�é�o�que�Mário�defende,�
em� termos� técnicos,�para� a� elaboração�da�nova�poesia.�Vale,� entretanto,� frisar�que� isso�não� significa� o�
abandono� total� das� métricas� existentes.� O� fundamental� consiste� em� que� elas� não� mais� se� colocam�
premeditadamente,�mas�pode�ser�utilizada,�caso�o�que�se�quer�dizer� fica�melhor�dentro�de�determinada�
métrica�ou�determinada�rima.�Essa�é�a�grande�diferença!�Como�diz�Mário,�“O�verso�continua�a�existir.�Mas�
42�Idem.Ibidem.�p.65�
43�ANDRADE,�Mário.�A�escrava�que�não�é�Isaura,�p.�208�
44�_____�Prefácio�Interessantíssimo,�p.�74.�
45�Leito�de�Procusto�era�uma�cama�de�tortura,�na�qual�as�pessoas�eram�colocadas.�Se�eram�menores�que�a�cama�eram�submetidos�a�
um�doloroso�estiramento;�se�eram�maiores,�tinham�seus�membros�amputados.�
46�ANDRADE,�Mário.�Op.�Cit.,�p.�66.�
correspond
sendo�a�rim
sublinha�é�q
Já�a
Ou�seja,�as�
composta�d
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referência�a
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mas�harmo
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LETRAS�|�17
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,�muitas�veze
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or�ele�criada�
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as,�sobrepos
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ua�vez,� seria
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rio�Mário�no�
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 assembléia 
a�logicidade�
l� por� parte�
s,� no� verso�
te”�e,�ainda,
icos�dizem�r
onoras”.�
io�de�Andrad
cimento� de�
mpre�existiu�
es�ocorrendo
a�de�se�libert
construção�
baixo,�do�poe
Povoar!”� Ass
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lassifica� os� v
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breporem�um
a�aquele� con
dando�marg
Prefácio:��
 
da�construç
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ndo,�não�ma
mas�às�outras
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em�à�simulta
ção,�o�que�nã
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,� o� que� Má
íntese,�traço
alorização�do
oemas�de�
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O�que�Mário
do�verso.”48
da�sintática”.
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onstante�do
e� Mário� faz
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harmônico� e
ais�melodias,
s,�nos�levam
ntro�de�uma
aneidade�de
ão�ocorre�no
o� significado
ário� fala� de
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LETRAS�|��179�
A poética de Oswald de Andrade 
�
�
PRONOMINAIS 
 
Dê-me um cigarro 
Diz a gramática 
Do professor e do aluno 
E do mulato sabido 
Mas o bom negro e o bom branco 
Da nação Brasileira 
Dizem todos os dias 
Deixa disso camarada 
Me dá um cigarro49 
�
Bem�mais�irreverente�e�polêmico�do�que�Mário�de�Andrade,�mas�tão�importante�quanto�este,�para�
implementação� das� novas� propostas� poéticas,�Oswald� de�Andrade� é� o� responsável� pelos�Manifesto� da�
Poesia�PauͲBrasil,�lançado�em�março�de�1924,�e�Manifesto�Antropófago,�lançado�em�maio�de�1928.��
Através�deles,�lança�Oswald�de�Andrade�o�seu�protesto�contra�o�elitismo,�o�pseudoͲintelectualismo,�
o�academicismo�que�nos�mantinham�ainda�bastante�aprisionados,�estética�e�ideologicamente,�às�heranças�
sócio/político/culturais�colonizadoras.��
Como�bem�o�assinala�Haroldo�de�Campos,�
�
O�Brasil� intelectual�das�primeiras�décadas�deste� século,� em� torno�à� Semana�de�22,� era�
ainda� um� Brasil� trabalhado� pelos� “mitos� do� bem� dizer”� (Mário� da� Silva� Brito,� no� qual�
imperava� o� “patriotismo� ornamental”� (Antonio� Candido),� da� retórica� tribunícia,�
contraparte� de� um� regime� oligárquicoͲpatriarcal,� que� persiste� República� adentro.� Rui�
Barbosa,�“a�águia�de�Haia”;�Coelho�neto,�“o�último�heleno”;�Olavo�Bilac,�“o�príncipe�dos�
poetas”eram�os� deuses� incontestes� de� um�Olimpo� oficial,� no� qual�o� Pégaso�parnasiano�
arrastava� seu� pesado� caparazão� metrificante� e� a� riqueza� vocabular� (entendida� num�
sentido� meramente� cumulativo)� era� uma� espécie� de� termômetro� da� consciência�
ilustrada.”
