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UNIVERSIDADE DE COIMBRA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE BOTÂNICA APONTAMENTOS DE FISIOLOGIA VEGETAL Capítulo I: As Plantas e a Água Gil Silva Cruz 2010 As plantas e a água Porque é importante a água A água é de longe o constituinte mais abundante das células vivas das plantas. Ela constitui em média 80-95% do peso dos tecidos moles das plantas e desempenha nelas funções cruciais, designadamente: 1) É o melhor e mais abundante solvente conhecido. Como solvente ela serve de meio onde ocorrem as reacções químicas; 2) Ela própria, ou os seus iões, participa como reagente em várias reacções (hidrólise e desidratação); 3) É o veículo de transporte das substâncias em solução (sais minerais, fitohormonas, açúcares, ácidos orgânicos, aminoácidos etc.), ou em suspensão, no interior da planta; 4) É essencial para manter a estrutura e propriedades das membranas, proteinas, ácidos nucleicos e outros constituintes do protoplasma; 5) Confere turgidez às células e tecidos e, nessa qualidade, é responsável por: - dar suporte mecânico às partes jovens não lenhificadas dos orgãos das plantas; pelo crescimento celular; e por muitos movimentos realizados pelas plantas ou por orgãos das plantas. Da totalidade da água absorvida pelas raizes, apenas uma porção muito reduzida (2-5%) é retida pelos tecidos e utilizada no crescimento ou em reacções químicas. Todo o resto é libertado pelas folhas sob a forma de vapor, um processo designado transpiração. Durante o seu ciclo de vida uma planta pode perder o equivalente a 100 vezes a sua massa, através das folhas, por transpiração. Tendo em conta que a água desempenha funções tão importantes nas plantas, sendo mesmo o recurso que mais limita a produtividade agrícola, é estranho que um recurso tão valioso seja, por elas, tão mal gerido. Essa situação torna-se mais fácil de compreender se tomarmos em consideração que as vias através das quais a planta perde água são também as portas de entrada do CO2 utilizado na fotossíntese. A planta tem que gerir, frequentemente, o compromisso entre duas situações extremas igualmente penalizantes: a de morrer de fome ou de desidratação. Nas plantas terrestres a água é absorvida do solo pelas raizes e, depois de atravessar radialmente a zona cortical, chega aos elementos condutores do xilema. Nestes a água é transportada até às folhas, na chamada corrente de transpiração, onde a maior parte é perdida para atmosfera, principalmente através do estomas. Estabelece-se, assim, um fluxo contínuo de água entre o solo e a atmosfera, com passagem pelo interior das plantas. Para compreendermos melhor os mecanismos e as forças responsáveis pela manutenção deste fluxo, importa referir algumas das propriedades da molécula da água. Propriedades da água A forma como o átomo de oxigénio e os dois átomos de hidrogénio se associam na molécula de água (Fig. 2) origina uma estrutura polar com uma região electronegativa (átomo de oxigénio) e as zonas correspondentes aos átomos de hidrogénio com cargas fraccionais positivas. Esta estrutura polarizada permite o estabelecimento de ligações de hidrogénio com outras moléculas de água ou com moléculas de outros compostos polares. A facilidade com que as moléculas de água estabelecem ligações entre si e com as moléculas de outros compostos polares, é a responsável pelas elevadas forças de coesão e de adesão, respectivamente, bem assim como pelas notáveis propriedades térmicas que apresenta. As propriedades físicas da água fazem dela um meio único para a vida. Em primeiro lugar a água é um excelente solvente da grande maioria de substâncias. Isto deve-se em parte às pequenas dimensões da molécula e, por outro lado, à sua natureza polar, que lhes permite orientar-se à volta dos iões e dos solutos polares em solução, mascarando a suas cargas eléctricas. Este facto diminui a interacção electrostática entre as substâncias polares, aumentando a sua solubilidade. Além disso, as terminações polares das moléculas de água podem orientar-se junto de grupos com cargas de macromoléculas, formando camadas de hidratação. Fig. 1 – Estrutura da molécula da água e a formação de ligações de hidrogénio A elevada força de coesão entre as moléculas de água permite que as colunas de líquido, que preenchem os vasos lenhosos, se mantenham intactas e ascendam às partes mais elevadas das árvores mais altas, mesmo quando sujeitas a tensões muito fortes. Por outro lado, as moléculas de água também são atraídas por outras moléculas polares (adesão) o que lhes permite aderir a superfícies sólidas como as das paredes celulares e formar camadas de hidratação à volta de iões e macromoléculas como as das proteinas e dos ácidos nucleicos. Por sua vez, os elevados calor específico e calor de vaporização habilitam as moléculas de água a absorverem quantidades relativamente elevadas de calor sem que a sua temperatura sofra alterações significativas, e a permanecerem no estado líquido numa vasta gama de temperaturas. Potencial hídrico O movimento da água no contínuum solo-planta-atmosfera é um processo físico, inteiramente passivo, que não requer a utilização de energia metabólica. Em qualquer sistema (solo, planta, atmosfera), a água desloca-se de um lugar para outro em resposta a diferenças de energia potencial ou potencial químico (µ). A diferença entre a energia potencial da água (µ) num determinado sistema (por conseguinte sujeita a todos os tipos de forças ou influências que actuam sobre esse sistema), e a energia potencial da água pura e livre (µo), sujeita à pressão atmosférica normal e à mesma temperatura da água do sistema, dividida pelo volume molal parcial da água (Vm) é chamada potencial de água ou potencial hídrico e designa-se, abreviadamente, pela letra ψ (psi). ψ = (µ-µo) /Vm Nas células vegetais, ou entre as células vegetais e o seu meio envolvente, a água flui de áreas de potencial hídrico mais elevado para áreas de potencial hídrico mais baixo. Se não existirem barreiras, o movimento da água só acabará quando se atingir o equilíbrio termodinâmico. Significa isto que a direcção do movimento da água num sistema é determinada por diferenças (gradientes) de potencial hídrico. Por convenção, foi estabelecido que o valor do potencial hídrico da água pura e livre à pressão atmosférica, ao nivel do mar é zero. Por conseguinte, o potencial hídrico duma solução, nas mesmas condições, é um valor negativo porque a concentração (energia livre) da água na solução é menor que a da água pura. O mesmo sucede quando a água se encontra adsorvida (aderente) a partículas do solo ou a tecidos das plantas, sendo, nestes casos, necessário fornecer energia para levar o potencial da água ao valor 0. O potencial da água livre aumenta com a temperatura, com a pressão exercida sobre ela e quando é elevada (colocada a um nivel superior). Embora o potencial hídrico seja uma expressão da energia livre da água nas condições existentes num dado sistema relativamente à água pura em condições padrão, ele é normalmente expresso em unidades de pressão (Pascals, MegaPascals (MPa), ou ainda bares e atmosferas; 1 bar = 0.987 atm. = 0.1 MPa) por estas serem mais fáceis de medir que as unidades de energia. O potencial hídrico pode também expressar-se em função da pressão do vapor de água da atmosfera em equilibrio com a solução aquosa, de acordo com a expressão: ψ = RT/V ln(e/eo) em que R representa a constante dos gases perfeitos (8,31 J ºK-1 mol-1); T a temperatura absoluta (ºK) e e e eo a pressão de vapor da atmosfera e do estado de saturação da mesma para aquela temperatura, respectivamente. Como e/eo representa o conteudo relativo de vapor de água da atmosfera (%HumidadeRelativa /100), a expressão anterior tomará a forma seguinte para uma temperatura de 20 º C e se passarmos para logaritmos decimais: ψ = 311,5 log %HR/100 Componentes do potencial hídrico Como já foi dito, o potencial hídrico da água pura e livre, à pressão atmosférica, foi fixado arbitrariamente como sendo igual a zero. A adição de solutos, pressões físicas e a presença de partículas sólidas (ou superfícies) hidrofílicas modificam o potencial da água pura. Assim, o potencial hídrico de um determinado sistema (por ex. uma célula) será igual ao somatório dos diversos potenciais componentes (osmótico ou de solutos, de pressão, matricial, etc.) que actuam sobre o referido sistema. ψ = ψs+ ψp + ψm +. . .. .