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Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 1 3 1 Compreender padrões fixos de ação (PFAs [FAPs]) e cadeias de reação. Conhecer as leis básicas do reflexo e o fenômeno da habituação. Estudar os experimentos de Pavlov sobre o condicionamento respondente da salivação. Entender a complexidade dos condicionamentos de segunda ordem e composto. Descobrir a base da tolerância às drogas e os efeitos do ambiente na overdose. Um imperativo biológico, compartilhado por todos os seres vivos, é sobreviver o bastante para se reproduzir. Por isso, os comportamentos relacionados à sobrevivência e à reprodução frequentemente parecem ser inatos. Ou seja, o organismo vem ao mundo com um repertório de comportamentos que facilitam a sobrevivência e a reprodução. Criaturas que voam para evitar predadores provavelmente nascerão com a habilidade de voar. Assim, o voar não precisa ser aprendido; é resultado da história da espeécie daquele organismo. O complexo arranjo de movimentos motores e coordenação envolvidos no voar podem ser aprendidos; mas é muito mais seguro quando este comportamento é baseado na dotação genética. Para a maioria dos animais, a sobrevivência, ao nascer, depende da capacidade de respirar, digerir alimento e mover-se. Quando uma minhoca é pendurada sobre a cabeça de um pintarroxo, esse estímulo elicia a abertura da boca e gorjeia. O comportamento da cria é resultado de mecanismos biológicos e é eliciado pela visão da minhoca pendurada. A relação entre a minhoca pendurada (estímulo) e a boca aberta (resposta) é um reflexo. A relação entre a minhoca pendurada (estímulo) e o abrir a boca (resposta) é 1 Pierce, W. D.; & Chenney, C. D. (2008). Reflexive behavior and respondent conditioning. In Behavior analysis and learning. 4ª Ed. New Jersey: Psychology Press. Capítulo traduzido por Antonio Ferreira da Silva (Univasf) e revisado por Artur Luiz Duarte Nogueira (PUC-SP) e Christian Vichi (Univasf) para fins didáticos da disciplina de Análise do Comportamento I do Curso de Psicologia da Univasf. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 2 3 um reflexo. Presumivelmente, ao longo da história evolucionária dos pintarroxos, as crias que apresentaram a boca escancarada e o gorjeio foram alimentados e os que não o fizeram talvez tenham sido ignorados. Isso não quer dizer que não houve modificações aprendidas de tais comportamentos iniciais (Walker, 1987, pp.21-26). Por exemplo, Tinbergen e Kuenen (1957) observaram que se a alimentação não seguisse o escancarar a boca a um estímulo artificial realista as crias de tordos paravam de responder. Nos humanos, o choro reflexo por desconforto ou fome de um bebê assegura o cuidado mais efetivo de seus pais. Pais se engajam em uma série de comportamentos de cuidado na tentativa de parar o choro. Normalmente, as respostas dos pais, tais como trocar a fralda, alimentar o bebê ou fazê-lo arrotar vão parar a agitação. ______________________________________________________________ COMPORTAMENTO FILOGENÉTICO ______________________________________________________________ As relações comportamentais que são baseadas na dotação genética de um indivíduo são chamadas de filogenéticas e sua presença se deve à história da espécie. Comportamentos que ajudam na sobrevivência ou procriação da espécie são frequentemente (mas nem sempre) não aprendidos. Isto porque as gerações passadas da espécie que se engajaram em tais comportamentos sobreviveram e se reproduziram. Esses animais transmitiram (para a próxima geração) as características, através dos genes, que permitiram comportamentos semelhantes. Assim, a história da espécie fornece um repertório comportamental básico de respostas que são eliciadas pelas condições ambientais. Darwin afirmou que essas características foram naturalmente selecionadas, uma vez que ocorreram sem nenhuma ação ou intervenção humana. SEQUÊNCIAS DE COMPORTAMENTOS Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 3 3 Padrões fixos de ação ou PFAs (FAPs) são sequências de comportamentos (uma série de movimentos conectados) que tem origem filogenética. Todos os membros de uma determinada espécie (frequentemente todos os machos ou todas as fêmeas) se engajam no PFA quando os estímulos apropriados liberadores são apresentados. Padrões fixos de ação têm sido observados e registrados em uma grande variedade de animais e por um grande número de comportamentos relacionados a sobrevivência e reprodução. Para ilustrar, Tinbergen (1951) observou que os esgana-gatos (n.t. um tipo de peixe de rio) machos respondem com uma sequência de movimentos estereotipados e demonstrações agressivas quando outros machos invadem o seu território durante o período de corte. A fêmea da aranha da espécie Capiennius salei constrói um casulo e deposita seus ovos dentro engajando-se em uma sequência fixa de respostas (Eibl- Eibesfeldt, 1975). Um ganso cinza que se depare com um ovo fora do seu ninho o rolará automaticamente para dentro do ninho alcançando o ovo (com o seu bico) e empurrando-o cuidadosamente para o ninho. Se o ovo for removido, o pássaro continua com a sequência fixa de ações de reaver o ovo. Ou seja, o pássaro continuará comportando-se como se o ovo estivesse presente mesmo que tenha sido removido. A seguinte passagem descreve a PFA que o esquilo Sciurus vulgaris L. executa quando guarda nozes para o inverno: O esquilo ... enterra nozes a cada outono, utilizando uma sequência bem estereotipada de movimentos. Ele pega a noz, desce até o chão e procura um local próximo à base do tronco de uma árvore ou a uma grande rocha. Na base de um ponto de referência tão conspícuo ele vai cavar um buraco através de movimentos alternados das patas dianteiras e coloca a noz dentro. Então a noz é fixada no local com rápidas pressões do focinho, coberta com terra com movimentos de varrer e socado para baixo com as patas dianteiras. (Eibl-Eisbesfeldt, 1975, p.23) Etólogos referem-se a esses comportamentos previsíveis e estereotipados como PFAs para ressaltar que estes comportamentos são Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 4 3 embutidos e imutáveis. Eles estão procurando fatores baseados em heranças genéticas para uma explicação do comportamento. Por outro lado o modelo da ciência do comportamento prefere considerar todos os comportamentos como flexíveis e adaptáveis, pelo menos em algum grau. Então, diante da habilidade adaptativa da maioria dos animais, nós nos referimos a esses comportamentos como padrões flexíveis de ações. Embora a maioria dos aspectos topográficos desses tipos de combinações de reflexos pareçam semelhantes entre os diversos indivíduos e situações, há algumas diferenças peculiares que mostram flexibilidade. Por exemplo, todos os pintarroxos (Turdus americanis) constroem ninhos que parecem muito similares na construção. Mas é claro eles não constroem no mesmo local, ou usam os mesmos materiais. Há grande variação individual todas as fases da construção, sugerindo modificação pelo ambiente (ontogenia). Cadeias de reações são semelhantes aos PFAs com uma grande diferença – cada resposta em uma cadeia de reação requer um estímulo apropriado para dispará-la. Lembrando que quando um PFA começa,o animal continuará a sequência mesmo que os estímulos que dispararam o comportamento sejam removidos. No exemplo anterior do esquilo, se a noz for removida do esquilo, o animal continuará a cavar um buraco e enterrar uma noz inexistente. Por outro lado, a cadeia de reação requer a presença de estímulos específicos para evocar cada ligação em uma sequência padronizada de comportamento. O desempenho de um organismo produz um estímulo que dispara o próximo conjunto de respostas na sequência; estes comportamentos produzem o próximo conjunto de estímulos seguidos por outro conjuntos de respostas. Apresentar estímulos que desencadeiam respostas que ocorrem no meio da sequência irá começar a cadeia naquele ponto e não no início. Também, ao contrário do PFAs, se os estímulos que evocam o comportamento forem removidos, a sequência é interrompida. Cadeias de reações são como conjuntos consecutivos de reflexos onde o estímulo que elicia a próxima resposta na sequência é produzido pelo reflexo anterior. A cadeia de reação de amamentação de bebês recém- nascidos está diagramada na Figura 3.1. Essa sequência de respostas Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 5 3 reflexas pode ser iniciada por estimulação táctil da bochecha do bebê. Esta estimulação elicia a resposta de busca incondicionada, que envolve virar a cabeça em direção a estimulação, abrir a boca, etc. A busca resulta no contato da boca com o mamilo; essa estimulação oral, por sua vez, elicia a sucção. Sugar produz o leite do peito na boca da criança, levando a mais sucção. Eventualmente, estímulos internos provenientes de um estômago cheio, mudanças na química do sangue e do sistema endócrino terminam a sequência e o bebê para de se alimentar. (Nota: Quando discutirmos comportamento operante e condicionamento operante em um capítulo posterior, também