Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DOCÊNCIA EM SAÚDE PSICOLOGIA CLÍNICA 1 Copyright © Portal Educação 2014 – Portal Educação Todos os direitos reservados R: Sete de Setembro, 1686 – Centro – CEP: 79002-130 Telematrículas e Teleatendimento: 0800 707 4520 Internacional: +55 (67) 3303-4520 atendimento@portaleducacao.com.br – Campo Grande-MS Endereço Internet: http://www.portaleducacao.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - Brasil Triagem Organização LTDA ME Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167 Portal Educação P842p Psicologia clínica / Portal Educação. - Campo Grande: Portal Educação, 2014. 189p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-8241-037-0 1. Psicologia Clínica. 2. Psicologia - História. 3. Saúde Mental. I. Portal Educação. II. Título. CDD 157.9 2 SUMÁRIO PREFÁCIO ........................................................................................................................................... 4 1 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO MUNDO ................................................................................ 6 1.1 JONH LOCKE E A PSICOLOGIA ............................................................................................... 9 1.2 A INFLUÊNCIA DE DARWIN .................................................................................................... 10 1.3 WUNDT: DA PSICOLOGIA EXPERIMENTAL FISIOLÓGICA À PSICOLOGIA DOS POVOS ..... 12 1.4 PSICOLOGIA DA INTELIGÊNCIA E DA FORMA ...................................................................... 14 1.5 O PRINCÍPIO DO SENTIDO ..................................................................................................... 15 1. 6 BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A PSICOLOGIA NO BRASIL ............................................. 18 2 GRANDES PENSADORES DA PSICOLOGIA E AS ABORDAGENS DELES DERIVADAS ..... 23 2.1 INÍCIO, O ESTRUTURALISMO ................................................................................................. 23 2.2 FUNCIONALISMO ..................................................................................................................... 24 2.3 WUNDT E O ASSOCIACIONISMO ........................................................................................... 24 2.4 PAVLOV E A REFLEXOLOGIA ................................................................................................. 25 2.5 BEHAVIORISMO, A PRIMEIRA POTÊNCIA ............................................................................ 28 2.5.1 Burrhus Frederic Skinner ....................................................................................................... 29 2.6 GESTALT, A PSICOLOGIA DA FORMA ................................................................................... 30 2.7 PSICANÁLISE ........................................................................................................................... 31 2. 8 HUMANISMO ............................................................................................................................ 34 2.8.1 Pirâmide de Maslow ................................................................................................................ 36 2.9 PSICOLOGIA TRANSPESSOAL ............................................................................................... 37 2.10 PSICODRAMA .......................................................................................................................... 38 2.10.1 Jacobo Levy Moreno .............................................................................................................. 39 2.10.2 Teoria do psicodrama ............................................................................................................. 41 2.10.3 Método psicodramático .......................................................................................................... 43 2.10.4 Psicodrama psicanalítico ....................................................................................................... 45 2.11 PSICOLOGIA ANALÍTICA ........................................................................................................... 47 3 A PSICOLOGIA ENQUANTO CIÊNCIA (PSICOLOGIA CIENTÍFICA) ..................................... 49 3.1 PESQUISA EM PSICOLOGIA E BIOÉTICA ............................................................................. 58 4 PRINCIPAIS ÁREAS DE ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ........................................................... 61 4.1 PSICOLOGIA DO ESPORTE .................................................................................................... 63 3 4.2 PSICOLOGIA AMBIENTAL ....................................................................................................... 63 4.3 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL ............................................................................................ 64 4.4 PSICOLOGIA INDUSTRIAL: ..................................................................................................... 65 4.5 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL: .......................................................................................... 666 4.6 PSICOLOGIA HOSPITALAR .................................................................................................... 68 4.7 PSICOLOGIA ESCOLAR .......................................................................................................... 69 4.8 PSICOLOGIA JURÍDICA ........................................................................................................... 82 5 PSICOLOGIA CLÍNICA: CONCEITO ........................................................................................ 86 6 CONCEITO DE SAÚDE ............................................................................................................ 92 7 SAÚDE MENTAL ...................................................................................................................... 96 8 DEFICIÊNCIA MENTAL ............................................................................................................ 97 8.1 CLASSIFICAÇÕES DA DEFICIÊNCIA MENTAL ....................................................................... 98 9 TRANSTORNO MENTAL ........................................................................................................ 101 10 PRINCIPAIS TRANSTORNOS MENTAIS ............................................................................... 104 10.1 DEPRESSÃO ........................................................................................................................... 104 10.2 ANSIEDADE ............................................................................................................................. 108 10.3 TRANSTORNO BIPOLAR ........................................................................................................ 111 10.4 TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO (TOC) ............................................................... 116 10.5 ESQUIZOFRENIA .................................................................................................................... 120 10.6 HIPERATIVIDADE E DÉFICIT DE ATENÇÃO ......................................................................... 126 11 AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA .................................................................................................. 132 12 INTERVENÇÃO ....................................................................................................................... 158 13 EQUIPE MULTIPROFISSIONAL .............................................................................................165 14 PRESENTE E FUTURO DA PSICOLOGIA CLÍNICA .............................................................. 168 15 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 177 GLOSSÁRIO ........................................................................................................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... ERRO! INDICADOR NÃO DEFINIDO. 4 PREFÁCIO FIGURA 1 A Psicologia talvez seja uma das mais controversas ciências da atualidade. Amada por uns e odiada por outros, sem dúvida ainda permanece obscura para a grande maioria. Ouve-se falar dela como ‘coisa do demônio’ dentro de igrejas católicas e evangélicas. Confundida com práticas alternativas não reconhecidas pela Ciência tradicional, muitos cientistas a veem com maus olhos e até com certo desdém. O certo é que as pessoas normalmente costumam combater aquilo que não conhecem. Esse comportamento é no mínimo preconceituoso. Faz-se necessário conhecer para só depois exercer sobre aquilo que se conhece algum tipo de pensamento, seja de apoio ou repulsa. Mas que seja feito com fundamento. O certo é que a Psicologia provavelmente seja uma das mais complexas ciências da atualidade. A começar pelo seu próprio objeto de estudo, a pretensão de estudar a alma humana. Por mais que se estude, jamais será possível abarcar toda esta complexidade, pois o ser humano é o reflexo de interações ambientais, sociais, físicas, cognitivas e espirituais. Várias Ciências se cruzam na busca desse conhecimento, como a Neurologia, a Filosofia, as Ciências Sociais, a Psiquiatria... Tudo o que for dito perto da dimensão do ser humano envolto em sua cultura e valores será muito pouco. Tudo isso faz da Psicologia uma Ciência extremamente bela e complexa, dificílima, embora fascinante. Ninguém, jamais sairá ileso depois que dela se aproximar. E o objetivo deste curso é facilitar uma primeira aproximação com