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O liame entre o estrito cumprimento do dever legal e o abuso de autoridade Josafá Souza Nogueira 2 , Luiz Henrique B. de Azevedo Silva 3 1. Trabalho realizado na Faculdade Montes Belos (FMB) 2. Discente do Curso de Direito da FMB 3. Prof. orientador da FMB Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo estudar os limites entre a excludente de ilicitude do Estrito cumprimento do Dever Legal, que esta elencada no artigo 23, inciso III do código penal brasileiro, saber quem está amparado por esta excludente e seu limite com o crime de “Abuso de Autoridade”, que pode ocorrer nos casos de excessos. A legislação permite a algumas autoridades a limitação dos direitos e garantias individuais de quem viola a ordem pública, sem cometer inflação a lei, em benefício a segurança e a paz social da coletividade. Palavras chaves: Abuso de autoridade. Estrito cumprimento do dever legal. Uso da força. Preservação da ordem pública. The link between strict compliance with the statutory duty and abuse of authority Abstract: This research aims to study the boundary between any unlawful act of strict compliance with legal obligations, which are summarized in Article 23, paragraph III of the Brazilian penal code, to know who this is supported by exclusive and its limits with the crime of “Abuse of Authority,” which can occur in cases of excess. The legislation allows the authorities to some limitation of rights and guarantees individual who violates the order, without making inflation the law to benefit the security and social peace of the community. Key words: Abuse of authority. Strict compliance with legal obligations. Use of force. Preservation of public order. 1.0 Introdução Abordando um conceito geral das excludentes de ilicitude e as suas finalidades, será apresentado em especial o estrito cumprimento do dever legal e a sua linha demarcatória com o abuso de autoridade. As excludentes de ilicitude surgiram como uma proposta para solucionar o problema de conflito e a permanência das normas, evitando-se, assim, que as autoridades ou seus agentes cumprissem a obrigação e o dever legal de agir e ao mesmo tempo 1d1s – los por aquilo que lhe era ordenado. Trata-se de uma pesquisa teórica, tomando por base uma metodologia dialética na discussão da aplicação da excludente de ilicitude do estrito cumprimento do dever legal, em confronto com o abuso de autoridade. No primeiro capítulo será abordada a origem das excludentes de ilicitude, verificar de uma forma bem sucinta, o seu surgimento. Saber como elas nasceram e a abrangência de sua existência. No segundo capítulo foi mencionada a conceituação de excludentes de ilicitude definida na legislação e no direito penal, trazendo ênfase às atitudes permissivas de cada uma existentes em nosso ordenamento jurídico. Caracterizando e mencionando a importância das excludentes nas ações realizadas de forma legal. Ainda neste mesmo capítulo, definirá a conceituação do estrito cumprimento do dever legal, os sujeitos, as suas excludentes, o dever legal e seu estrito cumprimento, esclarecendo também os modos de repreensão ao contraventor da lei, sem que essa ação caracterize, contudo o crime previsto na lei 4.898/65, “abuso de autoridade”. Será relatada no terceiro capítulo à definição de abuso de autoridade, quem são consideradas autoridades e quais atentados caracteriza esse delito. Será relatado também a sua origem, qual o motivo de seu surgimento os limites que separam a ação da excludente de ilicitude estrito cumprimento do dever legal do crime de abuso de autoridade. . 2.0 Origens das ecludentes de ilicitude Com o passar dos tempos e com a evolução humana, passaram – se à fase da vingança privada, onde o castigo era proporcional ao delito, tendo como seu precursor Talião. Antes de Talião, a punição ficava a cargo do ofendido que poderia matar escravizar ou banir o 2d2seqüênci. A pena ultrapassava de longe a pessoa do seu infrator para recair sobre seus familiares ou inteiramente sobre sua tribo (RANGEL, 2007). O Direito repressivo não se mostrou estático, e com maior organização social, chegou-se a fase da vingança pública, que protegia o príncipe, aplicando penas bastante severas. Mais adiante, retirou-se da pena o seu caráter religioso, transportando a responsabilidade para o grupo social. A fase medieval do Direito Penal teve grande influência do Direito Romano, Canônico e Bárbaro. Cominava pena de morte tais como fogueira, afogamento, soterramento, enforcamento etc. Desse sentimento de repúdio a desigualdade surge o iluminismo, movimento mundial iniciado na França após sua revolução, surgindo o Período Humanitário do Direito Penal que apregoa a humanização das leis e da administração da justiça penal (Rangel, 2007). As sociedades, até então cansadas de viverem num regime jurídico que não lhes proporcionavam segurança, entregaram ao Estado uma parcela de sua liberdade, todavia, era impossível que o Estado pudesse estar presente em todos os momentos de conflito para salvaguardar a todos os seus tutelados. Para tentar salvaguardar esses direitos o Estado prescreveu sanções e demais medidas visando prevenir e reprimir o desencadeamento