falaremos de cadeias de respostas, mas nesse caso as sequências são aprendidas e descritas como contingências entrelaçadas de três termos) Comportamento Reflexivo Os princípios que descrevem o reflexo (e seu condicionamento) são semelhantes para muitos tipos diferentes de reflexos. Por exemplo, as leis que governam a contração da pupila quando a luz incide sobre olho ou os princípios que descrevem a relação entre um repentino barulho e a resposta de sobressalto, também valem para a salivação produzida quando você se alimenta. Os trabalhos iniciais realizados por Sherrington (1906) concentraram-se no reflexo, e as relações que ele descobriu, quase um século atrás, generalizam-se para uma notável variedade de relações FIG. 3.1 Cadeia de reação da amamentação de bebês recém-nascidos diagramada. Esta sequência de respostas reflexas é iniciada pela estimulação táctil da bochecha do bebê. A estimulação da bochecha do bebê provoca a resposta de busca incondicionada que implica em virar a cabeça em direção ao mamilo, abrindo a boca e sugando-o. Resposta de busca Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 6 3 estímulo-respostas. Quando a comida é colocada na boca de um cão, suas glândulas salivares produzem saliva. Esta relação entre comida e salivação é um reflexo baseado na dotação genética do organismo e não é aprendido. Muitos reflexos têm função defensiva, protetora ou de sobrevivência. Frequentemente tais reflexos não são aprendidos porque têm que funcionar antes que experiências adequadas sejam fornecidas. Todos os organismos nascem com um conjunto de reflexos embutido, mas muitos são particulares de uma espécie. Assim, os humanos nascem com uma série de respostas que são eliciadas por estímulos específicos. Como ilustrado acima, a estimulação táctil da bochecha da criança evoca a resposta de busca - virar a cabeça em direção ao estímulo com a boca aberta, que então recebe o mamilo. Também, conforme observado, em pintarroxos jovens, o chamado reflexo de “pedir” (abrir a boca e gorjear) se presta a uma função semelhante – conseguir ser alimentado. Devido a essas relações serem relativamente invariáveis e biologicamente baseadas, nos referimos aos seus eventos eliciadores como estímulos incondicionados (US). O comportamento relacionado posterior ao estímulo é chamado de resposta incondicionada (UR). O termo incondicionado é usado porque o reflexo não depende da experiência do indivíduo ou do condicionamento ao longo de sua vida (i.e., aprendizagem). Quando um estímulo incondicionado elicia uma resposta incondicionada (US -> UR), a relação é chamada de reflexo. O comportamento reflexivo é automático, no sentido de que todo organismo fisicamente saudável sempre produzirá a mesma resposta incondicionada quando apresentado um estímulo incondicionado. Você não escolhe entre salivar ou não quando tem comida em sua boca; o estímulo incondicionado (que é “comida na boca”) dispara ou elicia UR de salivação. Essa é a forma que o animal (você) é construído. Entretanto, há momentos e condições descritas abaixo onde US não elicia a UR. Quando repetidas exposições do US não eliciam a UR. Quando a apresentação repetida do US leva a uma redução da UR, nós chamamos esse processo de habituação. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 7 3 Leis do Reflexo Aristóteles por volta de 350 a.c. desenvolveu princípios de associação que foram redescobertos por psicólogos e por Pavlov (um fisiologista) no século XX (Hothersall, 1990, p.22). Sherrington (1906) estudou muitos tipos diferentes de reflexo, e formulou as leis da ação reflexa. Porque comportamento reflexivo ocorre entre a maioria ou todas a espécies animais dos protozoários (Wawrzyncyck, 1937) aos seres humanos (Watson & Rayner, 1920), e porque o condicionamento respondente ou associativo é constituído sobre o comportamento reflexivo, é importante descrever as leis do reflexo. Essas leis são gerais, uma vez que respondem por todos os estímulos eliciadores ou incondicionados (ex.: alimento na boca, um toque em uma superfície aquecida, uma leve batida logo abaixo do joelho, uma luz forte diante dos olhos) e as respostas incondicionadas correspondentes (salivação, retirada rápida do dedo, chute, contração da pupila). Os estímulos incondicionados que eliciam respostas incondicionadas podem variar em intensidade. Por exemplo, a luz que brilha diante dos olhos pode ser forte o suficiente para ferir ou tão tênue que seja difícil de detectar. A batida logo abaixo do joelho, que causa o chute, pode variar de leve a forte, etc. A intensidade US eliciador tem efeitos diretos sobre o reflexo eliciado. As três leis primárias do reflexo descrevem esses efeitos: 1. A lei do limiar baseia-se na observação de que intensidades muito fracas do estímulo não vão eliciar uma resposta, mas à medida em que a intensidade aumenta chega-se a um ponto onde a resposta é eliciada, Ou seja, há um ponto abaixo do qual não há eliciação da resposta e acima do qual ela sempre ocorre. A região incerta onde, grosseiramente, 50% dos estímulos que são apresentados produzem a resposta, é chamada de limiar. 2. A lei da intensidade-magnitude descreve a relação entre a intensidade do estímulo eliciador e o tamanho ou magnitude da resposta eliciada. A medida que a intensidade do US aumenta, Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 8 3 também aumentaa magnitude da UR eliciada. Uma batida leve no tendão patelar (logo abaixo da rótula) vai evocar um movimento leve da parte inferior da perna para frente, uma batida mais forte irá produzir um chute mais vigoroso da perna (o reflexo patelar). Claro que existem limites superiores para a magnitude da batida. Se um martelo é usado para esmagar o joelho, o resultado é uma rótula fraturada e nenhum movimento por um longo tempo. 3. A lei da latência diz respeito ao tempo entre o início do estímulo eliciador e o aparecimento da resposta reflexa. A latência é a medida da quantidade de tempo decorrido entre os dois eventos. Com o aumento da intensidade do US aumenta, a latência para o aparecimento da UR eliciada diminui. Assim, um sopro forte de ar eliciará um rápido piscar de olhos. Um sopro mais fraco também eliciará um piscar de olhos, mas o início da resposta será atrasado. Essas três leis do reflexo são propriedades básicas de todos os reflexos. São chamadas de leis primárias porque, juntas, definem a relação entre a intensidade do estímulo eliciador (US) e a resposta incondicionada (UR). Os reflexos, entretanto, possuem outras características e uma delas, a habituação, tem sido mostrada em animais tão simples como os protozoários e tão complexos como os humanos. Habituação Uma das mais documentadas propriedades secundárias do reflexo é a chamada habituação. A ocorrência da habituação é observada quando um estímulo incondicionado repetidamente elicia uma resposta incondicionada e essa resposta gradualmente diminui em magnitude. Quando uma UR é repetidamente eliciada, ela pode, eventualmente, não ocorrer. Por exemplo, Wawrzyncyck (1937) deixou cair repetidamente um peso de 4 g sobre uma lâmina onde se encontravam protozoários da espécie Spirostomum ambiguum. A queda do peso inicialmente produziu uma resposta de contração ou sobressalto que declinou para próximo a zero com a repetição do estímulo. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 9 3 Um relato curioso de habituação humana, em uma situação perigosa, apareceu na edição de julho de 1997 da revista National Geographic. A pequena ilha de Monstserrat abrigava colonos desde 1632. Infelizmente o vulcão adormecido da ilha acordou, em julho de 1995. Repentinamente, a vida pacata que caracterizava a ilha foi abruptamente interrompida. Antes da principal erupção, um grande número de habitantes se recusou a deixar a ilha e esse povo sofreu através de diversas pequenas explosões vulcânicas: ... Gerard Dyer e sua esposa, Judith, ficaram com amigos em St. John’s, tão longe do vulcão em direção ao norte quanto se pode ficar... As pessoas podiam conseguir autorizações para visitar as zonas menos seguras e foi assim que Gerard veio a trabalhar nos flancos de Soufriere Hills naquela manhã clara. “Se você tem animais e colheitas, não pode simplesmente deixa-los pra trás” dizia Gerard enquanto caminhávamos para seu caminhão. “Você tem que cuidar deles e esperar que nada aconteça.” A medida que ele falava, o vulcão produz um estalo como um trovão distante – blocos de lava sólida rolam ao lado da cúpula. Gerard nem sequer olhava. Os nativos ficaram tão acostumados com os barulhos e sopros do vulcão que o terror inicial se foi. Como disse uma mulher, “A primeira vez em que houve uma chuva de cinzas todos correram, agora todos simplesmente olham.” (Williams, 1997, p.66) Nesse exemplo, Gerard foi, repetidamente, exposto ao som (US) de explosões vulcânicas menores. Inicialmente, aquele som eliciou uma resposta de sobressalto ou pânico, acompanhada de fuga, mas essas URs habituaram para próximo a zero com as repetidas erupções do vulcão. Um processo semelhante é observado quando as pessoas moram sob uma trajetória de