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ANDERSON RICARDO FRÉZ FRATURAS DO FÊMUR EM PACIENTES IDOSOS: ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO Cascavel 2003 ANDERSON RICARDO FRÉZ FRATURAS DO FÊMUR EM PACIENTES IDOSOS: ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus Cascavel, como pré-requisito para obtenção do Título de graduado em Fisioterapia. Orientadora: Carla Adriane Pires Ragasson Cascavel 2003 TERMO DE APROVAÇÃO ANDERSON RICARDO FRÉZ FRATURAS DO FÊMUR EM PACIENTES IDOSOS: ESTUDO EPIDEMIOLÓGICO Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial para obtenção do Título de graduado em Fisioterapia, na Universidade Estadual do Oeste do Paraná. _____________________________________________ Carla Adriane Pires Ragasson – UNIOESTE (orientador) _____________________________________________ Alberito Rodrigo de Carvalho - UNIOESTE _____________________________________________ Rodrigo Daniel Genske - UNIOESTE Cascavel, 16 de abril de 2003. DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a Deus, aos meus pais, irmãos, amigos e professores. “...and the world is drawn into your hands, and the world is etched upon your heart, and the world so hard to understand, is the world you can’t live without...” (muzzzle - the smashing pumpkins) AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus tudo que tenho; aos meus pais o carinho, compreensão e apoio em todas as fases da minha vida; ao meu irmão e meu amigo João a ajuda na revisão deste trabalho; à minha irmã e minha tia, que me auxiliaram na impressão deste trabalho; ao meu grupo de estágio: Caroline, Lucélia e Maria, que sempre tiveram muita paciência comigo; aos meus amigos pela companhia e o incentivo durante todos os anos; aos meus professores o conhecimento que passaram e as oportunidades que me ofereceram; à minha orientadora e coordenadora do projeto, que sempre teve muita paciência comigo; os professores que aceitaram participar da banca e aprovaram este trabalho; a todos os alunos que participaram do projeto; e a todos que de alguma forma contribuíram para a realização deste trabalho. Muito Obrigado! RESUMO As fraturas, principalmente do fêmur, decorrentes de quedas na população idosa, representam um motivo de preocupação para profissionais da saúde e dos familiares destes pacientes, pois podem acarretar uma série de complicações, levando à incapacidade física, limitações funcionais, perda da independência e comprometimento da qualidade de vida desta população. Estudos tornam-se necessários a fim de buscar meios mais efetivos para minimizar sua incidência. O objetivo deste estudo é analisar a incidência de fraturas do fêmur em pacientes idosos, decorrentes de quedas, no Hospital Universitário do Oeste do Paraná, na cidade de Cascavel, atentando-se para a importância da prevenção. A amostra apresentou uma incidência de 25,3% de fraturas do fêmur; destas, 62,5% do sexo masculino, 37,5% do sexo feminino, idade média de 59,4 anos e todos pacientes da raça branca. A incidência destas fraturas na população idosa representou 54,2%, sendo 84,6% decorrentes de quedas. Associado ao levantamento de dados, procedeu-se uma revisão das principais causas de fraturas, fatores de risco das quedas em pacientes idosos, e as medidas preventivas, que se fazem necessárias para reduzir a exposição destes idosos aos fatores de risco. Palavras chave: fratura do fêmur, idoso, quedas, prevenção. ABSTRACT The femoral fracture, by falls in elderly population, shows an important role to health professional and relatives. The fractures carry a lot of complications, as physical and functional handicaps, loss in independence and decrease of life quality in this population. Studies regarding their falling have become a necessity so that we can seek more effective means to minimize the incidence rate. The purpose of this study has been to analyse the incidence of femoral fracture in elderly pacients in Hospital Universitário do Oeste do Paraná, in Cacavel city, with special atention to prevention. The sample showed an incidence of femoral fracture was 25,3%; 62,5% was male, 37,5% was famale, the mean age was 59,4 years old and all was white. The incidence of femroal fracture in elderly population was 54,2%, and 84,6% was fall-induced. A review of the causes and the risk factors from falling and fractures in elderly pacientes is also present, as the preventive measures, that should be taken to reduce the exposition elderly to risk factors. Key words: femoral fracture, elderly, falls, prevention. SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS.................................................................. 11 LISTA DE GRÁFICOS............................................................... 12 LISTA DE ABREVIATURAS..................................................... 13 1 INTRODUÇÃO............................................................................ 14 2 FRATURAS.................................................................................. 16 2.1 ANATOMIA............................................................................................... 16 2.1.1 ESTRUTURA ÓSSEA................................................................................. 16 2.1.2 VASCULARIZAÇÃO.................................................................................. 18 2.1.3 PRINCIPAIS MÚSCULOS.......................................................................... 20 2.2 FRATURAS DO COLO DO FÊMUR....................................................... 22 2.2.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 22 2.2.2 MECANISMO DE LESÃO.......................................................................... 23 2.2.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 23 2.2.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS............................... 24 2.2.5 LESÕES ASSOCIADAS.............................................................................. 24 2.2.6 COMPLICAÇÕES....................................................................................... 25 2.3 FRATURAS INTERTROCANTERIANAS DO FÊMUR........................ 25 2.3.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 25 2.3.2 MECANISMO DE LESÃO.......................................................................... 27 2.3.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 27 2.3.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS............................... 27 2.3.5 LESÕES ASSOCIADAS.............................................................................. 