essa Ciência, que mais pergunta que responde, pois não é função da Psicologia encontrar respostas, ou soluções 5 simples e prontas para coisas complexas, mas apenas se propõe a entender melhor quem é o ser humano e como ele age. Quero caminhar com você ao dar os primeiros passos rumo ao conhecimento psicológico e espero que se apaixone tanto quanto eu me apaixonei por essa Ciência, ainda tão mal compreendida. Vamos lá? 6 1 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO MUNDO Desde o início dos tempos, o ser humano sempre quis compreender melhor o mundo que o rodeia, conhecendo as suas origens. Se entendermos a Psicologia como um conhecimento amplo, é possível afirmar que os mais antigos filósofos, os pré-socráticos, eram, em sua essência, psicólogos, embora não fossem assim denominados nem tivessem o seu exercício regulamentado em lei. Na busca pela indagação de si e pelo entendimento de suas origens, várias correntes teóricas se formaram. Dentre elas, as duas mais importantes, tentando explicar a origem do ser humano e do Universo: o Criacionismo e o Evolucionismo. Entende-se o Criacionismo como sendo a teoria ou sistema que sustenta as espécies animais e vegetais criadas de forma distinta, permanecendo invariáveis. Houve um Ser Superior que criou todas as coisas que existem. O relato da criação do mundo encontra-se pormenorizado na Bíblia Sagrada, livro de orientação de todos aqueles que professam a fé cristã (FERREIRA, 1993). Ao processo gradual de mudança genética em que as características de toda uma espécie são alteradas durante muitas gerações, produzindo uma mudança cuja função é proporcionar uma melhor adaptação dos indivíduos daquela espécie ao meio ambiente, processo conhecido como Seleção Natural, dá-se a denominação de Evolucionismo (HAYES, 1997). Mas as grandes questões da humanidade não se limitaram àquelas ligadas ao Universo. O ser humano sempre se interessou por conhecer melhor a sua própria essência: De onde vim? Para onde vou? Quem sou eu? O que vim fazer nesse mundo? As respostas a essas perguntas trariam alívio para a própria angústia e inquietação inerentes ao ser humano. Era preciso entender melhor as próprias emoções, ansiedades, sentimentos, o porquê da existência, do nascimento, da morte... Faz-se necessário entender que esses questionamentos tão profundos são naturais e fazem parte do processo de autoconhecimento. Não é preciso fugir de sensações que nem sempre são confortáveis, mas enfrentá-las, tirando proveito de cada evento desagradável para encontrar o próprio equilíbrio, a própria estrada. Um dos grandes equívocos atuais provavelmente seja o de querer se livrar, a todo e qualquer custo, da dor e dos sofrimentos humanos. Mas eles são parte da complexa natureza humana. Não há fórmulas miraculosas para 7 fazer com que o ser humano pare de sofrer, por mais que os livros de autoajuda falem o contrário. Não é essa a finalidade da Psicologia, mas sim, entender a alma humana e aprender a lidar melhor com a própria existência. A partir desse breve comentário, poderíamos afirmar que a Psicologia nasce de dois ramos distintos: da Filosofia, considerando pensadores como Aristóteles e Platão (os primeiros psicólogos – ainda que não utilizassem esse termo) e da Medicina, ainda que, de forma equivocada, tentassem encontrar respostas físicas para questões emocionais (Os pensadores, 1999). Provavelmente, a primeira grande obra psicológica de que se tem notícia seja a do pensador Aristóteles, intitulada “De Anima”. Embora já se estudasse a alma humana, o termo Psicologia só aparece no século XVI, com Rodolfo Goclênio. A palavra Psicologia tem sua raiz etimológica nos termos psiché (alma) + logos (razão, estudo). É bom que se diga que a Psicologia enquanto profissão é algo ainda recente, pois a regulamentação da profissão de psicólogo foi instituída somente em 27 de agosto de 1962 (data em que hoje se comemora o Dia do Psicólogo). Tem-se afirmado que a Psicologia é uma ciência com um longo passado, mas com uma curta história de reconhecimento enquanto atividade profissional e Ciência. Tal frase lança luz sobre o fato de que os povos de todos os tempos e de todas as culturas se tenham ocupado dos problemas da alma e da vida humana. A partir de alguns testemunhos escritos que nos ficaram das antigas culturas da Índia, China, Ásia Anterior, do Delta e do Nilo. A partir de mitos e contos populares, bem como de obras eruditas, pode-se concluir que as pessoas sempre refletiram sobre a alma, a morte e a imortalidade, sobre o bem e o mal, e as causas dos seus medos e preocupações. O estudo da alma humana e a existência do ser humano são eventos interligados. Daí a afirmação que a Psicologia é uma ciência em construção e de que o psicólogo é um profissional sempre em formação. Não há psicólogos prontos, visto que compreender o ser humano requer estudo incessante e a capacidade de aprender com os próprios erros. A nossa ciência ocidental, assim como a Psicologia, remonta à Grécia Antiga, pelo que o antigo escrito do filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) “Acerca da Alma”, é designado muitas vezes como o primeiro Manual de Psicologia. De fato, esse grande mestre da ciência antiga tratou de quase todos os problemas que ainda hoje nos ocupam; interessou-se de modo muito especial pela questão dos fundamentos biológicos da vida anímica e do seu desenvolvimento. 8 É do pensador Aristóteles a tese de que o todo vem antes das partes e é, portanto, mais do que o somatório das suas partes. Por exemplo: cada floresta é mais do que o somatório das suas árvores, arbustos e ervas que a constituem e dos animais que nela habitam, é uma totalidade própria com características especiais que pertencem à totalidade. Porém, tais totalidades existem igualmente no domíniopsíquico. Esse é um dos grandes fundamentos do que atualmente se intitula Psicologia da Gestalt, ou Psicologia da Forma. Essa concepção opõe-se à de Wilhelm Wundt (1832-1920), de que o todo da mente é constituído a partir de processos elementares, a qual denominou, a princípio, de a moderna Psicologia Científica, orientada pelo pensamento atomista da Física. Os gregos consideravam a alma como o sopro da vida, como aquilo que vivificava a vida. Como, porém, se realizava essa vivificação foi problema que permaneceu tão discutido quanto insolúvel. Tales de Mileto, muito antes de Aristóteles, considerou o movimento como algo essencial para o processo de vivificação; alguns filósofos da Antiga Grécia pensavam que a alma era “ar”, outros, que eram os odores os elementos vivificantes. (Os pensadores: Pré- socráticos, 1999). Platão (427-347 a.C.) qualifica alma como algo espiritual; o seu discípulo Aristóteles considerava-a como uma força, aliás, incorpórea, mas que movia e dominava os corpos. A partir de tais concepções, adquiridas exclusivamente pela especulação, existiam, contudo, também já na Antiguidade, estudos amplos sobre processos cerebrais, sobre as funções dos órgãos sensoriais e sobre perturbações dessas funções em caso de lesões cerebrais. Muito se houve falar sobre a doutrina dos quatro temperamentos, sobretudo em livros norte-americanos de Psicologia. Mas a grande verdade é que essa doutrina remonta ao grande médico grego Hipócrates (cerca de 400 a.C.), retomada e desenvolvida pelo médico romano Galeno (201 até 131 a.C.). Segundo ele, existem quatro temperamentos, determinados pela predominância de um dos quatro “humores”: o sanguíneo (sangue: folgazão e superficial), o colérico (bílis amarela: vontade forte e iras repentinas), o melancólico (bílis negra: pensativo e triste) e o fleumático (muco: sossegado e inativo). Apesar do seu funcionamento pseudocientífico, a doutrina dos quatro temperamentos afirmou-se na prática e os quatro tipos foram finalmente introduzidos como noções da nossa linguagem do dia a dia. (SOURNIA, 1996). Outro nome fundamental para que se estudem os primórdios da Psicologia é Santo Agostinho (354-430), pelo fato de ter descoberto dois métodos importantes: o da auto- observação e o da descrição da experiência interior, dando origem a uma Psicologia mais 9 subjetiva e qualitativa, baseada na fala e na introspecção, ao contrário daquela que prioriza apenas o comportamento observável. De certa forma, pode-se citar a psicologia europeia como aquela que mais se aproxima de uma Psicologia menos comercial e imediatista para uma mais aprofundada e introspectiva, denominada por alguns de ‘Psicologia profunda’. FIGURA 2 FONTE: Disponível em: www.alamed.com.br/psicologia.htm. Acesso em 14/05/2013 1.1 JONH LOCKE E A PSICOLOGIA Grande parte das pessoas que trabalham na Educação já ouviu falar que ‘a criança é como uma folha em branco na qual são registradas as várias experiências’. Essa ideia que também influenciou bastante a Psicologia, principalmente em relação às abordagens que priorizam a experiência como a principal fonte de formação do ser humano, vem de um pensador conhecido: Jonh Locke. http://www.alamed.com.br/psicologia.htm 10 Esse pensador veio sublinhar a importância que desempenham as impressões sensoriais para o desenvolvimento da nossa experiência. Imaginou o espírito da criança como uma folha de papel em branco (tábula rasa) na qual são “registradas” as experiências. John Locke também tem papel decisivo na Pedagogia e na Psicopedagogia. Seu pensamento sustentou ricas correntes pedagógicas e psicológicas. (ABAGNANO, 2000). Já Aristóteles se ocupara das associações, da combinação de duas ou mais representações ou vivências parciais. O fato de David Hume (1711-1776) ter retomado e aperfeiçoado a teoria aristotélica das associações demonstrou ser de extraordinária importância, também para a atual Psicologia. Hume ensinou que as representações eram imagens de impressões sensoriais e se encontravam ligadas umas às outras com base em leis mecanicamente funcionais. Reforçando o pensamento de Aristóteles, formulou as leis da associação do contato espaço-tempo, da semelhança, do contraste e da causalidade. Desde então se verifica a importância que as experiências exercem sobre a vida de qualquer ser humano, gerando gratificação ou traumas. As experiências têm uma função primordial na estrutura da pessoa, principalmente até os seis anos de vida. Aquilo que é vivenciado nessa fase torna-se determinante na vida adulta. A forma de ser, de reagir e de enfrentar crises em boa parte é construída na infância. Também a forma feliz de celebrar a vida em seus detalhes mais simples. 