+ em que ψs representa o potencial osmótico ou de solutos; ψp o potencial de pressão ou de turgescência; e ψm o potencial matricial ou de matriz. Vejamos como cada um destes componentes afecta o potencial hídrico das plantas. Potencial Osmótico (ψs) O potencial osmótico é proporcional ao número de partículas de soluto dissolvidas e é independente do tipo de partículas. A partícula pode ser uma molécula de açúcar, um ião de cálcio, ferro ou nitrato, ou ainda uma qualquer substância química dissolvida. Estas partículas em solução interactuam com, e reduzem, a actividade das moléculas de água, dimuindo a sua energia potencial. Deste modo, a adição de solutos faz sempre baixar o valor do potencial hídrico e o potencial osmótico é sempre uma grandeza negativa (ψs<0). O potencial osmótico das folhas de muitas plantas cultivadas está, geralmente, contido entre -1 e -2 MPa. Muitas vezes, em vez de se referir o potencial osmótico, que é negativo, usa-se o termo pressão osmótica (Π = - ψs) para designar o efeito dos solutos dissolvidos na água, a qual é uma grandeza positiva. Ela pode definir-se como a força (pressão) que é preciso aplicar a uma solução contida num osmómetro mergulhado em água pura para impedir que o volume de solução dentro do osmómetro se altere. Tanto o potencial osmótico, como a pressão osmótica estão relacionados com a fracção molar ou actividade da água (moles de água /moles de água + moles de soluto) ou, ainda, com a concentração de partículas de solutos dissolvidos. Para muitas soluções biológicas (diluidas) o potencial osmótico pode calcular-se pela equação de van`t Hoff: ψs = - RTC sendo C a concentração de solutos expressa em mol . m-3 de solvente. De acordo com esta fórmula, uma solução molal dum soluto não iónico apresenta, para uma temperatura de 20ºC, um potencial osmótico de –2,43 MPa. No caso de soluções de solutos ionizáveis Fig. 2 – Osmómetro de Dutrochet terá que se ter em consideração o número efectivo de partículas osmoticamente activas (moléculas não dissociadas e iões) presentes na solução de acordo com o grau de dissociação. Potencial de Pressão (ψp) O potencial de pressão é uma pressão física que representa a diferença em pressão hidrostática para a referência (pressão atmosférica normal). Pode ser positiva ou negativa (tensão). A água dos vasos lenhosos duma planta a transpirar activamente, encontra-se normalmente sob pressão negativa, podendo esta atingir valores inferiores a -2MPa. Pelo contário, a água contida nas células vivas encontra-se geralmente sujeita a uma pressão positiva (turgor), sendo, nesse caso, ψp>0. As alterações do valor de ψp das células podem fazer variar o seu volume dentro de certos limites. Assim, quando a água entra numa célula, faz aumentar o volume vacuolar e exerce uma pressão, denominada pressão de turgescência, sobre as paredes celulares. Ao mesmo tempo, desenvolve-se na direcção oposta, isto é, das paredes para o interior, uma pressão de igual valor, denominada pressão da parede, que, actuando como uma pressão hidrostática, aumenta o estado energético da água da célula e representa o potencial de pressão. Esta componente apresentará valores positivos sempre que o vacúolo exerça pressão sobre as paredes e diminuirá, aproximando-se de zero, à medida que a célula vai perdendo água e o vacúolo se contrai. Quando a pressão de turgescência atinge o valor zero, diz-se que a célula se encontra em plasmólise incipiente. Nesta altura o vacúolo deixa de exercer pressão sobre as paredes. Algumas vezes, têm sido referidos valores negativos para a pressão de turgescência, quando as paredes são atraidas (sugadas) para dentro em consequência da contracção vacuolar. Patricia Corrêa Patricia Corrêa Patricia Corrêa Potencial matricial ou de matriz (ψm) O potencial matricial resulta das forças que retêm as moléculas de água por capilaridade, adsorção e hidratação fundamentalmente por superfícies hidrofílicas como sejam as paredes celulares e vários componentes da matriz citoplasmática. No primeiro caso, as microfibrilhas de celulose entrelaçadas formam numerosos microcanais, nos quais a água é retida devido, principalmente, à tensão superficial que gera uma pressão negativa na interface água/ar. No citoplasma, a água é adsorvida por várias macromoléculas e colóides. Nas células em que a matriz celular representa uma pequena fracção do volume celular total (células bastante vacuolizadas), a componente matricial tem pouca expressão e pode ser desprezada (casos das células de parênquima jovens com paredes finas). Já o mesmo não acontece em células densamente citoplasmáticas, ou ricas em materiais mucilaginosos, como acontece com as células meristemáticas de mesófitas e nas células de algumas plantas xerófitas, respectivamente, bem assim como nos casos de tecidos vegetais desidratados, sementes secas e solos. Em qualquer caso, o potencial de matriz representa a força exigida para remover a água das superfícies que a retêm. A adsorção, ou adesão, das moléculas da água diminui a sua energia potencial, pelo que o potencial matricial (ψp) é sempre < 0. Entrada e saída da água nas células O movimento da água nas plantas (e noutros sistemas) pode assumir duas modalidades principais: difusão (incluindo-se nesta modalidade a osmose e a embebição) e fluxo em massa. O primeiro é um movimento lento das moléculas individuais, que se realiza a curta distância, accionado por gradientes de concentração. Ocorre, normalmente entre células vizinhas ou entre as células e o meio circundante próximo. O fluxo em massa consiste no movimento conjunto da água e solutos nela dissolvidos; faz-se a longa distância e é comandado por diferenças de pressão. É mais rápido que a difusão e faz-se numa só direcção. Quando se consideram as relações hídricas das células vivas com o meio exterior, ou com células vizinhas, predomina um tipo especial de difusão chamado osmose. Este fenómeno consiste na difusão das moléculas de água através duma membrana semipermeável, como pode ser considerada a membrana citoplasmática, a qual é permeável à água, mas não o é (igualmente) aos solutos. Difusão Vários fenómenos nas plantas dependem da difusão (a fotossíntese depende da entrada do CO2 para dentro das folhas; a transpiração depende da saída do vapor de água para a atmosfera; a absorção iónica depende do movimento dos iões minerais da solução do solo para a superfície da raiz; as reacções bioquímicas dentro das células dependem do movimento dos reagentes que lhes permite encontrarem-se; etc.). Trata-se de um movimento lento, a curta distância e ao acaso, de partículas individuais duma região de maior concentração (energia) para outra de menor concentração. O movimento dirigido das partículas continuará até que se estabeleça uma distribuição uniforme em todo o sistema, uma situação a que corresponde uma maior desorganização e uma menor energia livre do sistema. Nesse momento estabelece-se um equilíbrio dinâmico em que não se observa ganho de partículas de uma região relativamente a outras. Num dado sistema, a direcção de difusãodas moléculas ou iões de uma substância é independente da direcção de difusão de outras substâncias nele presentes, dependendo apenas da direcção do gradiente de concentração dessa substância. O fluxo ou taxa de difusão de uma substância, em condições ideais, pode ser determinada pela chamada lei de Fick, que se traduz pela fórmula: Js = - D ΔCs/Δx ou dM/dt= - Da.(dC/dx) em que dM representa a quantidade de substância que difunde através da área a no tempo dt, D é o coeficiente de difusão e dC/dx representa o gradiente de concentração, ou seja, a diferença de concentração dC entre dois pontos do sistema distanciados de dx. No caso de termos dois compartimentos separados por uma membrana permeável (cuja espessura é desprezavel), sendo as concentrações de um e do outro lado da membrana C1 e C2 respectivamente a lei de Fick toma a seguinte forma: dM/dt = Ka (C1-C2) sendo C1>C2 e K a constante de permeabilidade. O coeficiente de difusão D, que representa a maior ou menor facilidade com que uma dada substância difunde num dado sistema, varia de substância para substância e depende de vários factores de acordo com a equação: D = KT/√mη em que K é uma constante, T a temperatura absoluta, m o peso molecular e η a viscosidade do meio através do qual se dá a difusão. Deste modo, o coeficiente de difusão aumenta com a temperatura e diminui com o aumento da massa molecular da substância e com a viscosidade do meio. Se na equação da lei de Fick fizermos dC/dx igual a 1 e considerarmos a área a unitaria teremos D = dM/dt. Isto significa que D representa a quantidade de substância que difunde, na unidade de tempo, através da área unitária quando o gradiente dC/dx =1. Osmose O citoplasma, o vacúolo e os organitos das células vegetais encontram-se envolvidos por membranas biológicas que não são igualmente permeáveis a todas as substâncias. As membranas que assim se comportam são chamadas diferencialmente permeáveis e têm grande importância no controlo do tráfico de iões e moléculas para dentro e para fora dos compartimentos delimitados por elas. Outros tipos de membranas podem ser totalmente permeáveis ou completamente impermeáveis. Muitas substâncias, incluindo a água, passam através das membranas biológicas tão facilmente como passam através duma solução aquosa. Este movimento sem restrições de uma substância através duma membrana chama-se transporte passivo e a energia necessária para esse movimento resulta da própria energia cinética das moléculas. A difusão das moléculas dum solvente (ex. a água) através duma membrana diferencialmente permeável chama-se osmose (Fig. 3). Fig. 3 – Osmose Consequências da osmose nas células e tecidos vegetais As relações hídricas de células e tecidos vegetais podem ser descritas pelo diagrama de Hofler que traduz a interdependência entre o volume celular relativo (ou conteudo hídrico) e os valores de ψ, e dos seus componentes, ψs e ψp , à medida que a célula vai perdendo água (Fig. 4). Se o interior da célula possuir uma concentração de solutos maior (ψs mais negativo) que o exterior então a água entra para a célula, por osmose. Sendo a parede da célula relativamente rígida (só permite variações de volume dentro de certos limites), ela tende a resistir ao aumento de volume do protoplasto e à pressão que esse aumento de volume exerce sobre ela. Quer isto dizer que o potencial de pressão ou de turgescência aumenta para contrabalançar o efeito do potencial osmótico. Contudo, a entrada de água para a célula provocará um certo aumento de volume dependendo este do grau de elasticidade da parede. No caso limite de o meio exterior ser a água pura, o equilibrio ocorrerá quando o potencial hídrico dentro da célula for igual ao potencial hídrico no exterior, isto é, for igual a zero. Nestas circunstâncias, ψs = - ψp e a célula