de fatos atentatórios aos bens jurídicos dos cidadãos. A arma que se valia o Direito Penal como meio de ação era a pena, que imprimia ao autor da conduta repudiada pela norma jurídica um mal que correspondia em gravidade ao dano por ele causado. O Estado não podendo tutelar todos os conflitos de interesses que por ventura pudessem surgir, deu-se a oportunidade ao particular de se proteger dos injustos dirigidos a sua pessoa, não podendo exigir o Estado o sacrifício do direito do agredido, que nesse momento, agia como se Estado fosse, sendo considerado justo seu impulso de defesa. No Código Penal de 1.830 não previa claramente as causas de excludentes de ilicitude, más em seu artigo 14, mostrava indícios de preocupação nesse sentido: Dos crimes justificáveis Art. 14. Será o crime 3d3seqüência, e não terá lugar a punição delle: 1º Quando 3d3 feito pelo 3d3seqüênci para evitar mal maior. 2º Quando 3d3 feito em defeza da 3d3seqü pessoa, ou de seus direitos. 3º Quando 3d3 feito em defeza da 3d3seqü do 3d3seqüênci. 4º Quando 3d3 feito em defeza da pessoa de um terceiro. 5º Quando 3d3 feito em 3d3seqüênci á execução de ordens illegaes, não se excedendo os meios 3d3seqüênci para impedil-a. 6º Quando o mal consistir no castigo moderado, que os pais derem a seus filhos, os senhores a seus escravos, e os mestres a seus 3d3seqüênc; ou desse castigo resultar, uma vez que a qualidade delle, não seja contraria ás Leis em vigor. Em 1.890, o General Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisório da Republica dos Estados Unidos do Brasil, edita outro código penal, ao qual cita: Art. 32. Não serão também criminosos: § 1º Os que praticarem o crime para evitar mal maior; § 2º Os que o praticarem em defesa legitima, 3d3seqü ou de outrem. A legitima defesa não é limitada unicamente á protecção da vida; 3d3s comprehende todos os direitos que podem ser lesados. . O Decreto Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1.940, traziam as excludentes de ilicitude, com previsão no artigo 19 e era denominada exclusão de criminalidade. A substituição do Código Penal foi tentada pelo Decreto-lei n° 1.004, de 21 de outubrode 1969, sêm exito, pois as críticas foram tão grandes que ele foi modificado substancialmente pela Lei n° 6.016, de 31 de dezembro de 1973. Apesar de vários adiamentos para o começo de sua vigência, a referida lei tambem foi alterada por outra lei, a de n° 6.578, de 11 de outubro de 1978, alterando finalmente o Código de 1.969, baseado no posicionamento de que o código penal de 1.940 era mais atualizado que o vacante. Em 11 de julho de 1984, ocorreu outra reforma na Parte Geral do Código Penal, passando então a denominação exclusão da criminalidade para excludente de ilicitude, passando também, do artigo 19 para o artigo 23. Nessa reforma, não houve alterações no conteúdo do referido artigo. As excludentes eram previstas no Decreto – Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 da seguinte forma: Exclusão de criminalidade Art. 19. Não há crime quando o agente pratica o fato: I – em caso de necessidade; II – em legítima defesa; III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Passou – se então, com as alterações do Decreto – Lei nº 7.209, de 11 de julho de 1984 a ter a seguinte denominação: Exclusão de ilicitude Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato: I – em estado de necessidade; II – em legítima defesa; III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Portanto, nem toda violação das normas jurídicas atribuem a conduta a qualidade de ilícita, e consequentemente não permite a responsabilização criminal e a aplicação da pena. No entanto, em situações excepcionais, a lesão ao bem jurídico pode ser justificada e a conduta violadora da norma não adquire a qualidade de ilícita. Por isso, é legalmente permitida uma ação ao particular como se fosse o próprio Estado para defender seus interesses jurídicos legítimos ou de terceiros, desde que preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos da justificante. Os requisitos objetivos são os limites traçados pela lei material, onde é permitido ao agente reagir. O requisito subjetivo é a consciência da ilicitude ou da antijuridicidade, usadas no direito pátrio como expressões sinônimas. Para que não haja punição para essa conduta, é necessário que ela seja moderada, sem exageros, no limite da fronteira imposta pela lei, devendo cada caso ser analisado separadamente, para que a autoridade não venha a sofrer sanções injustificadas. 