28 2.3.6 COMPLICAÇÕES....................................................................................... 28 2.4 FRATURASSUBTROCANTERIANAS DO FÊMUR............................. 28 2.4.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 28 2.4.2 MECANISMO DE LESÃO.......................................................................... 29 2.4.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 30 2.4.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS............................... 30 2.4.5 LESÕES ASSOCIADAS.............................................................................. 31 2.4.6 COMPLICAÇÕES....................................................................................... 31 2.5 FRATURAS DA DIÁFISE DO FÊMUR................................................... 31 2.5.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 31 2.5.2 MECANISMO DE LESÃO.......................................................................... 32 2.5.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 33 2.5.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS............................... 33 2.5.5 LESÕES ASSOCIADAS.............................................................................. 33 2.6 FRATURAS DISTAIS DO FÊMUR.......................................................... 34 2.6.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 34 2.6.2 MECANISMO DE LESÃO.......................................................................... 35 2.6.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 37 2.6.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS............................... 37 2.6.5 LESÕES ASSOCIADAS.............................................................................. 37 2.6.6 COMPLICAÇÕES....................................................................................... 38 3 QUEDAS EM IDOSOS................................................................ 39 3.1 IDOSOS ..................................................................................................... 39 3.2 QUEDAS..................................................................................................... 39 3.2.1 CLASSIFICAÇÃO....................................................................................... 39 3.2.2 CONTROLE POSTURAL E QUEDAS........................................................ 40 3.2.2.1 Mecanismos Aferentes.................................................................................. 40 3.2.2.2 Mecanismos Centrais.................................................................................... 41 3.2.2.3 Mecanismos Eferentes.................................................................................. 41 3.2.3 INCIDÊNCIA.............................................................................................. 42 3.2.4 COMPLICAÇÕES....................................................................................... 42 3.2.5 FATORES QUE INFLUENCIAM A QUEDA NOS IDOSOS...................... 43 3.2.5.1 Envelhecimento............................................................................................ 43 3.2.5.2 Alterações Neurológicas............................................................................... 44 3.2.5.3 Sistema Vestibular........................................................................................ 45 3.2.5.4 Cognição e Memória.................................................................................... 45 3.2.5.5 Sistema Visual.............................................................................................. 45 3.2.5.6 Sistema Muscular......................................................................................... 46 3.2.5.7 Estado Funcional.......................................................................................... 46 3.2.5.8 Alterações Cardiológicas.............................................................................. 46 3.2.5.9 Estado de Saúde...................................................................................... 47 3.2.5.10 Osteoartrose.................................................................................................. 47 3.2.5.11 Atividades de Lazer...................................................................................... 48 3.2.5.12 Reposição Hormonal.................................................................................... 48 3.2.5.13 Medicamentos.............................................................................................. 48 3.2.5.14 Ausência de Cônjuge.................................................................................... 49 3.2.5.15 Sexo Feminino............................................................................................. 49 3.2.5.16 Fatores Externos........................................................................................... 49 3.2.5.17 Outros Fatores.............................................................................................. 50 4 PREVENÇÃO.............................................................................. 51 4.1 PREVENÇÃO DE FRATURAS................................................................ 51 4.2 PREVENÇÃO DE QUEDAS..................................................................... 52 4.3 INDICADORES DE QUALIDADE........................................................... 54 5 METODOLOGIA........................................................................ 56 6 RESULTADOS............................................................................. 57 7 DISCUSSÃO................................................................................. 62 8 CONCLUSÕES............................................................................ 66 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................ 67 LISTA DE FIGURAS Figura 01 - Anatomia das trabéculas ósseas na extremidade proximal do fêmur e o triângulo de Ward (W)........................................................................... 17 Figura 02 - Fêmur direito. Vista anterior e posterior................................................. 18 Figura 03 - Anatomia vascular da cabeça e colo femorais. Vista anterior e posterior................................................................................................ 19 Figura 04 - Artérias da cabeça e colo femorais. Vista anterior................................... 19 Figura 05 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada superficial. Vista posterior 20 Figura 06 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada superficial. Vista anterior. 