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Fisiologia Endócrina, Luciana Naves Universidade de Brasília Aula 2 - Controle neuroendócrino da função hipofisária Neuroendocrinologia advém da existência de pontos comuns entre os sistemas endócrino e nervoso, não havendo similaridade dessa afinidade em outros sistemas. Evidência disso é que o hipotálamo e a hipófise, dois órgãos muito importantes do SNC, então no sistema endócrino. Para que os sistemas endócrino e nervoso funcionem de forma adequada, são dotados de: Comunicação celular: as células conseguem trocar substâncias entre si. Para que isso ocorra, elas são dotadas de: Sistema endócrino: Junções GAP: fenestrações entre as células que permitem o trânsito entre substâncias. Controle parácrino: mecanismo de liberação local de hormônios produzidos por células. Sistema nervoso: Sinapses. Mensageiros: algumas substâncias funcionam como neurotransmissores e como hormônios. A adrenalina, por exemplo, pode ser produzida em células neuronais, tendo ação local, ou na glândula adrenal, sendo liberada na circulação sistêmica. Sistema endócrino: Hormônios. Sistema nervoso: Neurotransmissor. Atividade elétrica: fundamental para a condução neural e existente em algumas glândulas. Nesse caso, o estímulo elétrico é fundamental para a secreção hormonal. Sistema endócrino: Medula adrenal. Pâncreas. Sistema nervoso: Impulsos elétricos. Existem dois tipos de neurônios que devem ser considerados ao estudarmos o sistema endócrino: Neurônios magnocelulares: grandes - são neurônios extremamente longos que se iniciam no hipotálamo e lançam axônios que terminam na hipófise posterior (ou neurohipófise). A hipófise posterior não é constituída de um tecido propriamente endócrino, mas de terminações nervosas de neurônios magnocelulares que se iniciam no hipotálamo. Esses neurônios produzem determinados pró-hormônios no hipotálamo, que são transportados pelo corpo do axônio para a neurohipófise, e convertidos, essencialmente, em ocitocina e ADH. A hipófise posterior, portanto, diferencia-se significativamente da hipófise anterior (ou adenohipófise). Sinteticamente, então, no caso da neurohipófise, o pró-hormônio é formado no hipotálamo e, em seguida, transportado e armazenado na hipófise posterior, para, depois da clivagem e conversão a hormônio, ser secretado na circulação sistêmica. No caso da hipófise anterior, a produção dos hormônios é local, por estímulo do hipotálamo. Neurônios parvocelulares: pequenos – são neurônios menores que se iniciam no hipotálamo e terminam na haste hipofisária. É nesse local que os hormônios são secretados, estimulando, assim, a hipófise anterior a produzir outros hormônios. Sendo assim, a hipófise anterior funciona a partir do estímulo de hormônios hipotalâmicos, que são liberados em uma circulação restrita, a circulação porta-hipofisária. Diferencia-se então da hipófise posterior, em que os pró-hormônios dependem apenas da clivagem para se tornarem funcionais, isto é, os hormônios estão semi-prontos - ver esquema 6. Um corte anatômico na região hipofisária revela que a hipófise está localizada dentro da sela túrsica, que é uma estrutura óssea muito fina de diâmetro de cerca de 1 cm. Tem relações anatômicas importantes: o quiasma óptico superiormente, as carótidas e os seios cavernosos lateralmente. Como consequência dessas relações, se houver crescimento da hipófise superiormente, isto é, se houver um hipertrofia ou hiperplasia desse órgão, observaremos compressão do quiasma óptica, associada a prejuízos visuais que podem resultar em cegueira. Além disso, caso se expanda lateralmente, ela pode comprimir a carótida e, com isso, induzir uma isquemia cerebral - AVC isquêmico -, ou comprimir os seios cavernosos e os nervos cranianos III, IV, V1 e VI a ele relacionados. Se o aumento da glândula for de um tecido produtor de algum tipo de hormônio, haverá uma síndrome