Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
I – INTRODUÇÃO AO PROCESSO PENAL 1 – Conceito: O processo penal confere efetividade ao direito penal, fornecendo os meios e o caminho para materializar a aplicação da pena ao caso concreto. Processo penal é o meio pelo qual se resolve o conflito (pena, envolvendo crime ou contravenção) e pelo qual se exerce a jurisdição (só o juiz possui jurisdição: poder do Estado em aplicar a pena ao caso concreto). Válter K. Ishida Sendo assim, o direito material é a substância do direito, as normas, leis, representadas pelos Códigos. Já o direito formal (ou adjetivo) é o processo, que contém uma série de outras normas que conduzem a maneira de obter o direito material, sendo representado pelos códigos processuais. A pretensão punitiva surge toda vez que alguém pratica um determinado delito, podendo o Estado exigir que essa pessoa sacrifique sua liberdade para que prevaleça a punição estatal. E para solucionar o litígio, é sempre necessário o processo, pois o Estado não pode autoaplicar a norma penal, mesmo que haja a concordância de quem cometeu o delito. 2 – Finalidade Imediata: O Direito Proc. Penal viabiliza a aplicação do direito penal, concretizando-o. A finalidade do processo é a adequada solução jurisdicional ao conflito de interesses entre o Estado (normalmente representado pelo MP) e o infrator (indivíduo que cometeu o crime), através de uma sequência de atos que compreendem a formulação da acusação, (normalmente através da denúncia do MP), a produção das provas (ouvindo-se testemunhas), o exercício da defesa e o julgamento da lide (sentença criminal). 3 – Natureza Jurídica do Direito Processual Penal: Público, uma vez que um dos sujeitos da relação é o Estado Soberano. (o direito de punir – jus puniendi – é exclusivo do Estado) 4 – Características do Direito Processual Penal: a) Autonomia: Tem regras e princípios próprios distintos do direito material (penal) que são dispostos no CPP; b) Instrumentalidade: É o meio para fazer atuar o direito penal; c) Normatividade: Tem disciplinamento normativo disposto no CPP. 5 – Processo: É o meio para a solução dos conflitos de interesses. PROCESSO: PROCEDIMENTO + RELAÇÃO JURÍDICA PROCESSUAL (aspecto objetivo do processo) (aspecto subjetivo do processo) 5.1 Procedimento: É a sequência de atos praticados no processo. 5.2 Relação Jurídica Processual: a) Sujeitos processuais: partes e o magistrado; b) Objeto da relação: provimento jurisdicional desejado (aplicação de uma pena por meio de uma decisão); c) Pressupostos processuais: c.1 Relativos ao juiz: Investidura: Estar investido no cargo de Juiz em conformidade com a CF/88; Competência: É o limite legal dentro do qual o juiz poderá atuar; Ausência de suspeição: Deve haver imparcialidade necessária para o exercício da atividade jurisdicional. (hipóteses de suspeição e impedimento: 252/254, CPP) c.2 Relativo às partes: Obs.: Na ação penal pública, o MP possui capacidade de ser parte, estar em juízo e nele postular. Capacidade de ser parte: Capacidade para contrair obrigações e exercer direitos; Obs.: A capacidade para ser parte passiva no processo penal dá-se a partir dos 18 anos, considerada à época da ocorrência dos fatos. Capacidade postulatória: Necessária para o pleito judicial por conduto de advogado. 6 – Sistema Processual: O processo penal brasileiro adotou o sistema Acusatório para apuração da culpa. Somente o Poder Judiciário, através de seus órgãos, pode avaliar a responsabilidade criminal de alguém (art. 5º, XXXV, CF) No sistema acusatório, a gestão das provas é função das partes, cabendo ao juiz um papel de garante das regras do jogo, salvaguardando direitos e liberdades fundamentais. Diversamente do sistema inquisitorial, o sistema acusatório caracteriza-se por gerar um processo de partes, em que autor e réu constroem através do confronto a solução justa do caso penal. A separação das funções processuais de acusar, defender e julgar entre sujeitos processuais distintos, o reconhecimento dos direitos fundamentais ao acusado, que passa a ser sujeito de direitos e a construção do caso pelas partes em igualdade de condições, são assim, as principais características desse modelo. Características: a) Separação entre as funções de acusar (MP), defender (réu) e julgar (juiz); b) Os princípios do contraditório, ampla defesa e publicidade regem todo o processo; c) O órgão julgador é dotado de imparcialidade; d) liberdade de acusação, reconhecido o direito ao ofendido e a qualquer cidadão; e) prevalece a oralidade nos procedimentos; f) predomina a liberdade de defesa e a isonomia entre as partes no processo; g) livre sistema de produção de provas; h) a liberdade do réu é a regra. (Lei n. 12.403/11) Obs.: No sistema inquisitório, as funções de acusar, defender e julgar encontram-se enfeixadas em uma única pessoa – o juiz inquisidor. A ação iniciava-se ex officio por ato do juiz e não havia contraditório. 