3.0 Definições de excludentes de ilicitude. Visto que as excludentes de ilicitude surgiram no ordenamento jurídico brasileiro no ano de 1.940, com a denominação exclusão de criminalidade, é preciso definir o que vem a ser tal instituto jurídico. O direito prevê causas que excluem a antijuridicidade do fato típico, significa dizer que são normas permissivas, também chamadas tipos permissivos, que excluem a antijuridicidade por permitirem a prática de um fato típico (MIRABETE, FABRINI, 2011). Rocha (2007) define que a exclusão da ilicitude dá-se por preceitos permissivos, e não por normas. A norma jurídica materializa um comando que impõe observância obrigatória a todos. As excludentes de ilicitude legitimam a prática de um fato típico, não lhe atribuindo ilicitude, fator essencial para a caracterização do ilícito penal, desde que seja o único meio plausível de ação e capaz de afastar o perigo que circunda o agredido. Ressalta ainda: Objetivamente, a causa justificante define situação fática excepcional que retrata um conflito de interesses juridicamente tutelados. Subjetivamente, a causa de justificação exige que o autor da violação á norma típica tenha se orientado por finalidade compatível com a preservação de um dos interesses envolvidos na situação de conflito (ROCHA, 2007, P. 286). Dentre estas excludentes, será priorizado neste trabalho o estrito cumprimento do dever legal. Também serão mostrados os limites desta com o crime de abuso de autoridade. 4.0 .Estrito Cumprimento do Dever Legal Há casos em que a lei expressa não ser ilícita uma conduta, embora típica. O estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular do direito são causas lógicas de exclusão contida no inciso III do artigo 23 do Código Penal: “Não há crime quando o agente pratica o fato: (...) III- Em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular do direito”. O conceito de estrito cumprimento do dever legal é definido como a causa de exclusão da ilicitude que consiste na realização de um fato típico, por força do desempenho de uma obrigação imposta por lei, nos exatos limites dessa obrigação (CAPEZ, 2011). Para Nucci (2010, p.284) o estrito cumprimento do dever legal é “uma ação praticada em cumprimento de um dever imposto por lei, penal ou extrapenal, mesmo que cause lesão à bem jurídico de terceiro”. Prado (2007.), define esta excludente como o ato que pratica o agente público em estrito cumprimento de um dever legal, cumprindo exatamente o determinado pelo ordenamento jurídico na realização de uma conduta lícita (5d5se, executio non habet injuriam). Em outras palavras, a lei não pode punir quem cumpre um dever que ela impõe. Por ser um dever imposto por lei, àquele que age em seu cumprimento, não pode estar praticando um fato contrário à lei. Porém para que não houvesse exageros, foi assinalado no código penal com o adjetivo estrito, restringindo aos casos em que o agente está realmente dentro do seu dever legal. A excludente só ocorre quando há um dever imposto pelo direito objetivo e pode ser imposto por qualquer lei, não necessariamente lei penal. O dever pode estar contido em regulamento decreto ou qualquer ato emanado do poder público, desde que tenha caráter geral. Outro caráter (religioso, moral, social), não autoriza a pratica de um fato típico sob o abrigo dessa justificativa. O dever de agir tem previsão legal nas alíneas “a, b e c do parágrafo 2º, artigo 13 do código penal: Relação de causalidade: Artigo 13: O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera – se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Superveniência de causa independente § 1º A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu os resultados, os fatos anteriores, entretanto, imputam – se a quem os praticou. Relevância da omissão § 2º A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com o seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. A conceituação de estrito cumprimento de dever legal não foi colocada no Código Penal, porém foi definida como uma ação praticada em cumprimento de um dever imposto por lei, penal ou extrapenal, mesmo que cause lesão à bem jurídico de terceiro. O Cumprimento deve ser estritamente dentro da lei. Exige que o agente se contenha dentro dos rígidos limites de seu dever, fora dos quais desaparece a excludente. Assim, somente os atos rigorosamente necessários e que decorram de exigência legal se amparam na causa de justificação em estudo.Os excessos cometidos pelos agentes poderão constituir crime de abuso de autoridade, ou delitos previstos no código penal, não sendo este funcionário público. O dever legal que permite a justificação não é somente dirigido aos funcionários públicos, para o desempenho de suas funções, más também aos particulares, quando designados para exercerem alguns cargos ou função pública (ROCHA, 2007, p.315). Ressalta Rocha (2007) que “A permissão para a realização da conduta esta vinculada aos estritos limites da lei que institui o dever, e qualquer inobservância desses limites importa na ilicitude da conduta”. Para que o funcionário público se beneficie dessa excludente, faz se necessário que ele tenha conhecimento de estar agindo amparado por ela. Ou seja, não é admitido à justificativa nos delitos culposos porque o dever legal exige que a pessoa tenha o conhecimento de que esta praticando um fato imposto pela lei, pois ela não obriga á imprudência, negligência ou imperícia. Essa excludente, como as demais, também exige o elemento subjetivo, ou seja, o sujeito deve ter conhecimento de que está praticando um fato em face de um dever imposto pela lei, do contrário, estaremos diante de um ilícito. Como todas as causas excludentes de ilicitude, o estrito cumprimento do dever legal exige que a conduta que se pretende justificar tenha sido orientada por vontade compatível com a realização objetiva do fato justificado. No caso a justificação