voo de um aeroporto; inicialmente o som de um avião decolando ou pousando é aborrecedor ou assustador, mas após algum tempo o som passa despercebido. Há um certo número de propriedades gerais que caracterizam a habituação (Thompson & Spencer, 1966). Alguns dos princípios mais importantes da habituação são: (1) a diminuição da resposta habituada é maior no início mas este descréscimo diminui progressivamente à medida Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 10 3 que a habituação prossegue; (2) se o estímulo incondicionado é retirado por algum tempo, a resposta habituada é recuperada; e (3) quando a habituação é repetidamente produzida, cada nova série de estímulos apresentada gera, progressivamente, uma habituação mais rápida. Em outras palavras, a habituação acontece mais rapidamente diante de uma segunda série de apresentação de estímulos incondicionados do que de uma primeira, e mais rapidamente ainda diante de uma terceira série. Isto pode representar a forma mais simples de aprendizagem e também uma forma rudimentar de memória (Tighe & Leaton, 1976). A habituação é um processo comportamental que surgiu por causa da história filogenética. Aqueles animais que se habituavam tinham mais possibilidade de sobreviver e gerar prole. Um herbívoro que foge a cada vez que ouve o farfalhar do capim consegue se alimentar menos do que outro que fica na sua posição. O som do farfalhar do capim pode significar a presença do predador, ou simplesmente o vento soprando. A ativação repetida de mecanismos respondentes, quando desnecessários, estressa o animal, o que não é bom em termos de saúde e fisiologia. No nível fisiológico, a habituação se torna possível pela maneira como o arco reflexo é construído. Para explicar, um neurônio sensorial com um transdutor sensorial envia a informação através da medula espinhal que é recebida por um neurônio motor. Quando ativado pelo toque, por exemplo, o neurônio sensorial aferente gera ação potencial em um neurônio motor eferente, mediada pelas ligações sinápticas, que pode causar atividade muscular ou glandular. As sinapses recebem várias informações, algumas excitatórias e outra inibitórias. A presença da sinapse entre neurônios sensórios e motores permite a presença de entradas inibitórias e habituação da UR (Thompson & Glanzman, 1976). ______________________________________________________________ COMPORTAMENTO ONTOGENÉTICO ______________________________________________________________ Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 11 3 Além da história filogenética, o comportamento de um organismo é afetado por experiências ambientais. Cada organismo possui uma única história ontogenética ou de condicionamento. A mudança de comportamento resultado de tais experiências é chamada de aprendizagem e consiste nas interações organismo-ambiente. Eventos no mundo físico e social afetam o comportamento dos organismos. A aprendizagem se baseia na história filogenética ou da espécie para determinar quando, onde e que tipo de comportamento ocorrerá em um dado momento. Por exemplo, a salivação está envolvida com a digestão de alimentos. Pessoas não aprendem a salivar para saborear alimentos; essa é uma característica filogenética da espécie. Após algumas experiências onde você aprende que McDonald’s é bom como comida, você talvez salive à visão dos arcos dourados do McDonald’s, especialmente se está faminto e gosta de hambúrguer. A salivação ao ver os arcos dourados do McDonald’s ocorre devido ao condicionamento respondente - você não nasceu desta forma. É, entretanto, importante notar que o condicionamentorespondente e outros processos de aprendizagem evoluíram por que trouxeram alguma vantagem reprodutiva. Aqueles organismos cujos comportamentos ficaram sob o controle de eventos ambientais arbitrários (mas importantes) presumivelmente tiveram alguma vantagem sobre os outros. Através da evolução e seleção de Darwin, o condicionamento respondente se tornou um meio de adaptação comportamental. Em outras palavras, os organismos com uma capacidade para a aprendizagem respondente tinham mais probabilidade de sobreviver e reproduzir-se – aumentando seus genes na população. Condicionamento Respondente O condicionamento respondente envolve a transferência do controle do comportamento de um estímulo para outro pelo emparelhamento S-S. No Capítulo I nós vimos que o som de um sino pode eliciar salivação, após o sino ter sido associado com a comida. Esse tipo de condicionamento Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 12 3 acontece em todas as espécies, inclusive em humanos, e é comum na vida diária. Imagine que você sai para uma caminhada matinal e passa perto de uma padaria, onde sente o cheiro de rosquinhas frescas. Quando isso acontece sua boca começa a se encher de água e o estômago começa a roncar. Essas respostas condicionadas ocorrem porque, no passado, o cheiro foi associado (emparelhado) com comida na boca (rosquinhas). A Figura 3.2 mostra o condicionamento clássico da salivação descrito por Pavlov (1960). O painel superior mostra que um estímulo arbitrário como a luz (CS) é apresentado logo antes da comida (US) ser colocada na boca de um cão. Após vários emparelhamentos da luz com a comida, a luz é apresentada sozinha. Se a luz agora elicia a salivação (fase teste), é chamada de estímulo condicionado (CS), e a salivação à luz é chamada de resposta condicionada (CR). Observe que uma nova característica do ambiente (luz) passou a controlar o comportamento (salivação) do organismo. Assim o condicionamento clássico (Pavloviano ou respondente) envolve a transferência do controle do comportamento para um aspecto novo e, frequentemente, arbitrário do ambiente. Para experimentar esse tipo de condicionamento, faça o seguinte: Leia a palavra limão e pense na última vez que você comeu uma fatia de limão. Muita gente salivará diante dessa CS por que a palavra foi contiguamente (próximo em tempo) emparelhada com o gosto azedo da fruta. Essa mudança no estímulo controlador da comida para a palavra é possível devido à anatomia descrita acima, envolvendo a sinapse crítica para o final de um caminho neural comum. Neste caso a informação FIG. 3.2 Condicionamento respondente simples. Um estímulo arbitrário como a luz (CS) é apresentado logo antes da comida ser colocada na boca do cão (US). Depois de vários emparelhamentos de luz e comida, a luz é apresentada sozinha. Se, agora, a luz eliciar a salivação, é chamada de estímulo condicionado (CS), e a salivação diante da luz é uma resposta condicionada (CR) Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 13 3 para o sistema visual acaba por ativar, também, o neurônio que ativa a glândula salivar. Como a CR é uma resposta eliciada pelo CS, é normalmente chamada de respondente. Os termos resposta condicionada e respondente são intercambiáveis ao longo desse texto. O processo de apresentação de estímulos concomitantes (emparelhando ou associando estímulos) de tal maneira que o CS venha a controlar a ocorrência de uma resposta condicionada será chamado de condicionamento respondente. Em termos técnicos, o condicionamento respondente envolve o estabelecimento de uma probabilidade condicional entre o CS e o US (a ocorrência do US é condicional à presença do CS). Observe que a associação é entre o CS e o US (i.e., a palavra limão e o fruto verdadeiro na boca), porque eles foram emparelhados em algum momento do passado – não por obra de algum processo cognitivo interno (mental) de associação de eventos. Este é um ponto importante: A palavra “associação” é às vezes tomada no sentido de um processo mental interno que a pessoa ou outro animal executa. Ouvimos as pessoas dizerem que “o cão saliva quando o sino soa porque associou o som com o alimento.” Em contraste, o analista do comportamento chama a atenção para a associação física dos estímulos (CS e US) que ocorreu no passado. Em outras palavras, a associação é entre eventos – ela não se refere a associações mentais. A palavra limão (CS) elicia a salivação (CR) porque foi pronunciada em um tempo e lugar onde a química de um limão (US) produziu salivação (UR). As medidas usuais do comportamento para o condicionamento respondente são a magnitude (quantidade de salivação) e latência (tempo para o início da salivação) da resposta que segue a apresentação do US ou CS. Elas fazem sentido como medidas comportamentais porque o condicionamento respondente frequentemente envolve ações de músculos lisos e glândulas ou respostas tais como um piscar de olhos e resistência da pele (a UR ou CR), que podem variar segundo essas duas medidas. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 14 3 Aquisição respondente Quando um estímulo condicionado (CS) é repetidamente emparelhado com um estímulo incondicionado (US), o CS passa a produzir a resposta condicionada (CR). O aumento na CR frente à apresentação do CS é chamado de aquisição respondente. Em um experimento, Anrep (1920) demonstrou o condicionamento do reflexo salivar à um estímulo sonoro. O procedimento de aquisição envolveu acionar um som por um breve período, e, então, colocar a comida na boca de um cão. Anrep mediu a resposta condicionada através do número de gotas de saliva durante intervalos de 30 s em que o som ocorreu sem a presença da comida. A Figura 3.3A (aquisição) mostra que a quantidade de salivação ao som aumenta rapidamente durante as 25 primeiras tentativas e então nivela-se, ou alcança seu máximo chamado de assíntota. Em outras palavras, com emparelhamentos repetidos do CS e US, a magnitude da resposta condicionada aumenta. Uma vez que o reflexo condicionado atinge a sua assíntota, entretanto, pareamentos adicionais não têm efeitos adicionais. É importante observar que a assíntota para a resposta condicionada depende da intensidade do estímulo incondicionado. Com o aumento da intensidade do US, a magnitude da UR também aumenta até certo ponto. A magnitude da UR limita a força máxima da CR. Assim, quando mais comida é FIG. 3.3 A aquisição e a extinção da salivação. A curva de aquisição (A) é de um experimento de Anrep (1920), que emparelhou um som (CS) com a comida na boca de um cão (US). A curva de extinção (B) é de Pavlov (1960, p. 53), que apresentou o CS (visão da comida), na ausência do US (comida na boca). Os resultados são retratados como se fossem um único experimento. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 15 3 dada ao cão, maior será a quantidade de salivação. Se são oferecidas a um cão 57 gramas de carne, haverá mais salivação do que que forem oferecidas 28 gramas. Um som que é associado com 57 g de alimento eliciará salivação como CR em um nível mais alto (em assíntota) do que um som associado com 28 g do alimento. Está claro que essas relações são limitadas pela fisiologiado organismo. Se forem dadas 453 g de carne a um cão ele provavelmente salivará no seu nível máximo, e uma troca para 907 g não terá efeitos adicionais. Limites semelhantes são observados para reflexos tais como a variação no tamanho da pupila em resposta à luz, a magnitude do chute em resposta uma batida na patela, e o grau do sobressalto em resposta a um ruído. Respostas condicionadas e incondicionadas Observe que a resposta condicionada da salivação parece ser idêntica à resposta incondicionada. Isto é, quando o condicionamento a um som tiver ocorrido, liga-lo eliciará salivação. Essa resposta ao som parece ser a mesma que a salivação produzida pela comida na boca do cão. Na verdade, as primeiras teorias da aprendizagem consideraram que o som substituíra o estímulo alimentar. Isso implica em dizer que a relação CS-CR é a mesma de US-UR. Se as relações CS-CR e US-UR são as mesmas, então ambas devem seguir leis e princípios semelhantes. E as leis do reflexo governam a relação entre US-UR, como já visto. Se as relações de CS-CR e US-UR são as mesmas, então a lei da intensidade-magnitude deveria valer para os estímulos e respostas. Isto é, um elevação na intensidade do CS deveria aumentar a magnitude da CR. Adicionalmente, a relação CS-CR deveria seguir a lei da latência. Um aumento na intensidade do CS deveria diminuir a latência entre a apresentação do CS e a resposta condicionada. As pesquisas têm mostrado que essas e outras leis do reflexo, normalmente, não se mantém para a relação CS-CR (Millenson, 1967). Geralmente, uma mudança na intensidade do estímulo condicionado diminui a força da resposta condicionada. No experimento de Arep (1920), o som era apresentado em uma intensidade Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 16 3 particular, e, depois do condicionamento, eliciava uma dada magnitude e latência de salivação. Se Arep tivesse aumentado o som, teria havido menos salivação e esta teria demorado mais tempo para ocorrer. Assim, a relação CS-CR é específica do condicionamento original e não segue as leis do reflexo. Um dos motivos é que a relação CS-CR envolve um processo chamado de discriminação respondente. (veja abaixo). Extinção respondente Pavlov (1960) relatou um procedimento experimental muito simples que ele chamou de extinção respondente. O procedimento envolve a apresentação repetida do CS e a não apresentação do US. A Figura 3.3B (extinção) mostra a diminuição da salivação quando o assistente de Pavlov, Dr. Babkin, repetidamente apresentava o CS mas não mais alimentava o cão. Como se pode ver, a quantidade de saliva diminui e alcança um valor mínimo na sétima tentativa. Esse valor mínimo da CR é, frequentemente, similar ao valor obtido durante a primeira tentativa de aquisição e, provavelmente, reflete o nível respondente desse comportamento. O nível respondente, ou linha de base, refere-se à força da resposta alvo (salivação) antes que qualquer condicionamento conhecido tenha ocorrido. Uma distinção deve ser feita entre extinção como um procedimento e extinção como um processo comportamental. O procedimento envolve a apresentação do CS, mas não do US, depois da ocorrência do condicionamento. Como um processo comportamental, extinção se refere ao declínio em força da resposta condicionada quando um procedimento de extinção está em efeito. Nos dois exemplos, o termo extinção é usado corretamente. A extinção é o procedimento de quebrar a associação CS-US, resultando no declínio da CR. O declínio em força da CR é frequentemente rápido. Essa afirmação é verdadeira para o condicionamento da salivação, mas outros tipos de respostas condicionadas podem variar em resistência à extinção. Mesmo com a salivação, Pavlov observou que quando o tempo entre as tentativas aumentou, a CR diminuiu mais lentamente. Uma tentativa-teste é qualquer Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 17 3 circunstância em que o CS é apresentado na ausência do estímulo incondicionado. É claro, repetidas tentativas-teste equivalem à extinção. A extinção mais lenta da salivação com intervalos mais longos entre tentativas pode refletir o que chamamos de recuperação espontânea. Recuperação espontânea A recuperação espontânea é a observação de um aumento na resposta condicionada depois que tenha havido uma extinção respondente. Lembre-se que após a apresentação repetida do CS sem o US, a resposta condicionada diminui para o nível respondente. Depois da extinção da resposta para o nível respondente, após passado algum tempo, a ocorrência do CS eliciará novamente a CR e quanto maior o tempo decorrido entre a primeira e a segunda extinção maior a recuperação espontânea (Brooks & Bouton, 1993). Esse típico efeito é visto na Figura 3.4, que mostra o curso de extinção e recuperação espontânea de um outro experimento de Pavlov (1960). Neste experimento, o CS era a visão de carne em pó, e o US era comida na boca do cachorro. Como se poderia esperar, a visão de carne em pó eventualmente eliciava a resposta condicionada de salivar. Quando a extinção começou, o cachorro respondeu com 1 cc de saliva ao ver o CS. Em torno da quinta tentativa de extinção, o animal não apresentou quase nenhuma salivação ao ver a carne em pó, mas depois de 20 minutos de descanso sem a apresentação do estímulo, o CS novamente eliciou a resposta condicionada. Observe, entretanto, que a quantidade de salivação na tentativa de FIG. 3.4 Extinção e recuperação espontânea da salivação provocada pela exibição de carne em pó (Pavlov, 1960), com dados transcritos de Bower e Hilgard (1981, p. 51). Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 18 3 recuperação espontânea é muito menor que a quantidade eliciada na primeira tentativa de extinção. Pavlov (1960) argumentou que a recuperação espontânea mostra pouco enfraquecimento da relação CS-CR durante a extinção. Ele foi ainda mais adiante e sugeriu que uma “inibição interna” bloqueou a conexão entre os estímulos e as respostas. Pavlov via os fenômenos do condicionamento como sinais dos processos cerebrais e, consequentemente, viu o comportamento como um reflexo do funcionamento do sistema nervoso central. Nesse sentido, a recuperação espontânea refletiria processos fisiológicos subjacentes, e um destes seria um “amortecimento” ativo, mas temporário, das conexões associativas entre o CS e a resposta condicionada. Pavlov chamou esse aparente bloqueio fisiológico da relação CS-CR de “inibição interna.” Em contraste com a explanação fisiológica hipotética de Pavlov (ele não chegou a observar realmente nenhuma atividade neuronal), uma análise comportamental da recuperação espontânea sugere que a relação CS-CR é enfraquecida pela extinção, mas o contexto ou as características gerais da situação continuam a manter algum nível de controle sobre a resposta condicionada. Durante o condicionamento respondente, muitos dos estímulos não especificados pelo pesquisador como CS, mas presentes na situação experimental, vêm a controlar o comportamento. Por exemplo, odores de fundo, iluminação geral da sala, a presença de determinados pesquisadores, a passagem do tempo e todos os eventos que marcam o começo de uma série de condicionamento exercem algum tipo de controle sobre a resposta condicionada. Cada vez que um teste de recuperação é realizado, uma parte da situação, queainda não foi extinta, evoca a CR. O declínio gradual no controle de estímulos