7 – Fontes (Locais de onde provém o direito): Classificação: a) Fonte material: É a que elabora a norma. A competência para legislar sobre direito processual penal é da UNIÃO (art. 22, I, CF). Portanto, a única fonte material é a União. Mas os Estados poderão legislar em caráter complementar, somente em questões específicas, desde que o Estado esteja autorizado por lei Complementar (p. ú, art. 22, CF) b) Fonte formal: b.1 imediata ou direta: leis (em sentido amplo: CF/88 (art. 5º - normas processuais penais), CPP, LEP, Lei dos Juizados Especiais Criminais), tratados e convenções internacionais (art. 5º, §§2º e 3º, CF). b.2 mediata, indireta ou supletiva: Costumes, princípios gerais do direito, doutrina e jurisprudência. b.2.1 Costumes (art. 4º, LINDB): São regras de conduta praticadas de modo geral, constante e uniforme com a convicção de sua obrigatoriedade; b.2.2 Princípios gerais do direito (art. 3º, CPP): São premissas éticas extraídas da legislação e do ordenamento jurídico em geral. São estabelecidos de acordo com a consciência ética do povo. 8 – Integração do processo penal: Se houver lacunas nas normas processuais, há métodos para seu preenchimento. 8.1 Analogia (art. 3º, CPP e 4º, LINDB): “A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais do direito”. A analogia é meio de integrar a norma, estendendo sua aplicação para casos não previstos pelo legislador. O art. 3º do CPP admite interpretação extensiva e analogia. Pela analogia, aplica-se a um fato regido pela norma jurídica disposição aplicada a fato semelhante. Em face da omissão involuntária da lei, aplica-se norma que disciplina fato análogo. A analogia pode ser feita in bonam partem (em benefício do agente) ou in malam partem (em prejuízo do agente). No Direito Penal, somente é admitida a analogia em bonam partem, sendo vedada a analogia in malam partem. No entanto, no processo penal, a analogia pode ser feita livremente, sem restrições, pois ela não envolverá uma norma penal incriminadora. Obs.: Gustavo Henrique Badaró sustenta que o art. 3º do CPP não se aplica a normas que restrinjam a liberdade pessoal do acusado ou de qualquer outro direito de defesa. Como decorrência das garantias constitucionais da presunção de inocência e da ampla defesa, as disposições de leis processuais penais que limitem ou restrinjam a liberdade do acusado ou o exercício do direito de defesa devem receber interpretação restritiva, ou seja, estão proibidas a interpretação extensiva e a analogia, salvo em bonam patê, isto é, em favor do acusado ou para beneficiá-lo. Ex.: aplicação das normas pertinentes à sucessão ao cônjuge sobrevivente ao companheiro(a) na união estável; aplicação da Lei n. 7.783/89, que regula a greve no setor privado, ao serviço público, por analogia; aplicação das normas relativas à união estável entre heterossexuais à união estável homoafetiva. 8.2 Costumes e princípios gerais do direito (art. 4º, LINDB): Embora sejam inicialmente fontes, podem ser utilizados como forma de preenchimento da lacuna do ordenamento jurídico processual penal por expressa permissão da lei. Alguns princípios gerais: Todos devem ser tratados como iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza; Todos são inocentes até prova em contrário; Ninguém deverá ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Nenhuma pena deverá passar da pessoa do condenado; Aos acusados em geral devem ser assegurados o contraditório e a ampla defesa; A propriedade deve cumprir sua função social; (art. 182, §2º; 186, CF) Deve-se pugnar pela moralidade administrativa; Falar e não provar é o mesmo que não falar; Ninguém pode causar dano e quem o causar terá que indenizar; Supremacia do interesse público sobre o interesse privado; Ninguém deve ser punido por seus pensamentos; Ninguém é obrigado a citar os dispositivos legais nos quais ampara sua pretensão, pois se presume que o juiz os conheça; RESUMO: Jus Puniendi: Direito do Estado de aplicar a pena. Processo é o meio pelo qual se resolve o conflito e pelo qual se exerce a jurisdição. Direito Processual Penal é ramo do direito Público porque o direito de punir é exclusivo do Estado; um conjunto de normas e princípios que regulam a aplicação da jurisdição, a sistematização dos órgãos judiciários e auxiliares e a persecução penal. Tem-se como maior desafio do Direito Processual contemporâneo estabelecer um equilíbrio entre o direito de punir do Estado e o direito de liberdade do réu. NORMA