clínica caracterizada pelo excesso daquele hormônio. Se, por outro lado, o tecido não for produtor, poderá haver compressão de um parênquima que seja, resultando, assim, em uma síndrome clínica de falta de hormônio. Lesões relacionadas à hipófise resultam, portanto, em manifestações oculares, neurológicas ou endócrinas. Ressalta-se ainda a presença de diferentes núcleos no hipotálamo. Se analisarmos esses núcleos, o núcleo paraventricular, próximo do III ventrículo, produz o TRH e o CRH, que estimulam a produção de TSH e ACTH (importante para a produção de esteroides na suprarrenal), respectivamente. Na área pré-óptica, próxima do nervo óptico, temos a produção do GnRH, que estimula a produção de FSH e LH, e, por sua vez, atuam nas gônadas. No núcleo arqueado, temos a produção GHRH, que estimula a produção de GH, e, no periventricular, da somatostatina. A somatostatina é um hormônio que não termina com RH e, sendo assim, não é liberador, mas sim inibidor da produção de GH. O GH é, assim, liberado por um balanço do GHRH e da somatostaina. A dopamina é um inibidor da prolactina. Todos os hormônios hipotalâmicos tem a capacidade de estimular algum hormônio hipofisário. A prolactina, no entanto, é um hormônio que não tem um estimulador direto. Ela tem um mecanismo inibitório que predomina em seu controle, no caso, a dopamina. No mecanismo da prolactina, para haver aumento de sua atividade deve-se diminuir o seu inibidor. Observa-se que na hipófise posterior há a liberação do ADH, de papel importante no balanço hídrico, e da ocitocina, relevante para a contração uterina no trabalho de parto ou menstruação e para a contração da próstata e vesícula seminal na ejaculação, pelos neurônios magnocelulares. Já na hipófise anterior, os neurônios parvocelulares terminam próximo à haste hipofisária, de modo que os hormônios são liberados na circulação porta-hipofisária e estimulam células específicas que produziram os vários hormônios - ver esquemas 6 e 7. Complementarmente ao esquema, as endorfinas estão relacionadas com a sensação de bem-estar e também possuem estimulação hipotalâmica. Os hormônios peptídicos serão produzidos a partir de pré-pró-hormônios no RER e tem suas sequências sinal removidas ao chegarem ao complexo de Golgi. Por meio de processos de clivagem, com quebras parciais de cadeias de aminoácidos, o pré-pró-hormônio é convertido à pró-hormônio e, em seguida, a um hormônio biologicamente funcional. As sequências de aminoácidos inativas clivadas são, então, reaproveitadas. Se, por acaso, houver erros nessa clivagem, a cadeia anormal não apresentará o efeito biológico esperado. Hormônios hipotalâmicos: são todos proteicos, agindo, majoritariamente, em receptores de membrana, especificamente, nos de proteínas G. Somatostatina: Síntese no núcleo periventricular, pâncreas, TGI e células C da tireoide (ou parafoliculares). Efeito: inibe secreção de GH e TSH. Peptídeo derivado de precursor de 116 aas. Formas moleculares: SMS-14 (hipotálamo) e SMS-28 (intestino). Aplicação clínica: no caso de um paciente ainda na infância ou adolescência com excesso de hormônio de crescimento, observa-se o quadro de gigantismo. Caso o indivíduo já seja adulto, há acromegalia. Tratamento: administração de somatostatina. GHRH: Síntese no núcleo arqueado. Efeito: estimula secreção de GH. Peptídeo derivado de precursor de 108 aas. Formas moleculares: 1-44 NH2 (forma biologicamente ativa), 1-40 OH e 1-37 OH. Esses hormônios devem ser dotados de afinidade pelo receptor, de modo que, em geral, essa afinidade favorece os hormônios com extremidade amino-terminal, sendo eles, por isso, biologicamente ativos. Os hormônios hipotalâmicos não são dosados, pois caem na circulação-porta. Caso se deseje verificar alterações desse hormônio, deve-se avaliar o eixo como um todo, no caso, o GH. No caso do eixo de estimulação do GH, que é o somatotrófico, a glândula