50�
�
Tendo�como�objetivo�primeiro�de�suas�propostas�a�consolidação�da� identidade�brasileira,�a�nossa�
independência� cultural,� as� propostas� dos� manifestos� oswaldianos� voltamͲse� para� as�nossas� raízes,�
buscando�delas�extrair�a�seiva�básica�da�nossa�brasilidade.�
49�Poema�de�Oswald�de�Andrade,�extraído�do�livro�PauͲBrasil,�p.�120�
50�CAMPOS,�Haroldo.�Uma�poética�da�radicalidade.�In:�ANDRADE,�Oswald.�PauͲBrasil.�3.�ed.�São�Paulo:�Globo�;�Secretaria�de�Estado�
da�Cultura,�1990,�p.�8.�
LETRAS�|�180�
Ao� nomear� seu� primeiro� manifesto� de� Manifesto� da� Poesia� PauͲBrasil,� Oswald� de� Andrade� vai�
buscar,�naquela�que�foi�a�primeira�matériaͲprima�brasileira�de�exportação,�uma�metáfora�para�sintetizar�a�
ideia�central�de�seu�texto,�que�é�a�de�criação�de�uma�poesia�verdadeiramente�brasileira,�uma�poesia�que�
não�seja�mais�de�importação,�mas,�sim,�de�exportação.�Uma�poesia�liberta�de�vez�dos�“cipós�maliciosos�da�
sabedoria”,�das�“lianas�da�saudade�universitária”,�conforme�exorta�no�referido�manifesto.�Ou�seja,� liberta�
de�vez�do�academicismo�que�a�aprisiona.��
Em�contraposição�a�esse�academicismo,�Oswald�de�Andrade�inicia�seu�texto�se�colocando�contra�o�
assunto�poético,�defendendo�que��
�
“A�poesia�existe�nos�fatos.�Os�casebres�de�açafrão�e�de�ocre�nos�verdes�da�Favela,�sob�o�
azul�cabralino,�são�fatos�estéticos.�
O�Carnaval�no�Rio�é�o�acontecimento�religioso�da�raça.�PauͲBrasil.�Wagner�submerge�ante�
os� cordões� de� Botafogo.� Bárbaro� e� nosso.� A� formação� étnica� rica.� Riqueza� vegetal.� O�
minério.�A�cozinha.�O�vatapá,�o�ouro�e�a�dança.�”.51�
�
�ObserveͲse� que,� ao� se� contrapor� à� visão� poética� elitista,� Oswald,� ao� mesmo� tempo,� ressalta� a�
valorização�da�realidade�brasileira,�sublinhando�a�nossa�riqueza�cultural,�mineral,�vegetal.��
A�crítica�aos�“mitos�do�bem�dizer”,�à�“retórica�tribunícia”,�ao�“helenismo�literário”,�ao�“tecnicismo�
parnasiano”,� ao� “mimetismo� naturalista”,� ao� “eruditismo� da� linguagem”� emerge� de� forma� irônica� e�
contundente�do�Manifesto�PauͲBrasil,�em�passagens�como�estas:�
�x Toda�a�história�bandeirante�e�a�história�comercial�do�Brasil.�O� lado�doutor,�o� lado�citações,�o� lado�autores�
conhecidos.�Comovente.�Rui�Barbosa:�uma�cartola�na�Senegâmbia.�Tudo� revertendo�em� riqueza.�A� riqueza�
dos�bailes�e�das�frases�feitas.�Negras�de�jockey.�Odaliscas�no�Catumbi.�Falar�difícil.”52�
�x Houve� um� fenômeno� de� democratização� estética� nas� cinco� partes� sábias� do� mundo.� InstituíraͲse� o�
naturalismo.� Copiar.� Quadro� de� carneiro� que� não� fosse� lã� mesmo,� não� prestava.� A� interpretação� no�
dicionário�oral�das�escolas�de�Belas�Artes�querida�dizer�reproduzir�igualzinho...�
................................................................................................................................�
Só�não�se�inventou�uma�máquina�de�fazer�versos�Ͳ�já�havia�o�poeta�parnasiano.53�
�
Em� contraposição�a�essa� concepção� ideológica�e�estética,�Oswald�de�Andrade�vai�defender�uma�
poesia� vazada� na� linguagem� do� povo,� na� “língua� sem� arcaísmo,� sem� erudição.� Natural� e� neológica.� A�
contribuição� milionária� de� todos� os� erros.� Como� falamos.� Como� somos.”� Uma� língua,� portanto,� sem�
artificialismo,�que�expressasse�nossa�maneira�de�ser;�defende,�ainda,�para�a�poesia�pauͲbrasil,�em�reação�à�
cópia,�ao�retoricismo,�ao�mecanicismo�das�estéticas�em�vigor,�a�síntese,�a�invenção,�a�surpresa,�o�equilíbrio�
51�ANDRADE,�Oswald.�Manifesto�da�Poesia�PauͲBrasil.�In:�_____�Do�PauͲBrasil�à�Antropofagia�e�às�Utopias.�2.�ed.�Rio�de�Janeiro:�
Civilização�Brasileira,�1978,�p.�5�
52�Idem.�Ibidem.�
53�Idem.�Ibidem.�p,�7�
LETRAS�|��181�
geômetro,�o�acabamento� técnico,�uma�nova�perspectiva�e�uma�nova�escala.�Ou� seja,�que�a�nova�poesia�
brasileira,� em� consonância� com� a� modernidade,� assuma� também� uma� feição� concisa,� criativa� e�
provocadora.��
VoltarͲse�para�as�raízes,�como�se�sabe,�é�voltarͲse�para�o�passado.�É�olhar�para�um�tempo�anterior�
ao�que�se�vive,�para�melhor�compreender�o�presente�e�construir�o�futuro.�Como�Mário�de�Andrade,�Oswald�
também� reconhece�e�valoriza�a� contribuição�do�passado.�Sua�proposta�de�“acertar�o� relógio� império�da�
literatura� nacional”,� ou� seja,� de� adequar� a� arte� ao� novo� ritmo� da� vida,� modificado� pelos� avanços�
tecnológicos,�passa�,não�pela�rejeição�do�passado,�como�o�queria�Marinetti,�mas�pela�fusão�do�passado�e�
do�presente,�do�primitivo�e�do�civilizado,�da� tradição�e�da�modernidade,�conforme�o�ratifica�a�passagem�
abaixo,�extraída�do�referido�Manifesto:�
�
Temos� a� base� dupla� e� presente� –� a� floresta� e� a� escola.� A� raça� crédula� e� dualista� e� a�
geometria,�a�álgebra�e�a�química� logo�depois�da�mamadeira�e�do�chá�de�ervaͲdoce.�Um�
misto�de�“dorme�nenê�que�o�bicho�vem�pegá”�e�de�equações�.�
Uma� visão� que� bata� nos� cilindros� dos� moinhos,� nas� turbinas� elétricas,� nas� usinas�
produtoras,�nas�questões�cambiais,�sem�perder�de�vista�o�Museu�Nacional.�PauͲBrasil.”54�
�
Uma� visão,� porém,� liberta� de� qualquer� fórmula,� que� permita� ver� com� os� olhos� livres� a�
contemporânea�expressão�do�mundo.�
É�com�esse�olhar�livre�que�Oswald�de�Andrade�se�volta�não�apenas�para�a�literatura,�mas�para�toda�
manifestação�sócio/cultural/brasileira�no�Manifesto�Antropófago,�por�meio�do�qual,�de� forma�ainda�mais�
ferrenha�e�satírica,�critica�nossa�dependência�cultural,�se�colocando,�como�bem�o�observa�Benedito�Nunes,�
contra�“o�aparelhamento�colonial�políticoͲreligioso�repressivo�sob�que�se�formou�a�civilização�brasileira,�a�
sociedade�patriarcal�com�seus�padrões�morais�de�conduta,�as�suas�esperanças�messiânicas,�a�retórica�de�
sua� intelectualidade,�que� imitou�a�metrópole�e�se�curvou�ao�estrangeiro,�o� indianismo�como�sublimação�
das�frustrações�do�colonizado,�que�imitou�atitudes�do�colonizador.”�55�
Para� Oswald,� a� conquista� da� nossa� autonomia� cultural� implicava� a� reabilitação� do� índio� não�
catequizado�e�do�seu�extraordinário�espírito�edênico.�“Tupi�or�not�tupi,�that�is�the�question”�(Ser�ou�não�ser�
tupi,� eis� a� questão),� proclama� Oswald� no� mencionado� Manifesto,� conclamandoͲnos� a� retomar� a� nossa�
brasilidade,�através�do�retorno�simbólico�ao�mundo�primitivo,�pois,�segundo�ele,�“antes�dos�Portugueses�
descobrirem�o�Brasil,�o�Brasil�tinha�descoberto�a�felicidade.”56��
Além�disso,�era�preciso�dar� vez�e� voz� àqueles�que� foram� alijados�da�história� Ͳ� índios�e�negros� Ͳ�
através�do�desrecalcamento�da� sua�cultura,�abafada�pela� cultura�colonizadora,� retornando,�para� isso,�às�
fontes�primitivas.�Razão�pela�qual�uma�das�suas�propostas�fundamentais�reside�na�“transformação�do�tabu�
54�Idem.�Ibidem.,�p.�9�
55�NUNES,�Benedito.�Antropofagia�ao�alcance�de�todos.�In:�ANDRADE,�Oswald.�Op.�Cit.�p.�XXV.�
56�ANDRADE,�Oswald.�Manifesto�Antropófago.�In:�_____�Op.�Cit.,�p.�18.�
LETRAS�|�182�
em�totem”,�ou�seja,�na�transformação�do�que�era�proibido,�negado,�por�ser�considerado�impuro,�não�digno,�
em�algo�permitido�e,�mais�do�que� isso,�valorizado,� sacralizado.�O�que,�na�verdade,�dentro�da� sociedade�
brasileira,�relacionavaͲse�com�as�manifestações�culturais�indígenas�e�africanas.�Em�contrapartida,�realizaͲse�
a�operação�inversa�de�dessacralização�do�que�até�então�surgia�como�sacralizado�no�nosso�meio�cultural,�a�
exemplo�da�moral� cristã,�dos� costumes�europeus,�da�dominação�estrangeira,�do� índio�europeizado�e�de�
figuras� emblemáticas�da� cultura�dominante.�Por� isso�que�para� seu� criador,� a�Antropofagia� é� ao�mesmo�
tempo:� “culto� à�estética� instintiva�da�Terra�Nova�e� “redução� a� cacarecos�dos� ídolos� importados,�para� a�
ascensão�dos�totens�raciais.”57�
�Vejamos,�a�título�de� ilustração,�algumas�passagens�do�Manifesto,�confirmadoras�dessa�subversão�
cultural,�visada�pela�Antropofagia.��x Contra todos os importadores de consciência enlatada. A existência palpável da 
vida. E a mentalidade pré-lógica para o Sr. Lévy-Bruhl estudar. x Queremos a Revolução Caraíba. Maior que a Revolução Francesa. A unificação de 
todas as revoltas eficazes na direção do homem. Sem nós, a Europa não teria 
sequer

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