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Capítulo 5 43 Jorge M. Buchdid Amarante Princípios de Imunização 55 INTRODUÇÃO Imunidade é a habilidade do organismo de tolerar a pre- sença de material que compõe estruturalmente o corpo humano (self) e de eliminar materiais estranhos a ele. Essa habilidade discriminatória leva à proteção contra as doenças infecciosas, visto que muitos microrganismos são identificados pelo sistema imune como estranhos ao self estrutural que compõe o corpo humano. Existem dois mecanismos básicos para se adquirir imunidade – mecanismo ativo e mecanismo passivo. Chamamos imunidade ativa a proteção que é produzi- da pelo próprio sistema imune do indivíduo, e esse tipo de imunidade é com freqüencia de natureza permanente. Chamamos imunidade passiva a proteção induzida pela administração de produtos produzidos externamente àquele organismo, podendo portanto ser transferida de um para o outro. Habitualmente, esse tipo de imunidade tem na- tureza temporária, não perdurando no organismo e nem sendo “arquivada” para resposta posterior quando da nova exposição ao agente do qual se quis proteger. O sistema imune é um complexo imbricado de células que interagem entre si e cujo objetivo final é a identifica- ção de substâncias que não fazem parte da estrutura orgâ- nica, que são conhecidas como antígenos. Os antígenos podem ser vivos, como ocorre com vírus e bactérias, ou substâncias inativadas. A via de atuação é desenvolver a defesa orgânica contra esses antígenos. Essa defesa é conhe- cida como resposta imune e se caracteriza pela produção de substâncias protéicas conhecidas como anticorpos ou imunoglobulinas. O sistema imune também se compõe de células específicas, que medeiam a imunidade celular, cujo propósito é facilitar a eliminação de substâncias estranhas ao organismo que se quer proteger. As respostas imunes mais eficazes são geralmente as produzidas em resposta a um antígeno vivo; entretanto um antígeno não necessariamente precisa estar vivo para que ocorra esta resposta. Algumas proteínas, como o antígeno de superfície do vírus da hepatite B, são facilmente reco- nhecidas pelo sistema imune, ao passo que outros antíge- nos, como os polissacarídeos (cadeias longas de uma mo- lécula de açúcar que fazem parte da estrutura da parede celular bacteriana), são menos efetivos e o sistema imu- ne pode não ser ativado de maneira a produzir a proteção adequada. IMUNIDADE PASSIVA A imunidade passiva é a transferência de proteção con- seguida por um organismo, humano ou não, para um ou- tro organismo. Como característica tem natureza temporária, haven- do a degradação dos anticorpos ao longo de semanas ou poucos meses, tornando o indivíduo novamente susceptí- vel àquele antígeno. A forma mais comum de imunidade passiva é a que ocorre com o recém-nascido por ocasião da recepção de anticorpos maternos ao longo da gestação. Esses anticor- pos são transferidos da mãe, pela placenta, principal- mente nos últimos um a dois meses da gravidez. Como re- sultado, uma criança de termo terá o mesmo perfil anti- córpico materno que irá protegê-la por até um ano após o nascimento. A proteção é mais eficiente contra algumas doenças (sarampo, rubéola e tétano) do que contra outras (poliomielite e coqueluche). Anticorpos humanos homólogos são conhecidos como imunoglobulinas e produzidos pela combinação agrupada (pooling) da fração IgG de anticorpos oriunda de milhares de pessoas adultas doadoras. Como é originário de muitos doadores diferentes, o produto contém anticorpos contra muitos antígenos diferentes. Esses produtos são principal- 44 Capítulo 5 mente utilizados para profilaxia pós-exposição contra he- patite A e sarampo. Por outro lado, as globulinas hiperimunes humanas homólogas são produtos contendo altos títulos de anticor- pos específicos contra um determinado agente ou antíge- no. Esses produtos são sintetizados a partir de plasma de doadores que apresentam altos níveis do anticorpo de in- teresse. Entretanto, como essas globulinas são de origem humana, obviamente, esses produtos também apresentam pequenas quantidades de anticorpos contra outros antíge- nos. As imunoglobulinas hiperimunes são utilizadas para a profilaxia pós-exposição para várias doenças, incluindo a hepatite B, a raiva, o tétano e a varicela. O soro hiperimune heterólogo ou antitoxina é um pro- duto oriundo de animais, mais freqüentemente cavalos, e contém anticorpos contra somente um antígeno. Exemplos de antitoxinas são as empregadas para o tratamento de bo- tulismo e difteria. Esses produtos, por serem heterólogos, ou seja, não serem produzidos em humanos, podem trazer como conseqüência a doença do soro, reação produzida pela anticorpogênese induzida pela administração de pro- teínas do cavalo. IMUNIDADE ATIVA A imunidade ativa é a estimulação do sistema imune para a produção humoral (anticorpos) específica contra um antígeno com envolvimento da imunidade celular. Ao contrário da imunidade passiva, a imunidade ativa não é temporária, sendo permanente. Uma das maneiras de se adquirir imunidade ativa é apresentando a infecção natural por um agente infeccio- so, e, em geral, quando da recuperação da doença, a imu- nidade permanece. Esta persistência da proteção por toda a vida é conhecida como memória imunológica. Se- guindo-se a exposição do sistema imune a um agente in- feccioso, certas células, conhecidas como células B de memória (linfócitos B), continuam a circular na corren- te sangüínea, além de residirem na medula óssea por muitos anos. Após a reexposição ao antígeno, essas cé- lulas de memória iniciam um processo replicativo e produzem anticorpos muito