21 Figura 07 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada profunda Vista anterior.................................................................................................. 21 Figura 08 - Classificação de Pauwels das fraturas do colo femoral............................ 23 Figura 09 - Classificação do grupo AO das fraturas intertrocanterianas do fêmur...... 26 Figura 10 - Classificação de Russell-Taylor das fraturas subtrocanterianas................ 29 Figura 11 - Classificação do grupo AO das fraturas da diáfise femoral...................... 32 Figura 12 - Classificação do grupo AO das fraturas distais do fêmur......................... 36 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 01 - Deterioração da função geral em sujeitos idosos e a influência do treinamento............................................................................................44 Gráfico 02 - Incidência de fraturas do fêmur no HUOP.............................................. 57 Gráfico 03 - Incidência de fraturas do fêmur em pacientes idosos............................... 57 Gráfico 04 - Incidência de fraturas do fêmur em pacientes idosos do sexo masculino.............................................................................................. 58 Gráfico 05 - Incidência de fraturas do fêmur em pacientes idosos do sexo feminino................................................................................................ 58 Gráfico 06 - Intensidade dos traumas que levaram à fratura do fêmur......................... 59 Gráfico 07 - Mecanismo de lesão das fraturas femorais............................................. 59 Gráfico 08 - Intensidade dos traumas que levaram à fratura do fêmur em pacientes idosos.................................................................................................... 59 Gráfico 09 - Incidência de traumas de baixa energia em pacientes idosos do sexo masculino.............................................................................................. 60 Gráfico 10 - Incidência de traumas de baixa energia em pacientes idosos do sexo feminino................................................................................................ 60 Gráfico 11 - Localização das fraturas femorais........................................................... 60 Gráfico 12 - Localização das fraturas femorais em pacientes idosos........................... 61 LISTA DE ABREVIATURAS AO - Arbeitsgemeinschaft für Osteosynthesefragen BdS- Base de Sustentação CdM - Centro de Massa ed. - Edição Fig. - Figura HUOP - Hospital Universitário do Oeste do Paraná IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística n. - Número OA - Osteoartrose p. - Página RVE - Reflexo Vestíbulo-espinhal RVO - Reflexo Vestíbulo-ocular SNC - Sistema Nervoso Central UNIOESTE - Universidade Estadual do Oeste do Paraná v. – Volume 1 INTRODUÇÃO O envelhecimento da população é um fenômeno mundial. No Brasil, aproximadamente 8,6% da população são idosos, ou seja, há quase 14,5 milhões de pessoas com mais de 60 anos de idade. Embora esta incidência seja significante, está abaixo dos valores divulgados por países da Europa, da Oceania e da América do Norte. Paralelamente ao aumento da população idosa, existe uma aumento da vulnerabilidade para estes sofrerem lesões, as quais geralmente acontecem por traumas de baixa energia. Aumentando estas injúrias, também aumenta a necessidade de intervenções hospitalares. E entre os idosos, estas intervenções tornam-se mais longas, elevando a debilidade destes pacientes. A pré-disposição para lesões pode estar associada ao processo de senescência, ou seja, o envelhecimento fisiológico. Ocorrem alterações em vários sistemas as quais diminuem a funcionalidade dos idosos. Este envelhecimento também pode estar associado a patologias, sendo caracterizado como senilidade. Entre as lesões traumáticas mais comuns na população idosa está a fratura do fêmur. Esta perda da continuidade óssea pode acontecer na região proximal, distal ou ainda na diáfise femoral. O osso perde a capacidade de transmitir normalmente a carga durante o movimento, por perda da integridade estrutural, deixando o idoso imobilizado por períodos prolongados, aumentando a debilidade e diminuindo a funcionalidade. Nos idosos esta fratura ocorre por traumas pequenos, de baixa intensidade, como quedas. Estas geralmente não são intencionais e ocorrem por debilidade decorrente da senescência, da senilidade ou ainda dependem de fatores extrínsecos. Segundo o romancista Marquez (2001), a velhice começa com a primeira queda e a morte vem com a segunda. Evitar as quedas torna-se um trabalho essencial para esta população. Trabalhos preventivos incluem a intervenção de uma equipe multidisciplinar. O trabalho preventivo primário deve evitar que o primeiro episódio de queda ocorra, enquanto o secundário é realizado para evitar quedas recidivantes, e em ambos devem ser observados os fatores intrínsecos e extrínsecos. A fisioterapia pode atuar na prevenção de quedas através de exercícios físicos, aumento da mobilidade, fortalecimento muscular, melhora do equilíbrio, treino de marcha, melhora da aferência sensorial e facilidade em transferências, que levam a um aumento da estabilidade e permitem uma maior independência pela recuperação da confiança em sua atividades. As atividades devem ser realizadas sempre dentro dos limites, mas na maior intensidade tolerada. Porém os efeitos destas atividades são observados apenas enquanto são mantidas, ou por poucos meses após o término. Os objetivos do presente trabalho é o de caracterizar a alta incidência entre as fraturas do fêmur em pacientes idosos, ocasionadas por quedas traumáticas, evidenciando a importância do desenvolvimento de medidas preventivas frente a este fator de risco. 2 FRATURAS DO FÊMUR As fraturas do fêmur podem ser dividias em 3 grupos: as fraturas proximais, as fraturas da diáfise e as fraturas distais. Nas fraturas proximais estão incluídas as fraturas do colo fêmur, as fraturas intertrocanterianas e as fraturas subtrocanterianas (BAUMGAERTNER et al., 2000; DELEE, 1994; HELFET e LORICH, 2000). 