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Arritmia Sinusal Não Respiratória

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406
Barbosa Fo e cols
Arritmia sinusal não respiratória
Arq Bras Cardiol
2002; 78: 406-8.
Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras, Ministério da Saúde e Universidade
Gama Filho
Correspondência: José Barbosa Filho – Rua Souza Lima, 324/201 – 22081-010
Rio de Janeiro, RJ
Recebido para publicação em 23/11/00
Aceito em 12/6/01
José Barbosa Filho, Paulo Roberto B. Barbosa, Ivan Cordovil
Rio de Janeiro, RJ
Arritmia Sinusal Não Respiratória
Relato de Caso
Relatamos dois casos de arritmia sinusal que, por
não apresentar a variabilidade dos intervalos RR dentro
da faixa de freqüência modulada pela respiração, foi con-
siderada como uma forma de arritmia sinusal não respira-
tória. Por possuírem o pulso arterial periférico com aspec-
to alternante, semelhante ao observado no bigeminismo, e
por não apresentarem sinais e sintomas de insuficiência
cardíaca, acreditou-se tratar de alterações intrínsecas da
atividade elétrica do nó sinusal.
A arritmia sinusal respiratória é um fenômeno normal,
observado mais claramente em crianças e adolescentes. Por
sua vez, nos indivíduos idosos torna-se imperceptível, tan-
to do ponto de vista clínico como eletrocardiográfico. Nes-
sas circunstâncias, as variações dos intervalos RR modula-
das pela respiração só podem ser analisadas através de sis-
temas informatizados dotados de filtros capazes de captar e
processar adequadamente pequenas variações desses in-
tervalos. Através de algoritmos, podemos observar que o
sistema simpático-vagal modula a freqüência cardíaca den-
tro de uma banda de freqüência, que varia de 0,1Hz a 0,4Hz,
independente do estado clínico dos indivíduos.
Relato dos casos
Os pacientes foram estudados de acordo com os prin-
cípios da Declaração de Helsinque e da legislação brasileira
pertinente, submetido à Comissão de Ética Médica do
Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras e obtida auto-
rização para sua realização.
O presente trabalho foi realizado em dois indivíduos
atendidos em primeira consulta no ambulatório da Divisão
de Hipertensão Arterial do Instituto Nacional de Cardiolo-
gia Laranjeiras. A seleção desses pacientes para o estudo
da variabilidade dos intervalos RR do eletrocardiograma foi
motivada pelas características alternante, tanto auscultató-
ria quanto gráfica, do pulso arterial.
Caso 1 - Mulher de 79 anos apresentava queixa atípica
para doença cardiovascular, caracterizada por pontadas no
peito e zumbidos, estando em uso de complexos vitamínicos
e vasodilatador cerebral. Os exames físico, laboratorial, ra-
diológico e eletrocardiográfico encontravam-se dentro dos
limites da normalidade. O ecocardiograma apresentava si-
nais de esclerose aórtica e mitral, função ventricular preser-
vada e átrio esquerdo com 3,4cm. A pressão arterial eviden-
ciava cifras de 127/61 (média = 85) mmHg e a presença de
pulso alternante (fig. 1).
Caso 2 - Homem de 80 anos, apresentava história clínica de
angina estável, bem controlada com tratamento clínico, em uso de
mononitrato oral e ácido acetilsalicílico. O estudo radiológico
mostrava discreto aumento da área cardíaca (índice cardioto-
rácico=52%) e os exames físico do coração e laboratorial acha-
vam-se dentro dos limites da normalidade. O eletrocardiograma
mostrava bloqueio atrioventricular do 1º grau (intervalo
PR=260ms), ecocardiograma com sinais de esclerose da valva
aórtica, função ventricular preservada e átrio esquerdo com
3,8cm de diâmetro. A pressão arterial apresentava cifras de 151/
81 (média=104) mmHg e a presença de pulso alternante (fig. 1).
Ambos apresentavam ritmo sinusal e não tinham quei-
xas de palpitações.