terá atingido o volume máximo permitido (volume relativo 100). Nessa altura, a célula atingiu a sua túrgidez máxima. Fig. 4 - Diagrama de Hoefler Se esta célula for colocada num meio hipertónico, ou deixada a secar ao ar, ela perderá água. Em consequência dessa perda, o potencial de pressão (turgidez) diminui rapidamente, sendo acompanhado por uma ligeira diminuição do ψs e por uma redução do volume da célula. A certa altura, o protoplasto deixará de fazer pressão sobre a parede e nesse momento ψp = 0 e o ψ = ψs. Diz-se que foi atingido o ponto de plasmólise incipiente. Se a célula continuar a perder água o plasmalema tende a afastar-se da parede (Fig. 5), verificando-se uma redução do volume do protoplasma e uma diminuição significativa do ψs. A célula fica plasmolisada e, se a perda de água ultrapassar determinados limites que leve à rotura dos plasmodesmos, o processo torna-se irreversivel, acabando a célula por morrer. Um aspecto importante que determina a forma das curvas na figura 4 é a elasticidade das paredes celulares. Se a parede é muito rígida, o potencial hídrico e os seus componentes variam rapidamente para uma determinada perda de água; por outro lado, se as paredes são mais elásticas a variação daqueles parâmetros faz-se mais lentamente. Túrgida Plasmólise incipiente Plasmolisada Fig. 5 – Plasmólise de células de uma planta Embebição As superfícies hidrofílicas (proteinas amido, argila, etc.) adsorvem água e a tenacidade com que as moléculas de água são adsorvidas é não só função da natureza da superfície, mas também da distância entre a superfície e as moléculas de água adsorvidas. A adsorção de água por superfícies hidrofílicas é chamada embebição ou hidratação. O potencial matricial (Ψm) é, à pressão atmosférica, a medida da tendência que a matriz tem para adsorver mais moléculas de água. Esta tendência será igual à tenacidade média com que as moléculas da camada de água retidas mais frouxamente (as mais afastadas) são adsorvidas. O potencial matricial é expresso em unidades de pressão e contribui para o valor do potencial hídrico. Apresenta valores negativos ou zero. Em geral, quando um coloide, à pressão atmosférica, se encontra em equilíbrio com a sua vizinhança, as moléculas de água mais frouxamente retidas possuem a mesma energia livre que as moléculas de água da vizinhança e, por conseguinte, o potencial matricial do coloide é igual ao potencial hídrico da vizinhança. Num sistema de embebição o potencial matricial é a componente mais importante do potencial hídrico do sistema. No entanto, como os materiais hidrofílicos aumentam de volume quando embebem água, se se encontrarem confinados podem desenvolver pressões consideráveis. Nestes casos o valor do potencial hídrico será determinado por estes dois componentes: ψ = ψm + ψp Para haver embebição de água por um embebente é necessário que se verifiquem duas condições: 1. Que exista um gradiente de potencial hídrico entre o embebente e a solução banhante (embebido) 2. Que exista afinidade entre os constituintes do embebente e as moléculas do embebido Fig.6). Fig. 6 – para haver embebição tem que haver afinidade entre o embebente e o embebido A rapidez e a extensão da embebição dependem de factores nomeadamente: ♦Temperatura: - a embebição é mais rápida para temperaturas mais elevadas, embora a quantidade final de água embebida se mantenha igual ♦Potencial hídrico da solução banhante: - quanto maior for o gradiente de potencial hídrico entre o embebente e a solução banhante mais intenso será o movimento da água para dentro do embebente e maior será a quantidade de água embebida. Fig. 7 – A embebição é muito importante no processo de germinação das plantas Num sistema de embebição as moléculas de água adsorvidas à superfície das matrizes hidrofílicasperdem energia não só calorífica mas também cinética. Este facto faz com que no sistema de embebição se observem variações de volume e de temperatura como consequência da embebição da água. Assim a energia perdida sob a forma de calor faz com que a temperatura do sistema se eleve, enquanto que o volume final do sistema embebente-embebido seja menor que a soma dos volumes iniciais do embebente e do embebido tomados separadamente. Medição do potencial hídrico e dos seus componentes nos tecidos vegetais Potencial hídrico Tendo em conta a importância do potencial hídrico no movimento da água e também o facto de vários fénómenos fisiológicos serem fortemente afectados pelo estado hídrico da planta, apresenta grande interesse a sua determinação experimental bem como os seus componentes. Deste modo, foram desenvolvidos vários métodos para medir o potencial hídrico de tecidos vegetais e os seus componentes. Métodos de equilibrio: 1- Método baseado na variação de peso ou de volume Coloca-se uma amostra do tecido em questão em cada uma de uma série de soluções de concentrações variaveis mas conhecidas de substâncias como a sacarose , manitol ou polietilenoglicol (PEG). Pretende-se por este meio encontrar a solução em que o volume ou o peso da amostra de tecido vegetal não se alterou, após atingido o equilibrio. Isto significa que o tecido, mergulhado na solução, não ganhou nem perdeu água e, portanto, o tecido e a solução possuiam o mesmo potencial hídrico. Como, à pressão atmosférica normal, o potencial de pressão da solução livre é zero então o potencial hídrico da solução será igual ao potencial osmótico e este pode ser calculado pela equação de van`t Hoff. Para determinar qual a solução que apresenta o mesmo valor de potencial hídrico que a amostra de tecido vegetal projectam-se num gráfico os valores da variação do volume, ou do peso, contra a concentração da solução. Nesse gráfico o ponto em que a curva do volume corta a linha zero indica a solução que apresenta o mesmo potencial hídrico que o tecido, no início da experiência. Fig. 8 – Esquema do método gravimétrico de determinar o potencial hídrico em cilindros de batata 2- Método de Chardakov Em vez de se medirem as alterações produzidas no tecido, podemos medir a variação da concentração na solução teste. Se a solução se tornar menos concentrada, o tecido terá perdido água. Para verificar qual a solução teste em que não se observa qualquer variação de concentração, prepara-se uma série em duplicado de tubos de ensaio com concentrações gradualmente crescentes e cora-se ligeiramente com um pequeno cristal dum corante (ex. azul de metileno) uma delas. Fig. 9 – Esquema do método de Chardakov ou da gota corada As amostras de tecido são colocadas nos tubos de ensaio da série não corada, onde se deixam ficar o tempo suficiente para se estabelecer o equilibrio (15 - 20 min.). Ao fim deste tempo, retiram-se as amostras das soluções e coloca-se uma pequena gota da solução corada equivalente em cada tubo. Se a gota corada subir, a solução perdeu água para o tecido, se a gota descer o tecido perdeu água para a solução, ficando esta menos densa. A solução em que a gota difundir igualmente sem subir ou descer não ganhou nem perdeu água porque tinha o mesmo potencial hídrico do tecido. 3 - Método da bomba de pressão de Scholander No caso dos ramos, folhas e caules isolados de plantas a transpirar, pode determinar-se directamente o potencial hídrico da seiva xilémica utilizando a câmara de pressão de Scholander (Fig. 10). Fig. 10 – Esquema do método da bomba de pressão de Scholander O orgão isolado é colocado na câmara ficando apenas exposta a secção de corte. A seiva xilémica, que se encontra sob tensão, retrocede quando o orgâo é seccionado. Faz-se elevar a pressão dentro da câmara até a seiva xilémica aflorar de novo à secção de corte do orgão. Nessa altura, considera-se que a pressão aplicada na câmara equilibra as forças que retêm a seiva e que correspondem ao valor do potencial hídrico da seiva. Como esta se encontra em equilibrio com as células dos outros tecidos vizinhos, considera-se ser este o valor do potencial hídrico dos tecidos destes orgãos. 4 - Método psicrométrico O psicrómetro de termopares baseia-se no principio de que uma solução ou amostra vegetal em equilibrio com a atmosfera envolvente possui o mesmo potencial hídrico e que este está relacionada com a pressão de vapor relativa (e/eo) pela equação: Ψ= RT/V ln (e/eo) O método psicrométrico consiste no cálculo de Ψ através da medição da variação da temperatura observada na terminação dum sensor de temperatura (termopar) localizada no interior duma pequena câmara, onde também se encontra a amostra de tecido, provocada pela evaporação da água duma gota colocada na extremidade do termopar (Fig. 11) Uma técnica psicrométrica muito utilizada, chamada psicrometria isopiéstica, funciona assim: A amostra vegetal é colocada numa câmara hermeticamente fechada (Fig.11) a qual possui um sensor de temperatura (termopar) na extremidade do qual se coloca uma gota duma solução de Ψ conhecido. Fig. 11 – Determinação do potencial hídrico pelo método psicrométrico Inicialamente alguma água da gota e do tecido evaporar-se-á até que a atmosfera da câmara fique saturada de vapor de água, ou perto disso. A partir desse momento, se o potencial hídrico do tecido vegetal e da solução forem iguais, o movimento “net” de moléculas de água para e a temperatura da gota de solução, medida pelo termopar, não varia relativamente à temperatura exterior. Contudo, se o tecido tiver um Ψ mais baixo que a gota da solução então a água evapora-se da gota e difunde através da atmosfera da câmara sendo absorvida pelo tecido. A evaporação da água da gota provoca o seu arrefecimento e a variação da temperatura será medida pelo termopar. Se, pelo contrário, o potencial hídrico da