2.1 ANATOMIA 2.1.1 ESTRUTURA ÓSSEA O quadril é uma articulação de bola e soquete que compreende o acetábulo e a cabeça do fêmur. Ligando a cabeça femoral à diáfise do fêmur está o colo do fêmur. O ângulo que este subtende com o eixo longo do fêmur é o ângulo de inclinação, e é usualmente entre 120º e 135º na população adulta. Com a idade existe uma diminuição gradual deste ângulo. Além do ângulo no plano frontal em relação ao eixo vertical, o colo femoral é ligeiramente antevertido, em média de 10º a 15º em relação à posição dos côndilos femorais no plano horizontal ou transverso (BAUMGAERTNER et al., 2000). Delee (1994) relata que a cabeça do fêmur não é uma esfera perfeita, e a articulação é congruente apenas na posição de sustentação de peso. Na cabeça e no colo femoral existe um sistema de suporte formado por osso trabecular. Este sistema foi descrito por Ward em 1838, e é composto por cinco grupos normais de trabéculas no fêmur proximal (Fig. 01). A orientação é ao longo das linhas de estresse, abrindo um leque sob a cúpula superior da cabeça femoral, e concentrando-se no colo femoral medial estão as trabéculas compressivas primárias onde as forças que atuam nesta arcada são em grande maioria compressivas. Arqueando-se desde a fóvea para o córtex femoral lateral imediatamente distal ao trocânter maior situa-se o grupo primário de tração. Grupos compressivos e de tração secundários são orientados ao longo de linhas de tensão no colo femoral, com uma relativa escassez de osso trabecular na área central conhecida como triângulo de Ward (WARD1 apud DELEE, 1994). 1 WARD, F. O. Humam Anatomy. London: Renshaw, 1838. Figura 01 - Anatomia das trabéculas ósseas na extremidade proximal do fêmur e o triângulo de Ward (W). Fonte: DELEE, J. C. Fraturas e Luxações do Quadril. In: ROCKWOOD JR., C. A.; GREEN, D.; BUCHOLZ, R. W. Fraturas em Adultos. São Paulo: Manole, 1994, 3ª ed., v. II, p. 1460. Na região subtrocanteriana existe a transação do osso esponjoso daregião intertrocanteriana para o osso cortical espesso da diáfise (RUSSELL e TAYLOR, 2000). A diáfise estende-se desde o nível do trocânter menor até a dilatação dos côndilos. É ligeiramente arqueada anteriormente e é mais estreita em seu terço médio. Sua secção transversa é aproximadamente circular, exceto na linha áspera que corre para baixo pela face posterior, é a fixação para vários músculos, além de reforçar posteriormente para contrabalancear com as forças de flexão ântero-posterior que ocorrem durante a sustentação de peso (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). A área metafisária do fêmur distal é a zona de transição entre a diáfise distal e os côndilos articulares femorais. Nesta junção a metáfise dilata-se, especialmente no lado medial, para fornecer uma plataforma para a superfície condiliana de sustentação de peso da articulação do joelho. Anteriormente entre estes dois côndilos fica uma depressão articular lisa para a patela. Posteriormente entre os côndilos situa-se a incisura intercondiliana. Medialmente existe o tubérculo adutor, o ponto máximo de alargamento da metáfise (Fig. 02) (HELFET e LORICH, 2000). Falavinha (2003) relata que no início do alargamento distal ocorre uma troca lenta e gradativa de osso cortical para osso esponjoso, como ocorre na região proximal. O eixo anatômico da diáfise do fêmur é diferente do eixo de sustentação de peso. Este último passa através da cabeça do fêmur e do meio da articulação do joelho, formando 3º com a vertical. O eixo femoral anatômico tem uma angulação em valgo de 7º em relação ao eixo vertical (HELFET e LORICH, 2000). Figura 02 - Fêmur direito. Vista anterior (A) e vista posterior (B). Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_10.html>. 2.1.2 VASCULARIZAÇÃO As artérias da extremidade proximal do fêmur podem ser descritas em três grupos: (1) um anel arterial extracapsular localizado na base do colo femoral; (2) ramos cervicais ascendentes do anel arterial extracapsular na superfície do colo femoral; e (3) as artérias do ligamento redondo (Fig. 03 e 04). O anel arterial extracapsular é formado posteriormente pela artéria circunflexa femoral medial e anteriormente pela artéria circunflexa femoral lateral. As artérias glúteas superior e inferior também dão pequenas contribuições a este anel (DELEE, 1994). Figura 03 - Anatomia vascular da cabeça e colo femorais. Vista anterior (A) e posterior (B). Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_09.html>. Figura 04 - Artérias da cabeça e colo femorais. Vista anterior. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_09.html>. Os ramos cervicais ascendentes originam-se do anel arterial extracapsular e passam por cima da cápsula no sentido da cartilagem articular que demarca a cabeça femoral do seu colo. Estas artérias são conhecidas como artérias retinaculares. Anteriormente, elas penetram na cápsula da articulação do quadril na linha intertrocanteriana, e posteriormente passam por baixo das fibras orbiculares da cápsula. Esta estrita proximidade das artérias retinaculares ao osso coloca-se em risco de lesão em qualquer fratura do colo femoral (DELEE, 1994). Segundo Delee (1994), a artéria do ligamento redondo é um ramo da artéria obturatória. Embora os vasos deste auxiliem na vascularização da cabeça femoral, eles são inadequados para assumir a nutrição principal da cabeça femoral após uma fratura com desvio. Wolinsky e Johnson (2000) relatam que o fêmur distal e a diáfise apresentam um suprimento sangüíneo por uma única artéria nutridora, que é uma ramificação da artéria profunda da coxa e penetra na metade superior da diáfise, perto da linha áspera. A artéria nutridora forma as artérias medulares no canal medular que se estende proximal e distalmente. Toda a drenagem venosa da diáfise é no sentido da superfície perióstica. 2.1.3 PRINCIPAIS MÚSCULOS Os principais músculos envolvidos nas fraturas do fêmur são: Gastrocnêmio, Semitendinoso, Semimembranáceo, Bíceps Femoral, Quadríceps, Psoas Maior, Ilíaco, Tensor da Fáscia Lata, Piriforme, Quadrado Femoral, Obturador Interno, Oburador Externo, Gêmeo Superior, Gêmeo Inferior, Glúteo Mínimo, Glúteo Médio, Glúteo Máximo, Sartório, Pectíneo, Adutor Magno, Grácil, Adutor Curto e Adutor Longo (Fig. 05, 06 e 07). Figura 05 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada superficial. Vista posterior. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_10.html>. Figura 06 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada superficial. Vista anterior. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_10.html>. Figura 07 - Músculos da coxa e quadril direitos. Camada profunda. Vista Anterior. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/atlas_10.html>. 2.2 FRATURAS DO COLO DO FÊMUR Apley e Solomon (2002) definem fraturas de colo de fêmur como sendo aquelas que ocorrem no colo intracapsular do fêmur. 