estimulada é o fígado, o qual produz então os IGFs, fatores de crescimento linear. Isso revela que, do ponto de vista do crescimento infantil, o GH tem apenas o papel de estimulador dos fatores de crescimento. Dopamina: Síntese no núcleo arqueado.Efeito: inibe a secreção de prolactina. Peptídeo derivado de precursor de 92 aas. Normalmente vista como neurotransmissor, mas, nesse caso, atua como hormônio, por ter sido produzida em uma glândula endócrina, o hipotálamo, por ter caído em uma circulação restrita, a circulação porta-hipofisária, para atuar em uma glândula à distância, a hipófise. Diferencia-se, pois, de sua produção e atuação local como neurotransmissor. Existem vias estimulatórias para a prolactina, mas a via inibitória da dopamina é muito mais expressiva - ver esquema 7. TRH: Síntese no núcleo paraventricular. Efeito: estimula secreção TSH e PRL. Peptídeo derivado de precursor de 242 aa. Estrutura: 3 aas. Ver esquema 1. GnRH: Síntese na área pré-óptica. Efeito: estimula secreção de FSH e LH. Peptídeo derivado de precursor de 92 aas. Estrutura: 10 aas. Não cai na circulação sistêmica, de modo que os hormônios dosados são o LH e o FSH, e não o GnRH. Em termos gerais o GnRH estimula a produção de LH e FSH na hipófise, havendo, nas mulheres, aumento do estrogênio e progesterona, que regulam negativamente o ciclo por feedback negativo. Lembrando que a única situação de feedback positivo a ser estudada é o pico ovulatório de LH. Nos homens, induzem a produção de testosterona nos testículos. Caso clínico: paciente homem procurou ajuda médica para lidar com excesso de peso. Observou-se distribuição eurocoide do peso, com cintura fina e grande depósito de gordura no quadril. Um indivíduo homem não apresenta a distribuição eurocoide do peso (tipicamente feminina). Em geral, o acúmulo de gordura se dá na região abdominal - sugestão de deficiência de LH e FSH. Avaliação do volume testicular revelou aspecto reduzido, 12 cm³ (normal 25 cm³), indicando redução de FSH. Possibilidades diagnósticas: lesão na região pré-óptica do hipotálamo ou Klinefelter com atrofia testicular. Avaliação do perfil hormonal revelou LH e FSH baixos e testosterona indetectável - sugestão de deficiência central. Descartou-se a possibilidade da síndrome genética, pois, nesse caso, haveria produção hormonal hipofisária normal, ou até mesmo alta, sem resposta testicular à produção de testosterona. Como estava sua visão? “Ótima”. Sqn. Análise oftalmológica indicou cegueira monocular direita compensada. Tomografia revelou tumor comprimindo a região pré-óptica do hipotálamo, por crescimento da hipófise na região superior à sela túrsica. Tratava-se de uma lesão inflamatória da hipófise, com impregnamento por depósito amiloide. Após tratamento com corticoides, houve regressão completa dessa lesão, com recuperação gonadal - sem necessidade de reposição hormonal -, mas não visual, devido ao caráter crônico que resultou no infarto do quiasma óptico. CRH: Síntese no núcleo paraventricular. Efeito: estimula secreção de ACTH. Peptídeo derivado de precursor de 196 aas. Estrutura: 41 aas. Ver esquema 8. Hormônios hipofisários dividem-se em famílias com características bioquímicas comuns e com ação em receptores semelhantes. Família glicoproteica: LH: ação nas gônadas - alfa 89 aas e beta 115 aas. FSH: ação nas gônadas - alfa 89 aas e beta 115 aas. TSH: ação na tireoide - alfa 89 aas e beta 112 aas. Subunidade alfa idêntica nos três hormônios garante a afinidade desses hormônios pelos respectivos receptores. A especificidade, por sua vez, depende da subunidade beta variável. Mesmo havendo subunidades com número igual de aas, elas são diferenciadas pela conformação. Família POMC - pro-opiomelanocortina: pro, referente a precursor – opio, referente a opioides (endorfinas) – melano, referente a hormônio estimulador dos melanócitos – cortina, referente ao córtex da