rapidamente, reestabele- cendo a proteção necessária. Outra maneira de se produzir imunidade ativa é com o uso de vacinas. As vacinas interagem com o sistema imu- ne e freqüentemente produzem resposta semelhante à pro- duzida pela infecção natural, mas sem os riscos desta. As vacinas produzem, na maior parte das vezes, memória imunológica semelhante à que ocorre com a infecção na- tural. Como regra, quanto mais próxima uma vacina da doen- ça natural que ela tenciona proteger, mais potente será seu efeito protetor. Muitos fatores influenciam a resposta imune à vacina- ção. Nesses estão incluídas a presença de anticorpos ma- ternos, a natureza do antígeno, a dose administrada, a via de administração e a presença de adjuvantes (por exem- plo, materiais contendo alumínio adicionados às vacinas, para aumentar sua potência). Fatores do hospedeiro como idade, estado nutricional, genética e doença co-existente podem também afetar a resposta do organismo. CLASSIFICAÇÃO DAS VACINAS Existem dois tipos básicos de vacinas: vacinas com an- tígenos vivos e vacinas com antígenos inativados. As carac- terísticas entre elas são diferentes e determinam a manei- ra como devem ser utilizadas. VACINAS COM ANTÍGENOS V IVOS ATENUADOS São vacinas produzidas pela modificação do compor- tamento biológico de um agente causador de uma doença infecciosa (vírus ou bactéria). O agente vacinal resultante permanece com habilidade replicativa e com potencial de produzir imunidade, mas perde seu potencial patogênico de causar a doença. Em geral o processo de atenuação ocorre pelo cultivo repetido do agente em laboratório; a cepa vacinal do sa- rampo por exemplo foi conseguida a partir do isolamen- to de uma criança com sarampo em 1954. Foram necessá- rios quase dez anos de passagem seriada em meios de cul- tura de tecido para transformar o vírus selvagem em vírus atenuado vacinal. Existem vacinas com antígeno vivo atenuado contra vírus e bactérias. A resposta imunitária conseguida com uma vacina de vírus vivo atenuado é praticamente idêntica à produzida pela infecção natural. O sistema imune não diferencia ví- rus atenuados de selvagens para montar o cerne da respos- ta imune, mas em virtude da capacidade replicativa doví- rus vacinal ser habitualmente inferior a que ocorre na in- fecção natural, o teor anticórpico induzido pela vacina ge- ralmente é inferior ao conseguido pela infecção natural. As vacinas de vírus vivos atenuados podem causar rea- ções fatais ou graves como resultado de uma replicação descontrolada, simulando a infecção natural. Esse fato so- mente ocorre em indivíduos imunodeprimidos, seja qual for a natureza dessa infecção (HIV, uso de imunodepresso- res e doenças do sistema linfóide). Uma vacina com vírus vivo atenuado pode teoricamen- te ter o vírus revertido para sua condição replicativa e pa- togênica inicial (causador de doença), mas isto só se iden- tificou até o momento com a vacina oral contra a polio- mielite (Sabin). Vale ressaltar que a imunidade induzida pelas vacinas pode não se desenvolver devido a interferência de anticor- pos circulantes ao vírus vacinal. Um dos agentes mais sen- síveis a esse efeito é o vírus vacinal do sarampo. Os vírus vivos atenuados são lábeis e podem ser dani- ficados pelo calor e pela luz. Produtos que contenham es- ses vírus devem ser acondicionados e manipulados com muito cuidado para não haver a perda da eficiência vacinal. Entre os produtos disponíveis para vacinação com agente vivos atenuados temos as vacinas contra sarampo, caxumba, rubéola, poliomielite, varicela e febre amarela. A vacina contra o rotavírus recombinante vivo está licen- ciada nos EUA, mas não é comercializada devido à sua as- sociação com intussepção intestinal. Outra vacina recen- temente licenciada nos EUA é a vacina com vírus vivo ate- nuado contra o vírus influenza e que é administrada por spray nasal. Vacinas com bactérias vivas atenuadas são aquelas dirigidas contra a tuberculose (BCG) e vacina oral contra a febre tifóide. Capítulo 5 45 VACINAS COM ANTÍGENOS INATIVADOS Estas vacinas podem ser compostas tanto por vírus como bactérias ou frações destas. Vacinas fracionais são constituídas geralmente por polissacarídeos ou proteínas. Vacinas protéicas incluem os toxóides (toxina bacteriana inativada), enquanto as vacinas subunitárias incluem fra- ções virais. A maioria das vacinas polissacarídicas é com- posta de polissacarídeos puros da parede celular da bacté- ria. As vacinas polissacarídicas conjugadas são produtos que se compõem de um núcleo polissacarídico ligado qui- micamente a uma proteína. Essa ligação torna a vacina polissacarídica uma vacina mais potente e capaz de indu- zir memória imunológica. As vacinas inativadas têm inóculo não-replicativo; por- tanto, toda dose que se quer administrar já está presente por ocasião da injeção. Entre as vacinas inativadas, a composição poderá ser protéica ou polissacarídica. As vacinas polissacarídicas compõem-se de produtos contendo moléculas com cadeias longas de açúcar que compõem a superfície da parede celular de certas bacté- rias. As vacinas polissacarídicas puras estão disponíveis contra o pneumococo, o meningococo e o Haemophilus influenzae tipo b. Esta última não está mais disponível co- mercialmente. A resposta imune induzida por uma vacina polissaca- rídica é tipicamente independente de ativação de células T, ou seja, essas vacinas são capazes de estimular uma res- posta linfocitária B, sem o auxílio de células T. A conse- qüência disso são respostas anticórpicas com predomínio de IgM e pequena quantidade de IgG, e ausência de ativa- ção de células de memória para posteriormente permitir resposta anamnéstica (tipo booster – títulos anticórpicos progressivamente mais elevados após doses seriadas). No final dos anos 1980, foi descoberto o processo de conju- gação, manobra que altera uma resposta imune celular T- independente para T-dependente, frente a uma vacina polissacarídica, levando a maior imunogenicidade em lactentes e formação de resposta com memória imunoló- gica. A primeira vacina conjugada foi contra o Haemo- philus influenzae tipo b, mas atualmente produtos volta- dos para a proteção contra o pneumococo e contra o meningoco também estão disponíveis. VACINAS RECOMBINANTES As vacinas recombinantes são aquelas em que o antíge- no atuante no produto foi feito por tecnologia de engenha- ria genética. O exemplo mais claro de vacina recombinan- te é o produto para proteção contra hepatite B. As vacinas contra hepatite B são produzidas pela inserção do segmen- to do gene que codifica a síntese do antígeno de superfície viral para ser expressado por uma levedura. O produto fi- nal é extraído e a vacina comercializada. Essa tecnologia de produção de vacinas tem gerado produtos bastante seguros. MOMENTO DE ADMINISTRAÇÃO E ESPAÇAMENTO ENTRE VACINAS Todas as vacinas com inóculo vivo precisam que o agente sofra processo replicativo para que se consiga o efei- to protetor. Quando anticorpos são injetados contra o an- tígeno vacinal, a conseqüência é a perda de eficiência da vacina. Se uma vacina viva atenuada precisa ser adminis- trada em período próximo a uma imunoglobulina, deve ser dado intervalo suficiente para que a imunoglobulina não interfira com a replicação viral da vacina. Se a vacina for a primeira a ser administrada, a imunoglobulina deve ser administrada somente após pelo menos duas semanas de intervalo. Se a imunoglobulina for a primeira a ser admi- nistrada, o intervalo a ser seguido para administração da vacina posteriormente deverá ser programado de acordo com os títulos anticórpicos recebidos. A seguir, na Tabela 5.1, encontram-se alguns exemplos. ADMINISTRAÇÃO SIMULTÂNEA E NÃO-SIMULTÂNEA DE VACINAS Como regra geral, não existe nenhuma contra-indica- ção para a administração simultânea de qualquer vacina, porém, se vacinas de vírus vivo atenuado (sarampo, caxum- ba, rubéola, varicela e febre amarela) forem administradas de maneira não-simultânea, um intervalo mínimo de qua- tro semanas deverá ser respeitado em virtude da interferên- cia que poderá ocorrer na eficácia da segunda vacina. A única exceção para isso é a não necessidade desse interva- lo quando da administração da vacina contra febre amare- la e a contra o sarampo. Essa exceção não se aplica ao uso da vacina combinada do sarampo, caxumba e rubéola. Tabela 5.1 Dose e Administração de Produtos Humanos Correlacionados com as Vacinas Produto Dose Intervalo Sugerido Synagis (Ac. Monoclonal contra VSR) 15 mg/kg IM Nenhum Imunoglobulina antitetânica 250 unidades IM 3 meses Imunoglobulina contra hepatite A 0,02 ml/kg IM 0,06 mL/kg IM 3 meses Transfusão de hemácia lavada 10 mL/kg IV Nenhum Sangue total 10 mL/kg IV 6 meses Plasma/plaquetas 10 mL/kg IV 7 meses Imunoglobulina intravenosa 300-400 mg/kg IV 2 g/kg IV 8 meses 11 meses Os intervalos descritos acima são principalmente relacionados ao uso da vacina tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola) e da vacina contra varicela. Cabe considerar que no caso de gestantes que utilizaram a imunoglobulina anti-Rho(D) no período pós-parto não deverá ser postergada a vacinação contra rubéola nas mulheres susceptíveis, pois a interferência dessa imunoglobulina com a vacina é irrelevante. 46 Capítulo 5 INTERVALO ENTRE DOSES DA MESMA VACINA Quando se administram doses de vacina com interva- los mais longos que os preconizados, não há comprome- timento da eficácia vacinal; porém, quando se administram doses de vacinas com intervalos menores que os recomen- dados, a eficácia vacinal pode ser comprometida. Em geral, se uma diminuição de intervalo entre doses tiver que ser utilizada, considerar que até quatro dias a me- nos no intervalo não trará conseqüências para a eficácia vacinal. Se houver grandes intervalos entre as doses programa- das para uma vacina, por qualquer que seja a razão e para qualquer vacina, o esquema não deverá ser reiniciado em razão desses longos intervalos. VACINAÇÃO DO ADULTO E DE GESTANTES: VACINAS RECOMENDADAS As principais vacinas recomendadas para adultos, e in-clui-se nessa perspectiva também a mulher grávida, são as que se seguem: TÉTANO E D IFTERIA É uma das vacinas rotineiramente recomendadas para uso em adultos e também é freqüentemente recomendada para administração durante a gestação. A vacina combina os toxóides contra o tétano e a difteria. É usada para a imunização primária ou para os reforços em indivíduos previamente imunizados. Na Europa e nos EUA, o tétano obstétrico e umbilical praticamente desapareceu, entretanto, essa doença tem sido bastante freqüente em países da África, Ásia e Améri- ca do Sul. Na Índia, os coeficientes de morbidade indicam que 8 a 30% dos casos de tétano ocorrem em recém-nas- cidos. El-Sherbini descreve que no Egito o Ministério da Saúde local notifica somente 10% dos casos de tétano neonatal e que o uso da vacinação da gestante a partir do ano de 1989, sob forma de campanha pública, fez cair sig- nificativamente o número de internações e a gravidade do tétano neonatal. No Brasil, a cobertura vacinal de gestan- tes, em 1989, com o toxóide tetânico foi de 29%. Com base nos coeficientes de mortalidade da Organi- zação Mundial da Saúde (OMS) em 14 países sob vigilân- cia dessa entidade, estima-se que ocorram cerca de 500.000 mortes/ano causadas pelo tétano neonatal. Admi- tindo um