exige, além da objetiva realização de uma conduta obrigada, que o autor tenha se motivado pela vontade de cumprir fielmente e sem abusos, o dever que lhe cabia. (ROCHA, 2007, P.318). O estrito cumprimento do dever legal se refere somente a funcionário público, podendo o cidadão se beneficiar dessa excludente exclusivamente como co – autor ou partícipe. A conceituação de funcionário público para fins penais encontra-se no artigo 327 do Código Penal. Funcionário Público Artigo 327. Considera – se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente, ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. &1º Equipara – se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da administração Pública. & 2º A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previsto neste capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da Administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. 4.1 Os sujeitos e suas excludentes A conduta típica pode ser praticada uma sob a proteção da causa excludente de ilicitude do estrito cumprimento de dever legal. A – como autores da conduta: funcionários públicos (lato sensu) e particulares que exercem função pública (jurado, perito, mesário da Justiça Eleitoral, etc), pois agem em conformidade com o ordenamento legal. B – como co-autores ou partícipes: Nessa modalidade, qualquer pessoa pratica, inclusive particulares, desde que atue em conjunto com um funcionário público e que seja reconhecida a excludente para este e que tenha consciência de que também está agindo sob o albergue da causa de justificação – o fato não pode ser objetivamente lícito para uns e ilícito para outros. Vale ressaltar que, se o particular encontra determinado indivíduo na rua, e este é seu desafeto e, sem perceber que o mesmo estava sendo perseguido pela polícia, o agride, para vingar-se de fatos pretéritos, deverá, nesse caso, ser responsabilizado pelas lesões que vierem a causar, não pode se beneficiar da excludente, porque, mesmo tendo agido como co-autor da conduta dos policiais, não agiu com a intenção de auxiliar o autor da conduta no cumprimento de dever legal nem tinha consciência de que existia, no contexto fático, aquela situação justificante. 4.2 Dever legal e seu estrito cumprimento Dentro dessa conceituação, é muito importante atentar para essas duas expressões: o dever legal e o estrito cumprimento. O que vem a ser dever legal? Como a própria denominação sugere, é uma obrigação imposta por lei, significando que o agente, ao atuar tipicamente, não faz nada mais do que cumprir uma obrigação. Mas para que esta conduta, embora típica, seja lícita, é necessário que esse dever derive direto ou indiretamente de lei, ou seja, preceito de caráter geral, originário de poder público competente. O dever que dá suporte a uma conduta que se pretende justificar somente poderá ser oriunda de norma legal. O dever legal é definido como sendo toda e qualquer obrigação direta ou indiretamente derivada de lei (CAPEZ, 2011). Não é necessário, também, que esta obrigação esteja imposta textualmente no corpo de uma lei estrito sensu, pode constar de decreto, regulamento ou qualquer ato administrativo infralegal, desde que originários de lei. O mesmo se diga em relação a decisões judiciais, que nada mais são do que determinações emanadas do Poder Judiciário em cumprimento da lei e esta na lei ou dela derive. Em algumas situações, são constituídos casos típicos de cumprimento de dever legal, como a execução de pena de morte feita pelo carrasco, quando o sistema jurídico admitir (no Brasil, somente em época de guerra, diante de pelotão de fuzilamento); a morte do inimigo no campo de batalha produzida pelo soldado em tempo de guerra; a prisão em flagrante delito executada pelos agentes policiais; a prisão militar de insubmisso ou desertor; a violação de domicilio pela polícia ou servidor do judiciário para cumprir mandado judicial e outros. A permissão para realização do dever legal está vinculada aos estritos limites da lei que instituiu o dever, e qualquer desatenção desses limites ultrapassa o dever legal e incorre na ilicitude da conduta. Os limites do dever legal devem ser observados com a necessária conciliação entre os diversos deveres que consiste ao autor da conduta. A observação dos limites estabelecidos pelos deveres se pressupõe ao cumprimento fiel de um dever legal. E o cumprimento estrito (CAPEZ, 2011), define – se que quando a lei impõe determinada obrigação, existem limites, parâmetros, para que tal obrigação seja cumprida, isto é, a lei só obriga ou impõe dever até certo ponto, e o agente obrigado só dever proceder até esse exato limite imposto pela lei. Dessa forma, exige-se que o agente tenha atuado dentro dos rígidos limites do que obriga a lei ou determina a ordem que procura executar o comando legal. 