1.2 A INFLUÊNCIA DE DARWIN FIGURA 3 - CHARLES DARWIN FONTE: Disponível em: blog.revista.criterio.nom.br/.../05/darwin2.jpg. Acesso em 14/05/2013 11 A Psicologia sempre viveu o dilema de optar entre entregar-se à objetividade, para que ocorresse a apropriação do fazer científico, ou exercer um modo de fazer seus estudos de maneira mais alternativa e aberta à especulação e assim correr o risco de não ser legitimada nos meios acadêmicos. Pela própria raiz eminentemente filosófica, toda a Psicologia fora praticada até aos meados do século XX de modo predominantemente especulativo: julgava-se poder solucionar todos os problemas a partir da reflexão, da análise e da síntese. Ledo engano. Atualmente, percebe-se que as alternativas acima citadas não são excludentes, mas podem se complementar e se enriquecer mutuamente e assim o fazer científico enriquece seu olhar, tornando-se mais holístico e menos fragmentado. Prova disso são as propostas atuais do Sistema Único de Saúde (SUS), de tornar o trabalho cada vez mais interdisciplinar e menos individualista, o que amplia o prisma do observador para um horizonte mais amplo dentro do estudo de cada caso. Uma gastrite, por exemplo, pode ser analisada como algo proveniente de uma irritação gástrica apenas ou do produto complexo da somatização de uma vida corrida e sedentária aliada a uma alimentação precária digerida em um ambiente de ansiedade, somatizando em uma irritação gástrica, que vai eclodir em um órgão de choque, que pode ser o estômago. Isso prova que vários olhares sobre o mesmo assunto mostram o quão complexa é cada situação e o quanto podem se tornar ricos os debates entre os vários fazeres científicos. Quanto ao modo empírico de fazer ciência, pode-se afirmar que um dos principais impulsos na Psicologia teve sua origem nas observações e experimentos de Charles Darwin (1809-1882), o fundador da moderna doutrina genética e da hereditariedade. “A Origem das Espécies” (1859), magnífica obra desse cientista, influenciou de modo revolucionário quase todos os domínios da Ciência, desde a Física e Química, passando pela Biologia até chegar à Psicologia. Essa obra promove debates, os mais acalorados, e inúmeras teses, colocando como inimigos frontais teólogos e cientistas, lógico, dentro de uma perspectiva excludente, fragmentada e dualista. Além das suas investigações biológicas, Darwin ocupou-se igualmente de uma série de problemas que hoje denominaríamos psicológicos. As ideias de Darwin deram um novo impulso à investigação psicológica e constituíram o fundamento para muitos campos da moderna Psicologia: a Psicologia do Desenvolvimento e a Psicologia Animal; o estudo da expressão dos movimentos afetivos, a investigação das diferenças entre os diversos indivíduos; o problema da 12 influência da hereditariedade em comparação com a do meio ambiente; o problema do papel da consciência; e, logo a seguir; o estudo experimental das funções anímicas como também a introdução do princípio quantitativo da investigação. O historiador Boring, cuja formação acadêmica remonta a Wilhelm Wundt, passando por Edward E.Titchener, afirma, em determinado passo, acerca da psicologia americana, que ela herdou o corpo da investigação experimental alemã; o espírito, todavia, provém de Darwin. Refere-se assim à tradição americana fundada com base em William James (1842-1910) e John Dewey (1859-1952) que – diferentemente da tradição alemã criada por Wundt – transfere para primeiro plano as questões da Biologia, do Desenvolvimento e da Atividade Anímica. Historicamente é interessante verificar que as primeiras publicações de Fechner e Wundt sobre as Percepções Sensoriais surgiram ao mesmo tempo em que: a “Origem das Espécies”, de Charles Darwin; os "Elementos de Psicofísica", de Fechner apareceram em 1860 e os “Contributos para uma Teoria das Percepções Sensoriais”, de Wundt, no ano de 1862 (DAVIDOFF, 2003). 1.3 WUNDT: DA PSICOLOGIA EXPERIMENTAL FISIOLÓGICA À PSICOLOGIA DOS POVOS FIGURA 4 - WUNDT FONTE: Disponível em: <serendip.brynmawr.edu>. Wundt é considerado por muitos estudiosos como o pai da Psicologia. Sem dúvida, a posição de destaque que Wundt ocupa entre os psicólogos e a sua influência internacional, gigantesca, têm sua fundamentação em uma série de circunstâncias: Wundt não se limitou a criar, em 1879, em Leipzig, o primeiro laboratório destinado à investigação experimental dos 13 fenômenos da consciência, fato que muitos consideraram o marco inicial da Psicologia como ciência independente. Ele desenvolveu, além disso, um sistema amplo para o nascimento dessa nova ciência, pesquisando aspectos que iam desde a Psicologia Experimental Fisiológica até a Psicologia dos Povos, dando origem àquilo que hoje se conhece como Psicologia Social e Comunitária. Essa ampla gama de estudos dentro da Ciência Psicológica demonstrava que Wundt possuía invulgar capacidade e fecundidade para o trabalho. Fato curioso é que a base teórica da Psicologia pensada por Wundt vinha da Física. Não é à toa que hoje se fala em termos como campos de tensão dentro da dinâmica dos grupos. Tal como um físico, ele pretendia encontrar elementos e processos elementares; a partir deles pensava poder construir a alma como um todo. No entanto, também ele próprio, no fundo, não estava absolutamente convencido desta ideia, como demonstra o fato de ter esperado que a Psicologia dos Povos fornecesse de qualquer modo conhecimento para os fenômenos mais complexos da alma humana. Apesar da grandiosa concepção fundamental, a Psicologia dos Povos de Wundt não levou a quaisquer resultados duradouros precisamente no que se refere à compreensão dos fenômenos mais complexos ou mesmo daqueles que dizem respeito ao desenvolvimento humano. Mesmo porque Wundt não chegou a desenvolver um conceito preciso daquilo que seria essa área da Psicologia, a Psicologia dos Povos. Enquanto Wundt militava em defesa da Psicologia dos Povos, outros pensadores estudavam os fenômenos de maturação por meio da observação de animais e de crianças, o que daria origem à Psicologia do Desenvolvimento. Esse sistema de pensamento incide exclusivamente sobre a observação do comportamento animal e humano e dos processos de maturação de tal comportamento. De Francis Galton a Lloyd Morgan, William McDougall, Thorndike, Yerkes e John B. Watson, encontramos uma série de investigações brilhantes que se ocupam das questões da hereditariedade, do comportamento animal, dos instintos e do comportamento infantil. O estudo do comportamento observável é um dos pilares doutrinários do Behaviorismo e os estudos realizados por seus seguidores baseavam-se quase que exclusivamente em observações de animais e de crianças. Hoje em dia a Psicologia Animal e a Psicologia Infantil constituem dois ramos extremamente vastos e significativos da investigação psicológica, apesar 14 de que já são necessários vários cuidados legais, pelos abusos antes cometidos por pesquisadores menos avisados. Em pesquisas que envolvam seres humanos, por exemplo, é necessário, atualmente, que seja assinado um termo de Livre Consentimento. É preciso conhecer de que trata a pesquisa e quais os possíveis riscos envolvidos nela, para, só assim, decidir se deseja fazer parte da experiência ou não. Em relação aos animais, o pesquisador precisa garantir, por meio de documentações específicas, que este não vai sofrer nenhum dano. Controvérsias à parte, o certo é que a tradição das observações realizadas em animais foi perpetuada em muitos países e pela comparação cuidadosa entre o comportamento animal e o humano – levada a efeito nas investigações de Wolfgang Köhler, Howard Liddel, Nikolaas Tinbergen, Konrad Lorenz e Otto Koehler – permitiu que se obtivessem conhecimentos fundamentais sobre as funções psíquicas em diferentes fases do desenvolvimento. Muitas pesquisas são relacionadas a medicamentos, por exemplo, parte da generalização dos resultados obtidos do estudo com animais. É do conhecimento geral o grande incremento sofrido pela Psicologia da Criança e do Adolescente; amplificada ao âmbito da investigação experimental, desde Karl Bühler e David Katz até Arnold Gesell e Jean Piaget. Praticamente toda a teoria piagetiana foi obtida a partir de observações dos seus próprios filhos. Um estudo cuidadoso e que certamente exigiu muito do seu espírito investigativo. Foram anos a fio para que fosse possível elaborar a sua teoria, de contribuição inestimável também para a Psicologia Clínica Infantil, de maneira mais específica. 