coeficiente de mortalidade atribuída de 85%, pode-se estimar que ocorrem cerca de 600.000 casos/ano de tétano neonatal nesses países. Nos EUA, entre 1986 e 1989, ocorreram 48 a 64 casos/ ano de tétano, acometendo quase exclusivamente indiví- duos não imunizados ou inadequadamente vacinados. No período de 1982-1989, indivíduos maiores de 20 anos de idade totalizaram 95% dos 513 casos relatados no perío- do, e desses 59% eram maiores de 60 anos de idade. Tais números mostram que aproximadamente 30-35% dos ca- sos incidiram em indivíduos entre 20 e 60 anos, sendo que 6 a 11% ocorreram em pessoas entre 18 e 39 anos, que compreendem a faixa mais abrangente do período repro- dutivo. Esses dados mostram que as gestantes não imunes dariam à luz uma criança sem nenhuma imunidade ao té- tano e que permaneceria suscetível à doença pelo menos até o quarto mês de vida, e qualquer descuido em relação ao coto umbilical poderia trazer conseqüências absoluta- mente evitáveis. Dado mais alarmante é que 81% das pessoas que desen- volveram tétano após um ferimento e que procuraram atendimento médico não receberam profilaxia adequada conforme as recomendações correntes. A administração correta do toxóide leva à proteção em praticamente 100% dos casos. Quando se faz necessária a imunização passiva, a imunoglobulina hiperimune contra o tétano (IgT) na dose de 250 U IM deve ser usada sem contra-indicações durante o período gestacional. Em 1927, Ramon recomendou que a mulher grávida se imunizasse contra o tétano de maneira a transferir passi- vamente, por via placentária, anticorpos para o feto, ha- vendo proteção contra o tétano neonatal. Desde então, vá- rios estudos têm confirmado a transmissão da imunidade materna para o feto, assim como a total segurança dessa vacina. Por tais motivos, hoje a OMS recomenda a vacina- ção antitetânica durante a gestação. Em relação à difteria, recentemente, entre 1993 e 1995, se descreveu uma epidemia nos novos Estados Indepen- dentes da antiga União Soviética (Moscóvia, Ucrânia, Armênia, Estônia, Lituânia, entre outros dos 14 novos Es- tados), acometendo crianças e adultos. A prevenção dessa doença é realizada com o toxóide diftérico, habitualmen- te combinado com o toxóide tetânico, quando para uso em adultos (dT – dupla adulto). O uso deve ser preferivel- mente combinado, pois já documentou-se que a ausência de anticorpos contra a toxina diftérica com freqüência acompanha-se da ausência de anticorpos contra a toxina tetânica. Devem ser administradas duas doses da vacina dupla no adulto (dT), sendo a primeira administrada o mais precoce possível e com intervalo não inferior a quatro semanas da segunda dose (idealmente oito a dez sema- nas). No caso de gestantes, devemos ter o cuidado de re- alizar esta última, pelo menos duas a quatro semanas an- tes da data prevista do parto. É nas últimas semanas da gestação que ocorre a transferência dos anticorpos sinte- tizados por ocasião da vacinação, e se a segunda ou ter- ceira dose for administrada muito próxima ao parto não haverá tempo para essa transferência. O intervalo para a administração da terceira dose do esquema primário é de seis a 12 meses após a segunda. Aplicadas três doses, um único reforço deve ser adminis- trado a cada cinco a dez anos. No adulto já imunizado com o esquema primário da infância ou durante qualquer pe- ríodo da fase adulta, somente uma dose de reforço deve ser administrada ao final de dez anos, mas no caso de gestan- tes, deve ser administrada em torno do quarto mês da ges- tação ou com pelo menos um mês de antecedência à data provável do parto. A Tabela 5.2 resume a conduta em relação ao uso da vacina contra a difteria-tétano (dT) em adultos e durante a gestação, e a Tabela 5.3, as recomendações de vacina após exposição de risco para o tétano Capítulo 5 47 INFLUENZA A gripe pode ser causada por dois tipos de vírus: in- fluenza A e influenza B, e quando da ocorrência de uma epidemia, notamos aumento significativo da mortalidade, principalmente nos grupos de maior risco, como os indi- víduos idosos (> 65 anos de idade) e indivíduos com doen- ças pulmonares ou cardiopatias crônicas, tendo assim como indicação primordial essa população de pessoas. A vacina é composta por vírus inativados e duas apresenta- ções são disponíveis: vacina com o vírion completo e a va- cina com partículas subvirais purificadas (split-virus vaccine). A eficácia vacinal é de 70 a 80% e é administra- da aos adultos em dose única, que deve ser repetida anual- mente em razão da considerável variação antigênica que ocorre principalmente nos vírus influenza A. Consideração especial deve ser feita em uma popula- ção específica de adultos – as gestantes. As mulheres grá- vidas, assim como aquelas que apresentem as patologias de risco anteriormente mencionadas, devem ser imunizadas, pois a vacina é considerada segura para uso durante a ges- tação. Estudos recentes indicam que a mulher durante o ter- ceiro trimestre ou puerpério, mesmo na ausência de fatores de co-morbidade associada, tem maior risco para compli- cações e hospitalização em razão da infecção pelos vírus in- fluenza. Tal achado levou à recomendação de vacinação ro- tineira as mulheres com mais de 14 semanas de gestação e que estarão passando pela estação de gripe, que, no Brasil, começa no mês de março e se estende até o final de setem- bro. Os efeitos adversos da vacina são relativamente raros, consistindo em dor e induração no local da aplicação, ocor- rendo nos primeiros dois dias após sua administração. Rea- ções sistêmicas como mal-estar e mialgias também são pas- síveis de ocorrer, mas relatos de gripe após a vacina são me- ramente