2.2.1 CLASSIFICAÇÃO Delee (1994) classifica as fraturas do colo do fêmur baseado nas características da fratura, isto é, pela localização anatômica, pelo ângulo de fratura e pelo desvio da fratura. O grupo suíço Arbeitsgemeinschaft für Osteosynthesefragen (grupo AO) considera o local da fratura e procura relacionar o tipo com o prognóstico, além de classificá-las em B1 (subcaptal, sem ou com mínimo deslocamento), B2 (transcervical) e B3 (subcapital deslocada) (MACEDO e GALIA, 2003). Já Klenerman e Marcuson2 (apud DELEE, 1994) relatam que as fraturas intracapsulares do colo do fêmur podem ser classificadas em subcapital, quando ocorre imediatamente abaixo da superfície articular da cabeça femoral ao longo da antiga placa epifisária; e transcervical, que passa através do colo femoral entre a cabeça femoral e o trocânter maior. A fratura da base do colo é classificada como extracapsular A classificação pelo ângulo foi realizada por Pauwels em 1935, e apresenta três tipos (Fig. 08), baseando-se na direção da linha da fratura através do colo femoral. O tipo I é uma fratura a 30º com a horizontal; o tipo II, a 50º; e o tipo III, a 70º. As fraturas tipo I são mais horizontais que o tipo III, que são quase verticais (PAUWELS3 apud MACEDO e GALIA, 2003). O desvio da fratura foi classificado por Garden, baseando-se no grau de desvio observado em radiografias pré-redução. A fratura do tipo Garden I é uma fratura incompleta ou impactada;. a tipo Garden II é uma fratura completa sem desvios; tipo Garden III é uma 2 KLENERMAN, L; MARCUSON, R. W. Intracapsular fractures of the neck of the femur. J Bone Joint Surg, 52B: 514-517, 1970. 3 PAUWELS, F. Der Schenkenholsbruck, em mecchanisches problem. Grundlagen des Heilungsvorganges. Prognose und kasuale Therapie. Stuttgart, Beilageheft zur Zeistschrift fur Orthopaedische, Ferdinand Enke, 1935. fratura completa com desvio parcial; e a tipo Garden IV é uma fratura completa com desvio total dos fragmentos de fratura (GARDEN4 apud DELEE, 1994). Figura 08 - Classificação de Pauwels das fraturas do colo femoral. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/clasfraturas_10.html>. 2.2.2 MECANISMOS DE LESÃO Existem dois mecanismos de lesão: o primeiro é uma queda produzindo um golpe direto sobre o trocânter maior; e o segundo, que é a rotação externa da extremidade. Neste, a cabeça é firmemente fixada pela cápsula anterior e ligamentos iliofemorais. Enquanto o colo roda posteriormente, a cortical posterior colide contra o acetábulo,e o colo dobra-se (KOCHER5 apud DELEE, 1994). Delee (1994) afirma que a maioria dos pacientes que sofrem fratura do colo do fêmur tiveram um traumatismo pequeno. A presença de microfraturas assintomáticas no trabéculo do colo do fêmur leva ao questionamento sobre o que ocorre primeiro, a fratura ou a queda (MACEDO e GALIA, 2003). 2.2.3 INCIDÊNCIA Delee (1994) escreve que as fraturas do colo do fêmur são incomuns em pacientes jovens e em pacientes mais velhos de raças nas quais a osteoporose é incomum. 4 GARDEN, R. Malreduction and avascular necrosis in subtropical fractures of the femur. J Bone Joint Surg, n. 53B, pp. 183-197, 1971. 5 KOCHER, T. Beitrage zur kentruss einiger praktisch wichtiger fracturformen. Basel and leipzig, Carl Sallman, 1896. Macedo e Galia (2003) relatam que o número de casos entre adultos jovens tem crescido, devido ao aumento da intensidade dos traumas. A idade média da ocorrência de uma fratura do colo femoral é de 77 anos nas mulheres e 72 anos nos homens. Homens podem sofrer 80% destas fraturas, e a taxa de fratura duplica a cada década de vida após os 50 anos (AAOS BULLETIN6 apud DELEE, 1994). Os pacientes com fratura do colo de fêmur são em média 3 anos mais jovens que aqueles com fratura trocanteriana, ambas ocorrendo mais comumente na oitava década (DELEE, 1994). Fraturas por estresse do colo femoral podem ser vistas em atletas que praticam balett, corridas de longa distância, marcha atlética ou ginástica (MORAES, 2001). 2.2.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS As fraturas por estresse e impactadas levam a dor na virilha ou dor referida ao longo do lado medial do joelho, mas não existe nenhuma deformidade clínica. Os pacientes são capazes de deambular com uma claudicação antálgica e apenas um desconforto é produzido pelo movimento ativo ou passivo na amplitude de movimento do quadril. Pode estar presente algum espasmo muscular e a percussão sobre o trocânter maior é dolorosa (DELEE, 1994; MACEDO e GALIA, 2003). Fraturas deslocadas levam a dor no quadril e os pacientes apresentam a perna em rotação externa, abdução e ligeiro encurtamento (DELEE, 1994). 2.2.5 LESÕES ASSOCIADAS A maior magnitude do traumatismo leva a um arrancamento de partes moles e cominuição (DELEE, 1994). 6 AAOS BULLETIN. Femoral Neck Fractures (adult), p. 11-12, 1989. 2.2.6 COMPLICAÇÕES As fraturas do colo femoral têm todos os problemas associados com a consolidação de fraturas intracapsulares, como em outros locais do corpo (DELEE, 1994). A porção do colo que é intrcapsular não possui uma camada de câmbio na sua cobertura fibrosa para participar na formação do calo periférico no processo de consolidação. Por essa razão, a consolidação na área do colo femoral é dependente unicamente da consolidação endostal. A não ser que os fragmentos da fratura sejam cuidadosamente impactados, o líquido sinovial é capaz de lisar a formação de coágulos e desse modo destruir um novo modo de consolidação secundária, pela prevenção da formação de células e de uma estrutura em arcabouço para possibilitar a invasão vascular da cabeça femoral. Para todas as finalidades práticas, a cabeça femoral é tornada em grande parte avascular, por uma fratura com desvio. A consolidação da fratura pode ocorrer apesar de um fragmento avascular, embora a incidência de pseudoartrose seja aumentada (DELEE, 1994). Delee (1994) acrescenta que mesmo com tratamento ótimo podem ocorrer sinais de necrose asséptica, que é o infarto ocorrido em seguida a uma fratura do colo femoral, é secundário à fratura, redução ou fixação; e mais tardiamente pode ocorrer o colapso segmentar. O decúbito prolongado imposto durante a recuperação pode levar a formação de úlceras de pressão (DELEE, 1994). 2.3 FRATURAS INTERTROCANTERIANAS DO FÊMUR As fraturas intertrocanterianas ocorrem na região desde o colo femoral extracapsular até a área imediatamente distal ao trocânter menor (BAUMGAERTNER et al., 2000). 