5.0 Abuso de autoridade Abuso de Autoridade é “o ato ou efeito de impor a vontade de um sobre a de outro, tendo por base o exercício do poder, sem considerar as leis vigentes” (CAPEZ, 2008). Pode se claramente ser definida como qualquer conduta que possa vir a atentar contra a liberdade de locomoção, a inviolabilidade do domicílio, o sigilo da correspondência, contra a liberdade de consciência e de crença, ao livre exercício de culto religioso, á liberdade de associação, aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto, ao direito de reunião, a incolumidade física do indivíduo e aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional.A conduta excessiva pode ocorrer em qualquer das causas de excludentes de ilicitude, porém o nosso ordenamento jurídico não permite, com base nas causas de justificação, ofensas desnecessárias a bens juridicamente tutelados. Portanto, havendo excessos, os danos por ele produzidos não são justificados e o autor da conduta responde conforme seu elemento subjetivo. Qualquer pessoa que se sentir lesada em seus direitos, por qualquer ato praticado por autoridade pode requerer junto as autoridades competentes a representação para que seja instaurado o processo e apurar as responsabilidades civis, penais e administrativas contra essa autoridade que cometeu abuso no exercício de suas funções. 5.1 Histórico Legislativo da criação da lei do Abuso de Autoridade Cumpre lembrar o momento histórico que atravessava o País quando esta Lei foi promulgada. Surgiu com a queda de Getúlio Vargas e com a realização das eleições para a Assembleia Constituinte e para presidente. Esse período, que se estendeu de 1945 até o golpe militar em 1964, caracterizou se pela expansão da industrialização nacional, pela consolidação do populismo nacionalista como uma derivação do regime autoritário criado por Vargas, pelo fortalecimento dos partidos políticos de caráter nacional e por grande efervescência social, gerando graves conflitos sociais, envolvendo civis e militares, quase sempre desembocando em situações de grande violência (NUCCI, 2009). Em 09 de dezembro de 1965, foi editada a Lei nº 4.898, que definiu como crime o abuso de autoridade, cuja ação é pública incondicionada, com pena máxima prevista de seis meses de detenção, além de multa, perda do cargo e inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo de até três anos (CAPEZ, 2008). A Constituição Federal de 1988 consagrou direitos e garantias individuais que devem ser respeitados por todos, inclusive pelos detentores do poder estatal. A lei de Abuso de Autoridade regula o direito de representação e o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal (CAPEZ, 2008). O objetivo maior da lei é proteger os cidadãos dos abusos praticados pelas autoridades públicas ou por seus agentes, que possam comprometer direitos e garantias constitucionais como a liberdade de locomoção, o sigilo das correspondências, inviolabilidade domiciliar, incolumidade física, etc. 5.2 As autoridades. Conforme especifica a referida lei 4.898/65, em seu artigo 5º, “autoridade é qualquer pessoa que exerça função pública, cargo ou emprego, de natureza civil ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração”. Portanto, esses delitos são considerados crimes próprios, pois só podem ser praticados por autoridades. Conforme descreve o artigo 5º desta lei, é considerada autoridade qualquer pessoa que exerça função pública, ainda que transitoriamente e sem remuneração (SILVA, LAVORENTI e GENOFRE, 2002). São exemplos de Autoridades: Os titulares de cargos públicos criados por lei, os contratados sob regime diverso do direito público, para exercício de funções de natureza pública, os mensalistas, os diaristas, tarefeiros e qualquer outro nomeado a título precário, desde que exerçam função pública, qualquer outra pessoa, ainda que transitória, precária e gratuitamente, exerça função pública, os serventuários da justiça, o comissário de menores, o funcionário de Autarquias, o Vereador, o advogado encarregado da cobrança da dívida ativa do Estado, o Guarda Municipal, etc. (CAPEZ, 2008, p.31). Portanto, os sujeitos ativos dos crimes em estudo devem exercer necessariamente uma função pública, pouco importando a sua transitoriedade e se recebe remuneração dos cofres públicos. O que é importante ressaltar é a natureza da função exercida pelo agente, não importando a forma de investidura na Administração pública. Alguns agentes não são considerados autoridades; como exemplo os tutores e curadores dativos, os inventariantes judiciais, o administrador de massa falida, o depositário judicial e os diretores de sindicatos (CAPEZ, 2008). 5.3 A prática do Abuso de Autoridade fora do exercício da Função Pública É muito questionado se a autoridade, mesmo estando fora do exercício de suas funções, pratica o crime de abuso. Capez (2008) preconiza que ocorre a prática de abuso de autoridade fora do exercício da função, cita: Segundo decidiu o Plenário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, parece fora de dúvida que o acusado agiu como autoridade, seja perante as vítimas, seja perante o Dr Delegado de Polícia e não como cidadão. Dissociar-se a autoridade do cidadão, depois que ele se identifica, é mero artifício. A partir do momento em que se identificou como Promotor de Justiça passou a exercer o poder inerente ao seu cargo, agindo além da medida legal (CAPEZ, 2008, p.31). Se o abuso praticado pela autoridade não tiver qualquer conexão com a atividade por ela exercida, retira a configuração do crime, pois nesse caso, o funcionário não abusou de sua função. 