solução for mais baixo que o do tecido, nesse caso, a água difunde do tecido para a gota, fazendo elevar a temperatura desta, sendo a variação medida pelo termopar. Deste modo, medindo a variação da temperatura do sensor para várias soluções de potenciais hídricos conhecidos, é possivel, através dum gráfico, determinar a solução cujo Ψ será exactamente igual ao Ψ do tecido, ou seja aquela em que a variação de temperatura no sensor seja zero. Por este método também se pode determinar o potencial osmótico (Ψ s) duma solução. Deste modo, a determinação dos valores de Ψs e Ψp dum tecido vegetal pode fazer-se com os psicrómetros de termopares eliminando um dos componentes da equação Ψ = Ψs + Ψp e medindo o outro. Para isso, depis de medir o Ψ no tecido vivo, congela-se e descongela-se o tecido, rompendo, assim, as membranas. A rotura impede que se desenvolva turgidez e, embora o conteudo celular inumde as paredes os efeitos mátricos são pequenos podendo ignorar-se. Neste caso, Ψ= Ψs. O valor de Ψp calcula-se a partir da diferença entre o valor de Ψ do tecido vivo e o valor de Ψ tecido congelado / descongelado. Os potenciais osmóticos da seiva extraida podem tambem ser determinados com um psicrómetro ou com um osmómetro crioscópico que mede a depressão do ponto de congelação. No entanto torna-se dificil obter uma amostra representativa da seiva celular Medição do potencial osmótico (Ψ s) Método plasmolítico Um dos procedimentos para medir o potencial osmótico dum tecido vegetal baseia-se no facto de que no ponto de plasmólise incipiente Ψ = Ψ s pelo que o potencial osmótico do pois durante a extracção é muito provavel que ocorra uma diluição com água extracelular. tecido será igual ao potencial hídrico da solução que provoca plasmólise incipiente. O valor obtido por este método deve ser corrigido para a variação do volume da célula. Para a determinação do potencialosmótico por este método colocam-se as amostras do tecido vegetal numa série crescente de soluções de potencial hídrico conhecido e procura- se aquela que provoca indícios ligeiros de plasmólise em 50% das células da amostra. Essa solução terá um potencial hídrico igual ao potencial osmótico das células. Este procedimento é particularmente indicado para certos tecidos epidérmicos com vacúolo corado, em que é fácil de visualizar, com a ajuda do microscópio, a separação incipiente da membrana citoplasmática da parede celular. Noutros casos, essa visualização é dificil de verificar. Método crioscópico Em muitos casos, o potencial osmótico do tecido é determinado crioscòpicamente, medindo o ponto de congelação do conteudo celular obtido por espressão do tecido. Sabendo-se que uma solução 1 molal apresenta uma depressão do ponto de congelação de 1,86 ºC e que o seu potencial osmótico é de –2,27MPa (a 0ºC), pode relacionar–se o potencial osmótico duma solução desconhecida com o abaixamento do seu ponto de congelação (Δt) pela expressão: Ψ s = (−2,27/1,86) Δt (MPa) ou Ψ s = − 1,22 Δt (MPa) Medição do potencial de pressão (ψp) A medição directa do potencial de pressão da maior parte das células vegetais é dificil de fazer em virtude das suas pequenas dimensões. Assim, o valor do potencial de pressão das células dum tecido vegetal é, geralmente, determinada a partir da diferença entre o valor do potencial hídrico e o valor do potencial osmótico do tecido. No entanto, actualmente é já possivel medir directamente o valor do potencial de pressão de alguns tipos de células de maiores dimensões utilizando microsondas de pressão (micromanómetros) cuja extremidade aberta é inserida, através da parede, nas células. As primeiras microsondas eram tubos microcapilares de vidro com um extremidade fechada e a outra aberta e afilada. A pressão dentro da célula era calculada com base na compressão que o conteudo da célula exercia sobre o gás que preenchia o microcapilar.) Fig. 12- Esquema da utilização duma micro-sonda de pressão Actualmente existem versões mais sofisticadas que podem ser usadas em células de menores dimensões. Nessas versões o tubo microcapilar de vidro encontra-se preenchido com um óleo e ligado a um micrómetro e um detector (transductor) de variações de pressão muito sensivel (Fig. 12) Quando a extremidade do microcapilar penetra na célula, os fluidos da célula penetram no tubo fazendo recuar o óleo. Rodando o parafuso do micrómetro faz-se voltar o fluido celular à extremidade do manómetro, isto é, restaura-se o volume original da célula. Neste momento, a pressão dentro da célula é equilibrada exactamente pela pressão exercida no manómetro, a qual é detectada pelo transductor de pressão. Este aparelho permita também provocar pequenas variações no volume celular e medir as alterações de pressão daí resultantes. Relações Hídricas das Plantas Completas Para o estabelecimento do equilíbrio hídrico das plantas contribuem três processos interligados que são: 1) A absorção da água a nivel da raiz; 2) a transpiração que ocorre principalmente nas folhas; e 3) a condução da água (e sais minerais em solução) nos elementos condutores do xilema, entre a raiz e as folhas. A água que as plantas perdem por transpiração deve ser substituida em quantidades equivalentes por água absorvida do solo pelas raizes. De facto, com excepção de algumas plantas que podem absorver alguma água da atmosfera através das folhas ou de estruturas especializadas e das plantas aquáticas que geralmente podem absorver a água através de toda a superfície em contacto com a água, a maior parte das plantas terrestres obtêm a água que necessitam a partir do solo. Estabelece-se, um movimento contínuo de água entre o solo e a atmosfera (fig. 13), passando pelo interior da planta, conhecido como contínuum solo-planta-atmosfera (SPAC). A água do solo, contudo, está sujeita a forças diversas que condicionam a sua utilização pelas plantas. Por isso, para uma melhor compreensão do processo da absorção radicular, convem conhecer alguns dos aspectos e propriedades do solo que afectam a disponibilidade da água às plantas. Fig. 13 – Esquema mostrando o trajecto da água desde o solo até à atmosfera, passando pelo interior duma planta O solo e a absorção da água pelas plantas O solo O solo é um meio muito complexo que consiste em: uma fase sólida formada por partículas inorgânicas resultantes da meteorização das rochas, e por partículas de matéria orgânica em diferentes fases de decomposição(húmus); uma fase líquida correspondente à solução do solo contendo solutos dissolvidos e uma fase gasosa que se encontra geralmente em equilibrio com a atmosfera exterior. Fazem ainda parte do solo seres vivos como algas, bactérias, fungos, nemátodes e vários outros organismos. A fase sólida do solo é constituida por partículas de diferentes dimensões e natureza diversa. De acordo com o seu tamanho as partículas do solo podem classificar-se em areia grossa, areia fina, vasa (silte) e argila de acordo com a tabela seguinte. Tab. Classificação das partículas do solo e suas propriedades Tipo de partículas Tamanho em mm Retenção da água Arejamento Areia grossa 2.00 – 0.2 Fraca Excelente Areia fina 0.2 – 0.02 Fraca Excelente Vasa ou Silte 0.02 – 0.002 Boa Bom Argila Menos que 0.002 Excelente Fraco A proporção em que estes diferentes tipos de partículas entram na constituição dum solo determina a sua textura. Um solo que contenha menos de 15% de argila e vasa é um solo arenoso, enquanto que um solo com mais de 40% de partículas de argila é considerado um solo argiloso. Um solo com cerca de 40% de areia, 40% de vasa e 20% de argila é chamado solo franco. As partículas individuais de areia e vasa dum solo encontram-se, geralmente reunidas por partículas de argila e húmus formando agregados complexos que determinam a estrutura desse solo. Por sua vez, a estrutura do solo influencia a porosidade do solo e, por consequência, a capacidade de retenção de água e arejamento do solo. A porosidade, ou espaço poroso, refere-se aos espaços (canais) interligados situados entre as partículas do solo. Este espaço poroso ocupa cerca de 40 – 60% do volume do solo. Reconhecem-se duas categorias principais de poros: os macroporos e os microporos ou poros capilares. Os solos em que predomina o primeiro tipo de poros (solos arenosos) possuem fraca capacidade de retenção da água, mas são bem arejados. Por sua vez os solos argilosos em que predominam os microporos são solos compactos com grande capacidade de retenção de água e fraco arejamento. A quantidade de matéria orgânica (húmus) do solo influencia não só a sua estrutura como também a capacidade de retenção de água e as suas qualidades nutritivas. A água do solo Após uma rega abundante ou chuvas prolongadas todos os espaços entre as partículas do solo ficam preenchidos com água. O solo fica saturado, não podendo conter mais água. Grande parte da água que preenche os macroporos escoa-se para niveis inferiores do solo por acção da gravidade. Esta água constitui a fracção gravitacional e não está disponivel para as plantas. A quantidade de água expressa em percentagem por unidade de peso do solo seco que fica neste após toda a água gravitacional se ter escoado constitui o chamado ponto de capacidade de campo. Este valor varia com o tipo de solo, sendo relativamente baixo nos solos arenosos e bastante elevado nos solos argilosos. Com excepção de alguns solos salinos a concentração de solutos no ponto de capacidade de campo é muito baixa e o valor do pontencial hídrico é próximo de zero (≈ -0,01MPa). Fig. 14 – Fracções da água dum solo A maiorparte da água que permanece no solo apesar da acção da gravidade preenche os canais capilares e os espaços intersticiais