1.4 PSICOLOGIA DA INTELIGÊNCIA E DA FORMA É impossível falar da Psicologia da Inteligência e da Forma sem citar nomes como: Franz Brentano (1838-1917), Christian von Ehrenfels (1859-1932) e Edmund Husserl (1859- 1938). Estes dois grupos, que costumam normalmente serem designados por Escola de Würzburg e de Berlim, insistiam em que a compreensão das relações de sentido e a percepção de formas, ou seja, de formas e totalidades, são processos de uma espécie própria e não se podem explicar como sendo formados por elementos, isto é, a forma não se mostra absoluta, 15 mas existe uma relação entre a forma e a percepção de quem vê, para que haja um sentido. Esse pensamento explica, de certa forma, a existência da relatividade e do significado da arte. O valor da obra artística, uma tela, por exemplo, está no significado atribuído pelo observador. Essa escola psicológica demonstra que o todo tem um significado maior do que o que teria simplesmente em unirem as suas partes. Fazendo uma analogia a esse pensamento e demonstrando-o, por exemplo, na rotina de uma policlínica, diria que trabalhar em uma equipe interdisciplinar de saúde tem um efeito muito superior que tentar unir conclusões de trabalhos isolados de diversos profissionais de saúde, produzidos de forma individualizada. Daí ser a máxima dessa Escola: “O todo é mais que a soma de suas partes”. Os pensadores da Psicologia da Inteligência e da Forma apresentavam, além disso, a comprovação experimental para provar a exatidão da sua tese. Não são as representações, mas sim as suas relações que decidem o sentido de um pensamento, afirmou Karl Bühler, um dos jovens representantes da Escola de Würzburg, ao ser contestado por Wundt. As percepções estruturais do pensamento são operações específicas, por meio das quais se constroem as nossas percepções: as impressões sensoriais não são simplesmente refletidas e ligadas umas com as outras; mas dá-se a partir de diferentes centros cerebrais uma projeção das impressões sensoriais em diferentes direções, o que faz com que cada pessoa interprete e veja o mundo de uma determinada forma (PIMENTEL, 2003; PERLS, 1969). 1.5 O PRINCÍPIO DO SENTIDO “Minha vida carece de sentido.” “É preciso dar sentido à existência.” “Menino, dê um rumo à sua vida!” Todos certamente já ouviram frases assim, que denotam, de certa forma, a necessidade de que a vida tenha um significado, uma direção,senão se transformaria em um barco à deriva. Eduard Spranger trouxe à Psicologia o que denominava de valores espirituais, aos poucos retornando à mesa de discussão, dentro de uma perspectiva mais abrangente e menos reducionista. “Reivindico a palavra Psicologia para a ciência da vida provida de sentido”, declarou Eduard Spranger, no ano de 1922, em uma máxima verdadeiramente clássica. A 16 palavra “sentido” é definida aqui de modo diferente do que na Psicologia da Inteligência, para a qual sentido significa o contexto espiritual de um pensamento. Sentido aqui é definido como “aquilo que está integrado num todo de valores como membro constituinte” ou, por outras palavras, provido de sentido é aquilo que contribui para a realização de valores, o que amplia a função da Psicologia, de apenas explicativa para algo compreensivo. Spranger, que, seguindo as ideias de Wilhelm Dilthey (1833-1911), contrapõe uma Psicologia compreensiva à Psicologia explicativa dos experimentalistas. O essencial na vida humana passa a ser a orientação dos valores. Dever-se-ia compreender a pessoa a partir do “espírito objetivo”, produtor de valores. Na linguagem da moderna Psicologia, isso quer dizer que Spranger se ocupava exclusivamente com as finalidades de valor e com os produtos de cultura formados por intermédio deles, enquanto considera o estudo da realização das ações humanas desprovidas de importância. Porém, como Karl Bühler acentua na sua obra “A Crise da Psicologia”, ambos os aspectos são importantes. É necessário entender que se tratam apenas de aspectos diferentes de um mesmo ser, o ser humano. Portanto, uma dimensão não deve excluir a outra, mas a ela se complementar. Ação e sentido são inerentes à alma da pessoa. De nada adianta a execução de tarefas se aquilo não vier provido de sentido e, a falta desse sentido tem promovido diversos transtornos psíquicos no mundo do trabalho. Um terceiro grupo ocupou-se ainda de outra maneira com a relação de sentido das finalidades. Esse fato mostra cada vez mais claramente que o ponto de vista do sentido ocupa um plano especial na Psicologia atual. É a relação de sentido da ação motivada, tal como Sigmund Freud (1856-1939), o fundador da Psicanálise, a viu e descreveu – aliás, descreveu-a, no início da sua teorização dentro dos limites daquilo que ele definiu como libido, e que pode ser rapidamente conceituado como energia vital. Aos poucos a relação de sentido da ação motivada foi se ampliando, até compreender- se a concepção cada vez mais divulgada de que todo o nosso pensamento e procedimento visam à satisfação de determinadas necessidades e adquirem o seu sentido a partir de tal necessidade ou desejo. Sob esse ponto de vista, todo o procedimento é provido de sentido, uma vez que é determinado por motivos. Mesmo o pensamento e o procedimento daqueles que estão em 17 sofrimento psíquico têm sentido, isto é, têm em vista um objetivo, ainda que o sentido dos próprios objetivos seja mal compreendido naquele momento. No entanto, uma vez que mesmo esse sentido mal compreendido é muitas vezes susceptível de ser interpretado pelo analista, é possível, em muitos casos, ajudar a pessoa a adquirir uma melhor autocompreensão e a partir daí um modo de vida mais equilibrado e harmônico. Dentro de uma perspectiva psicanalítica, pode-se afirmar que até aquilo que se sonha é provido de sentido, visto que lhe é inerente uma finalidade dirigida no sentido da satisfação de necessidades. A interpretação, introduzida por Freud no pensamento psicológico como novo princípio fundamental, deve ser utilizada sempre que a pessoa que atua oculta a si própria e aos outros o verdadeiro objetivo dos seus anseios. Em tais casos, ela pensa e atua simbolicamente (quer dizer, acontece inconscientemente), em vez do objetivo verdadeiro coloca um objetivo substituto ou ilusório, para desviar a atenção das intenções que lhe parecem contestáveis, reprováveis ou puníveis. No princípio do sentido amplo aqui desenvolvido, encontram-se incluídos, tanto o princípio da relação do sentido no nosso pensamento, acentuado pela Psicologia da Inteligência, como o princípio do sentido das finalidades de valor, defendido por Spranger. Atravessada por várias teorias, recorrendo a métodos e técnicas de investigação diversificada, organizada em várias especialidades, a Psicologia procura, nessa diversidade, responder às questões que desde sempre se colocaram acerca do comportamento, emoções, sentimentos, relações sociais, sonhos, perturbações... (NASIO, 1988). 18 1. 6 BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A PSICOLOGIA NO BRASIL FIGURA 5 FONTE: Disponível em: www.veja.abril.com.br. Acesso em 14/05/2013 É possível falar de uma Psicologia genuinamente brasileira? Até bem pouco tempo parecia impossível até mesmo pensar sobre essa possibilidade. O filósofo Farias Brito (1912, p. 277, apud ANTUNES, 2004 ) retrata bem essa posição pessimista ao questionar que: de todo esse assunto, de tão alta significação, o que motivaria entre eles incentivaria o interesse dos homens mais eminentes de todo o mundo? A resposta deveria ser: nada, absolutamente nada! Pois, para ele, realmente, o solo da intelectualidade nacional não parecia ser terreno fértil e propício para a semente da nova Ciência. Depois de posição tão desoladora, é importante ressaltar que se o pensamento culto brasileiro não fosse tão fértil, a Psicologia enquanto Ciência não teria tido a expansão tão grande que teve no início século XX, e ainda hoje continua tendo. Poucas vezes uma Ciência cresceu tanto e em tantas áreas ao mesmo tempo como a Ciência Psicológica, e de forma específica, a Ciência Psicológica Brasileira. O brasileiro tem as suas peculiaridades e, se ainda hoje ainda importamos boa parte das pesquisas da Europa e dos Estados Unidos, também já se fazem adaptações de testes psicológicos para a realidade brasileira, o que demonstra o franco crescimento dessa Ciência em nosso País. 19 A Psicologia enquanto profissão, por exemplo, está presente nas áreas jurídica, clínica, organizacional, dos esportes, hospitalar, do comportamento animal, etc. Além disso, o Brasil foi um dos primeiros países do mundo a regulamentar a profissão de Psicólogo, pela Lei 4.119. Infelizmente, não há muitos registros daquilo que se produz no Brasil em termos de Ciência Psicológica, pelo menos em termos proporcionais. Aprendeu-se a supervalorizar aquilo que vem de fora e a desvalorizar a nossa produção, seja ela artística ou científica e de que área for. Por um lado, os profissionais de Psicologia não registram seu trabalho, talvez por considerarem de pouco valor (seria um complexo de inferioridade?). Por outro lado, o Brasil, pelo próprio processo de colonização, sofre daquilo que se pode denominar “Complexo de Menos Valia”. E assim se forma uma profissão sem registros, sem memória, sem história, aliás, noção plenamente generalizada para outras áreas no Brasil. Infelizmente, ainda há uma grande quantidade de conhecimentos importados, de forma especial, o conhecimento importado dos Estados Unidos. O grande problema é que a nossa gente e a nossa cultura são diferentes e aquilo que se aplica para outros países muito provavelmente não se aplicará para nosso povo. Principalmente em se tratando de questões psicológicas e emocionais, pois se tem no Brasil, uma diversidade religiosa e cultural completamente incomum a outros lugares. Daí se questionar tanto a validade dos testes psicológicos, em sua grande maioria criados em outros países e aplicados aqui. Ao realizar um breve retrospecto da história da Psicologia no Brasil, vê-se que no início do século XX muitos estudantes que se interessaram pela Psicologia foram estudar no exterior, vislumbrando problemas e “soluções” típicos daqueles