coincidências e jamais se relacionam a ela. SARAMPO A vacina do sarampo é produzida com vírus vivo ate- nuado e foi introduzida em 1963 para uso nos EUA e pro- tege cerca de 95% dos vacinados adultos, induzindo imu- nidade prolongada. Chui et al., em estudo realizado em uma sociedade de indivíduos com alto índice de vacina- ção contra o sarampo, avaliaram os níveis de anticorpos adquiridos passivamente, em crianças de 2-12 meses nas- cidas de mães imunizadas na infância. Eles concluíram que 93% dessas crianças já não mais apresentavam anticorpos neutralizantes aos seis meses de vida e 100% delas aos 12 meses de idade. Com base em relatos deste tipo, a Acade- mia Americana de Pediatria preconiza, no período entre os quatro a seis anos de idade, uma dose adicional da vacina do sarampo, além das doses habitualmente administradas na infância precoce, e idealmente deve ser usada a vacina que combina o sarampo,a caxumba e a rubéola (tríplice viral). Por ser vacina com vírus vivo atenuado, ela não deve ser administrada no período gestacional. Na mulher não grávida em que é administrada deverá haver a espera de pelo menos 30 dias antes de uma eventual gravidez. RUBÉOLA A vacina contra rubéola é produzida com vírus vivos atenuados e foi introduzida para uso em 1969 e é capaz de induzir imunidade duradoura em 95% dos vacinados. No adulto, o objetivo da vacina é prevenir a rubéola congêni- ta e, conseqüentemente, a síndrome da rubéola congênita. A vacina não deve ser usada durante a gestação, e após sua administração em uma mulher não grávida recomen- da-se que por um mês haja precauções contra a gravidez. Essa recomendação deve ser seguida, apesar de os Centers for Disease Control and Prevention (CDC), em 1988, te- rem monitorado 305 mulheres que acidentalmente foram vacinadas enquanto grávidas ou vieram a engravidar no período dos três meses após a administração da vacina. O resultado dessa amostra mostrou que nenhum dos con- ceptos apresentou a síndrome da rubéola congênita, e hoje o risco estimado para esse tipo de acidente vacinal é me- nor que 1%, e tal ocorrência não deve ser motivo para in- terrupção da gestação. Tabela 5.2 Vacinação contra a Difteria e o Tétano (dT – Dupla Adulto) em Adultos e durante o Período Gestacional* Esquema Vacinal Primário Reforços da Vacina Adultos ou gestantes nunca vacinados Duas doses de dT, administradas com Uma dose 6-12 meses após a segunda dose. previamente contra difteria-tétano intervalo de 30-60 dias Adultos ou gestantes com 1 ou 2 Completar série primária com duas doses Uma dose 6-12 meses após a segunda doses previamente administradas Adulto ou gestante com série primária ________ Administrar uma dose, se transcorrido mais de 5 anos da completa (3 doses dT) última dose *É aconselhável, mas não obrigatório, aguardar o segundo trimestre da gestação para o início da vacinação. Tabela 5.3 Guia para a Profilaxia contra o Tétano após Ferimentos de Risco História Vacinal Pregressa Ferimentos Limpos ou Pequenos dT IgT Outros Ferimentos dT IgT Desconhecida ou < 3 doses Sim Não Sim Sim Mais ou igual a 3 doses Não Não Não Não 48 Capítulo 5 CAXUMBA A vacina contra a caxumba é produzida com vírus vivo atenuado e foi introduzida em 1967, sendo capaz de indu- zir imunidade duradoura em mais de 90% dos vacinados. Como vacina de vírus vivo atenuado, não deve ser usada no período gestacional. Para adultos e crianças deve ser utili- zada na formulação que combina as vacinas da rubéola e sarampo (tríplice viral), respeitando-se a recomendação de não engravidar por um mês após a administração da vacina. VARICELA A varicela tem alta taxa de ataque secundário (90- 100%), com mortalidade variável entre cada faixa etária: 0,75 caso/100.000 (1-14 anos); 6,23 casos/100.000 (< 1 ano); 2,70 casos/100.000 (15-19 anos); e 25,20 casos/ 100.000 (30-49 anos). Exposição Pré-Natal e Perinatal A síndrome da varicela congênita se caracteriza por microftalmia, cicatrizes cutâneas, hipotrofia de membros, coriorretinites, atrofia ótica/cortical e catarata e ocorre com freqüência diferente em relação a idade gestacional de ocorrência: 0 a 12 semanas gestação: 0,4%; 13 a 20 se- manas gestação: 2%; 13 a 24 semanas: 0,8% e 25 a 36 se- manas: 1,7%. O herpes-zoster também ocorre com mais freqüência na infância. Vacinas VZV CEPA OKA: Atualmente em uso. Cultivada em cultura de células pulmonares de em- brião humano (recultivo 11x), recultivada em fibroblastos embrionários de porco-da-índia (12x) e recultivo em cé- lulas diplóides humanas (2x). As doses variam entre 1.000 e 2.000 PFU. Imunogenicidade A imunogenicidade entre indivíduos normais entre 1- 12 anos é de 97% com 100% de eficácia clínica para con- tatos com a doença. Os indivíduos normais com mais de 13 anos têm 78% de soroconversão após a primeira dose e 99% de soroconversão após a segunda dose (4 a 8 semanas após primeira). Nos casos de falha vacinal, houve atenua- ção da doença para menos de 50 vesículas, e a transmissão secundária nos casos de falha foi de 12,2% com follow-up de 1-8 anos. A análise de contatos domiciliares (vacina até três dias do contato) mostra que zero de 26 (0%) vacinados teve a doença e 19/19 (100%) controles tiveram a doença. A incidência de herpes-zoster após a doença é de 77 casos/100.000/ano, enquanto a incidência de HZ após a vacina é de 18 casos/100.000/ano. As recomendações são para pessoas com > 1 ano de idade e < 13 anos de idade deve-se administrar uma dose de vacina que pode ser combinada com SCR simultanea- mente em locais separados, ou com intervalo > 30 dias se administrados separadamente. Em pessoas > 13 anos de idade deve-se administrar duas doses, SC, com intervalo de quatro