do solo (fig. 14) podendo ser utilizada pelas plantas. Esta água retida por forças de capilaridade é chamada fracção capilar ou água de capilaridade e encontra-se geralmente sob tensão. À medida que o conteudo de água do solo diminui, quer devido à evaporação directa para a atmosfera, quer por ser absorvida pelas plantas, as forças que retêm as moléculas de água aumentam, tornando-se cada vez mais dificil às plantas extrairem esta água do solo. Quando as plantas que vivem num determinado local não conseguem retirar mais água do solo murcham e não recuperam desse estado enquanto não for adicionada mais água ao solo. Nesse momento atinge-se o chamado ponto de emurchecimento (murchidão) permanente, o qual representa o limite inferior da água do solo disponivel às plantas. A água que ainda permanece no solo constitui a chamada fracção higroscópica e é constituida principalmente pela água de hidratação dos coloides do solo. A quantidade de água presente no solo no ponto de murchidão permanente também varia com o tipo de solo. No entanto, o valor do potencial hídrico neste ponto é, com algumas excepções, independente do tipo de solo e situa-se por volta de –1.5 MPa. O conteudo de água dum solo compreendido entre o ponto de capacidade de campo e o ponto de murchidão permanente representa a água disponivel para ser absorvida pelas plantas. Esse valor é relativamente elevado nos solos siltosos e argilosos e baixo nos solos arenosos. A tabela seguinte apresenta valores típicos para alguns tipos de solo. Tab. Percentagens típicas para a capacidade de campo e ponto de murchidão permanente de alguns solos. Tipo de solo Capacidade. de campo (%) Ponto de murchidão permanente (%) Água disponivel (%) Areia 4.5 2.2 2.3 Vasa ou limo 18.4 12.6 5.8 Argila 45.1 26.2 18.9 Determinação da água do solo A quantidade de água presente numa determinada amostra de solo pode ser determinada por pesagens sucessivas da amostra antes e após secagem a 105ºC durante 48 horas. Outros processos incluem a variação da condutibilidade eléctrica de materiais porosos (gesso) mergulhados no solo (blocos de Buouyoucos), retardamento da transmissão de neutrões lentos e tensiómetro. Componentes do potencial hídrico do solo O potencial hídrico do solo pode ser separado em dois componentes: o potencial osmótico (ψs) e o potencial matricial (mais própriamente uma pressão hidrostática negativa ψp). O potencial osmótico da solução do solo é geralmente negligível (≅ -0.02MPa) com excepção de alguns tipos de solos (solos salinos) em que o potencial osmótico pode apresentar valores francamente negativos. O segundo componente (potencial matricial ou pressão hidrostática negativa) é praticamente igual a zero nos solos fortemente humedecidos, mas baixa consideravelmente à medida que o solo vai secando. Esta pressão negativa resulta da adesão das moléculas de água às partículas do solo e à tensão superficial desenvolvida na interfase água-ar da água contida nos interstícios capilares do solo. O seu valor será tanto mais negativo quanto menos água existir no solo. Movimento da água no solo A água desloca-se nos solos predominantemente por fluxo em massa, accionada por um gradiente de pressão. Algum movimento pode também ocorrer devido à difusão. À medida que a água na proximidade das raizes é gasta o seu potencial de pressão (ou matricial) baixa, estabelecendo-se um gradiente de pressão com as regiões vizinhas de maior conteudo hídrico. Dado que os espaços intersticiais preenchidos com água comunicam uns com os outros, a água desloca-se por fluxo em massa nesses canais em direcção às raizes. A taxa de fluxo da água no solo depende da magnitude do gradiente de pressão (força motriz) através do solo e da condutividade hidráulica (ou da resistência) do solo. A condutividade hidráulica do solo, a qual mede a maior ou menor facilidade com que a água se desloca através do solo, varia com o tipo de solo. Os solos arenosos têm condutividades hidráulicas elevadas, enquanto que os solos argilosos, com pequenos espaços entre as partículas, têm condutividades mais baixas. A condutividade hidráulica do solo depende ainda da quantidade de água que nele existe. Assim, será baixa nos solos secos (os espaços intersticiais ficam preenchidos com ar que impede o movimento da água) e aumenta rápidamente quando o solo fica hidratado. Absorção da água pela raiz O sistema radicular além de fixar a planta ao solo, servir de local de acumulação e síntese de substâncias diversas, também lhe permite-lhe obter a água e os nutrientes minerais de que precisa. Para que a absorção da água possa ocorrer é necessário que exista um gradiente de potencial hídrico entre a solução do solo e o conteudo das células absorventes da raiz e que se estabeleça um contacto íntimo entre a superfície do sistema radicular e a água do solo. A absorção da água pelas raizes faz-se mais eficientemente nas zonas jovens próximo da extremidade da raiz e especialmente na zona de diferenciação ou maturação celular (ou zona pilosa), onde a presença de milhares de pelos radiculares (fig. 15) aumenta enormemente a área de contacto com a solução do solo e o volume de solo explorado pela raiz. Pouca água é absorvida na zona meristemática propriamente dita, provavelmente porque o citoplasma destas células é muito denso e porque não existem ainda diferenciados os tecidos vasculares que possam conduzir a água para outras regiões da planta. Fig. 15 – Aspecto duma raiz jovem duma planta mostrando as diferentes zonas morfolóficas e da relação dos pelos radiculares com o solo Na zona de diferenciação celular, para além da presença dos pelos radiculares, com as suas paredes altamente permeáveis e grande volume vacuolar, os tecidos vasculares já começaram a diferenciar-se, enquanto que a deposição de suberina e lenhina na parede das células endodérmicas é ainda muito incipiente, não oferecendo por isso grande resistência ao movimento da água em direcção aos vasos lenhosos. As regiões mais maduras da raiz possuem frequentemente uma camada exterior de tecido protector, chamada exoderme ou hipoderme, em que as paredes celulares em contacto com o solo possuem substâncias hidrofóbicas que as tornam relativamente impermeáveis à água. Contudo, a presença de lentículas e os pontos de emergência das raizes laterais, que quebram a continuidade do revestimento protector, permitem a entrada de quantidades significativas de água no interior da raiz. Fig. 16 – Aspectos das micorrizas ectotróficas; M- manto; Ha – rede de Hartig; E – endoderme; S – estela. Em muitas árvores, as raizes jovens não apresentam pelos radiculares. Em vez disso encontram-se envolvidas por densos revestimentos de hifas de fungos as quais, para além de se estenderem a distâncias consideraveis no solo, também penetram nos espaços intercelulares da zona cortical da raiz. Estas associações entre hifas de fungos e o sistema radicular de plantas superiores são chamadas micorrizas (Fig. 16). Neste tipo particular de micorrizas chamado ectotróficas (ou ectomicorrizas) as hifas do fungo desempenham um papel particularmente importante na absorção da água e de certas substâncias minerais. Forças responsáveis pela absorção da água A entrada da água na raiz faz-se sempre em resposta a um gradiente de potencial hídrico entre a solução do solo e o conteudo das células da raiz ou, em última análise, a água dos vasos lenhosos. As forças responsáveis pelo estabelecimento desse gradiente podem ser a sucção ou aspiração (tensão) que a perda de água ao nivel das folhas transmite à superfície da raiz, e/ou a diferença de concentração de solutos entre a solução do solo e o interior da raiz.Em qualquer dos casos a entrada da água para a raiz é sempre um movimento passivo sem necessidade de consumo directo de energia metabólica para se realizar. Apesar disso tratamentos e condições que afectem o metabolismo da raiz, como baixas temperaturas, baixas pressões de oxigénio e inibidores respiratórios, também influenciam a absorção de água pelas raizes. Este efeito é, contudo, indirecto e deve-se, provavelmente, à inibição do crescimento da raiz, a alterações da permeabilidade das membranas biológicas e à inibição da absorção dos nutrientes minerais, com reflexos no movimento osmótico da água. Factores que influenciam a absorção da água A absorção da água pela raiz das plantas é afectada por vários factores, incluindo a idade e o estado fisiológico das plantas. Dentre esses factores podemos considerar factores ambientais e factores inerentes à planta. Dentre os primeiros incluem-se factores do solo como a temperatura, a concentração da solução do solo, o arejamento e a disponibilidade de água, e factores atmosféricos como a temperatura do ar, o vento e a luz. Os factores do solo afectam directamente o processo de absorção, enquanto que os segundos afectam principalmente a transpiração e só indirectamente a absorção. No que se refere aos factores inerentes à planta podemos destacar a espessura da cutícula que reveste as folhas, a espessura do revestimento de pelos nas partes aéreas, a densidade de estomas nas folhas e o seu grau de abertura, a compacidade do mesófilo folear e o desenvolvimento do sistema radicular relativamente à parte aérea. A maior parte destes factores afecta o fenómeno da transpiração e, apenas indirectamente, a absorção radicular. Movimento radial da água na zona cortical da raiz A água depois de ter sido absorvida pelos pelos radiculares ou pelas restantes células epidérmicas tem de atravessar a zona cortical da raiz e a endoderme antes de atingir os elementos do xilema no cilindro central (fig. 17). Nesse trajecto a água pode seguir