Os sinais de eletrocardiograma dos dois pacientes fo-
ram captados durante 300s, utilizando o amplificador
AECG03 (Lynx Tecnologia Ltda., São Paulo) e analisados
utilizando o sistema ECGAR®, desenvolvido para esta finali-
dade e previamente descrito 1. Os sinais foram adquiridos
com os indivíduos deitados em decúbito dorsal e respiran-
do em sua freqüência natural, em um ambiente isolado com
a temperatura ambiente mantida em 25oC e no período entre
14h e 17h. Os exames foram realizados com intervalo de pelo
menos 4h após a última refeição.
A pressão arterial foi medida com os pacientes na po-
sição deitada, após 5min de repouso em decúbito dorsal uti-
lizando o método oscilométrico. Durante a aferição, as cur-
vas de pressão foram registradas durante intervalo de 25s.
A análise da variabilidade de RR (V-RR), em ambos os
pacientes, foi realizada no domínio do tempo e da freqüência.
No domínio do tempo, foi obtida a medida da freqüência cardía-
ca média da série de intervalo RR normal, calculada a partir dos
Arq Bras Cardiol, volume 78 (nº 4), 406-8, 2002
Arq Bras Cardiol
2002; 78: 406-8.
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valores das freqüências cardíacas instantâneas. No domínio da
freqüência, a série de intervalos RR normais consecutivos foi
interpolada e o espectro de potência foi calculado utilizando
técnica já descrita 2. Foram analisadas as características das
áreas do espectro de potência da região entre 0,05 e 1Hz e
identificada a região de maior concentração de energia.
A forma da onda P precedendo cada batimento normal
foi analisada e comparada, duas a duas, com os batimentos
subseqüentes, utilizando a correlação simples.
O aspecto das séries de intervalos RR normais e o res-
pectivo espectro de potência de um indivíduo controle de
mesma faixa de idade podem ser observados na figura 2.
A distribuição dos intervalos RR normais dos pacientes
analisados no domínio da freqüência (fig. 3) é bastante diferente
do observado no indivíduo normal da mesma faixa etária da fi-
gura 2. O comportamento da série de intervalos RR normais e a
distribuição das diversas bandas de V-RR podem ser observa-
do na figura 2. Nos pacientes estudados, por sua vez, podemos
notar que as principais características são a baixa energia de
todo o espectro de potência, em especial a da região de alta fre-
Fig. 1 - Registro do pulso durante a tomada da pressão arterial pelo método oscilomé-
trico. Observar o aspecto alternante do pulso.
Fig. 2 - Registro das séries de intervalos RR normais e o respectivo espectro de potência de um indivíduo controle de mesma faixa etária dos pacientes analisados. Observar que a
energia do espectro de potência praticamente não ultrapassa os 0,4Hz. Nas ordenadas do gráfico estão dispostos intervalos RR: no caso 1 estão expressos em bpm; no caso 2, estão
expressos em ms. Nas abcissas, os tempos de captação dos sinais do eletrocardiograma são expressos em ms. No gráfico da FDE, as ordenadas representam os valores da energia
espectral, em ms2/Hz .103, e as abcissas os valores das freqüências, em Hz, das bandas analisadas. FDE- função de densidade espectral de potência.
Fig. 3 - Registro das séries de intervalos RR normais e o respectivo espectro de potên-
cia dos dois pacientes estudados. Observar que as principais características do es-
pectro de potência são a sua baixa energia e a presença de um pico de energia na banda
de muito alta freqüência. Os dados expressos nas ordenadas e abcissas, de ambos os
gráficos, são os mesmos da figura 2. FDE- função de densidade espectral de potência.
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Fig. 4 - Registro da derivação D
2
 dos eletrocardiogramas dos pacientes estudados, onde se observam a manutenção do mecanismo sinusal, ondas P de mesma morfologia e intervalos
RR sem nítidas variações.
qüência, e a presença de uma concentração inesperada de ener-
gia na banda de muito alta freqüência (fig. 3). É notável o fato de
que a freqüência em Hz, na qual a energia do espectro de po-
tência se concentra, corresponde à metade do intervalo RR re-
lativo à freqüência cardíaca média no domínio do tempo. As-
sim, no caso 1, a energia do espectro de potênciaconcentrou-
se em 0,658Hz, correspondendo à freqüência cardíaca de 79
bpm, e, no caso 2, concentrou-se em 0,515Hz, correspondendo
à freqüência cardíaca de 61,8bpm (fig. 3).