PROCESSUAL NO TEMPO E NO ESPAÇO 1 – Lei Processual no Espaço (art. 1º, CPP) As normas do processo penal são essencialmente territoriais; portanto, têm aplicação tão-somente nos limites físicos do Estado que a editou. Todavia, há exceções. O próprio Código de Processo Penal ressalva algumas hipóteses em que seus dispositivos não se aplicam: a) tratados, convenções e regras de direito internacional. (inc. I) A lei processual penal não incide porque o crime será julgado por algum organismo internacional, a exemplo do TPI, criado pelo Estatuto de Roma em 17/07/98, aprovado no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 112/02, com jurisdição subsidiária, no sentido de que deve atuar apenas quando o país competente não faz valer a lei penal, especialmente nos crimes de guerra e contra a humanidade. b) as normas do CPP não incidirão nos casos de processos por crime de responsabilidade (Lei n. 1.079/50; ex.: art. 85 e 100, §7º; CF) em que devem ser observadas as prerrogativas do Presidente da República e outras autoridades (art. 52, I e II, CF, p. ex.); nos processos de competência da Justiça Militar (pois incide o CP Militar e o CPP Militar) e nos crimes de imprensa (inc. II, III, IV) (neste último caso, o STF, no julgamento da ADPF n. 130/DF, julgou pela não recepção ou revogação de toda essa lei, daí porque para esses casos, deve haver a aplicação direta do procedimento previsto no CPP). Desta forma, vigora o Princípio da Territorialidade, onde a lei processual penal se aplica a todas as infrações cometidas em território brasileiro. Territorialidade penal: Se o réu praticou o crime em território brasileiro, aplica-se a lei penal e para se processar o acusado, utiliza-se a lei processual penal brasileira. Então, aplicado o direito penal no território brasileiro, por consequência, aplica-se o direito processual penal brasileiro. 2 – Lei Processual no Tempo (art. 2º, CPP): “A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”. A lei processual penal tem aplicação IMEDIATA, ou seja, tem incidência desde logo, imediatamente após sua entrada em vigor, atingindo os processos que já estão em andamento, pouco importando se traz ou não situação gravosa ao réu. A aplicação do Princípio “Tempus Regit Actum” (o tempo rege o ato) vigora em nosso ordenamento jurídico, significando que a lei processual penal provê apenas para o futuro, mantida a validade dos atos já praticados sob a égide da lei anterior. Os atos anteriores já praticados antes da vigência da lei processual penal nova continuam válidos, por respeito ao ato jurídico perfeito, direito adquirido e a coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF/88) Do referido princípio decorrem três consequências: a) a irretroatividade da lei processual penal; b) a sua aplicação imediata, ainda que seus efeitos sejam mais gravosos; c) a validade dos atos já praticados; i) normas de direito penal: não retroagem, salvo para beneficiar o réu. Lei vigente no momento do delito. ii) normas de direito processual penal: têm aplicação imediata. Lei do tempo da prática do ato (tempus regit actum). Obs.: A doutrina e a jurisprudência foram identificando que no decurso da aprovação de normas processuais penais, algumas delas tinham relação direta com o direito de locomoção, o direito de punir do Estado, bem como garantias asseguradas aos acusados. São as denominadas normas processuais penais heterotópicas ou de efeitos materiais. Tem-se como norma heterotópica aquela que, mesmo contida no diploma processual, possui conteúdo de direito material, ou seja, assegura direitos e, dessa forma, retroage caso beneficie o réu. Como exemplo, podemos citar as normatizações relativas à prisão do réu ou à concessão de liberdade provisória, pois ainda que embutidas no CPP, possuem conteúdo material, uma vez que dizem respeito à garantia constitucional da liberdade. RESUMO: Pacificou-se o entendimento de que a aplicação das regras do direito material, se de alguma forma trouxer algum benefício ao investigado ou processado, deverá retroagir. Ex.: João estava preso preventivamente, pois presentes os requisitos da prisão preventiva decretada em um determinado momento. A Lei n. 12.403/11 introduziu medidas cautelares diversas da prisão. Trata-se de norma processual. Todos os processos em que os réus estavam presos preventivamente tiveram que passar por uma revisão dos juízes para apurar se não seria mais adequada a aplicação de medida cautelar. Neste caso, retroage, pois tem íntima ligação com o direito de locomoção. Obs.2: Os processos que já estão com a fase instrutória iniciada quando a lei nova entrou em vigor deverão seguir sob o império da lei processual penal anterior.
Compartilhar