duas vias: 1) pelo apoplasto, isto é pelo contínuo formado pelas paredes das células corticais e espaços intercelulares e 2) passando pelo interior das células (via celular). Nesta última podemos ainda distinguir duas alternativas: a) via simplasto, em que a água depois de penetrar nas células periféricas da raiz atravessa o citoplasma das diversas camadas de células corticais e da endoderme passando dumas células para as outras através dos plasmodesmos; b) via transmembranar em que a água entra e sai sucessivamente em cada uma das células das diversas camadas da zona cortical e da endoderme atravessando a membrana citoplasmática e eventualmente o tonoplasto. Na prática as duas vias não são separadas pois a água apoplástica encontra-se em equilíbrio com a água do interior das células. Isto significa que o movimento da água através do cortex se faz pelas duas vias. O apoplasto terá provavelmente uma maior contribuição no processo por esta via oferecer menos resistência ao fluxo da água que a via celular. No entanto, ao nivel da endoderme, a água apoplástica tem que passar pelo interior das células endodérmicas por as suas paredes radiais e transversais apresentarem faixas suberificadas (faixas ou bandas de Caspary) que representam uma barreira à passagem da água e das substâncias nela dissolvidas para o interior do cilindro central. Fig. 17 – Vias do movimento radial da água na raiz A resistência que a zona cortical e a endoderme, oferecem ao movimento da água desde o solo até aos vasos lenhosos é bastante maior que a resistência que o xilema oferece à circulação da seiva, sendo, por isso, a principal causa do atraso que se observa na curva de absorção quando esta é comparada com a curva de transpiração. A remoção das raizes faz desaparecer em grande medida esse desfasamento. Força motriz do movimento radial O movimento radial da água na zona cortical da raiz faz-se em resposta a um gradiente de potencial hídrico entre a solução do solo e a solução dos vasos lenhosos. Na criação desse gradiente participam dois componentes: a sucção resultante da perda de água por transpiração que coloca a água do xilema sob tensão; e a componente osmótica resultante da secreção de iões no xilema. Duma maneira geral, a primeira componente (diferença de pressão) é mais importante que a segunda (diferença na concentração de solutos) no estabelecimento da força motriz responsavel pelo movimento da água. Certas condições ambientais (baixas temperaturas e falta de oxigénio) e tratamentos com inibidores respiratórios, aumentam a resistência ao fluxo da água através da zona cortical da raiz, provavelmente por inactivarem as aquaporinas ou através de outros processos ainda desconhecidos. Ascensão da água nas plantas Anatomia da via de condução A água com sais minerais dissolvidos, depois de atingir os vasos condutores do xilema da raiz é transportada em sentido ascendente em direcção às folhas e outros orgãos aéreos da planta, constituindo a chamada corrente de transpiração. Que a água e substâncias minerais nela dissolvidas se deslocam no xilema pode ser comprovado fornecendo às raizes uma solução dum corante ou dum radioisótopo, ou ainda removendo os tecidos exteriores ao xilema em todo o perímetro do caule duma planta. No primeiro caso o corante ou o radioisótopo localizam-se essencialmente nos elementos condutores do xilema (embora possam ocorrem trocas laterais com os tecidos vizinhos e especialmente com o floema), enquanto que no segundo caso se verifica que a água continua a chegar às folhas, apesar de se terem removido os tecidos exteriores ao xilema incluindo toda a zona cortical e também o floema. Também foi demonstrado (Strasburger e Boucherie) que as células vivas do xilema não desempenham qualquer papel importante neste movimento ascensional da água, uma vez que a sua morte, provocada pela imersão da base seccionada do caule numa solução de ácido pícrico, não impede a solução ácida de ascender na planta e de atingir as folhas. Dos diversos tipos de células que constituem o xilema (fibras, parênquima e elementos traqueais) (fig.18) são estes últimos que se encontram mais directamente envolvidos na condução da seiva xilémica. Os elementos traqueais são de dois tipos: os traqueidos e os elementos de vaso. Fig. 18 – Xilema duma planta e elementos condutores da água Tanto os traqueidos como os elementos de vaso são células tubulares alongadas, mortas na maturidade, com paredes secundárias lenhificadas e diversamente esculpidas. Os traqueidos são células individuais com diâmetros compreendidos entre 10 e 50 µm e, geralmente, menos de 1 cm de comprimento. O movimento da água entre os traqueidos é facilitada em zonas da parede secundária, conhecidas por pontuações, em que a deposição dos materiais da parede secundária foi interrompida, ficando a parede dessas zonas restringida à parede primária, que é permeavel. As pontuações das paredes de traqueidos adjacentes encontram-se justapostas formando pares de pontuações, de tal forma que os lumina desses traqueidos se encontram separados, nessas zonas, apenas pelas chamadas membranas das pontuações constituidas pelas paredes primárias e pela lamela média. Nos traqueidos com pontuações areoladas a parte mediana da membrana da pontuação encontra-se dilatada (tórus) e pode funcionar como uma válvula que fecha a pontuação quando a pressão nas células condutoras adjacentes é diferente. As extremidades afiladas de traqueidos sucessivos sobrepoem-se em certa extensão permitindo a passagem da água de um traqueido para o seguinte ou para o traqueido que lhe fica ao lado, através dos pares de pontuações existentes. Os vasos xilémicos são longos tubos constituidos pela associação topo a topo de várias unidades de elementos de vaso, em que, na maturidade, as paredes terminaisdos elementos de vaso se dissolveram ficando uma ou mais aberturas (perfurações) que constituem as chamadas placas de perfuração. Nas paredes laterais dos elementos de vaso existem pontuações semelhantes às dos traqueidos. Os vasos xilémicos apresentam calibres bastante maiores que os traqueidos e são também mais longos. Dado o seu maior calibre e extensão os vasos são considerados mais eficientes na condução da água e substâncias minerais que os traqueidos. Mecanismos de ascensão da água nas plantas A água entra para a planta pelas raizes e é perdida principalmente pelas folhas. A questão que aqui se coloca é saber como é feito o transporte da água desde a raiz até ao topo das plantas, incluindo árvores com mais de 100 metros de altura. Neste caso, as forças necessárias para deslocar a água a essas alturas são substanciais, (2,0 - 3,0 MPa) pois têm que contrariar a influência da força da gravidade sobre a coluna de água, mas também a resistência que a via de transporte (xilema) oferece ao movimento da água. No que se refere ao mecanismo que gera essas forças existem duas possibilidades: 1) A água pode ser bombeada (empurrada) de baixo para cima, ou 2) A água pode ser aspirada de cima. Pressão Radicular No primeiro caso inclui-se o fenómeno da pressão radicular. A pressão radicular é uma força (pressão) positiva gerada na raiz de algumas plantas, que empurra a água presente nos vasos do xilema para cima. Essa força pode ser demonstrada se o caule duma planta envasada e bem regada for seccionado junto ao solo. Se as condições forem favoráveis, a água com substâncias minerais dissolvidas sairá sob pressão através da secção de corte. O valor dessa pressão pode ser medido se ajustarmos um manómetro à secção de corte, podendo atingir valores da ordem de grandeza de 0.1 a 0.5 MPa. O desenvolvimento da pressão radicular nas plantas está intimamente relacionada com a estrutura da raiz e com a absorção activa de iões do solo e a sua secreção e acumulação no cilindro central, nos vasos do xilema. A acumulação de solutos no xilema faz com que a água se desloque do solo para o cilindro central empurrando a seiva presente nos vasos lenhosos que, deste modo, é obrigada a subir na planta. A ocorrência da pressão radicular é favorecida por condições que estimulem a actividade metabólica da raiz, como temperaturas amenas (20-25ºC) e bom arejamento do solo (oxigénio), humidade adequada do solo e ausência de transpiração. Talvez por causa disso, a pressão radicular é mais evidente em certas horas do dia (normalmente durante o período nocturno) e em certas épocas do ano (princípio da primavera). Normalmente, não se observa na maior parte das árvores, nem nas plantas a transpirarem intensamente. Estes factos, associados com os fracos valores que a pressão radicular normalmente apresenta, demonstram que esta hipótese não pode ser aceite como o principal mecanismo de ascensão da água nas plantas, embora o fenómeno da pressão radicular possa, em circunstâncias especiais, contribuir para a circulação da água. Intimamente associada com a pressão radicular está o fenómeno da gutação. Este fenómeno consiste na emissão de água na forma líquida em certos locais da margem das folhas de certas plantas impedidas de transpirar (fig 19). A água sai através de aberturas especiais chamadas hidátodos ou estomas aquíferos localizados no prolongamento das terminações dos feixes condutores mais pequenos das folhas. Estas poros distinguem-se dos verdadeiros estomas por se manterem sempre abertos, e não possuirem qualquer mecanismo de regulação da sua abertura. Fig. 19 – Gutação numa planta de morangueiro e esquema mostrando a organização dos tecidos na proximidade dum hidátodo Capilaridade Uma outra possibilidade a ter em conta seria a subida de água por capilaridade no caule das plantas. A subida de água em tubos