2.3.1 CLASSIFICAÇÃO O aspecto mais importante de um esquema de classificação intertrocanteriano é a sua capacidade de caracterizar um padrão de fratura como estável ou instável. Sendo a definição de estabilidade a capacidade da fratura, após redução anatômica e fixação, suportar cargas compressivas sem redesviar-se; e a fratura instável é aquela que colapsa ainda mais ou desvia- se nas mesmas circunstâncias (BAUMGAERTNER et al., 2000). A codificação das fraturas proximais do quadril foram realizadas na tentativa de oferecer uma classificação alfanumérica uniforme das fraturas que incorporam o prognóstico e sugerem o tratamento. Neste sistema, advogado pelo grupo AO, as fraturas são divididas em três grupos, e cada grupo é novamente dividido em três subgrupos (Fig. 09). As fraturas do grupo A1 são fraturas simples com uma única extensão para dentro do córtex medial; o córtex lateral do trocânter maior permanece intacto. O subgrupo define a linha da fratura. As do grupo A2 são multifragmentárias por definição. A linha da fratura começa em qualquer lugar no trocânter maior e estende-se medialmente em dois ou mais lugares. Isto cria um terceiro fragmento de fratura que inclui o trocânter menor. O córtex lateral permanece intacto. As fraturas neste grupo são geralmente instáveis, dependendo do tamanho dos fragmentos mediais. O subgrupo das fraturas grupo 2 define o número e a geometria dos fragmentos. As do grupo A3 são aquelas com ambos os córtices medial e lateral fraturados; os subgrupos descrevem a direção e a cominuição da fratura (MÜLLER et al.7 apud BAUMGAERTNER et al., 2000). Figura 09 - Classificação do grupo AO das fraturas intertrocanterianas do fêmur. Fonte: <http://www.fbpfisioterapia.hpg.ig.com.br/fratura_trans%201.htm>. 7 MÜLLER, M. E.; NAZARIAN, S.; KOCH, P; et al. The Comprehensive Classification of Fractures of the Long Bones. New York, Springer-Verlag, 1990, p. 118. 2.3.2 MECANISMOS DE LESÃO Uma pequena porcentagem das fraturas intertrocanterianas ocorrem com traumatismos de alta energia. A maioria resulta de uma queda simples. O paciente descreve trauma no trocânter maior ou uma atividade de torção imediatamente seguida por uma queda, e a maior parte das fraturas ocorre em casa (BAUMGAERTNER et al., 2000). 2.3.3 INCIDÊNCIA Quase 9 de cada 10 destas fraturas ocorrem em pacientes acima de 65 anos, e aproximadamente 3 de 4 fraturas ocorrem em mulheres. Esta incidência está aumentando paralelamente à longevidade aumentada da população (BAUMGAERTNER et al., 2000). Estima-se que um terço de todas as mulheres e um sexto de todos os homens que atingirem a idade de 90 anos terão sofrido pelo menos uma fratura de quadril. Aproximadamente metade são fraturas intertrocanterianas (CUMMINGS et al.8 apud BAUMGAERTNER et al., 2000). As fraturas intertrocanterianas ocorrem em uma população mais idosa que as fraturas de colo de fêmur. As pessoas desta faixa de idade são seriamente afetadas por osteoporose e condições clínicas em geral, e mais freqüentemente apresentam padrões cominutivos ou instáveis (BAUMGAERTNER et al., 2000). 2.3.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS Após a queda o paciente é incapaz de se levantar ou levantar apenas a perna. O membro inferior fica encurtado e mais em rotação externa que nas fraturas do colo femoral, pelo fato de a fratura ser extracapsular (APLEY e SOLOMON, 2002).8 CUMMINGS, S. R.; KELSEY, J. L.; NEVITT, M. C.; et al. Epidemiology of osteoporosis and osteoporotic fractures. Epidemiol Rev 7:178-208, 1985. 2.3.5 LESÕES ASSOCIADAS Embora a maioria dos pacientes idosos com fraturas intertrocanterianas do fêmur não sofram outras lesões, 7 a 15% têm fraturas associadas. Os ossos comumente afetados incluem os mais susceptíveis a osteopenia: rádio distal, úmero proximal, costelas, púbis e coluna vertebral. As fraturas da diáfise femoral ipsilateral do joelho ou tornozelo também podem ocorrer concomitantemente com a fratura do quadril (BAUMGAERTNER et al., 2000). 2.3.6 COMPLICAÇÕES A taxa de mortalidade é mais alta que em pacientes com fraturas de colo femoral (BAUMGAERTNER et al., 2000). É importante determinar o nível de função do paciente antes da ocorrência da fratura. Nas melhores circunstâncias, este nível é o máximo que o paciente pode esperar obter com a recuperação. Após a recuperação da fratura, o estado deambulativo é deteriorado em algum grau. Um deambulador na comunidade pode ficar limitado a deambulação domiciliar (BAUMGAERTNER et al., 2000). 2.4 FRATURAS SUBTROCANTERIANAS DO FÊMUR As fraturas subtrocanterianas são aquelas que ocorrem entre o trocânter menor e o istmo da diáfise do fêmur (RUSSELL e TAYLOR, 2000). 2.4.1 CLASSIFICAÇÃO Russel e Taylor (2000) propuseram uma classificação baseada principalmente na sua orientação no sentido da fixação interna que possibilita melhor construção biomecânica com o menor dano vascular à fratura. As fraturas subtrocanterianas são divididas em dois grupos, cada um dos quais tem dois subgrupos (Fig. 10). As fraturas do grupo I não comprometem a fossa piriforme, de modo que as técnicas de fixação intramedular são relativamente diretas. Nas de tipo IA, a cominuição e as linhas de fratura estendem-se desde abaixo do trocânter menor ao istmo femoral; qualquer grau de cominuição pode estar envolvido nesta área, inclusive cominuição bicortical. As do tipo IB possuem linhas de fratura e cominuição comprometendo a área do trocânter menor até o istmo. As fraturas do grupo II estendem-se proximalmente para dentro do trocânter maior e comprometem o local de entrada na fossa piriforme. Esse comprometimento do trocânter maior dificulta as técnicas de fixação fechada. As do tipo IIA estendem-se desde o trocânter menor ao istmo com extensão para dentro da fossa piriforme, mas cominuição importante ou grande fratura do trocânter menor não estão presente. Em uma fratura tipo IIB, há extensão para dentro da área do trocânter maior com cominuição importante do córtex femoral medial e perda de continuidade do trocânter menor. Figura 10 - Classificação de Russell-Taylor das fraturas subtrocanterianas. Fonte: <http://www.ortosite.hpg.ig.com.br/clasfraturas_10.html>. 2.4.2 MECANISMOS DE LESÃO Em paciente jovens, a fratura é causada por trauma de alta energia. Estas fraturas são associadas com cominuição em grandes áreas do fêmur proximal, e são causadas ou por forças laterais diretas na coxa proximal ou por falha sob carregamento axial na região subtrocanteriana; ainda pode ocorrer por trauma penetrante (projétil de arma de fogo). No grupo etário mais velho, as fraturas ocorrem com trauma de baixa energia, como uma queda simples, freqüentemente ocorrem em osso osteopênico com canal medular alargado e córtices mais finos (RUSSELL e TAYLOR, 2000). 