5.4 Fatores que configuram o abuso de Autoridade previsto no artigo 3º da Lei 4.898/65. As condutas que configuram crime de abuso de autoridade estão arroladas no art. 3º da Lei nº 4.898/1965. São classificados como crimes de atentados ao qual o autor Gabriel Habib trouxe a seguinte definição: São aqueles que já trazem a figura da tentativa como elemento do tipo. Se a tentativa já esgota a figura típica na conduta do agente o delito já está consumado. Seria correto, portanto, afirmar que, nesses crimes, o tentar já é consumar. Dessa forma, o delito não admite a figura da tentativa (HABIB e GABRIEL, 2009, p. 20). Os crimes previstos no artigo 3º da lei 4.898/65 são os atentados contra: Art. 3º Constitui abuso de autoridade qualquer atentado: a) À liberdade de locomoção; b) À inviolabilidade de domicílio; c) Ao sigilo da correspondência; d) À liberdade de consciência e de crença; e) Ao livre exercício do culto religioso; f) À liberdade de associação; g) Aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto; h) Ao direito de reunião; i) Aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional (SILVA, GENOFRE e LAVORENTI, 2002, p.353). O maior objetivo dessa lei é proteger os cidadãos dos abusos praticados pelas autoridades públicas ou pelos seus agentes, quando venha a comprometer algum direito ou garantia constitucional. Também caracteriza o abuso de autoridade a prática dos atos especificados no artigo 4º da lei 4.898/65: a - Ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder; a- Submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei; a- Deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa; a- Deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada; a- Levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar fiança, permitida em lei; a- Cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem, custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie quer quanto ao seu valor;a- Recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou de qualquer outra despesa (SILVA, 2002, P.353 e 354). Tanto no artigo 3º como no 4º da referida lei, o elemento subjetivo é o dolo, que consiste na vontade de abusar do poder que o agente detém em nome do Estado, portanto, pode ocorrer de a pessoa ficar aguardando por horas para ser ouvido como testemunha e um foro ou em uma delegacia (tendo impedido a sua liberdade de locomoção) e não configurar abuso, sem que o agente público tenha a vontade específica de usar mal a autoridade estatal, não existindo o dolo. A responsabilidade administrativa é apurada por meio de procedimento administrativo próprio (sindicância ou processo), conforme rege os estatutos ou leis orgânicas a que for subordinada tal funcionário que praticou o abuso. 6. Limites entre o estrito cumprimento do dever legal e abuso de autoridade A linha demarcatória que separa as excludentes de ilicitude do abuso de autoridade se caracteriza pela não observância das normas permissivas e pelo dolo consciente de praticar determinado ato ilícito. È necessário que a autoridade restrinja, sem nenhum respaldo legal e com a intenção de abusar do poder, a liberdade do indivíduo, não sendo necessário consumar – se a privação dessa liberdade (configurando a figura típica descrita no artigo 4º, alínea “a” da lei 4.898/65), sendo necessária somente a turbação do direito de se locomover como de 11d11seqüênc algum local público (NUCCI, 2008). Algumas situações que serão citadas darão maior clareza nos liames das excludentes de ilicitude com o abuso de autoridade. Vejamos o Artigo 3º da lei 4.898/65 e suas alíneas, a qual será especificada as situações em que se caracteriza ou não o abuso: 6.1. A liberdade de locomoção Inicialmente, cumpre conceituar a restrição à liberdade de locomoção, citada na lei 4.898/65, em seus artigos 3º, alínea “a”, e no artigo 4º, alíneas “a, b, c, d, é, e também a alínea “i”, é definida como qualquer conduta que impeça, sem motivo legal, o direito de ir e vir garantido pela Constituição Federal ao cidadão (CAPEZ, 2008). No artigo 5º, inciso LXI, da Constituição Federal, Prevê ainda que “Ninguém será preso, senão em flagrante delito ou por ordem judicial escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar definido em lei” (CAPEZ, 2008). O artigo 4º, alínea “a”, da lei 4.898/65, descreve que “ordenar ou” executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder também constitui atentado á liberdade de locomoção prevista no artigo 3º, no entanto, prevalece a figura criminosa do artigo 4º, em face do princípio da especialidade (CAPEZ, 2008). No artigo 4º, da lei de abuso de autoridade, faz referências diretas a violação ao direito de locomoção do cidadão, conforme relata o artigo 3. Existem situações em que a lei permite a restrição da liberdade: O artigo 139 da CRFB/1988 prevê que, na vigência do Estado de Sítio, seja decretada, com fundamento no artigo 137, I, que as pessoas poderão ser obrigadas a permanecer em localidade determinada ou poderão ser detidas em edifícios não destinados a acusados ou condenados por crimes comuns (CAPEZ, 2008, p.10). Vale ressaltar que essa liberdade de locomoção não é totalmente absoluta, como não são todos os direitos e as garantias fundamentais, pois todo e qualquer direito fundamental são relativos, podendo ceder em face do estrito cumprimento de dever legal ou do exercício regular do direito, sem a devida configuração do abuso. 