locais. Ao retornarem ao Brasil, assumiram a posição de intelectuaisdominadores, colocando o Brasil na posição de “objeto de pesquisa”. Dentro dessa perspectiva, tudo o que partia do povo, sua cultura, suas crenças, seus valores, era menosprezado, considerado como “não científico”. Apagar hábitos, costumes e tradições eram “papel científico”, sua “mais nobre função”. Decorre daí que um povo que não preserva as suas próprias raízes se torna mais fácil de dominar, pois não reconhece a sua própria identidade. Um povo sem história é um povo sem identidade. E um povo sem identidade assume a identidade de qualquer outro como sendo sua. O que não é verdade soa falso, inautêntico. Esse fato é visto muito facilmente nos hábitos 20 alimentares, na linguagem, na forma de vestir... É urgente a necessidade de nos reconhecermos como Nação e valorizar aquilo que é genuinamente nosso. Boa parte desse problema tem a sua origem no Pensamento Positivista, que não considera o conhecimento histórico como algo de valor científico, o que se torna um impedimento ao próprio avanço. Ao desvalorizar a contribuição da cultura pré-científica à evolução do conhecimento humano, essa corrente restringe a história da Psicologia ao desenvolvimento da Psicologia científica nos últimos dois séculos. A exclusão do domínio historiográfico dos conhecimentos psicológicos difundidos no seio das diferentes tradições culturais e julgados não relevantes implica a renúncia à memória das raízes dessa disciplina presente em tais tradições e o esquecimento das questões originais que determinaram o seu surgimento, ou favoreceram sua influência e seu desenvolvimento em específicos ambientes culturais. Outra consequência é a redução da Psicologia a apenas a europeia e norte-americana, revestidas de uma pretensa universalidade (ANTUNES, 2004). Felizmente, o que era visto como avanço científico, hoje é visto como sério entrave ao conhecimento. Não há mais como negar o profundo nexo entre Ciência e conhecimento histórico. Parte daí a busca incessante de vários estudiosos em Psicologia para encontrar as verdadeiras raízes do conhecimento psicológico brasileiro. A partir do século XVI, o que se vê é uma combinação original entre o que se pode denominar de psicologia indígena e conhecimentos europeus. Como exemplos desses primeiros registros, podemos citar os seguintes títulos: Tratados da terra e gente do Brasil (Londres, 1625), Notícias curiosas e necessárias sobre o Brasil (Lisboa, 1668), Crônicas (Lisboa, 1661), Sermões-XV volumes (Lisboa, 1696), Arte de criar bem os filhos na idade de puerícia (Lisboa, 1685), Nova Escola para aprender a ler, escrever e contar (Lisboa, 1722), Viridiário Evangélico-IV volumes (Lisboa, 1724; 1734; 1746, 1755), Progymnasma literário e tesouro de erudição sagrada e humana, para enriquecer o ânimo de prendas e a alma de virtudes (Lisboa, 1737), Reflexões sobre a vaidade dos homens ou Discursos morais sobre os efeitos da vaidade (Lisboa, 1752), Problemas de Arquitetura Civil, a saber: Porque os edifícios antigos têm mais duração e resistem mais ao tremor de terra que os modernos? (Lisboa, 1770). Muito interessantes são os relatos sobre o comportamento social dos índios em uma fase de pré-colonização. Eles revelam muito sobre uma forma peculiar de Psicologia, a indígena. 21 De acordo com esses relatos, o amor às crianças é intenso e se alguém trata bem aos pequenos indígenas tem dos pais aquilo de que precisar. O papel maternal é extenso, ou seja, as mulheres das tribos cuidam das crianças como se fossem suas mães. Depois do parto, a mulher levanta-se e ocupa-se de suas tarefas domésticas e da roça. Enquanto o marido fica deitado na rede e recebe as visitas e os cuidados de amigos e parentes – como se fora a mulher. Para dar atenção à criança, o pai se afasta do trabalho e permanece em casa. A mãe amamenta a criança exclusivamente de leite materno até um ano, um ano e meio e em alguns casos até os sete ou oito anos. As índias, no período da colonização, foram proibidas de amamentar seus filhos por período prolongado – à moda das mulheres portuguesas, que entregavam seus filhos às amas nos primeiros anos –, tendo como justificativa que, se amamentadas, as crianças cresceriam ‘frouxas’. Atualmente, o hábito de amamentar é amplamente estimulado e reconhecido como benéfico pela Ciência. Há relatos daquele período de que as crianças indígenas participavam ativamente da sociedade e da rotina da vida adulta. Os pais levavam as crianças para junto de si quando vão trabalhar. De igual modo, os hábitos higiênicos são aprendidos desde cedo: as crianças levantam cedo e vão ao rio, lavar-se e nadar. Os jogos simbólicos, tão enfatizados por psicanalistas como Erik Erikson e Bruno Bettelheim são prática comum na vida das crianças indígenas há muito tempo. Iniciadas na vida social e religiosa desde cedo, elas cantam, dançam e representam nas suas tribos e as brincadeiras variadas são feitas com muita alegria. Segundo relatos do período colonial, as crianças eram muito mais alegres que os meninos portugueses e as brincadeiras ocorriam sem brigas nem palavrões. É prática comum os mais hábeis ensinarem os outros a tocar e a cantar. Não se observam práticas punitivas nas comunidades indígenas e há uma relação de estreito afeto entre pais e filhos. Também não se observa uma divisão radical entre infância e vida adulta, mas as regras sociais são transmitidas gradativamente, sempre ao lado de algum adulto, pai ou mãe, o que se transforma em uma fonte de segurança e saúde emocional. As condições de vida social indígena aparecem como elementos que facilitam um desenvolvimento psíquico sadio e bem integrado em todos os seus fatores. A clareza acerca do significado e da positividade da vida, transmitida pelos adultos, permite à infância indígena uma alegria, vivacidade, abertura à realidade, muitas vezes relatadas pelos missionários e viajantes do período colonial, em seus diários. 22 Pode-se dizer que, de modo geral, na formação da cultura brasileira, a Psicologia, antes do advento desse saber enquanto Ciência ocupava um lugar de conhecimento generalizado difuso, presente em diversas áreas humanas. No Brasil do século XIX, a Psicologia se restringe na transmissão e interpretação de conhecimentos vindos da Europa e dos Estados Unidos. Observa-se uma descontinuidade entre conceitos e práticas de conhecimentos psicológicos do período colonial e aqueles adquiridos no século XIX. Esse fato se deve à intensa desvalorização de tudo o que foi aprendido anteriormente, havendo, então, uma tentativa de apagar todo e qualquer registro e impregnar uma “nova psicologia”, a “psicologia médica”. Quase nada se sabe acerca das produções brasileiras. Pouco se fala das publicações psicopedagógicas de Alexandre de Gusmão, da obra de Padre Vieira ou do Frei Mateus da Encarnação Pinna. Nossos pensadores não são reconhecidos, à época, como intelectuais. Pode-se afirmar que o esquecimento praticado no século XIX a respeito da tradição anterior é uma das causas da “perda de memória” da Psicologia atual. A fragmentação e a dispersão dos conhecimentos psicológicos também são uma grande barreira à tentativa de unificação dessa Ciência, pois seus conhecimentos nascem da Medicina e da Filosofia e perpassam a Política, Sociologia, Direito e Religião. Sem dúvida, as dificuldades se iniciam a partir de seu objeto de estudo: a subjetividade humana. Apesar disso, ou até mesmo por causa disso, a Psicologia também é reconhecida como uma Ciência altamente rica e complexa, perpassando várias áreas humanas. 23 2 GRANDES PENSADORES DA PSICOLOGIA E AS ABORDAGENS DELES DERIVADAS FIGURA 6 - LETRA GREGA PSI, SÍMBOLO DA PSICOLOGIA FONTE: Arquivo pessoal do autor. 2.1 INÍCIO, O ESTRUTURALISMO Considera-se Wilhelm Wundt como fundador da psicologia moderna, por ter criado, em 1879, o primeiro laboratório de psicologiana universidade de Leipzig (na Alemanha). A Psicologia só se tornou uma ciência independente da Filosofia graças a Wundt, nos finais do século XIX. Foi a partir desse acontecimento que se desenvolveram de forma sistemática as investigações em psicologia, por intermédio de vários autores que a essa ciência se dedicaram, construindo múltiplas escolas e teorias. Wundt criou o que, mais tarde, seria chamado de Estruturalismo, por Edward Titchener; cujo objeto de estudo era a estrutura consciente da mente, as sensações. Segundo essa perspectiva, o objetivo da Psicologia seria o estudo científico da Experiência Consciente por meio da Introspecção. Titchener levou a ideia da Psicologia para os Estados Unidos da América, modificando-a em alguns pontos. As principais limitações do Estruturalismo residem no fato de a introspecção não ser um verdadeiro método científico incontestável e de essa corrente excluir as psicologias animal e infantil. Essa corrente foi extinta em meados do século XX (BADCOCK, 1976). 24 2.2 FUNCIONALISMO O Funcionalismo é o modelo que substitui o Estruturalismo na evolução histórica da Psicologia, sendo o seu principal impulsionador William James. O principal interesse dessa corrente teórica residia na utilidade dos processos mentais para o organismo, nas suas constantes tentativas de se adaptar ao meio. O ambiente é um dos fatores mais importantes no desenvolvimento (JAMES; DEWEY; VEBLEN, 1974). 