2.4.3 INCIDÊNCIA Russel e Taylor (2000) relatam que as fraturas subtrocanterianas são aproximadamente 10 a 34% de todas as fraturas de quadril. Em uma revisão de 300 fraturas de quadril, foram classificadas como subtrocanterianas 26,7% dos casos (BOYD e GRIFFIN9 apud RUSSELL e TAYLOR, 2000). Durante um estudo de fraturas subtrocanterianas, foi constatado que 63% destas ocorreram em pacientes com mais de 51 anos e 24% em pacientes entre 17 e 50 anos (VELASCO e COMFORT10 apud RUSSELL e TAYLOR, 2000). A idade média de 40,6 anos foi observada em pacientes com fratura subtrocanteriana com mecanismo de lesão de alta energia, enquanto no mecanismo de baixa energia a idade foi de 76,2 anos (BERGAM et al., 1987). 2.4.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS Uma fratura subtrocanteriana resulta em encurtamento da extremidade afetada e posicionamento em varo da cabeça e colo do fêmur, efetivamente criando um grupo muscular abdutor funcionalmente enfraquecido. Se não for corrigida, esta deformidade causa uma claudicação importante por causa do comprimento funcional encurtado dos músculos abdutores (RUSSELL e TAYLOR, 2000). A cabeça e o colo femoral são abduzidos pelos músculos glúteos e fletidos pelo psoas deixando o membro inferior em rotação externa (APLEY e SOLOMON, 2002). 2.4.5 LESÕES ASSOCIADAS 9 BOYD, H. B.; GRIFFIN, L. L. Classification and tratament of trochanteric fractures. Arch Serg 58:853-866, 1949. 10 VELASCO, R. U.; COMFORT, T. Analysis of treatment problems in subtrochanteric fractures of the femur. J Trauma 18:513-522, 1978. Em traumas de baixa energia as lesões associadas mais comuns são as contusões e escoriações, mas lesão craniana ou vertebral podem acontecer. Quando o trauma é causado por alta energia o paciente é considerado politraumatizado (RUSSELL e TAYLOR, 2000). Em um estudo com 130 pacientes, 27 apresentavam lesões associadas de crânio, tórax e abdome. Ocorreu uma alta incidência de fraturas patelares e tibiais ipsilaterais associadas com fraturas subtrocanterianas, comprometendo futuramente a flexão do joelho e a movimentação do tornozelo, que juntamente com a perda da função do quadril limitam a capacidade funcional do paciente (WADELL, 197911 apud RUSSELL e TAYLOR, 2000). 2.4.6 COMPLICAÇÕES Russel e Taylor (2000) relatam que o decúbito prolongado durante a recuperação pode levar à formação de úlceras de pressão e redução da capacidade funcional. 2.5 FRATURAS DA DIÁFISE DO FÊMUR As fraturas da diáfise do fêmur ocorrem proximalmente desde o nível do trocânter menor até a dilatação dos côndilos, distalmente (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). 2.5.1 CLASSIFICAÇÃO Estas fraturas podem ser bem definidas pela localização: terço proximal, médio ou distal e pela descrição da fratura baseando-se no seu aspecto radiográfico (transversa, oblíqua curta, oblíqua longa, fragmento borboleta, cominutiva ou segmentar). Essa descrição, juntamente com informação sobre a gravidade da ferida e a cominuição da fratura, fornece os dados essenciais à compreensão de quase todas as fraturas da diáfise do fêmur (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). 11 WADELL, J. P. Subtrochanteric fractures of the femur: A review of 130 patients. J Trauma 19:585-592, 1979. A classificação do grupo AO é bastante adequada porque tem fortes implicações prognósticas e é de fácil memorização (Fig. 11). Nessa classificação, as fraturas do grupo A são as simples, cujo traço é único. Os tipos de traço são: espiróide no subgrupo A1, oblíquo no A2 e transverso no A3, obedecendo à tendência de piora do prognóstico segundo esses traços. No grupo B estão as fraturas com cunha. No subgrupo B1 estão as fraturas com cunha giratória, gerada por mecanismo torsional; no B2 as com cunha de flexão ou de vergamento; no B3, as com cunha fragmentada.No grupo C estão as fraturas complexas. No subgrupo C1 estão as cominutivas por mecanismo torsional; no C2, as segmentares; no C3, as cominutivas não-espiróides (MÜLLER et al.12 apud PACOLA, 2003). Figura 11 - Classificação do grupo AO das fraturas da diáfise femoral. Fonte WOLINSKY, P. R.; JOHNSON, K. D. Fraturas da Diáfise do Fêmur. In: BROWNER, B. D.; JUPITER, J. B.; LEVINE, A. M.; TRAFTON, P. G. Traumatismos do Sistema Musculoesquelético. São Paulo: Manole, 2000, v. II, p. 1939. 2.5.2 MECANISMOS DE LESÃO As fraturas da diáfise femoral são usualmente o resultado de grande trauma, como os acidentes de automóveis, motocicletas ou ferimentos a tiro. A direção e a quantidade de força absorvida influenciam nos padrões da fratura, podendo ser uma força direta aplicada perpendicularmente ao eixo do osso ou uma força aplicada ao fêmur em direção axial. No 12 MÜLLER, M. E.; NAZARIAN, S.; KOCH, P. Classification AO des fractures -1: Les os longs. Berlin: Springer Verlag, Heidelberg, 1987. idoso a fratura resulta de trauma de baixa a moderada energia, como o resultado de uma força rotacional (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). 2.5.3 INCIDÊNCIA As fraturas da diáfise do fêmur são mais comuns em pacientes com menos de 25 anos e com mais de 65 anos, com uma incidência de 3 fraturas por 10.000 pessoas (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). Moran et al. (1990) relatam que existe uma incidência crescente de fraturas da diáfise do fêmur no idoso, enquanto Moraes (2001) afirma que atletas que praticam balett, corridas de longa distância, marcha atlética ou ginástica podem apresentar fratura por estresse da diáfise do fêmur. 2.5.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS O membro está encurtado, deformado e instável (PACOLA, 2003; WOLINSKY e JOHNSON, 2000). O paciente é incapaz de mover o seu quadril, joelho ou o segmento perna por causa da dor com qualquer movimento que ele tente (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). 