a oito semanas. Deve-se evitar salicilatos por seis semanas após cada dose de vacina. A vacina contra a varicela é produzida com vírus vivo atenuado. Também recomenda-se que, após as doses admi- nistradas, a mulher não grávida aguarde pelo menos um mês para uma nova gestação. Não é permitido seu uso du- rante qualquer período gestacional. POLIOMIELITE A poliomielite é doença causada pelos poliovírus tipos 1, 2 e 3 e, desde 1992, não houve novos diagnósticos no Brasil, dando a essa doença o status de doença eliminada do país. No Brasil, indivíduos acima dos 18 anos de idade são considerados imunes e, mesmo não tendo sido vacinados na infância, não necessitariam sê-lo após essa idade, pois já apresentariam imunidade conferida pela infecção inapa- rente pelos poliovírus selvagens. Dois tipos de vacina contra a poliomielite estão licen- ciadas: a. OPV (oral poliovirus vaccine – Sabin): vacina sinteti- zada com poliovírus vivos e atenuados; Tabela 5.4 Situações nas quais as Vacinas Sabin ou Salk Estariam Indicadas e suas Doses Preconizadas* Situação de Exposição Situação Vacinal do Adulto Vacina e Número de Doses • Viagem para área de alta endemicidade Nunca vacinada Salk: 2 doses com intervalo de 1 a 2 meses, e • Profissionais que manipulam poliovírus terceira dose 6 a 12 meses após a segunda • Contato estreito com excretores fecais de poliovírus • Adultos não vacinados, cujos filhos receberão Sabin • Viagem para área de alta endemicidade Parcialmente vacinado Salk: completar esquema primário de 3 doses, • Profissionais que manipulam poliovírus como acima. • Contato estreito com excretores fecais de poliovírus • Adultos não vacinados, cujos filhos receberão Sabin • Viagem para área de alta endemicidade Previamente vacinados com esquema Salk ou Sabin:1 dose de reforço • Profissionais que manipulam poliovirus completo de Sabin ou Salk • Contato estreito com excretores fecais de poliovírus • Adultos não vacinados, cujos filhos receberão Sabin *Red Book, 2000 Capítulo 5 49 b. IPV (enhanced-potency inactivated poliovírus vaccine – Salk): vacina sintetizada com poliovírus inativados. A série primária de qualquer das vacinas leva a imuni- dade em > 95% dos indivíduos e consiste em três doses para qualquer um dos dois tipos, variando somente o in- tervalo entre as duas primeiras doses, que seria entre seis e oito semanas para a vacina Sabin e quatro e oito sema- nas para a vacina Salk. Os reforços são administrados 6 a 12 meses após a segunda dose de qualquer uma delas. No contexto de vacinação de adultos, é excepcional a indicação da vacina contra a poliomielite e isso também se aplica às gestantes. Quando da necessidade de doses da vacina contra a poliomielite, como ocorre em viagens para países com a doença ainda presente, o produto escolhido é a vacina de vírus inativados, visto que o risco de polio- mielite induzida pelos vírus vivos da vacina Sabin é reco- nhecido como maior em adultos. A Tabela 5.4 ilustra as situações de indicação da vaci- na contra a poliomielite.Embora não haja evidência convincente dos efeitos ad- versos das vacinas contra a pólio em mulheres grávidas, a imunização durante a gestação deve ser evitada por razões de risco teórico. Entretanto, nas situações citadas, a vaci- na poderá ser realizada, mas preferivelmente após o pri- meiro trimestre da gestação. HEPATITE B A infecção pelo vírus B da hepatite em adultos pode re- sultar no estado de portador crônico em 6 a 10% dos ca- sos, e, destes, cerca de 25% apresentam a forma mais agres- siva da infecção crônica, que resulta em cirrose, insuficiên- cia hepática ou carcinoma hepatocelular primário. Considerando que a mulher grávida infectada pode transmitir o vírus ao concepto em freqüência de até 95%, situação em que a mãe mostra positividade ao antígeno e do vírus da hepatite, deveríamos nos atentar para a pesqui- sa sistemática do HBsAg no pré-natal, de maneira a iden- tificarmos as mães portadoras, e para que o concepto, logo ao nascimento, recebesse imunoprofilaxia específica, pois a criança infectada ao nascimento evolui na quase totali- dade dos casos (> 90%) para o estado de portador crôni- co do vírus B, vindo a desenvolver, em idade muito jovem, as complicações inflamatórias ou neoplásicas dessa infec- ção viral. Atualmente, a recomendação oficial é de imunização universal para os adultos e crianças, ou seja, logo após o nascimento todos os neonatos devem ser vacinados. A vaci- na disponível é sintetizada por engenharia genética, e o componente imunizante (20 mg de HBsAg) se origina de re- combinação genética do Sacharomyces cerevisiae, vetor que é inoculado com o gene codificador dessa partícula viral. Na profilaxia pré-exposição a dose recomendada são três aplicações, sendo que as duas primeiras têm interva- lo de um mês e a terceira deve ser realizada cinco meses após a segunda dose. Exceção se faz em pacientes com in- suficiência renal crônica, nos quais se preconiza o dobro para cada dose (40 mg), e administração com zero, 30 e 60 dias e com um ano. A imunidade conferida em adultos sadios tem duração permanente, não sendo indicado o uso de doses adicionais de reforço. Quando realizada nas situações de profilaxia pós-expo- sição (contatos sexuais com portadores crônicos ou traba- lhadores da área da saúde que tenham se exposto a aciden- tes percutâneos com agulhas ou instrumental cirúrgico contaminado), devemos usá-la o mais precocemente pos- sível (até 14 dias na primeira situação e nas primeiras 24 a 48 horas na segunda), usando-se o mesmo esquema de doses, mas associando-se a gamaglobulina hiperimune (HBIg) na dose de 0,06 ml/kg ou 5 ml para adultos, em dose única, intramuscular, e