Os eletrocardiogramas registrados (fig. 4) revelam que o
mecanismo sinusal é mantido, com ondas P de mesma morfo-
logia e correlação elevada entre as formas da onda, mostran-
do que o comportamento dos intervalos RR não corresponde
a nenhum tipo de arritmia supra ou ventricular reconhecida.
O registro da curva de pulso arterial durante a tomada
da pressão arterial apresentou aspecto típico de pulso
alternante (fig. 1).
Discussão
A V-RR com o padrão de distribuição de freqüência do
espectro de potência, diferente daquelas freqüentemente ob-
servadas em indivíduos normais e cardiopatas, foi consignada
pela primeira vez por Binkley e cols. 3, em um paciente com insu-
ficiência cardíaca. Entretanto, não é de nosso conhecimento
que esse padrão tenha sido registrado em pacientes sem altera-
ções estruturais importantes do coração e sem arritmias que
pudessem justificar esse comportamento dos intervalos RR 4.
Na verdade, o comportamento da V-RR, tanto em idosos quan-
to em indivíduos cardiopatas, caracteriza-se pela baixa energia
e pela distribuição homogênea de energia, nas diversas ban-
das do espectro de potência 2. Especificamente, no que
concerne às variações rápidas dos intervalos RR normais, a
redução da energia da banda alta freqüência está relacionada à
diminuição da atividade do sistema nervoso parassimpático.
Nossos dois pacientes tiveram, como características
básicas, concentração muito elevada de energia na área de
muito alta freqüência do espectro de potência, fora, portan-
to, da região normalmente modulada pelo sistema simpá-
tico-vagal (fig. 3).
Semelhante ao que foi observado por Binkley e cols.,
embora nossos pacientes não apresentassem sinais e sinto-
mas de insuficiência cardíaca, foi, a par das alterações do es-
pectro de potência, o registro da curva da pressão arterial
sistêmica com o aspecto típico de pulso alternante que cha-
mou a atenção ao fenômeno (fig. 1).
Para Binkley e cols. 3, o mecanismo responsável por essas
alterações, isto é, pico de energia na faixa de muito alta freqüência
do espectro de potência associada a pulso alternante, está relaci-
onado com a redução da sensibilidade dos barorreflexos, seme-
lhante ao baixo ganho dos sistemas de controle dos mecanismos
de retroalimentação, determinando descontrole das oscilações
dos sinais da pressão arterial 5. Assim, variações da pressão arte-
rial provocariam alterações semelhantes da V-RR.
Por outro lado, poderíamos especular que o meca-
nismo fosse inverso, isto é, alterações rápidas da V-RR
estariam na dependência de uma alternância elétrica da
atividade do nó sinusal, independente da respiração.
Desta forma, as alterações eletromecânicas observadas,
teriam um mecanismo semelhante ao do bigeminismo (in-
tervalos RR mais curto, pressão arterial mais baixa), ten-
do como base fisiopatológica alterações intrínsecas do
nó sinusal. A partir dessa hipótese poderíamos supor
que este comportamento da V-RR possa representar uma
forma de doença do nó sinusal.
Do ponto de vista evolutivo, pudemos observar que,
por um período de três anos de acompanhamento, nossos
pacientes mantiveram-se com o mesmo padrão, tanto do
espectro de potência quanto do comportamento da onda de
pulso, sem apresentar alterações clínicas dignas de nota.
1. Barbosa PRB. A signal-averaging system for surface ECG signal analysis.
Phys Med Biol 1994; 39: 412.
2. Barbosa PR, Barbosa FJ, Morais de Sá CA. Influência da idade, sexo e doença coronária
sobre a modulação autonômica do coração. Arq Bras Cardiol 1996; 67: 325-9.
3. Binkley PF, Eaton GM, Nunciata E, et al. Heart rate alternans. Ann In-
tern Med 1995; 122: 115-7.
Referências
4. Frank JL, Ropper AH, Zuniga G. Acute intracranial lesions and respiratory sinus
arrhytmia. Arch Neurol 1992; 49: 1200-7.
5. Franklin GF, Powell JD, Emami-Nacini A. Feedback Control of Dynamic
Systems. New York: Addisson-Wesley; 1991: 111-3.

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