2.3 WUNDT E O ASSOCIACIONISMO Wilhem Wundt (1832-1920), juntamente com o seu discípulo Tichener, inicia o caminho que irá levar a Psicologia a atingir o estatuto de ciência. Começa por definir como objeto da Psicologia o estudo da mente: o estudo da mente (ou consciência) faz-se ao nível do consciente do ser humano pela análise dos elementos simples da mente, à semelhança da divisão em átomos da realidade (MONTEIRO, 2003). Para ele e seus seguidores (nomeadamente Edward Tichener, 1867-1927), as operações mentais não eram mais do que a organização de sensações elementares, procurando relacioná-las com a estrutura do sistema nervoso. No seu laboratório, em Leipzig, vai procurar conhecer a forma como se relacionam e associam os elementos da consciência: é a concepção associacionista dos comportamentos. Para atingir esse objetivo, vai utilizar como método a introspecção (observação interna), mas de um modo controlado: observadores treinados deveriam, no laboratório, descrever as suas próprias experiências, resultantes de uma situação experimental definida. Os dados eram depois relacionados e interpretados por uma equipe de psicólogos; exemplo, após a apresentação de um estímulo visual ou som teriam de descrever as sensações recorrendo a um conjunto definido de termos para maior objetividade. 25 2.4 PAVLOV E A REFLEXOLOGIA FIGURA 7 - PAVLOV FONTE: Disponível em: www.sonoma.edu/psychology/images/pavlov.gif. Acesso em 14/05/2013 Você está condicionado a fazer isto ou aquilo. Joãozinho precisa de um reforço escolar. Os trabalhadores da empresa estão sem estímulo. Sequestradores precisariam ser punidos no Brasil. Todos nós já ouvimos expressões desse tipo pelo menos uma vez na vida. Em grande parte o nosso vocabulário de base comportamentalista se deve ao pensador Pavlov, devido a uma de suas clássicas experiências fisiologistas; e uma das mais conhecidas é a que ele realizou com cães. Esse experimento pode ser descrito de forma simplista, da seguinte forma: o cientista tocava uma sineta e em seguida oferecia alimento ao cão. Depois de algumas vezes repetindo essa experiência ele passou a apenas tocar a sineta e observou, usando equipamentos de laboratório, que esse simples ato estimulava as glândulas salivares do cão, fazendo-o produzir secreção e exibir um comportamento de esperar pela chegada do alimento. Esse comportamento poderia ser reforçado e se tornar cada vez mais forte ou se tornar tênue até a ponto de ser extinto, a depender das variáveis apresentadas ao sujeito. http://www.sonoma.edu/psychology/images/pavlov.gif 26 FIGURA 8 FONTE: Disponível em: http://animalbehaviour.net/gifs+pics/Pavlov's_dog.jpg. Acesso em 14/05/2013. Os conhecimentos advindos dos experimentos de Pavlov se generalizaram e, com as devidas adaptações, puderam ser utilizados em muitas outras áreas e atualmente são empregados nos setores empresarial, escolar e clínico, principalmente. Na área de adestramento animal, até hoje os princípios da Reflexologia de Pavlov são empregados. Pavlov continuou suas pesquisas em ritmo intenso, estudando minuciosamente aquilo a que hoje denominamos sistema nervoso, e sistematizou um conjunto de leis fisiológicas, o que lhe valeu o Prêmio Nobel de Medicina, em 1904. Segundo esse cientista, é no córtex cerebral o local onde reside o espírito. É lá onde os comportamentos nascem, se modificam e são extintos. Atualmente, essas ideais já não são utilizadas de forma tão radical, apesar de muitas delas se fazerem presentes, de forma mais sutil, no chamado neobehaviorismo; contudo, é na aprendizagem onde ganha um forte impacto. Veja o nosso sistema de avaliações, por exemplo! O pensamento pavloniano foi aprofundado pelo cientista J. B. Watson. Ao reflexo condicionado de Pavlov, ele acrescentou o condicionamento denominado operante. Era tanta a confiança de Watson que ele afirmou em certa ocasião que bastava entregar nas mãos dele uma dúzia de crianças bem nutridas e um ambiente favorável e ele as transformaria naquilo que ele quisesse e isso não iria depender da raça, aptidões ou inclinações intelectuais. Da mesma forma, poderia transformar essas crianças em ladrões ou pedintes, caso desejasse. http://animalbehaviour.net/gifs+pics/Pavlov's_dog.jpg 27 Essa forma de pensar e fazer a Psicologia trouxe para si um sem-número de críticas, principalmente a de ser “reducionista”, ou seja, o pensar psicológico estaria reduzido ao comportamento, fosse ele humano ou animal. O fato é que, por causa desse sistema de conhecimentos sobre o comportamento, a Psicologia pode ser reconhecida atualmente como Ciência, embora ainda seja vista com certa desconfiança pelos pensadores mais radicais de outras áreas, principalmente aquelas mais antigas, como o Direito e a Medicina. É lógico que isso não se aplica a todos. Para os behavioristas, entretanto, que se utilizavam e ainda se utilizam, do conhecimento objetivo, todo e qualquer comportamento poderia ser medido, quantificado, controlado, como também a possibilidade de repetir ações poderia ser prevista. Dentro de uma perspectiva mais radical, pode-se afirmar que a hereditariedade não é levada em conta e o ambiente só é considerado como forma de exercer um maior controle sobre as variáveis. Emoções não são levadas em conta. Não se cogita o subjetivo. Contudo, houve um intenso estudo dos processos cognitivos, dando origem em grande parte àquilo que hoje se denomina Neuropsicologia. O pensamento Behaviorista Radical é norteado por princípios que aos nossos olhos podem parecer estranhos, a depender da perspectiva com que observarmos esses parâmetros. Essa corrente apregoa que todo e qualquer comportamento se constitui de uma resposta a estímulos. Comportamentos simples são formados por cadeias menores e comportamentos mais complexos são simplesmente o somatório de redes mais simples de comportamentos interligados. O comportamento humano passa a ser visto, então, como fruto dos movimentos musculares e das secreções glandulares, o que parece absurdo aos nossos olhos. Watson não se resumiu à vida acadêmica, mas chegou a ser vice-presidente de uma agência de propaganda. Dentro dessa linha de pensamento também se destacaram nomes como Skinner, Tolman e Hull. 28 2.5 BEHAVIORISMO, A PRIMEIRA POTÊNCIA FIGURA 9 - JOHN B. WATSON FONTE: Disponível em:arbeitsblaetter.stangl-taller.at. Acesso em 14/05/2013 A maior escola de pensamento americana surgiu no início do século XX, sendo influenciada por teorias sobre o comportamento e fisiologia animal. A tradução do inglês de Behavior é comportamento, portanto, o foco de estudo do comportamentismo ou comportamentalismo (título traduzido) é o comportamento observável, e o condicionamento é o método utilizado nessa escola. Foi fundada por John B. Watson (Behaviorismo Metodológico) que acreditava que o controle do ambiente de um indivíduo permitia desencadear qualquer tipo de comportamento desejável. Traz do funcionalismo a aplicação prática da Psicologia; o seu foco está na aprendizagem. Segundo essa perspectiva não se pode estudar cientificamente os pensamentos, desejos e sentimentos que acompanham os comportamentos em estudo (WATSON, 1972). 29 2.5.1 Burrhus Frederic Skinner FIGURA 10 - SKINNER FONTE: Disponível em: www.facade.com/celebrity/B_F_Skinner>. Acesso em 14/05/2013 Foi influenciado, inicialmente, pelas teorias de Ivan Pavlov e Edward Thorndike. E, posteriormente, pelas teorias do operacionismo. Foi Burrhus Frederic Skinner o maior autor neocomportamentalista, levantando a tona seu condicionamento operante e a modificação do comportamento (Behaviorismo Radical). No meio do século XX, vários autores escreveram sobre o pensamento, a cognição. Diziam fazer parte do comportamento este pensamento, estava sendo criada uma divisão no behaviorismo: a Psicologia Cognitiva. Alguns autores desta escola foram: Albert Bandura, Julian Rotter e Aaron Beck. Estes falavam que o comportamento pode ser entendido também a partir da cognição. O aprendizado pode existir sem a necessidade de condicionamento em laboratório, mas pela observação e elaboração do que foi visualizado. É chamada de a primeira grande força da psicologia (SKINNER, 2006). http://www.facade.com/celebrity/B_F_Skinner 30 2.6 GESTALT, A PSICOLOGIA DA FORMA FIGURA 11 FONTE: Disponível em: <web.educastur.princast.es/.../191gestalt.gif>. Acesso em 14/05/2013. Fundada dentro da filosofia por Max Wertheimmer e Kurt Koffka, a Gestalt traz novas perguntas e respostas para a Psicologia. Ela se detém nos campos da percepção e na visão holística do homem e do mundo. A palavra gestalt não tem uma tradução para o português, mas pode ser entendida como forma, configuração. Criticava principalmente a psicologia de Wundt, que era chamada de psicologia do “tijolo e argamassa”, pois via a mente humana dividida em estruturas. A Gestalt preocupa-se com o homem visto como um todo, e não como a soma das suas partes (o lema da Gestalt é justamente este: o todo é mais que a soma das suas partes). No ano de 1951, Frederic S. Pearls cria a teoria Gestalt-terapia, trazendo consigo a teoria de campo de grupos de Kurt Lewin. 31 2.7 PSICANÁLISE FIGURA 12 - SIGMUND FREUD FONTE: Disponível em: <www.thecjc.org/sfreud.htm>. Acesso em 14/05/2013. Quando se pensa em procurar um psicólogo, um emaranhado de ideias invade a mente: tem-se a falsa impressão de que é preciso estar transtornado emocionalmente ou mentalmente para procurar ajuda. Na verdade o psicólogo deveria trabalhar em uma perspectiva muito mais de promoção à saúde que propriamente no âmbito meramente curativo, mas os preconceitos em relação ao seu trabalho muitas vezes o impedem de trabalhar dentro dessa perspectiva. Também se imagina uma sala sombria, com móveis pretos e um divã. Atrás dele alguém calado e de aspecto severo, fechado. Muito desse imaginário coletivo faz parte do legado deixado por Sigmund Freud, pai da Psicanálise (1856-1939). Na verdade nem todo psicanalista é psicólogo. Ele pode ser formado em Medicina, por exemplo. O médico psiquiatra também pode utilizar a Psicanálise para a elaboração de alguns conceitos. O psicólogo, por sua vez, trabalha dentro do que denomina abordagem, que pode ser: Humanista, Existencialista, Behaviorista ou Psicanalista, a depender da base teórica que dá sustentação à sua prática. Isso também não quer dizer que o psicólogo só possa utilizar-se dos conhecimentos de sua abordagem. 