em locais diferentes. Os efeitos colaterais mais freqüentes da vacina são dor no local da aplicação e, mais raramente, febre de baixa in- tensidade. A gestação não deve ser considerada contra-indicação à vacina, embora dados sobre a segurança para o feto não estejam disponíveis. A vacina contém somente partículas não infectantes de HBsAg e, em tese, não impõe nenhum risco ao feto. RAIVA A raiva é uma doença cuja mortalidade atinge 100% e atualmente é totalmente prevenível. Nos EUA, duas vaci- nas estão licenciadas para uso, que são: 1. HDCV (human diploid cell vaccine), com vírus rábico inativado e cultiva- do em fibroblastos humanos. Uma dose contém 1 ml de liofilizado, que, reconstituído, deve ser aplicado por via intramuscular nos dias 0, 3, 7, 14 e 28 que se seguem à ex- posição ao animal suspeito (profilaxia pós-vacinal). Tam- bém está licenciada a formulação para uso em situações de pré-exposição, que deve ser administrado por via intradér- mica, nos dias 0, 7 e 28; e 2. Vacina com vírus inativado e cultivados em células Vero, contendo 1 ml de liofilizado, que, reconstituído, deve ser aplicado por via intradérmica nos dias 0, 3, 7,14 e 28 e cuja intenção básica é a profila- xia pós-exposição. A vacina produzida em células diplóides humanas ou Vero tem a vantagem de ser mais imunogênica e isenta das complicações neurológicas passíveis de ocorrer com a va- cina produzida em cérebros de camundongos lactentes, atualmente em uso no Brasil. A doença neurológica que ocorre complicando a administração desse tipo de vaci- na, ocorre em razão da indução de anticorpos contra a mielina residual do camundongo que está presente no pro- duto, levando a reações imunológicas cruzadas com a mielina humana. Não há citações na literatura médica de efeitos adversos ao feto quando da profilaxia contra a rai- va na gestante. CÓLERA O cólera recentemente voltou a ser problema de saú- de pública no Brasil e ainda é endêmico em outros países em desenvolvimento. A vacina disponível é inativada, ad- ministrada em uma ou duas doses e com intervalos de uma a quatro semanas. A eficácia é de 50% e com duração de imunidade de três a seis meses, não prevenindo a transmis- são da doença. A administração freqüentemente resulta em dor, hiperemia e induração no local aplicado por um a dois dias, podendo ser acompanhada de febre, mal-estar e cefaléia. Não existe informação específica disponível so- bre seu uso no período gestacional; mas, embora a cólera 50 Capítulo 5 seja doença grave durante a gravidez, o uso da vacina de- veria ser reservado a circunstâncias individuais com base no risco atual da doença, pesando-se riscos e benefícios. HAEMOPHILUS INFLUENZAE T IPO B Adultos saudáveis não estão sob maior risco de doen- ça invasiva pelo Haemophilus influenzae tipo b (Hib), pois 85% ocorrem em crianças menores de cinco anos de ida- de. Adultos de risco são aqueles que apresentam doença pulmonar crônica e condições subjacentes que predispo- nham a infecções por bactérias encapsuladas (esplenecto- mizados, com anemia falciforme, doença de Hodgkin e outras patologias hematológicas ou imunossupressoras). Os dados de eficácia em adultos são escassos, mas oscilam entre 87-100%. Glezen et al. administraram no terceiro tri- mestre da gestação, em estudo controlado com 215 mulhe- res, uma dose da vacina contra o Hib (PRP não conjugado) e concluíram que as crianças nascidas de mães que rece- beram a vacina tinham níveis de anticorpos protetores para o Hib mais altos que as mães não imunizadas, e as estima- tivas de proteção do recém-nascido, norteadas pelos títu- los de anticorpos, eram em média de quatro meses, ao contrário das mães não vacinadas, cujos conceptos esta- vam protegidos por dois meses, em média. A segurança da vacina contra o Hib em mulheres grávi- das não foi estabelecida, mas em bases teóricas, evitar a va- cinação da gestante durante o primeiro trimestre e reserva- la para situações de risco substancial (asplenia funcional ou anatômica e infecções pelo HIV) é conduta prudente. DOENÇA MENINGOCÓCICA A doença ocasionada pelo meningococo é endêmica em todo o mundo, podendo ocorrer epidemias. Os meningoco- cos do sorogrupo B e C são os causadores da maioria dos ca- sos no Brasil e os sorogrupos A, Y e W135 são excepcionais. A vacina meningocócica é uma vacina polissacarídica inativada e pode ser disponível como bivalente (A,C e B,C) e quadrivalente (A,C,Y,W135). Em adultos é administrada como dose única e induz imunidade sorogrupo-específica, com duração de cerca de três a cinco anos. É indicada so- mente em situações de epidemias ou indivíduos com de- ficiências de componentes terminais da cascata do comple- mento. Recentemente passou a ser disponível a vacina conjugada contra o meningococo C, que, diferentemente das vacinas polissa-carídicas combinadas convencionais, apresenta maior imunogenicidade, podendo ser iniciada a administração a partir dos dois meses de vida. Nessa situ- ação, a administração é realizada em três doses com inter- valos de dois meses entre elas. Tabela 5.5 Sumário das Vacinas, Doses e Recomendação de Uso em Adultos e durante o Período Gestacional Imunobiológico Esquema Primário e Reforços Uso Durantea Gestação Tétano e Difteria Duas doses com intervalos de 4 semanas; terceira dose 6-12 meses Rotineiro após a segunda e reforços a cada 10 anos Sarampo Dose única Contra-indicado Caxumba Dose única Contra-indicado Rubéola Dose única Contra-indicado Febre amarela Dose única pelo menos 10 dias antes da viagem e reforço a cada Evitar, mas se absolutamente necessária pode 10 anos ser administrada Poliomielite *Duas doses (eIPV) com intervalo de 4 semanas e terceira