6.2 Violação de domicílio O cidadão tem esse direito resguardado, pois tal conduta viola o direito fundamental previsto na CRFB/88, que dispõe que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial (HABIB, 2009). A denominação casa se refere a “qualquer compartimento habitado”, “aposento ocupado de habitação coletiva” e “compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade”. Desde a mais moderna construção de alto luxo até o compartimento mais humilde feito de papel ou outro recipiente qualquer. Independe de classe social, podendo a pessoa lesada pertencer a alta classe social ou a um humilde local de habitação (NUCCI, 2009). Estão excluídos desta proteção legal os bares, os restaurantes, as lanchonetes, lojas, bingos, casas lotéricas, cujo acesso é liberado ao público. Caso a autoridade ingresse na residência de alguém autorizada pela norma legal ou constitucional, não há que se falar em abuso, está amparada por uma das exceções previstas no artigo 5º, inciso XI da CRFB, porém, ocorrendo algum desvio ou excesso, responderá pelo crime de abuso, se for autoridade, e não sendo, responderá pelo crime previsto no artigo 150 do código penal, (Violação de domicilio). 6.2 Sigilo de correspondências Ao sigilo da correspondência compreendendo como o ato de violar correspondência alheia, sem permissão do destinatário, seja comunicação por carta telegráfica ou telefônica. Existem algumas situações em que são permitidas sem que configure abuso: O código de processo penal, em seu artigo 240, $1º,f, prevê: proceder – se busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem para: aprender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato (CAPEZ, 2008, p.13). Ressalta ainda: A antiga lei de falências (Dec. Lei n. 7.661/45) autorizava a abertura e a leitura da correspondência do falido pelo síndico da massa (art. 63, II). Atualmente o art. 22, III, d, da lei n. 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, prevê também a possibilidade do administrador judicial, sob a fiscalização do Juiz e do comitê, na falência, receber e abrir a correspondência dirigida ao devedor, entregando a ele o que não for assunto de interesse da massa (CAPEZ, 2008, p.13). A prática deste delito é considerada especial porque se um particular violar o sigilo das correspondências de alguém, pratica o delito previsto no artigo 40 da lei nº 6.538/78, (lei de Serviços Postais). Contudo, se o autor da violação for uma autoridade pública, pratica o delito previsto no artigo 3º da lei nº 4.898. 6.5. Liberdade de crença, religião ou culto religioso. À liberdade de consciência e de crença o livre exercício do culto religioso está prevista na Constituição Federal em seu art. 5º, VI e VII da CRFB/88. Sobre a liberdade prevista, veremos: É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos e as suas liturgias e ninguém será privado de direitos por motivos de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir se de obrigação legal a todos imposta e recusar se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei (HABIB, 2009, p.24). Esta liberdade não é ilimitada, a autoridade pode impedir a realização de cultos que atentem contra a moral, quepratique a realização de oferendas com animais ou ponha em risco a ordem pública. Nessa modalidade, o sujeito ativo é sempre a autoridade, e o sujeito passivo será sempre o Estado ou qualquer pessoa atingida pelo abuso, podendo até ser pessoa jurídica. 6.6. Liberdade de associação. Habib (2009) define como conceito uma reunião permanente e estável de várias pessoas com um fim lícito e comum. Sobre a liberdade de associação, somente é considerada abuso a atitude da autoridade que tente impedir ou dificultar que o cidadão associe-se ou mantenha-se associado a qualquer agremiação, legalmente constituída. Pode haver o impedimento da formação ou continuidade de uma associação que tenha fins ilícitos, sem a configuração do abuso, simplesmente pelo estrito cumprimento do dever de agir. Cumpre ressaltar o conceito de associação como sendo uma reunião estável e permanente de várias pessoas para a consecução de um fim determinado ou para o desempenho de certa atividade. 6.7 Aos direitos e garantias legais assegurados 14d exercício do voto: Depreende-se que constitui abuso de autoridade qualquer ato da autoridade que impeça ou dificulte o cidadão de exercer o seu direito de votar (CRFB, 1988, art.14). Ressalta-se ainda que o voto tenha algumas características peculiares, pois é secreto, é livre, pessoal, direto e também obrigatório. Qualquer atentado, físico ou moral praticado por autoridade contra aquele que exerce o voto poderá configurar o crime de abuso de autoridade. 6.8 O direito de reunião. É definido como o agrupamento voluntário de pessoas, sem caráter de permanência ou estabilidade, em um determinando lugar, no qual se discute um assunto qualquer e após o qual grupo se dissolve. Para que uma reunião possa ser impedida ou dissolvida por qualquer autoridade no exercício de suas funções precípuas, é necessário que esta reunião tenha fins ilícitos ou que esteja sendo realizada em local proibido ou sem prévia permissão. 