suprarrenal. ACTH: clivado em MSH e CLIP (biologicamente inativo). Lipotrofina: origina as endorfinas. Endorfina. Composta por hormônios de peso molecular e número de aas diferentes, mas originados de um precursor comum. Doença de Addison: quadro inflamatório ou infeccioso da suprarrenal - como resultado de uma tuberculose, por exemplo. Com isso, haverá queda do nível de cortisol e consequente elevação do ACTH. Observaremos então todos os sintomas referentes à queda de cortisol, como queda da imunidade, alteração na disposição, etc. Com o aumento do ACTH, por sua vez, o nível de lipotrofinas também se elevará, resultando em um aumento da endorfina e, por conseguinte, da sensação de prazer. O aumento do MSH, resultante do aumento do ACTH, resulta em mudança de cor. O indivíduo fica visualmente com uma aparência pouco saudável, com uma pele pálida acinzentada fosca. Não há intensificação da cor da pele exposta ao sol, mas das mucosas, principalmente a bucal e as regiões de dobras das mãos. Cabe ressaltar, ainda, que o prazer associado ao aumento da endorfina, muitas vezes ofusca a sintomatologia da queda de cortisol. Família mamossomatotrófica: mamo, referente a mama – somato, referente a crescimento. GH. Prolactina. Grupo de peso molecular e número de aas semelhantes, com mesmo tipo de receptor, o JAK-tirosina cinase. Célula pluripotencial: ver esquema 6 - glândula celular hipofisária que controla diversos eixos hormonais, a partir da presença de fatores de transcrição que atuam na diferenciação celular. PROP-1: se houver um erro genético de não produção desse fator de transcrição, o indivíduo apresentará hipopituitarismo, isto é, uma deficiência na produção de hormônios hipofisários. LH, FSH: possui LHX3 e LHX4 como fatores de transcrição acessórios. TSH. GH. PRL. PIT-1: é o fator de transcrição pituitário específico. TSH. GH. PRL. CUTE: ACTH. Ao se analisar um indivíduo com uma deficiência hormonal combinada, isto é, quando há mais de um eixo envolvido, deve-se considerar que se trata de um processo central possivelmente associado a uma deficiência congênita na expressão de um fator de transcrição. Uma deficiência na diferenciação dos corticotróficos via CUTE é potencialmente fatal, devido a sua essencialidade à vida. Caso clínico: indivíduo do sexo masculino, 27 anos, com 1,11 m de altura, retardo mental leve, musculatura flácida e depósito de gordura no abdome com padrão de celulite - lipodristrofia. Além disso, o volume testicular e a pilificação pubiana estavam diminuídas, revelando atraso na puberdade. A celulite, por ser uma característica feminina, e o volume testicular reduzido, associado ao não desenvolvimento dos caracteres secundários masculinos, revelam possível deficiência de LH e FSH. O atraso no crescimento reflete, possivelmente, deficiência na produção de GH. Clinicamente, a deficiência de prolactina não é detectável. Uma deficiência de TSH resultaria em baixa produção de hormônios tireoidianos que, cronicamente, resultariam em um quadro de retardo mental. A deficiência combinada poderia ser provocada por deficiência de PROP1. Tratamento por reposição de hormônios: TSH, GH, LH e FSH, consecutivamente. Administração de GH mesmo aos 27 anos? Depende da idade óssea, devido à possibilidade de geração de acromegalia. Idade óssea por avaliação das epífises: 9 anos. 3 meses depois: FAIL. Resistência periférica do receptor JAK-tirosina cinase? Avaliação da história clínica: por morar em uma região menos favorecida, não dispunha de meios para conservação da medicação. Solução: contato com assistência social. Conceitos importantes: A hipófise anterior está sob o controle do hipotálamo. Hormônios periféricos regulam a secreção da hipófise anterior. Os hormônios da hipófise anterior estão sob controle estimulatório, exceto a prolactina que está sob controle inibitório.
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