32 É cada vez maior o número de psicólogos denominados temáticos, ou seja, aqueles que utilizam diversos arcabouços teóricos, a depender da demanda daquele momento. São também denominados de psicólogos ecléticos. Sigmund Freud foi um médico psiquiatra que estudou sobre vários assuntos e levou bem mais tempo que seus colegas para se formar, por ter utilizado boa parte de seus anos em estudos de laboratório. Estudou, por exemplo, temas como a fisiologia dos peixes. O seu interesse pela Psiquiatria, entretanto, se iniciou com as descobertas de Charcot, seu futuro mestre, e os estudos sobre histeria, considerado naquela época, doença de mulher, principalmente daquelas que não haviam casado. O termo histeria vem de ‘útero’ e até hoje as mulheres solteiras de idade mais avançada são chamadas de forma desprezível, de histéricas. Freud descobriu que a histeria possuía causas emocionais e que as pessoas nas quais eram recalcadas, ou seja, as que não extravasavam seus desejos libidinais, poderiam sofrer de crises histéricas, inclusive homens. Essa descoberta, ao ser proclamada em um encontro científico, causou furor nos médicos presentes, que se retiraram, deixando o doutor Freud falando sozinho naquele encontro internacional. Freud viu suas aulas particulares se esvaziarem de alunos. Como também suas turmas da faculdade se tornaram pouco frequentadas. Polêmico, mas obstinado, estudava até as três horas da manhã, e muito material escrito acabava sendo jogado no lixo, pois já discordava de tudo aquilo. Suas teorias iam ser reescritas por várias vezes durante a sua vida. Trabalhou com hipnose, mas logo reconhecera a sua falta de habilidade com tal técnica e percebeu que poderia produzir os mesmos efeitos com a técnica da associação livre, o que daria origem à cura pela fala, ou, como ficaria conhecida mais tarde, Psicanálise. A Psicanálise foi considerada por Freud como um conhecimento firmado em um tripé composto por técnica, teoria e pesquisa, principalmente. A Psicanálise é conhecida pela investigação do inconsciente e pela descoberta da sexualidade infantil, tema polêmico até hoje. Freud não teve apenas um mestre, mas vários nomes inspiraram sua teoria, desde Goethe a Nietzsche e costumava ler desde Literatura e Antropologia, a livros de Biologia e Fisiologia Animal. Também tinha uma predileção por antiguidades. Um personagem importante da Psicanálise é seu discípulo, Carl G. Jung, primeiro presidente da sociedade psicanalítica. Com o avanço da teoria de Freud em relação à sexualidade infantil, Jung, que não concordava com o que Freud afirmava acerca do assunto, 33 rompe com o psicanalista e segue outro caminho, criando uma nova teoria, denominada Psicologia Analítica. A proposta inicial foi retirar do inconsciente o seu teor puramente sexual. Mas Freud retifica o ex-colega, dizendo que “o ego possui várias naturezas das pulsões, mas a pulsão sexual é a que ganha mais investimento”. Freud, inclusive, alerta que é possível canalizar as pulsões libidinais para as artes ou a produção científica. O conceito de inconsciente foi criado anos antes, e Freud utilizou-se desse termo com outro sentido, encarregando-se de criar uma teoria acerca do tema. Na Psicanálise, inconsciente significa outra ordem, com outras regras, um dos elementos do aparelho psíquico, constituído por pensamentos, memórias e desejos que não se encontram em nível consciente, mas que exercem grande peso no comportamento humano. Existem atualmente várias correntes psicanalíticas, oriundas de pensadores que ampliaram ou discordaram da visão freudiana. Dentre esses nomes estão Anna Freud, filha de Freud, Melanie Klein, Lacan,Bion, Winnicott, Carl G. Jung, Alfred Adler, Erik Erikson, Carl Rogers etc. (TALAFERRO, 1996). A Psicanálise hoje se apresenta de várias formas, que são a psicanálise ortodoxa, a psicanálise nova (ou neopsicanálise) e a psicologia de orientação analítica ou de orientação psicanalítica (utilizada não só por psicanalistas formados, mas também por psicólogos não especializados), todas com algumas peculiaridades. A Psicanálise é considerada a segunda grande força de Psicologia, e segundo o Conselho Federal de Psicologia Brasileiro e demais Conselhos Regionais de Psicologia (CRPs). A Psicanálise é aceita no meio acadêmico, porém só pode ser utilizada de forma integral com uma formação em Psicanálise, devo dizer que ainda não reconhecida pelo MEC. Caso contrário, deve-se utilizar a técnica de psicoterapia de orientação psicanalítica. Para a Psicanálise, as ações humanas são orientadas, basicamente, por três instâncias mentais (simbólicas): consciente (EGO) – raciocínio, operações lógicas; pré-consciente (SUPEREGO) – memórias, interiorização de regras sociais, produzem angústias, ansiedades e “pune” o EGO quando este aceita impulsos vindos do ID; inconsciente (ID) – pulsões, desejos e medos recalcados. Não obedece à lógica nem à moral. Representa os impulsos e os instintos. 34 Para ter acesso ao inconsciente, o psicanalista utiliza processos indiretos, tais como: Hipnose Consiste em induzir o paciente, por meio de uma sugestão intensa, a um estado semelhante ao sono, a partir do qual é possível estabelecer a comunicação com o hipnotizador e ser sugestionado, podendo assim revelar memórias ocultas ou ser condicionado para determinada ação ou comportamento. A hipnose é pouco usada atualmente. Sua utilização se restringe ao controle de comportamentos de uso abusivo de álcool e drogas e só deve ser praticada por profissionais capacitados e treinados devidamente. Método psicanalítico, recorrendo às técnicas de: o interpretação dos sonhos; o interpretação de atos falhos; o transferência, ou seja, o paciente atua, durante a sessão, em relação ao psicanalista, como se ele fosse uma outra pessoa: pai, mãe, namorado, etc. Cabe ao profissional trabalhar com essa “encenação” de forma a levar o paciente à cura de seu trauma. Nesse jogo se encontram envolvidos sentimentos e emoções muito fortes, de raiva, ressentimento, paixão... A Psicanálise se popularizou demais, o que levou seu vocabulário a ser utilizado de forma indiscriminada e também a graves erros de interpretação. Além disso, várias pessoas praticantes de charlatanismo se dizem “psicanalistas”. 2.8 HUMANISMO FIGURA 13 - CARL ROGERS FONTE: Disponível em: www.psychotherapie-netzwerk.de. Acesso em 14/05/2013. 35 O enfoque da Psicanálise no inconsciente, e seu determinismo, e o enfoque na observação apenas do comportamento, pelo behaviorismo, foram as críticas mais fortes dos novos movimentos de Psicologia surgidos no meio do século XX. Na verdade o Humanismo não é uma escola de pensamento, mas sim um aglomerado de diversas correntes teóricas. Em comum elas têm o enfoque humanizador do aparelho psíquico, em outras palavras, elas focalizam o ser humano como detentor de liberdade, escolha, sempre no presente. Traz da filosofia fenomenológico-existencial um extenso gabarito de ideias. Foi fundada por Abraham Maslow, porém a sua história começa muito tempo antes. A Gestalt foi agregada ao Humanismo pela sua visão holística do homem, sendo importante campo da Psicologia, na forma de Gestalt- terapia. Mas foi Carl Rogers, um psicanalista americano, um dos maiores exponenciais da obra humanista. Ele, depois de anos afinco praticando psicanálise, notou que seu estilo de terapia se diferenciara muito da terapia psicanalítica. Ele utilizava outros métodos, como a fala livre, com poucas intervenções, e o aspecto do sentimento, tanto do paciente, como do terapeuta. Deu-se conta de que o paciente era detentor de seu tratamento, portanto não era passivo, como passa a ideia de paciente, denominando então este como cliente. Era a terapia centrada no cliente (ou na pessoa). Seus métodos foram usados nos mais vastos campos do conhecimento humano, como nas aulas centradas nos alunos, etc. Apresentou três conceitos, que seriam agregados posteriormente para toda a Psicologia. Esses eram a congruência (ser o que se sente, sem mentir para si e para os outros), a empatia (capacidade de sentir o que o outro quer dizer, e de entender seu sentimento), e a aceitação incondicional (aceitar o outro como este é, em seus defeitos, angústias, etc.). Erik Erikson, também psicanalista, trouxe seu estudo sobre as oito fases psicossociais, em detrimento das quatro fases psicossexuais de Freud, onde todas as fases eram interdependentes, e não necessariamente determinam as fases posteriores; para ele o homem sempre irá se desenvolver, não parando na primeira infância. Viktor Frankl, com sua logoterapia, veio a acrescentar os aspectos da existência humana, e do sentido da vida, onde um homem, quando sente um vazio de sentido na vida, busca auxílio, pois não se sente confortável em viver sem sentido ou ideais. Diz também que eventos muito fortes podem adiantar a busca pelo sentido da vida. Tais eventos podem criar desconforto, trauma intenso, mas podem criar um aspecto de fortaleza no indivíduo (ROGERS, 1961, 1974). 36 2.8.1 Pirâmide de Maslow Maslow trouxe, para a Psicologia que havia fundado, estes autores, agregando, ainda seus estudos sobre a pirâmide de necessidades humanas. FIGURA 14 - PIRÂMIDE DE MASLOW FONTE: Disponível em: <staff.gc.maricopa.edu/.../blackboard/MASLOW.JPG>. Acesso em 14/05/2013. Para Maslow, as necessidades fisiológicas precisam ser saciadas para que se precise saciar as necessidades de segurança. Estas, se saciadas, abrem campo para as necessidades sociais, que se saciadas, abrem espaço para as necessidades de auto-estima. Se uma destas necessidades não está saciada, há a incongruência. Quando todas estiverem de acordo, abre- se espaço para a auto-realização, que é um aspecto de felicidade do indivíduo. Esta é hoje considerada a terceira grande força dentro da psicologia. (FRICK, 1975). 