6.9 Á incolumidade física do indivíduo. A Constituição Federal, no artigo 5º, incisos X e XLIX, nos fala que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Significa que será considerado abuso, quando a autoridade causar lesão física ao cidadão sem motivo justificadamente legal. Esse crime engloba toda a ofensa praticada por autoridade, seja violência física seja moral. Porém, é possível que a autoridade pública utilize violência e atente contra a incolumidade física de alguém, más por um motivo justificado. Como exemplo a hipótese da força física utilizada de forma estritamente necessária para efetuar a prisão em flagrante de alguém que resista à prisão (HABIB, 2009,). Caso a autoridade pública venha a abusar de sua autoridade, atentando contra a integridade física da vítima, torturando – a para dela obter confissão, declaração ou informação, responderá pelo crime de tortura, tipificado no art. 1º, I, da lei 9455/97 (HABIB, 2009). 6.10 Aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. É garantido o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendido as qualificações profissionais que a lei estabelecer (CF, 1988). A lei de abuso de autoridade considera crime qualquer atentado aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício profissional. Porém, não caracteriza abuso o atentado ao comércio irregular, ou lugares onde o comércio não é autorizado. O combatente a essa atividade age dentro da legalidade das excludentes, não cometendo nessa situação o abuso. 7.0 Considerações gerais O objetivo deste artigo é demonstrar o quanto é importante analisar o estrito cumprimento do dever legal e o que o separa do abuso de autoridade, pois existe um limite que demarca onde termina a excludente e onde se inicia o abuso de autoridade. Não basta a conexão condicional entre a excludente, têm se a obrigação de praticar os atos nos limites da legalidade. Esses crimes somente são praticados por sujeito qualificado (crime próprio), e não depende da ocorrência de efetivo prejuízo naturalístico para a vítima (crime formal). Ocorrendo o excesso no cumprimento de suas obrigações sem prévia justificação, estará esta autoridade cometendo o crime de abuso. Se o agente estatal faz a retenção de alguém para verificar, por exemplo, se é pessoa procurada pela justiça, ou autora de algum delito, pode se configurar o crime de abuso ou simplesmente o exercício do poder de polícia legítimo do Estado. O fator fundamental para distinguir o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular do direito do abuso de autoridade é a análise do elemento subjetivo específico que é a vontade daquela autoridade de abusar do poder que o Estado lhe proporciona. Porém é corriqueiro e natural que a polícia possa deter elementos que estejam embriagados ou em atitudes escandalosas, e também pessoas com distúrbios mentais ou vândalos que estiverem destruindo coisas públicas ou privadas. Porém se o fizerem com o objetivo de simplesmente fazer cessar a devida situação, pelo tempo necessário para o retorno a sequência, configura a perfeita aplicação do poder estatal. O direito penal privilegia da intervenção mínima, não sendo considerado abuso de autoridade. Se, por outro lado, o agente policial, em busca de um criminoso, exige – lhe os documentos pessoais para atestar de que se trate de uma pessoa procurada pela justiça ou não, por algum tempo a pessoa abordada há de ficar lesada em seu direito de locomoção, e em se havendo o bom senso e a ausência da vontade de abusar do poder, configura se o estrito cumprimento do dever legal, por outro lado, se o agente permanecer por horas em determinado local, sem poder se retirar do local, mesmo após se identificar, há a configuração do abuso de poder. Ao preceituar o código sobre o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito, restou definido que o agente deve obedecer religiosamente aos requisitos objetivos descritos pelo poder público. Se deles se desviar, estará cometendo um crime, seja o de omissão ou de abuso de autoridade. No presente estudo ficou bastante claro, tanto na excludente denominada estrito cumprimento do dever legal como no abuso de autoridade, que somente as autoridades podem atuar no 16d16s ativo da situação, pois somente elas se beneficiam dessa excludente. Portanto, cabe à autoridade ter o discernimento rigoroso de que esta agindo nos limites da legalidade e também à sociedade ter conhecimento de até onde vai seus direitos para que possa exigi-los em eventuais desvios de condutas por parte dessas autoridades. Referências bibliográficas BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgado em 5 de outubro de 1988, com alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nº1/1992 a 56/2007 e EC de revisão nº 1 a 6/1994. 26. Ed. – Brasilia : Câmara dos deputados, 2008, 464 BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Dispõe sobre a exposição e a criação do Código Penal de 1940. Vade Mecum Saraiva. 12 ed.São Paulo: Saraiva, 2011, p. 543-584. BRASIL. 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