contextual através de repetidas extinções, também é responsável pela progressiva redução da recuperação da resposta condicionada. Generalização e Discriminação Respondente Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 19 3 Generalização Pavlov conduziu um grande número de experimentos de condicionamento e descobriu muitos princípios que permanecem uteis até os dias atuais. Um dos seus importantes achados diz respeito ao princípio da generalização respondente. A generalização respondente ocorre quando um organismo apresenta uma resposta condicionada diante de valores do CS que não foram treinados durante a aquisição. Por exemplo, a aquisição respondente ocorrerá quando um estímulo específico, como um som de 60- dB em uma determinada frequência (ex.: 375 Hz), é associado com um US (comida). Depois de vários emparelhamentos, o CS elicia uma resposta condicionada, neste caso salivação. Se um som de 60-dB e 375 Hz é agora apesentado sem o US (uma tentativa-teste), o animal salivará em seu nível máximo. Para demonstrar a generalização, o pesquisador varia algumas propriedades do estímulo condicionado. Por exemplo, um som de 60-dB nas frequências de 75, 150, 225, 300, 375, 450, 525, 600 e 675 Hz é apresentado em tentativas-teste, e a magnitude da resposta condicionada é medida. A Figura 3.5 mostra os resultados possíveis de tal experimento. Como se pode ver, a quantidade de salivação diminui em qualquer direção na qual o estímulo-teste se afasta do valor usado no treinamento. Este gráfico, que traça a correspondência entre valores de estímulos diferentes e magnitude da resposta, é chamado de gradiente de generalização. Curiosamente, um gradiente de generalização similar pode não ocorrer se a intensidade, ao invés da frequência, do CS for variada. Ou seja, se os decibéis ao invés dos ciclos por segundo (Hertz) são alterados nos testes de FIG. 3.5 Um gradiente de generalização hipotético para a resposta de salivação. Nesse experimento idealizado o treinamento ocorreria a 375 Hz e então variações de 75 a 675 Hz são apresentadas. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 20 3 generalização, um resultado diferente pode ocorrer. Alguns estudos têm mostrado que se a intensidade do CS aumenta, também aumenta a magnitude da resposta condicionada (Heinemann & Chase, 1970; Razran, 1949). Heinemann e Chase (1970) concluíram que, proporcionalmente, mais respostas condicionadas eram eliciadas quando a intensidade do som do CS aumentava. Baseados nesse achado, Heinemann e Chase sugeriram que poderia haver aumentos consistentes na força da CR quando a intensidade do CS aumenta, embora nem toda a pesquisa tenha confirmado essa suposição (Ernst, Engberg & Thomas, 1971). Uma conclusão conservadora é que quando o CS se afasta muito do valor que foi originalmente estabelecido, a resposta condicionada se torna mais fraca (veja também Thomas & Setzer, 1972). A generalização é um processo adaptativo que permite que os organismos respondam de forma semelhante, mesmo quando as condições não permanecem exatamente iguais, de uma tentativa para outra. Imagine uma situação em que a aproximação do predador (US) é associada ao som de galhos estalando, grama farfalhando e arbustos em movimento (CS). Um organismo que foge (CR) só na presença exata dessas condições estimulantes não sobreviveria por muito tempo. Isto porque os eventos que ocorrem durante o condicionamento nunca são precisamente repetidos – cada aproximação do predador produz variação no sons, visões e odores. Mesmo em um laboratório onde muitas características do ambiente são controladas, há alguma variação nos estímulos de uma tentativa para outra. Quando um sino é emparelhado com comida, um cão pode mudar sua orientação em relação ao sino e, consequentemente, alterar o som; a umidade do local e outros fatores também podem produzir leves variações na frequência do som. Por causa da generalização, a relação CS-CR pode ser fortalecida, mesmo que as condições estímulos nem sempre sejam as mesmas de tentativa para tentativa. Assim, a generalização foi, muito provavelmente, um processo adaptativo, permitindo que os organismos respondessem aos caprichos da vida. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 21 3 Discriminação Outro princípio do condicionamento respondente que Pavlov descobriu é chamado de diferenciação ou discriminação. A discriminação respondente ocorre quando um organismo apresenta uma resposta condicionada a um estímulo, mas não a outros eventos semelhantes. Este é um processo no outro extremo do contínuo da generalização. Um procedimento de treinamento da discriminação envolve a apresentação de tentativas de condicionamento positivas e negativas. Por exemplo, uma tentativa positiva ocorre quando um CS+ como um som de 60-dB é associado com um estímulo incondicionado como a comida. Nas tentativas negativas, um som de 40-dB é apresentado (CS-), mas nunca emparelhado com a comida. Por causa da generalização de estímulos, o cão pode salivar em ambas os sons de 60-dB (CS+) e 40-dB (CS-) nas primeiras tentativas. Entretanto, se o procedimento seguir adiante, o animal não mais salivará para o CS- (som de 40-dB), mas apresentará a resposta diante do CS+ (60- dB). Uma vez que tais respostas diferenciais ocorrem, podemos afirmar que o cão discrimina entre os dois sons. A discriminação respondente é um outro processo adaptativo. O mundo seria muito caótico se um animal passasse o tempo todo fugindo da maioria dos sons, visões e odores, generalizando para tudo. Tal animal não sobreviveria, nem se reproduziria, porque não haveria tempo para outras atividades essenciais, como comer, beber e procriar. A discriminação permite ao organismo economizar seu tempo e responder de acordo com os requisitos do ambiente. No exemplo do predador, os barulhos que são seguramente associados com um animal que lhe considera um prato principal devem se tornar um CS+ para voar ou lutar. Barulhos semelhantes feitos pelo vento ou por animais inofensivos são CS- para tais comportamentos. Observe, entretanto, que há uma linha tênue entre discriminação e generalização em termos de sobrevivência. ______________________________________________________________ RELAÇÕES TEMPORAIS E CONDICIONAMENTO ______________________________________________________________ Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 22 3 Condicionamento de Atraso Há varias formas de organizar a relação temporal entre a apresentação de um CS e o estímulo incondicionado (US). Até agora temos descrito um procedimento no qual o CS é apresentado alguns segundos depois que o US ocorre. Esse procedimento é chamado de condicionamento de atraso (a apresentação do US é levemente atrasada em relação ao CS) e é mostrado na Figura 3.6A. O condicionamento de atraso é considerado a forma mais eficiente de condicionar reflexos autônomos simples como a salivação. No diagrama da Figura 3.6A, o CS é disparado, e 3 s depois o US é apresentado. O intervalo entre o começo do CS e do US (chamado de intervalo CS-US) determina a efetividade do condicionamento. Para respostas autônomas como asalivação, pressão sanguínea, temperatura corporal, níveis hormonais e secreção de suor, um intervalo CS-US de 5 a 30s parece ser mais efetivo. Um intervalo CS-US breve de 0,5 s parece ser ótimo para o condicionamento de respostas esqueléticas rápidas tais como a resposta patelar, o piscar de olhos e a retração de um membro ao tocar uma superfície quente. No condicionamento do piscar de olhos em humanos, um atraso de FIG. 3.6 Várias sequências temporais entre o CS e o US, que são comumente usadas no condicionamento respondente simples. O tempo é mostrado na divisão inferior da figura e transcorre da esquerda para a direita. As outras divisões descrevem as sequências temporais entre o US e o CS para os quatro arranjos básicos de condicionamento respondente. Por exemplo, o condicionamento de atraso é mostrado na divisão A, onde o CS é acionado e, alguns segundos depois, o US é apresentado. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 23 3 0,4s entre o CS e o US produz o condicionamento mais rápido em jovens adultos, mas um atraso maior de cerca de 1s é mais efetivo em pessoas mais velhas (Solomon, Blanchard, Levine, Velasquez & Groccia-Ellison, 1991). Condicionamento Simultâneo Um outro arranjo temporal é chamado de condicionamento simultâneo, onde o CS e o US são apresentados ao mesmo tempo. Esse procedimento é mostrado na Figura 3.6B, onde CS e US são apresentados no mesmo momento. Por exemplo, ao mesmo tempo em que o sino toca (CS), a comida é colocada na boca do cão (US). Comparado com o condicionamento de atraso, onde o CS precede o US brevemente, o condicionamento simultâneo produz uma resposta condicionada mais fraca (Smith e Gormezano, 1965; White & Schlosberg, 1952). Uma maneira de entender esse efeito mais fraco é observar que o CS não sinaliza a ocorrência iminente do US no condicionamento simultâneo. Baseados nessa observação, muitos pesquisadores enfatizaram a previsibilidade do CS como uma característica central do condicionamento clássico (veja Rescorla, 1966). Assim, o CS funciona porque disponibiliza informação que “comunica” ao organismo que o US virá em seguida. No condicionamento simultâneo, entretanto, pode não haver informação previsível por parte do CS, mas ainda assim algum condicionamento ocorre. Isso sugere que a previsibilidade pode facilitar o condicionamento, mas não é essencial para ele (Papini & Bitterman, 1990). Condicionamento de Traço O procedimento para o condicionamento de traço é mostrado na Figura 3.6C. O CS é apresentado por um curto período, ligado e desligado, e depois de algum tempo o US ocorre. Por exemplo, uma luz pisca por 2 segundos e 20 segundos depois o alimento é colocado na boca do cão. O termo condicionamento de traço se origina da ideia de um “traço de memória” e se refere ao fato de que o organismo se lembra da apresentação do CS. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 24 3 Geralmente, conforme o tempo entre o CS e o US aumenta, a resposta condicionada se torna mais fraca (Ellison, 1964; Lucas, Deich & Wasserman, 1981). Para o condicionamento do piscar de olho (um sopro de ar no olho US -> um piscar de olho UR), a resposta ao CS não ocorre quando o CS e o US são separados por um tempo maior que 2 segundos (Schneiderman, 1966). Quando comparado com o condicionamento de atraso com o mesmo intervalo, entre o início do CS seguido pelo US, o condicionamento de traço não é tão efetivo – produzindo uma resposta condicionada mais fraca. Pesquisas recentes estenderam o condicionamento de traço para a aprendizagem da aversão ao gosto (veja o Capítulo 7) e para mudanças bioquímicas que ajudam a entender a associação de estímulos ao longo do intervalo de traço. (Misanin, Goodhart & Hinderlite, 2002). Condicionamento reverso Como mostrado na Figura 3.6D, o condicionamento reverso estipula que o US se inicia e termina antes que o CS se apresente. O consenso geral tem sido o de que o condicionamento de trás para frente não é confiável, e muitos pesquisadores questionam-se se ele de fato ocorre (mas veja Barnet & Miller, 1976, e Heth, 1976, para uma visão que o sustenta). É verdade que o condicionamento reverso normalmente não produz uma resposta condicionada. Isto é, se você coloca comida na boca do cão e então toca um sino, o som não eliciará a resposta de salivação quando apresentado mais tarde. A maioria dos experimentos de condicionamento de trás para frente têm usado estímulos arbitrários como luzes, sons e formas como estímulos condicionados. Entretanto, Keith-Lucas e Guttman (1975) encontraram condicionamento reverso quando usaram um CS biologicamente significante. Esses pesquisadores concluíram que após um ataque mal sucedido de um predador, as formas, sons e odores do atacante seriam associados com a dor do ataque. Considere a situação em que um animal herbívoro não percebe a aproximação de um leopardo. O ataque (US) acontece de forma sorrateira e sem aviso (sem CS). O animal sobrevive à investida e consegue Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 25 3 fugir. Neste caso, a dor infligida pelo ataque é o US para a fuga que precede a percepção visual do predador (CS). Para tal situação, o condicionamento reverso teria um valor adaptativo, uma vez que o animal aprendesse a evitar de leopardos. Keith-Lucas e Guttman (1975) projetaram um experimento para testar esta hipótese do valor adaptativo. Ratos foram colocados em câmaras experimentais e alimentados com pelotas de açúcar em um determinado local. Enquanto comiam as pastilhas, os ratos receberam um choque elétrico (US). Depois do choque, a câmara ficou completamente escura por 1, 5, 10 ou 40s. Quando a luz da câmara voltou a acender-se um porco espinho de brinquedo (CS) foi apresentado ao rato. Esclarecendo os termos do experimento, considere que comer as pastilhas corresponderia ao equivalente de laboratório da pastagem no ambiente, o choque representaria um ataque do predador e a aparência do porco espinho de brinquedo substituiria o predador. Dois grupos controle foram mantidos sob condições idênticas, exceto que em um dos grupos viu o porco espinho, nas não levou o choque, e o outro grupo levou o choque, mas não viu o porco espinho. No dia seguinte, cada animal foi expostos à mesma situação e o número de respostas foi medido. Comparados com os grupos controle, o condicionamento reverso foi encontrado depois de um atraso de 1, 5 e 10 s, mas não de 40s. Comparados aos animais do grupo controle, os sujeitos experimentais apresentaram maior fuga (medo) do porco espinho, passaram menos tempo na presença dele e comeram menos. Presumivelmente, o choque (US) eliciou a reação de medo-luta (UR), e o condicionamento reverso transferiu essa reação para o porco espinho de brinquedo (CS). O medo induzido pelo porco espinho (CR) interferiu na alimentação e produziu a fuga do animal de brinquedo. Esse experimento mostra que, com um CS biologicamente relevante, o condicionamento reverso é possível. Não obstante, a maioria dos pesquisadores sugere que o arranjo reverso do US e então do CS não resulta em condicionamento confiável (mas veja Cole & Miller, 1999; Siegel & Domjan, 1971; Tait & Saladin, 1986, para Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 26 3 condicionamento reverso inibitório;e também Arcediano & Miller, 2002, para timing e condicionamento reverso). ______________________________________________________________ CONDICIONAMENTO RESPONDENTE DE SEGUNDA ORDEM ______________________________________________________________ Até agora consideramos somente o condicionamento de primeira ordem. Para revisar brevemente, no condicionamento de primeira ordem um estímulo aparentemente neutro é emparelhado com um estímulo incondicionado. Depois de vários emparelhamentos o controle da resposta ao US é transferido para o estímulo neutro, que passa a ser chamado de estímulo condicionado (CS). O condicionamento de segunda ordem amplia essa transferência do controle para os eventos que não foram diretamente associados com o estímulo incondicionado. Esses eventos ganham controle sobre a resposta por causa do seu emparelhamento com um estímulo condicionado já estabelecido. Assim, o condicionamento de segunda ordem consiste em emparelhar um segundo CS2 com um CS1 já funcional, ao invés de parear um CS e um US (Rizley & Rescorla, 1972). Tal condicionamento de ordem superior é importante porque amplia a série de efeitos comportamentais produzida pelo condicionamento respondente, especialmente no que diz respeito ao aprendizado do significado das palavras (Staats, 1975) e condicionamento avaliativo em seres humanos (De Houwer, Thomas & Baeyens, 2001, para uma revisão). Algumas reações fóbicas (i.e. medo intenso e aparentemente irracional) apresentadas por algumas pessoas podem ser causadas pelo condicionamento de ordem superior. Considere uma pessoa que se recusa a sentar com os amigos no quintal em um dia agradável de verão. A visão das flores a perturba de forma intensa e ela diz que “com muitas flores também deve haver provavelmente abelhas.” Uma possível interpretação para a situação é que essa pessoa foi picada (US) por uma abelha (CS1), e percebeu que abelhas voam em volta de flores (CS2). O medo “fóbico” de Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 27 3 flores ocorre por causa do emparelhamento de abelhas (CS1) com flores (CS2). Assim, reações fóbicas e outras respostas emocionais podem, às vezes, envolver condicionamento respondente de ordem superior (veja Martin & Pear, 2006, sobre dessensibilização sistemática e a hierarquia do medo). NA ÁREA APLICADA: O uso e abuso de drogas e as complexidades do condicionamento respondente A pesquisa básica sobre o condicionamento respondente simples e complexo (i.e. incluindo efeitos contextuais) tem importância aplicada. Recentemente, o Governo Americano declarou guerra à importação e uso de drogas ilegais. Um dos resultados disso é que mais dinheiro está sendo gasto em pesquisas para identificar os fatores que afetam o uso e abuso de drogas. Vários experimentos têm mostrado que os estímulos condicionados podem produzir efeitos semelhantes aos das drogas em humanos e outros animais, perturbando comportamento e produzindo mudanças fisiológicas. Além do mais, estímulos que foram emparelhados com as drogas, às vezes, produzem respostas condicionadas internas que são o oposto dos efeitos incondicionados da droga. Por exemplo, quando injetamos insulina (US) em animais, a resposta incondicionada é a redução do açúcar no sangue (UR). A resposta a um estímulo (CS) que tenha sido emparelhado com a insulina é exatamente o oposto; o nível do açúcar no sangue sobe (Siegel, 1972, 1975). Efeitos combativos semelhantes foram encontrados em outras drogas, além da insulina. Por exemplo, a anfetamina reduz o apetite, mas um CS que tenha sido emparelhado com ela aumenta a ingestão de alimentos (Poulos, Wilkinson & Cappell, 1981). O pentobarbital é um sedativo, mas a resposta a um estímulo condicionado, a ele associado, combate a sonolência comumente associada à droga (Hinson, Poulos & Cappell, 1982). Efeitos