dose Evitar, mas se absolutamente necessária 6-12 meses após a segunda. **Duas doses (OPV) com intervalo pode ser administrada de 8 semanas e terceira dose 6-12 semanas após a segunda. Reforços, quando necessários, podem ser realizados com qualquer dos dois produtos Hepatite B Duas doses com intervalo de 4 semanas e terceira dose 6 meses Indicada em situações especiais após a primeira. Reforço a cada 7 anos Influenza A e B (Gripe) Dose única e reforços anuais Rotineiro Raiva Uma dose nos dias 0, 3, 7,14 e 28 de vida para profilaxia Indicada em situações especiais pós-exposição e 1 dose nos dias 0, 7 e 28 para profilaxia pré-exposição Cólera Duas doses com intervalo de 1-4 semanas e reforços a cada 6 meses Indicada em situações especiais Haemophilus influenzae Dose ideal para adultos ainda não determinada, mas 1 dose muito Evitar, mas se absolutamente necessária pode tipo b provavelmente é eficaz ser administrada Meningococo Dose única com intervalo de reforços que variam para cada soro Evitar, mas se absolutamente necessária pode grupo a que se destina a vacina ser administrada. Pneumococo Dose única com eventuais reforços a cada 6 anos ou mais Evitar, mas se absolutamente necessária pode ser administrada Tuberculose Dose única Evitar, mas se absolutamente necessária pode ser administrada Capítulo 5 51 A segurança da vacina meningocócica em mulheres grávidas não foi estabelecida. Em bases teóricas, reservá- la para situações de risco substancial é conduta prudente. PNEUMOCOCO Dados precisos de ocorrência de doença pneumocóci- ca no Brasil não são disponíveis, mas nos EUA o coeficien- te de incidência de bacteremia pneumocócica está estima- do em 15-19 casos/100.000 habitantes/ano. A freqüência de pneumonia é cerca de três a cinco vezes maior que os casos detectados de bacteremia. Indivíduos com certas condições patológicas crônicas são de maior risco para a doença pneumocócica, assim como para sua maior gravidade. Nessas situações estão os diabéticos, cardiopatas e pneumopatas crônicos, alcoóla- tras, portadores do vírus da AIDS, cirróticos e asplênicos anatômicos ou funcionais. A vacina pneumocócica é produto polissacarídico que contém material capsular purificado de 23 sorotipos do Streptococcus pneumoniae, responsáveis por quase 90% dos casos de bacteremias pneumocócicas nos EUA. A vacina é administrada em dose única, IM ou SC, com a imunidade tendo início de duas a três semanas após a ad- ministração e durando, pelo menos, cinco anos quando aplicada em adultos sadios. As reações identificadas após a vacinação são leves (eritema e dor local) e ocorrem em cerca de 50% dos casos. Reações mais severas (febre e mialgias) ocorrem em menos de 1% dos casos. A segurança da vacina pneumocócica entre as gestan- tes não está ainda completamente avaliada e as mulheres de alto risco para a doença devem idealmente ser imuni- zadas antes da gestação ou logo após o parto. Lee et al. ad- ministraram uma dose da vacina pneumocócica 23 valen- te a fêmeas de camundongo grávidas e perceberam que os filhotes delas apresentaram resposta anticórpica mais efi- caz e rápida que os filhotes das não-imunizadas, concluin- do que o uso dessa vacina durante a gestação poderia le- var a uma resposta rápida de anticorpos a imunógenos polissacarídicos do pneumococo nos recém-nascidos. TUBERCULOSE A tuberculose continua sendo um grave problema de saúde pública no Brasil. A vacina usada é a BCG (Bacille Calmette-Guérin) e é um produto composto por uma sus- pensão de Mycobacterium bovis vivo e atenuado, sendo ad- ministrada por via intradérmica ou percutânea. Raramente é indicada para adultos e nenhum efeito deletério foi observado no feto, mas evitar a vacinação du- rante a gestação é conduta prudente. FEBRE AMARELA Casos de febre amarela são relatados na África e Amé- rica do Sul e duas formas clínicas, urbana e selvagem, são epidemiologicamente distintas, mas etiológica e clinica- mente idênticas. A febre amarela urbana é doença viral transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti, e a fe- bre amarela selvagem ou não-urbana é doença viral trans- mitida para hospedeiros não-humanos por uma variedade de mosquitos e também pode ocorrer em humanos que se exponham a áreas de florestas. A vacina é produto constituído pela cepa 17D do vírus vivo atenuado e cultivado em embriões de galinha. É ad- ministrada em dose única, subcutânea, induz imunidade com duração de dez anos ou mais e está indicada para via- jantes que irão à África, América Central e América do Sul, onde se inclui aí o Brasil, devendo ser aplicada pelo me- nos dez dias antes da viagem. Informação específica não é disponível sobre os efeitos no feto em desenvolvimento, portanto parece razoável evi- tar a vacina nas gestantes, postergando quando possível a viagem para o local que impõe o risco da doença. Se hou- ver absoluta impossibilidade para o cancelamento da via- gem, a vacina pode ser administrada, em razão do risco de aquisição e da gravidade da doença. BIBLIOGRAFIA 1. Centers for Disease Control and Prevention – Epidemiology and prevention of vaccine-preventable diseases. Jan 2003. 2. Centers for Disease Control and Prevention. Update on adult immunization – Recommendations of the Immunization Practices Advisory Committee (ACIP). MMWR 1991; 40(RR-12):1-93. 3. Chabala S, Williams M, Amenta R, Ognjan AF. Confirmed rabies exposure during pregnancy: treatment with human rabies immune globulin and human diploid cell vaccine. Am J Med 1991; 91(4):423-4. 4. Chui LW, Marusyk RG, Pabst HF. Measles virus specific antibody in infants in a highly vaccinated society. 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