37 2.9 PSICOLOGIA TRANSPESSOAL FIGURA 15 FONTE: Disponível em: www.rcespiritismo.com.br. Acesso em 14/05/2013 Maslow estava insatisfeito com sua própria teoria, dizendo que faltava-lhe o fato de o homem ser um ser espiritualizado. Para ele eram importantes a espiritualidade e as características da consciência alterada, teoria de Stanislav Grof. Criou então, com ajuda de outros psicólogos, uma teoria que era abrangente nesse aspecto. Como Carl G. Jung era um estudioso dos aspectos transcendentais da consciência, foi tomada sua teoria para incorporar a Psicologia Transpessoal. A abordagem Transpessoal é, portanto, uma área da Psicologia que estuda as possibilidades psíquicas (mentais, emocionais, intuitivas e somato-sensoriais) do ser humano pelos diferentes estados ou graus de consciência pelos quais passa a pessoa (para se ter ideia do que sejam estados de consciência, lembre-se que o estado de consciência de quando se está acordado é diferente do estado de consciência de quando se está dormindo; que o estado de consciência de quando se resolve um problema de matemática é diferente de quando se assiste a um filme, etc.) (JORNAL INFINITO, 2003). Em cada um desses estados de consciência (que são vários, alguns ainda desconhecidos) é experimentada uma forma diferente de se perceber ou interpretar a realidade (quando estamos com raiva ou frustrados, percebemos o mundo de uma maneira muitíssimo diversa de quando estamos apaixonados). http://www.rcespiritismo.com.br/ 38 A Psicologia Transpessoal, portanto, volta-se para o estudo desses diversos estados, não os encarando como contrários,mas como complementares, dando, porém, especial ênfase àqueles estados de consciência superiores, espirituais ou “transpessoais”. Porque, em tais estados, o sentimento de separação e de egoísmo torna-se um segundo plano em relação a um sentimento e identificação mais ampla, cooperativa, fraternal, transpessoal para com todos os seres vivos (consciência crística, búdica, nirvânica, universal ou ecológica). Segundo a Teoria Transpessoal, Francisco de Assis, Gandhi, Jesus Cristo, Einstein, Luther King e tantos outros grandes nomes foram detentores de outra forma de ver e sentir o mundo que o fizeram capazes de ajudar o próximo e tornaram-se capazes de ver o mundo de outra forma. A essa capacidade eles denominam “consciência cósmica”. A Psicologia Transpessoal fala de vários níveis de consciência, que vão do mais obscuro (a sombra), até o mais alto grau de consciência, a transpessoal. Por ter seu foco na consciência e seus aspectos, foi também chamada de Psicologia da Consciência. Seu estudo é recente e traz muitas características que necessitam de um estudo maior (TABONE, 2005). Vale ressaltar que a Psicologia Transpessoal ainda não é reconhecida como prática científica pelo Conselho Federal de Psicologia e os psicólogos inscritos no Conselho não estão autorizados a tê-la como prática profissional. 2.10 PSICODRAMA “Um Encontro de dois: olhos nos olhos, face a face. E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei no lugar dos meus; E arrancarei meus olhos para colocá- los no lugar dos teus; Então ver-te-ei com os teus olhos e tu ver-me-ás com os meus” (J. L. Moreno). 39 2.10.1 Jacobo Levy Moreno FIGURA 16 - MORENO FONTE: Disponível em: <www.jacobmoreno.it/images/morenofoto1.gif>. Acesso em 14/05/2013. O Psicodrama pode ser considerado como um dos meios psicoterápicos mais inovadores. Falar em Psicodrama nos remete a um médico romeno chamado Jacob Levy Moreno. Ele foi o criador do Psicodrama e do Sociodrama, reverenciado como exemplo de criatividade e dedicação à investigação psicológica e social. Ele nasceu na Romênia, em 1892, e faleceu nos EUA, em 1974. Foi um homem de ampla cultura e fortes ideias religiosas e filosóficas, amante do teatro e incansável investigador do ser humano e de seus vínculos afetivos; deixou-nos uma vasta obra escrita e um movimento psicodramático que abrange a América, Europa e Ásia. Em 1925, indo morar nos EUA, desenvolveu e sistematizou suas descobertas: a socionomia, sendo dividida em sociometria, sociodinâmica e a sociatria. A socionomia é o estudo do grupo e suas relações. A sociometria visa medir as relações entre os membros do grupo, evidenciando as preferências e evitações presentes nas relações grupais. Utiliza como método o teste sociométrico. A sociodinâmica se interessa pela dinâmica do grupo e utiliza como método o role-playing ou jogo de papéis. Já a sociatria busca tratar as relações grupais e utiliza três métodos: o Sociodrama, a psicoterapia de grupo e o Psicodrama. 40 Com a leitura de suas obras, muitos autores declaram que o Psicodrama possui um grande conteúdo emocional e uma audácia renovadora, pois surgiu como uma nova e dinâmica linha de investigação para o conhecimento e terapia dos conflitos psicológicos. Para o surgimento dessa teoria, Moreno desafiou críticas, rompeu com o movimento médico da sua época, atacando os valores oficiais, conseguindo desenvolver uma teoria baseada em uma concepção de ser humano e saúde que tem como núcleo a espontaneidade. O otimismo sobre o vital, o amor, a catarse e os papéis que o Eu do indivíduo vai formando (MORENO, 1980). Essa busca pelo reencontro dos verdadeiros valores éticos, religiosos e culturais em uma forma dramática espontânea (mais tarde, denominado como desenvolvimento do Axiodrama) foi o primeiro conteúdo do Psicodrama. O lugar do nascimento do Psicodrama foi um teatro dramático de Viena. Moreno declarou que não possuía nenhuma equipe de atores, nem uma peça e que neste dia apresentou-se sozinho, sem nenhuma preparação, ante um público de mais de mil pessoas. Segundo ele, no palco havia somente uma poltrona de espaldar alto, como o trono de um rei, no assento, uma coroa dourada. Surgiu com um intento de tratar e curar o público de uma enfermidade, uma síndrome cultural e patológica que os participantes compartilhavam no momento (Viena encontrava-se em pós-guerra, não havia governo... a Áustria estava inquieta em busca de uma nova alma). Mas psicodramaticamente, Moreno possuía um elenco e uma obra. Uma vez que o público era seu elenco, e a obra era retratada pela trama demonstrada pelos acontecimentos históricos, no qual cada um representava seu papel real. Cada representante de um papel foi então convidado para subir ao palco, e encenar o papel de um rei, sem preparação e diante de um público desprevenido, que funcionava como jurado. Mas nesse primeiro momento nada se passou. Ninguém foi achado digno de ser rei e o mundo permaneceu sem líder. Apesar do aparente fracasso dessa primeira representação, esse foi o marco do nascimento de uma nova modalidade de expressão catártica que, instrumentada pelo exercício da espontaneidade e sustentada na teoria dos papéis, viria a se constituir o método psicodramático de abordagem dos conflitos interpessoais, cujo âmbito natural é o grupo. Surge então, a expressão “psicoterapia de grupo”. 41 O Psicodrama desde seus primórdios estabeleceu um setting basicamente grupal, com a presença do terapeuta (diretor de cena), seus egos auxiliares e os pacientes (tanto como protagonistas como público). Aliás, a expressão, “psicoterapia de grupo” foi pela primeira vez utilizada por Moreno. 2.10.2 Teoria do Psicodrama Moreno foi capaz de dar sentido à improvisação dramática e retomar o conceito de catarse, pois, ao ocorrer uma identificação do espectador com os atores, ocorre uma catarse e, também, certa conscientização. Para que ocorra essa catarse, deve existir uma espontaneidade e criatividade, pois, caso contrário, é uma mera repetição que não trará nada de novo nem aos protagonistas nem ao público. É na criação espontânea que se consegue o vínculo do ser humano com o mundo. O Psicodrama possui o conceito de espontaneidade-criatividade, a teoria dos papéis, a psicoterapia grupal como pontos básicos da sua teoria, além de outros como: Tele (capacidade de se perceber de forma objetiva o que ocorre nas situações e o que se passa entre as pessoas), Empatia (tendência para se sentir o que se sentiria caso se estivesse na situação e circunstâncias experimentadas pela outra pessoa.), Coinconsciente (vivências, sentimentos, desejos e até fantasias comuns a duas ou mais pessoas, e que se dão em “estado inconsciente”) e Matriz de Identidade (lugar do nascimento). A teoria da espontaneidade: está ligada dialeticamente à criatividade, compreende uma fenomenologia, uma metapsicologia, uma psicotécnica, uma psicopatologia e uma psicologia genética. As que possuem maiores riquezas são: a Psicotécnica ou treinamento da espontaneidade que, ainda que pareça parado, procura resgatar o espontâneo perdido pelo homem ao longo da sua existência, e a Psicologia Genética, quer dizer: a criança, ao nascer, realiza seu primeiro ato criativo – é o primeiro ato de catarse de integração. Nasce com uma capacidade criadora própria do ser humano, que irá completando com a maturidade e com a ajuda dos outros. O primeiro ego-auxiliar é a sua própria mãe. Ao longo de sua infância, na medida em que vai vivendo os diversos papéis e em contato com os agentes sociais, desenvolve essa capacidade criadora e atrofia em maior ou 42 menor medida, de acordo com o tipo de relações e na medida em que as “tradições culturais” lhe sejam impostas pelos mais velhos. Esses agentes da sociedade lhe submetem, durante o
Compartilhar