como estes sugerem que o condicionamento respondente desempenha um papel crucial na tolerância às drogas. Veja aqui como funciona. Com os repetidos emparelhamentos de uma droga (US) e de um Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 28 3 CS (e.g. o processo de injeção), a resposta condicionada ganha em força e cada vez mais se opõe aos efeitos incondicionados da droga. Isso significa que o usuário precisará, gradativamente, de maiores quantidades de droga para experimentar o mesmo efeito. Na vida cotidiana, os estímulos condicionados originam-se da hora do dia ou do local em que a droga é usada, do método pelo qual ela é administrada (i.e., usando uma agulha), o local, tal como uma taverna ou em casa, e eventos sociais como um parceiro de dança. Observe que, no caso da tolerância, a redução dos efeitos das drogas (UR) não é provocada pela habituação, mas pelo resultado dos efeitos combativos (CR) do processo de injeção da droga e seu contexto (CS). Quando uma maior quantidade de droga (US) é necessária para obter os mesmo efeitos (UR), falamos em tolerância às drogas (Baker e Tiffany, 1985). Assim, os efeitos combativos dos CSs são os principais componentes da tolerância às drogas. NOTA SOBRE: A fisiologia e o controle das respostas preparatórias pelos estímulos condicionados O conceito de homeostase ajuda a esclarecer o controle pelo estímulo condicionado (CS) sobre as respostas condicionadas opostas àquelas induzidas pelo US. Homeostase é a tendência que um sistema tem a permanecer estável e resistir às mudanças. No que diz respeito a um sistema biológico, a homeostase se refere à regulação do sistema através de ciclos de feedbacks negativos. Por exemplo, o corpo mantem a temperatura dentro de um limite muito estreito. Se o ambiente esquenta ou esfria, mecanismos fisiológicos (sudorese ou tremores), envolvendo os sistemas nervosos simpático e parassimpático, são ativados para reduzir o desvio da temperatura normal do corpo. Com relação à exposição a uma droga, quando uma droga (US) é administrada abala a estabilidade do sistema, isto é, talvez aumente os batimentos cardíacos ou reduza a respiração (UR). Se algum Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 29 3 aspecto do ambiente está consistentemente presente no momento em que a droga é administrada (e.g. o método de administração, uma pessoa, ou um local), então esse estímulo torna-se um estímulo condicionado (CS) capaz de eliciar uma resposta condicionada que é, frequentemente, preparatória e compensatória (CR). Se o US droga causa aumento no batimento cardíaco, a resposta condicionada (CR) compensatória (homeostática) será uma redução no batimento cardíaco, ou seja, o componente aprendido (CSagulha -> CRredução batimento cardíaco) combate a resposta não aprendida à droga (USdroga -> URaumento batimento cardíaco). Esse efeito homeostático compensatório pode ser tão grande que anula as respostas à droga e o usuário para de experimentar o “barato”, processo que é chamado de tolerância. O início da tolerância pode ser perigoso para o usuário de drogas. Se uma grande quantidade de droga for usada para compensar a tolerância e a resposta combativa compensatória não é produzida, pode ocorrer uma overdose. Além do mais, se os estímulos preparatórios (CSs) eliciarem suas respostas e a droga (US) não for administrada, pode ocorrer uma condição a que chamamos de abstinência. Overdose de Heroína e o Contexto Considerar a tolerância às drogas como o resultado de uma respostacondicionada ajuda a explicar os casos de overdose. É conhecido que usuários de heroína sobrevivem a doses da droga que matariam uma pessoa não usuária regular da droga. Apesar desse alto nível de tolerância, aproximadamente 1% dos viciados em heroína morrem de overdose da droga a cada ano. Estas vítimas tipicamente morrem de depressão respiratória induzida pela droga. Surpreendentemente, muitos desses usuários morrem por uma dose de heroína similar a que eles normalmente tomam no seu dia a dia. Siegel, Hinson, Krank e McCully (1982) propuseram que essas mortes resultariam de “uma falha no mecanismo da tolerância. , Isto é, o usuário de opiáceos, que normalmente pode tolerar doses extraordinariamente altas, não está tolerante na ocasião da overdose” (p. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 30 3 436). Eles sugeriram que quando a droga é administrada nas condições ambientais usuais (CS+), as CRs que a combatem a droga permitem uma dosagem mais alta. Quando a situação em que a droga é tomada muda, os CSs não estão presentes, a resposta condicionada oposta não ocorre e a dosagem é suficiente para matar o usuário. Siegel e seus colaboradores projetaram um experimento com animais para testar essas idéias. Em um estudo ratos foram injetados com heroína, em dias alternados, por 30 dias. A quantidade de heroína foi gradualmente aumentada até uma dose que produziria tolerância à droga. Nos dias em que não foram injetados com heroína, os ratos foram injetados com uma solução de dextrose (i.e. açúcar e água). Ambas as injeções foram administradas em um de dois diferentes contextos – a sala da colônia onde os ratos viviam, ou uma sala diferente que apresentava um ruído branco constante. Um grupo controle de ratos foi injetado apenas com a solução de dextrose nos dois contextos. Os pesquisadores previram que os animais experimentais desenvolveriam uma tolerância à droga; esta tolerância ocorreria se características da sala na qual as injeções de heroína foram dadas se tornassem CSs que viessem a provocar respostas opostas (CRs) à droga. Para testar essa suposição, Siegel e colaboradores (1982), no dia do teste, dobraram a quantidade de heroína administrada nos animais experimentais. A mesma dose alta de heroína também foi dada aos animais do grupo de controle, que não apresentavam histórico de FIG. 3.7 Resultados dos experimentos de Siegel, Hinson, Krank e McCully (1982). O grupo de ratos do “mesmo local” recebeu a alta dosagem de heroína no mesmo local em que normalmente eram injetados com a droga, e somente 32% morreu. Duas vezes mais animais morreram de overdose no grupo sob a condição “local diferente”, presumivelmente porque a heroína foi injetada em um local em que nunca tinha sido aplicada. Por fim, a heroína matou quase todos os animais do grupo de controle. Adaptado de Siegel et al. (1982), Science, 216, 436-437. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 31 3 tolerância. Metade dos animais experimentais recebeu essa alta dosagem no local onde a droga era usualmente administrada. Os outros ratos viciados receberam uma injeção com a alta dose onde eles recebiam a injeção de dextrose. A Figura 3.7 mostra os resultados deste experimento. Como se pode ver, a alta dosagem de heroína matou quase todos os animais do grupo de controle. Para os dois grupos de animais com histórico de exposição à heroína, um grupo (mesmo local) recebeu a dose mais alta no local onde usualmente era injetada a heroína. Somente 32% dos ratos morreram nessa condição, presumivelmente porque os CSs iniciou as respostas condicionadas opostas. Esta inferência é apoiada pela taxa de mortalidade no grupo de local diferente. Estes ratos tomaram a alta dosagem de heroína em um outro local que nunca tinha sido associado com a administração da droga. Duas vezes mais animais morreram ao receberem a alta dose (64%), quando comparados com os animais do grupo do mesmo local. Ao que parece, os efeitos do contexto ao longo desse tipo de condicionamento respondente podem ser uma questão de vida ou morte – a tolerância à heroína (e talvez outras drogas) se relaciona com a situação em que o condicionamento ocorreu (Siegel, 2001). O que acontece quando um CS relacionado à droga é apresentado sem a droga US, como no procedimento clássico de extinção? Neste caso os comportamentos respondentes são frequentemente chamados “fissura” e o processo é conhecido como abstinência condicionada. O CS elicia reações que são comumente combatidas pelo US. Entretanto, quando o US não é apresentado e aquelas reações do CS ocorrem, o sujeito experiência aquilo que chamamos de abstinência. Um usuário de heroína pode ter os seus sintomas de abstinência terminados imediatamente por uma injeção de heroína. Se você está acostumado a fumar um cigarro após as refeições, a vontade que você experimenta após o jantar pode ser aliviada com o ato de fumar. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 32 3 Imunossupressão Condicionada A imunossupressão condicionada é outro exemplo das influências ambientais alterando o que normalmente é considerado um processo controlado interna e autonomicamente. Nesse procedimento, um CS (um sabor singular) é emparelhado com uma droga US droga que suprime o funcionamento do sistema imunológico, como, por exemplo, a produção de anticorpos (observe que drogas como a ciclofosfamida são usualmente administradas para suprimir a rejeição de um órgão transplantado). Depois de vários pareamentos o CS é apresentado sozinho e a reação do sistema imunológico é medida. Ader e Cohen (1981, 1985, 1993) foram os primeiros a investigar e sustentar sistematicamente esse fenômeno. Claramente a próxima questão é: o sistema imunológico pode também ser condicionado para aumentar a reação imunológica? Parece que sim. Em um estudo com humanos Buske-Kirschbaum, Kirschbaum, Stierle, Jabaij e Helhammer (1994), depois de emparelhar um sabor CS e uma injeção de adrenalina US, subsequentemente aumentaram a produção de células NK (assassinas naturais) pela apresentação do sabor sozinho. A questão do aprimoramento condicionado do sistema imunológico também se aplica à descoberta dos efeitos placebo. Como pode uma substância neutra, um placebo, ter algum efeito no bem-estar fisiológico de uma pessoa? Muitos estudos têm mostrado que grupos que recebem uma pílula de açúcar reagem tão bem quanto aqueles do grupo de tratamento legítimo (Brody, 2000). Como isso pode ser possível quando um placebo, que por definição, não pode causar nenhuma mudança? A conclusão óbvia é que há condicionamento respondente ocorrendo. Um CS, digamos a “crença” do paciente (resultado da experiência com médicos e medicações) de que está recebendo tratamento, é apresentado e esse estímulo verbal age como um placebo para eliciar o mecanismos de melhora, CR. Mesmo cirurgias simuladas de artroscopia para artrite são tão funcionais quanto cirurgias verdadeiras, e claro, com muito menos efeitos colaterais e menor custo (Moseley, O’Malley, Peteresen, Menke, Brody, Kuykendall et al., 2002). Uma Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 33 3 coisa que esse tipo de estudo indica é que há muito mais interação nos dois sentidos entre o ambiente e mecanismos fisiológicos do que sesuspeitava. Os organismos são adaptáveis e aprendem. Parece que os órgãos (e.g. glândulas salivares) e sistemas orgânicos (e.g. sistema imunológico) também podem alterar suas funções como resultado de experiência. Mas, é óbvio que precisamos de mas pesquisas para ampliar e validar esses tópicos. SESSÃO AVANÇADA: Condicionamento Complexo ______________________________________________________________ ASPECTOS DO CONDICIONAMENTO COMPLEXO ______________________________________________________________ Condicionamento e Estímulos Compostos Até agora examinamos as relações entre CS e US de forma isolada, ignorando em sua maior parte o contexto ou fundo nos quais os eventos acontecem. Para investigar os efeitos do contexto no condicionamento respondente, os pesquisadores têm arranjado situações que envolvam estímulos compostos. Nesses casos, e para manter as coisas de certa forma simples, dois estímulos condicionados (e.g. som e luz) são apresentados juntos antes (atrasado) ou durante (simultaneamente) um US. Esse arranjo de dois estímulos controláveis (CSs compostos) apresentados juntos pode ser mostrado para adquirir a capacidade de eliciar uma única resposta condicionada. Em um exemplo cotidiano, o odor de comida em uma padaria ou restaurante provavelmente se torna um CS para a salivação, tendo sido emparelhado com roscas ou hambúrgueres e fritas (US). Mas outros estímulos relacionados como o nome, o funcionário, a localização da loja e outros sinais externos também são pareados com o comer. Esses aspectos adicionais da experiência do fast food tornam-se estímulos condicionados que funcionam como o contexto (CS composto) que evoca a salivação. As diferenças nos procedimentos de condicionamento relacionados aos estímulos compostos resultam nos processos comportamentais chamados de pré-condicionamento sensorial, bloqueio e sombreamento. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 34 3 Sombreamento Pavlov (1960) foi quem primeiro descreveu o sombramento (n.t. overshadowing). Um estímulo composto consistindo em dois ou mais estímulos simples são apresentados ao mesmo tempo. Por exemplo, uma luz fraca e um som forte (CS composto) podem ser apresentados ao mesmo tempo e emparelhados com um estímulo incondicionado como a comida. Pavlov descobriu que o estímulo mais saliente ou marcante do estímulo composto passa a regular a resposta condicionada de forma exclusiva. Nesse caso o som alto e não a luz fraca se tornará um CS e eliciará a salivação. Se diz então que o tom sombreou o condicionamento à luz. Isso acontece mesmo quando a luz fraca poderia ter funcionado como um CS se tivesse sido originalmente apresentada e emparelhada com um US. Bloqueio Kamin (1969) relatou um efeito relacionado ao ofuscamento que também envolvia os estímulos compostos. Esse efeito é chamado de bloqueio (n.t. blocking) e descreve a situação em que um CS emparelhado com um US bloqueia a associação CS-US subsequente. No bloqueio, um CS é emparelhado com um US até que a resposta condicionada atinja o sua força máxima. Após esse condicionamento, um segundo estímulo é apresentado ao mesmo tempo em que o CS original, e ambos são emparelhados com o estímulo incondicionado. Em tentativas teste, o CS original evoca a CR mas o segundo estímulo não. Por exemplo, um som (CS) pode ser associado com a comida (US) até que o som seguramente evoque salivação. Em seguida, o som mais uma luz são apresentados juntos como um CS composto e os dois são associados à comida (US). Em tentativas teste, o som eliciará salivação, mas a luz não. O som previamente condicionado bloqueia o condicionamento do estímulo luminoso. Kamin (1969) usou um procedimento chamado de supressão condicionada (veja Estes & Skinner, 1941). Na supressão condicionada um Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 35 3 estímulo previamente neutro (e.g. som, luz, etc.) é emparelhado com um US aversivo como um choque elétrico. Depois de vários emparelhamentos, o estímulo originalmente neutro transforma-se em um estímulo aversivo condicionado (CSave). Diz-se que o CSave elicia uma resposta emocional condicionada (CER) que é comumente chamada de ansiedade ou medo. Uma vez que o CSave tenha sido condicionado, seus efeitos podem ser observados por mudanças no comportamento operante de um organismo. Por exemplo, um rato pode ser treinado a pressionar uma barra por comida. Depois que uma taxa estável de respostas é estabelecida, o CSave é introduzido. Quando isso ocorre, o comportamento do animal de pressionar a barra é interrompido, presumivelmente por causa da CER eliciada pelo CSave. Basicamente podemos dizer que o CSave amedronta o animal fazendo-o parar de pressionar a barra. A supressão condicionada é um procedimento largamente utilizado no condicionamento respondente, e como você verá adiante, importante no estudo das emoções humanas. Usando um procedimento de supressão condicionada, Kamin (1969) descobriu o fenômeno do bloqueio. Dois grupos de ratos foram usados: um grupo bloqueio e um grupo controle. No grupo bloqueio, os ratos foram apresentados a um som (CSave) que foi associado com choques elétricos por 16 tentativas. Em seguida os ratos receberam 8 tentativas durante as quais os estímulos compostos de luz e som eram seguidos pelo choque. O grupo controle não recebeu as 16 tentativas de condicionamento luz-choque, mas foram expostos às 8 tentativas de som e luz emparelhados com o choque. Ambos os grupos foram testados para supressão condicionada da pressão à barra na presença da luz. Isto é, a luz era apresentada sozinha e a supressão da pressão à barra por comida indicava a ocorrência da CER. Kamin descobriu que a luz suprimiu a pressão à barra no grupo controle mas não afetou a pressão à barra do grupo de bloqueio. Em outras palavras, o condicionamento anterior com o som bloqueou ou impediu o condicionamento à luz. Funcionalmente, a luz era o CSave no grupo controle, mas não no grupo de bloqueio. Análise do Comportamento e Aprendizagem Pierce & Cheney Comportamento Reflexivo e Condicionamento Respondente 1 36 3 O bloqueio e o sombreamento podem, também, ser interpretados como casos de estímulos redundantes. Se dois ou mais estímulos forem emparelhados com o mesmo US então somente um único elemento do composto é necessário para eliciar a CR. Nós geramos intencionalmente estímulos compostos (na verdade dificilmente podemos evitá-los) de tal forma que algum ou outro aspecto do ambiente acaba ganhando propriedades eliciadoras. Todas as manipulações de estímulos são conduzidas em algum lugar, seja no laboratório ou em outro local, e elementos daquele ambiente serão emparelhados com o estímulo de interesse. É a repetida, consistente e previsível natureza do emparelhamento CS-US específico que tende a restringir a conexão com apenas alguns estímulos. Pré-Condicionamento Sensorial O pré-condicionamento sensorial é um outro exemplo de controle de estímulos por eventos compostos. Nesse caso, dois estímulos como a luz e o som são repetidamente apresentados juntos sem a ocorrência de um US conhecido – isso é chamado de pré-condicionamento. Mais tarde, um desses estímulos é emparelhado com um estímulo incondicionado por várias tentativas e então outro estímulo é testado para o condicionamento. Mesmo que esse segundo estímulo nunca tenha sido associado diretamente com o US, ele elicia a resposta condicionada (Brogden,
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