capilares, como são os traqueidos ou os vasos lenhosos mais pequenos, está bem documentada. Este fenómeno chamado subida capilar ou simplesmente capilaridade, é devido à interacção de várias forças. Estas incluem a adesão entre as moléculas de água e os grupos polares da parede do tubo capilar, a tensão superficial resultante da coesão entre as moléculas da água, e a força da gravidade que actua sobre a coluna de água. A altura a que a água é capaz de subir num tubo capilar é inversamente proporcional ao raio do tubo. Deste modo, num vaso ou num traqueido com diametro de 50 µm a altura a que a água pode subir é de apenas 0,6 metros, diminuindo essa altura drasticamente quando o diâmetro do vaso aumenta. Por esse motivo a capilaridade apenas poderia explicar a ascensão da água em plantas de pequenas dimensões. Teoria da tensão-coesão Excluidas as hipóteses anteriores, resta, por conseguinte, a hipótese que considera que a água é aspirada (puxada) pela parte aérea da planta. Esta suposição é apoiada por uma série de observações (fig. 20), as quais serviram de base à chamada teoria da tensão- coesão proposta por Dixon e Joly e também por Askenasi por volta de 1914. Segundo esta teoria, a água que se evapora das paredes das células do mesófilo para os espaços intercelulares circundantes tem que ser substituida (reposta) por água retirada do citoplasma. Isto faz baixar o potencial hídrico dessas células o que lhes permite que retirem água das células vizinhas. Estas, por sua vez, retiram água doutras células próximas e, por último, as células localizadas junto aos elementos condutores do xilema acabam por obter água directamente destes. Desta forma, a água do xilema da folha é colocada sob tensão (pressão negativa) e esta, em virtude da coesão das moléculas de água, transmite-se a toda a coluna de líquido, ao longo da planta, incluindo a raiz. Ao ser retirada água da raiz, o potencial hídrico das células absorventes diminui, aumentando a sua capacidade para extrairem água da solução do solo. Fig. 20 – Esquemas de montagens experimentais destinadas a demonstrar a teoria da tensão-coesão. A perda de água por transpiração faz baixar o conteudo hídrico das folhas e estabelece-se um gradiente de potencial hídrico entre as folhas e a solução do solo em contacto com a superfície radicular. Este gradiente constitui a força motriz que faz circular a água no continuum solo-planta-atmosfera. A teoria da tensão - coesão assenta em três pressupostos: •1) O valor do gradiente de potencial hídrico (força motriz) entre as folhas e a solução do solo tem que ser suficientemente grande para fazer chegar a água às copas das árvores mais altas nas quantidades requeridas. •2) As forças de coesão entre as moléculas de água das colunas de seiva nos vasos lenhosos têm que ser suficientemente fortes para suportarem as tensões a que são submetida sem haver ruptura da continuidade dessas colunas de líquido. Num tubo de vidro de 500 µm de diâmetro são necessárias tensões superiores a 2 MPa para provocar essa rotura. Em capilares mais finos o valor aumenta consideravelmente. •3) A água nos vasos lenhosos das plantas a transpirar activamente encontram-se necessáriamente sob tensão. A estes critérios podemos ainda acrescentar um quarto que é: •As paredes dos vasos lenhosos têm que ser suficientemente fortes para suportarem o peso das colunas de líquido e as tensões a que estas estão sujeitas sem colapsarem. Para validar a teoria deve ser possivel testar positivamente os pressupostos enunciados. Se a grandeza dos gradientes de potencial hídrico entre as zonas de evaporação (transpiração) e a raiz (ou a solução do solo) parece ser mais que adequada (frequentemente superiores a 2-3 MPa) para justificar o movimento da água nas plantas, as maiores dúvidas que possam subsistir dizem respeito à força tensil da água ou seja à capacidade das coluna de líquido suportarem as elevadas tensões aque são sujeitas sem se romperem. De facto, quando as condições são favoráveis à transpiração e a água disponivel no solo é muito escassa, desenvolvem-se tensões muito grandes que as colunas de líquido que preenchem os vasos lenhosos, principalmente os de maior calibre, não são capazes de suportar intactas e cavitam. Este fenómeno da cavitação consiste na vaporização repentina e localizada da seiva num determinado sector dum vaso lenhoso, provocando o embolismo, ou seja o preenchimento por uma bolha de gás desse sector. As tensões susceptiveis de causar cavitação variam com as espécies. A arquitectura dos vasos lenhosos, com as suas pontuações areoladas que funcionam como válvulas, e a tensão superficial na interface gás-líquido, impedem que a bolha de gás se espalhe por todo o vaso ou mesmo pelos elementos condutores vizinhos, e faz com que o embolismo fique restringido a um pequeno sector. No entanto a água pode facilmente contornar a zona obstruida, através das células e vasos adjacentes e retomar depois o seu trajecto normal. Certas condições parecem favorecer a cavitação. São elas: Stress hídrico elevado, congelamento da seiva no inverno e acção de certos agentes patogénicos. Apesar de ocorrer alguma cavitação, esta não é generalizada e as forças de coesão entre as moléculas de água parecem ser, na maior parte dos casos, suficientemente fortes para suportar as tensões requeridas para fazer ascender a água no caule das plantas. Apesar disso as plantas devem possuir mecanismos que permitam minimizar os efeitos da cavitação ou de repararem o embolismo, para a longo prazo poderem sobreviver. A estrutura dos elementos condutores é o principal mecanismo de minimizar o efeito da cavitação, na medida em que, conjuntamente com a tensão superficial da seiva na interface gás-líquido, permite restringir o embolismo a sectores muito limitados do sistema condutor. Por outro lado, a pressão radicular que se desenvolve durante a noite nas plantas herbáceas, ou em certas épocas do ano no caso de algumas plantas lenhosas, pode facilitar a dissolução das bolhas de gás e o enchimento com seiva dos vasos anteriormente obstruidos. Por sua vez, nas plantas lenhosas é frequente elas fecharem os estomas nos períodos de maior transpiração a fim de reduzirem a taxa de cavitação. Também o facto das plantas lenhosas produzirem todos os anos (início da primavera) novos elementos condutores pode servir para substituir os vasos xilémicos obstruidos por outros funcionais evitando assim os efeitos nefastos da cavitação. Que o conteudo dos vasos lenhosos das plantas a transpirar activamente se encontra sob tensão, não parece oferecer dúvidas. Esta situação pode ser inferida a partir de várias observações, designadamente: Fig. 21 – Variação do diâmetro do tronco duma árvore com as horas do dia (transpiração) 1) Quando se corta o caule de uma planta que está a transpirar a seiva nos vasos lenhosos retrocede bruscamente para ambos os lados, tal como sucede com um elástico que se rompe. 2) O diâmetro do tronco das árvores varia durante as horas do dia, sendo menor nas horas de maior transpiração (fig. 21). 3) O movimento da seiva inicia-se de madrugada nas partes mais elevadas das plantas quando as folhas começam a perder água por transpiração. Esse movimento estende-se depois gradualmente em direcção à base do tronco e à raiz. Velocidade A velocidade de circulação da seiva nas plantas depende fundamentalmente de dois factores: 1) Da grandeza do gradiente de potencial hídrico entre as folhas e a raiz; 2) Da resistência ao fluxo da água. O gradiente de potencial hídrico constitui a força motriz e por isso quanto maior for o gradiente , maior será a velocidade. Por outro lado, a velocidade de circulação aumenta quando diminui a resistência ao fluxo. Assim, nos vasos de maior calibre a água circula mais rapidamente que nos vasos mais estreitos ou nos traqueidos. Fig. 22 – Medição da velocidade de circulação da seiva xilémica Dum modo geral, a seiva apresenta picos de velocidade de circulação por volta do meio dia quando as condições atmosféricas são mais favoráveis à transpiração. Nas plantas com vasos de maior calibre (lianas) têm-se registado velocidades de transporte compreendidas entre 16 e 45 metros por hora, enquanto que nas plantas com vasos de menor calibre a velocidade de circulação está geralmente contida entre 1 e 6 metros por hora. A velocidade de circulação no xilema pode ser determinada recorrendo a corantes e radioisótopos ou a sondas termoeléctricas (fig.22) que aquecem ligeiramente a seiva num dado local dum caule, ou dum ramo, e detectam a sua passagem noutro ponto do percurso da seiva. Transpiração Cerca de 99% da água absorvida pelas plantas é libertada para a atmosfera na forma de vapor. Esta perda de água na forma de vapor é designada transpiração. Uma pequena porção da água transpirada pode ser perdida através de pequenas aberturas, chamadas lentículas, existentes na casca de caules, rebentos e ramos jovens (transpiração lenticular), mas a maior parte da água é perdida através das folhas. A grande capacidade das folhas para perderem água está relacionada com a sua arquitectura interna, a qual está mais adaptada para suprir as necessidade da fotossíntese do que para economizar água. Deste modo, as folhas apresentam grandes superfícies através das quais se podem realizar trocas gasosas e, ao mesmo tempo, a evaporação de grandes quantidades de água (Tab. ). Tabela. Quantidade de água transpirada por uma única planta durante uma estação de crescimento Planta Água perdida (em litros) Ervilhaca (Vigna sinensis) 49 Batateira (Solanum tuberosum) 95 Trigo (Triticum aestivum) 95 Tomateiro (Lycopersicon esculentum) 125 Milho (Zea mays) 