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CORTES E CPMF HUGO DE BRITO MACHADO Advogado, Professor Titular de Direito Tributário da Universidade Federal do Ceará e Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 5.ª Região (Aposentado) O governo ameaçou fazer um corte de 4 bilhões de reais no orçamento se o Congresso não aprovasse a emenda constitucional prorrogando a CPMF. Sustentamos então que tal ameaça escondia uma inverdade, ou um absoluto desprezo pela lei. Não podia haver necessidade de cortes no orçamento porque não era juridicamente possível a previsão de uma arrecadação de tributo inexistente. Não se podia admitir estivesse prevista no orçamento a arrecadação da CPMF depois do final de sua vigência. Ou não era verdadeira a afirmação da necessidade de corte, ou então o orçamento fora elaborado com absoluto desrespeito à lei, com previsão de receita juridicamente inexistente. Senadores e Deputados, porém, preferiram acreditar no governo e afinal aprovaram a prorrogação da CPMF, pois não queriam, como ninguém queria ver cumprida a ameaça dos cortes no orçamento já tão sacrificado. E assim continuaremos suportando o sacrifício da CPMF, que não é pequeno como pode parecer, pois numa aplicação financeira de 30 dias, como incide sobre a totalidade do valor aplicado, corresponde a mais de 30% do rendimento auferido. Satisfeito o desejo do governo, este mais uma vez demonstra que não é confiável. Anuncia que vai manter o corte dos 4 bilhões (DN de 24/07/02). Haveria uma perspectiva de frustração de receitas tributárias com a estimativa de perda de arrecadação do imposto de importação e do IPI incidente nas importações, além de aumento nos gastos com pessoal. Desta vez, como quer justificar os cortes no orçamento, o governo não falou dos sucessivos recordes na arrecadação de impostos federais. O problema, como se vê, é que não existe transparência na MACHADO, Hugo de Brito. Cortes e CPMF. 2002. Disponível em: <http://www.hugomachado.adv.br>. Acesso em: 20 out. 2005. Cortes e CPMF administração financeira. O Tesouro Nacional é uma verdadeira caixa preta da qual o governo só mostra os detalhes que lhe convém mostrar para justificar as medidas que adota. É provável que a queda nas importações seja compensada com o aumento do consumo de produtos nacionais, que eleva a arrecadação de outros tributos, mas isto ao governo não interessa dizer. Seja como for, não há como se possa negar um fato. O governo traiu a confiança daqueles que acreditaram que aprovando a prorrogação da CPMF os cortes não seriam feitos. Disse claramente que necessidade de fazê-los decorreria da não prorrogação da CPMF. Obteve tal prorrogação, inclusive sem a noventena prevista na Constituição, não perdeu nenhum centavo na arrecadação desse tributo, e mesmo assim vai manter os cortes. É difícil acreditar-se que os técnicos do Ministério da Fazenda sejam tão incompetentes que no momento da pressão sobre o Congresso para a prorrogação da CPMF não soubessem da necessidade de cortes no orçamento em razão dos fatos agora apresentados. Fatos que possivelmente não justificam os cortes que o governo quer fazer e cujo verdadeiro motivo talvez não possa ser publicamente revelado. Tudo isto a nosso ver decorre do total e absoluto menos prezo pelo elemento jurídico no trato das questões governamentais. Os direitos e garantias individuais e sociais, a Constituição e as leis do País, já não importam. Enquanto a Constituição preconiza a publicidade e a moralidade predominam a falta de transparência e a falta de ética na condução da coisa pública. Os princípios jurídicos são atropelados pelas conveniências políticas. Cresce a desigualdade que eleva a violência a níveis insuportáveis. E a tendência, diante da criminosa omissão das autoridades, é muito sombria. 2 MACHADO, Hugo de Brito. Cortes e CPMF. 2002. Disponível em: <http://www.hugomachado.adv.br>. Acesso em: 20 out. 2005.
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