206 O arranjo interno, muito disperso, das células faz com que cerca de 70% do volume seja ocupado por espaços intercelulares que comunicam com a atmosfera através dos estomas. As folhas possuem, ainda, um eficiente e muito ramificado sistema de nervuras que fornecem água à superfície de evaporação interna. A água perdida por transpiração terá que ser substituida por água absorvida do solo pelas raizes e posteriormente deslocada para as folhas. A transpiração é essencialmente um processo de difusão. O vapor de água passa deste modo das superfícies de evaporação para a atmosfera livre onde é arrastado pelos movimentos de turbulência do ar. Como qualquer processo de difusão, a do vapor de água obedece às leis de Fick e depende do gradiente de concentração de vapor de água (ΔC) entre a folha e a atmosfera (força motriz do processo) e das resistências à difusão que o vapor de água encontra no seu trajecto T = ΔC/r em que T é a taxa de transpiração (g cm-2 s-1), ΔC o gradiente de concentração de vapor de água (g cm-3) e r a resistência difusiva total (s cm-1). Transpiração estomática e transpiração cuticular Do vapor de água transpirado pelas folhas, a maior parte é perdida através dos estomas (transpiração estomática, 90 a 95%), embora uma parte significativa se possa evaporar directamente da superfície das células epidérmicas para a atmosfera (transpiração cuticular, 5 a 10%). As duas vias transpiratórias encontram-se a funcionar em paralelo, sendo a força motriz da difusão (ΔC) a mesma para ambos os tipos. Deste modo, a importância relativa de cada uma delas depende das resistências respectivas, sendo a transpiração total da folha a soma de ambas as modalidades. A resistência cuticular, que é determinada essencialmente pela espessura e composição da cutícula, é muito maior que a resistência estomática quando os estomas estão abertos, mas em condições de seca, que provocam o encerramento dos estomas, a transpiração cuticular torna-se no principal processo de perdade água pelas plantas. Fig. 23 – Trajecto da água durante a transpiração A transpiração estomática pode ser considerado como um processo em duas etapas (fig.23): 1) a evaporação da água das paredes encharcadas das células do mesófilo ou das paredes internas das células epidérmicas, para os espaços intercelulares seguido da migração do vapor de água para o espaço subestomático; 2) difusão do vapor de água do espaço subestomático para a atmosfera exterior através da abertura dos estomas. Por isso, a resistência estomática compreende vários componentes: re = rw + ri + rp em que rw , ri , e rp representam respectivamente a resistência das paredes das células do mesófilo, a resistência dos espaços intercelulares e a resistência do poro do estoma. Destas resistências, de longe a mais importante é a resistência do poro a qual depende, de forma dramática, do grau de abertura do estoma. A resistência aumenta á medida que os estomas se vão cerrando, sendo atranspiração estomática abolida quando os estomas se encontram totalmente fechados. Deste modo, a regulação da abertura dos estomas é o mecanismo mais importante de controlo da perda de água pelas plantas. Antes de atingir a atmosfera livre, o vapor de água tem ainda que atravessar a camada estacionária de ar, rica em vapor, que se deposita junto à superfície da folha. A resistência que esta camada estacionária oferece à difusão do vapor de água depende da sua espessura. Por sua vez, a espessura depende da geometria e tamanho das folhas e da velocidade do vento (agitação do ar). O valor desta resistência é, portanto, variavel, sendo particularmente importante nos dias calmos, sem vento. Medição da água transpirada A determinação da água perdida por transpiração por uma planta ou por um orgão isolado duma planta pode fazer-se essencialmente por dois métodos: 1) Métodos baseados na variação de peso 2) Métodos baseados nas trocas gasosas O primeiro caso aplica-se principalmente a pequenas plantas envasadas ou orgãos isolados (folhas, pequenos ramos), mas também já tem sido usado em estudos agrícolas, no campo, com a construção de lisímetros que são grandes recipientes cheios de terra, montados num sistema de pesagem e mergulhados no solo,. Se se tiver o cuidado de evitar trocas directas de vapor de água entre o solo e a atmosfera, a variação de peso observado reflecte as perdas de água ocorridas através das plantas. Os métodos baseados nas trocas gasosas envolvem normalmente o encerramento duma folha ou ramo numa câmara transparente por onde passa uma corrente de ar, cujo teor em humidade é conhecido. A transpiração pode ser calculada como a diferença entre a quantidade de vapor de água presente no ar que entra na câmara e a quantidade de vapor de água no ar que sai da câmara. Fisiologia dos estomas Dada a importância de que se revestem os estomas na gestão dos recursos hídricos das plantas, é conveniente conhecer um pouco melhor os aspectos relacionados com a sua estrutura e a sua fisiologia. Estrutura e distribuição dos estomas. O número de estomas por cm2 de área folear varia muito de espécie para espécie, estando normalmente compreendido entre 1000 e 100000. De acordo com a distribuição dos estomas as folhas podem ser anfiestomáticas (estomas em ambas as páginas) e folhas hipoestomáticas (estomas restringidos à página inferior). Mesmo nas folhas anfiestomáticas a distribuição dos estomas não é, na maior parte dos casos, uniforme sendo geralmente mais abundantes na página inferior (Tabela 2). O aparelho ou complexo estomático (ou simplesmente estoma) é constituido por duas células guarda (fig.24) (ou estomáticas, ou oclusivas), que delimitam um poro, o ostíolo, e, em muitos casos, pelas células epidérmicas adjacentes chamadas subsidiárias, acessórias ou anexas que diferem na sua morfologia das restantes células epidérmicas Fig. 24 – Estrutura dum estoma As células guarda apresentam algumas características distintivas (Fig.25), tais como: 1) Capacidade para alterar rápida e reversivelmente a sua turgidez e, consequentemente, o seu volume; 2) Orientação radial das microfibrilhas de celulose na parede das células guarda o que determina uma menor elasticidade na direcção longitudinal da parede interior (voltada para o ostíolo), relativamente à parede dorsal. Em alguns casos, a parede interna também é mais espessa que a dorsal; Fig. 25 – Esquemas da distribuição das microfibrilhas na parede das células guarda e suas consequências para o mecanismo de abertura dos estomas 3) Capacidade para atingirem uma concentração de solutos mais elevada e, por conseguinte, uma maior turgidez, que as células vizinhas da epiderme; 4) Ao contrário das outras células epidérmicas, as células guarda possuem cloroplastos; 5) Encontram-se simplasticamente isoladas das células vizinhas, não possuindo plasmodesmos, por isso, recebem a água e solutos do apoplasto; 6) Apresentam formas características: nas dicotiledóneas têm forma de rim enquanto que nas monocotiledóneas apresentam forma de alter. O ostíolo, quando completamente aberto, apresenta dimensões que variam de espécie para espécie. Contudo, elas encontram-se compreendidas entre: 3 - 12 µm de largura e 10 - 40 µm de comprimento. Mecanismo de abertura dos estomas É um facto bem conhecido que os movimentos de abertura e encerramento dos estomas são consequência de variações na turgidez das células guarda. Nestas, um aumento de turgidez traduz-se numa abertura dos estomas, enquanto que uma diminuição da turgidez provoca o seu fecho. Também se sabe que estas variações de turgidez são comandadas por alterações do conteudo osmótico e pela entrada ou saida de água da células guarda. Mais dificil de explicar é o mecanismo responsável pela indução das rápidas alterações de conteudo osmótico nas células guarda. Ao longo do tempo têm sido apresentadas diversas explicações para o facto, as quais, por uma razão ou por outra, se revelaram inadequadas. A teoria actualmente aceite foi elaborada com base em observações que revelaram que a abertura dos estoma era precedida por uma acumulação maciça de K+ nas células guarda (Fig. 26) e que o seu fecho se correlaciona com a diminuição da concentração do mesmo ião. Segundo esta teoria, a acumulação do ião K+ obedeceria a um mecanismo quimiosmótico clássico que consistiria no seguinte: Fig. 26 – Niveis de K+, Cl- e Fósforo nas células guarda de estomas fechados e abertos No plasmalema das células guarda existem H+-ATPases activadas por baixos niveis de CO2 interno e outros sinais como a luz azul, as quais bombeiam activamente protões (H +) para o exterior, originando um gradiente electroquímico entre o exterior e o interior das células guarda. Fig. 27 – Mecanismo quimiosmótico explicativo da abertura e encerramento dos estomas Os iões K+ entrariam para as células através de canais próprios, que respondem a diferenças de potencial eléctrico transmembranar, aproveitando o gradiente de carga eléctrica criado pelo excesso das cargas + dos protões no exterior das células. Para manter a neutralidade eléctrica no interior das células é necessário que entrem para as células aniões de compensação como os iões cloro (Cl-) ou, mais frequentemente, que sejam produzidos iões malato em resultado da ionização do ácido málico (Fig. 27). O fecho dos estomas resultaria da desactivação da bomba de protões por acção do ABA e da saida passiva da células guarda de iões potássio, Cl- e iões malato ao longo dos seus gradientes de concentração. Controlo do movimento dos estomas Sendo os estomas simultaneamente a porta de entrada do CO2 para a fotossíntese e de saida do vapor
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