2.5.5 LESÕES ASSOCIADAS As lesões de nervos periféricos associados com uma fratura da diáfise femoral são raras. O nervo ciático é bem protegido por músculos entre ele e o fêmur, exigindo um desvio externo da fratura ou lesão por trauma penetrante. As lesões vasculares também são incomuns, mas trauma fechado que causa fratura do quarto distal da diáfise femoral pode lacerar a artéria femoral ao nível do canal adutor (WOLINSKY e JOHNSON, 2000). Diversas lesões musculoesqueléticas estão associadas com fraturas da diáfise do fêmur, como a fratura do colo do fêmur, fratura intertrocanteriana ou luxação do quadril (WOLINSKY e JOHNSON, 2000), e a patela pode apresentar lesão óssea ou condral (PACOLA, 2003). Lesões de joelho podem estar associadas com fratura diafisária femoral em 14 a 55% dos casos (VANGNESS et al., 1993). Ligamentos e meniscos do joelho estão comprometidos em cerca de 23 a 50% das fraturas, e são examinados após a estabilização da fratura (PACOLA, 2003). Muitos pacientes apresentam um derrame ipsilateral, o qual é sugestivo de uma lesão ligamentar importante do joelho (DECAMPOS et al., 1994). Um exame artroscópico do joelho realizado em pacientes com fratura da diáfise do fêmur revelou uma ruptura meniscal em 13 de 47 pacientes (VANGNESS et al., 1993). Um segundo estudo de 40 pacientes encontrou lesões importantes em 55% dos joelhos. Quarenta e oito por cento tinham uma ruptura parcial e 5% uma ruptura completa de ligamento cruzado anterior; 5% tinham uma ruptura parcial e 2,5% uma ruptura completa de ligamento cruzado posterior; e 20% tinham uma lesão de menisco lateral (DECAMPOS et al., 1994). Fraturas ipsilaterais da tíbia ocorrem ocasionalmente em conjunção com fratura da diáfise femoral. Este padrão de lesão é chamado joelho flutuante e é visto em pacientes politraumatizados (JOHNSON et al., 1985). As fraturas abertas são vistas regularmente. Em um estudo, estas representaram 16,5% das 520 fraturas diafisárias femorais tratadas (WINQUIST et al.13 apud WOLINSKY e JOHNSON, 2000). Embora as fraturas femorais abertas possam ter pequenas lacerações cutâneas, a lesão dos tecidos moles profundos pode ser importante (LHOWE e HANSEN, 1988). 2.6 FRATURAS DISTAIS DO FÊMUR Estas fraturas abrangem o terço inferior deste osso, que inclui as áreas supracondiliana ou metafisária, e intracondiliana ou epifisária (HELFET e LORICH, 2000). 2.6.1 CLASSIFICAÇÃO A classificação proposta pelo grupo AO separa as fraturas em três grupos principais (Fig. 12): tipo A (extra-articulares), tipo B (unicondilianas) e tipo C ( bicondilianas). Os três grupos são divididos em subgrupos. As fraturas tipo A são divididas em fraturas supracondilianas simples com duas partes (tipo A1); fraturas em cunha metafisária (tipo A2); fratura supracondiliana cominutivas (tipo A3). As do tipo B são divididas em fraturas sagitais 13 WINQUIST, R. A.; HANSEN, S. T., JR.; CLAWSON, D. K. Closed intramedullary nailing of femoral fractures: A report of five hundred and twenty cases. J Bone Joint Surg 66A:529-539, 1984. do côndilo lateral (tipo B1); fraturas sagitais do côndilo medial (tipo B2); e as fraturas coronais (tipo B3). As do tipo C são divididas em fraturas supracondilianas não cominutivas, em T ou Y, (tipo C1); fraturas cominutivas supracondilianas (tipo C2); e fraturas cominutivas supracondilianas ou intercondilianas (tipo C3). Ao progredir de A para C, e de 1 para 3, a gravidade aumenta e o prognóstico de um bom resultado diminui (MÜLLER et al.14 apud HELFET e LORICH, 2000). 2.6.2 MECANISMOS DE LESÃO Não existe um mecanismo de trauma único para explicar as fraturas de fêmur distal. Existe uma concordância com que a patela exerce um fator de primordial importância na gênese da fratura do fêmur distal e ocorre uma associação de mecanismos de traumas (FALAVINHA, 2003). Nos pacientes mais velhos as lesões ocorrem após trauma moderado, como uma queda sobre o joelho fletido. Nos pacientes mais jovens estas fraturas ocorrem após trauma de alta energia, com aplicação direta de carga ao joelho fletido. A maioria é causada por acidentes de veículos, acidentes industriais e quedas de altura (HELFET e LORICH, 2000). A fratura supracondilar é produzida por um trauma em hiperextensão, forçando o osso em flexão no plano sagital. A base da patela pressionada sobre a região metafisária pode agir como um fulcro, ajudando a produzir a fratura. Com esse mecanismo de trauma indireto, a fratura é extra-articular. O mecanismo de trauma, da fratura unicondilar que ocorre no plano frontal, é o mesmo que pode produzir as fraturas no plano tibial. O trauma indireto forçando o joelho em varo ou valgo força o fêmur distal contra o planalto tibial. Por este ser mais resistente, ocorre a fratura do côndilo femoral que está em contato com o mesmo. A fratura unicondilar que ocorre no plano sagital lesa a parte posterior do côndilo femoral. Nessa fratura também existe um mecanismo em valgo ou varo, mas, com um grau de flexão do joelho, isso concentra o choque entre o planalto tibial e a parte posterior do côndilo femoral lateral ou medial. As fraturas supra e intercondilar ocorrem por um trauma direto contra o joelho em flexão. Nessa posição a patela está apoiada sobre o fêmur distal e age como um fulcro entre os dois côndilos, forçando a separação deles (FALAVINHA, 2003). 14 MÜLLER, M. E.; NAZARIAN, S.; KOCH, P. Classification AO des Fractures. NewYork, Springer- Verlag, 1987. Figura 12 - Classificação do grupo AO das fraturas distais do fêmur. Fonte: HELFET, D. L.; LORICH, D. G. Fraturas do Fêmur Distal. In: BROWNER, B. D.; JUPITER, J. B.; LEVINE, A. M.; TRAFTON, P. G. Traumatismos do Sistema Musculoesquelético. São Paulo: Manole, 2000, v. II, p. 2038. 2.6.3 INCIDÊNCIA As fraturas de fêmur distal responsabilizam-se por entre 4 a 7% de todas as fraturas femorais (FALAVINHA, 2003; HELFET e LORICH, 2000). As fraturas do fêmur distal ocorrem predominantemente em duas populações de pacientes: pessoas jovens, especialmente homens, após trauma de alta energia; e pessoas idosas, especialmente mulheres idosas, após lesões de baixa energia (HELFET e LORICH, 2000). Oitenta e quatro por cento das fraturas do fêmur distal ocorrem em pacientes acima de 50 anos (KOLMERT e WULFF15 apud HELFET e LORICH, 2000). A incidência de fratura femorais distais aumentam espontaneamente com a idade e são maiores em mulheres idosas do que em homens (ARNESON et al., 1988). 2.6.4 CONSEQÜÊNCIAS ANATÔMICAS E FUNCIONAIS As fraturas supracondilianas caracteristicamente deformam-se com encurtamento femoral, angulação posterior e desvio do fragmento distal. Nas fraturas mais graves, com comprometimento intercondiliano pode ocorrer desalinhamento rotacional dos côndilos, um em relação ao outro no plano frontal, como resultado de suas inserções musculares (HELFET e LORICH, 2000). 2.6.5 LESÕES ASSOCIADAS A posição da perna no momento do trauma determina a presença e o tipo de lesão. Podem ocorre concomitantemente fraturas acetabulares, luxações de quadril, fraturas de colo femoral e fraturas associadas da diáfise femoral. Além disso, lesões dos tecidos moles do joelho podem estar presentes (HELFET e LORICH, 2000). Fraturas complexas podem romper a cápsula articular e permitir o extravasamento do líquido sinovial para os tecidos vizinhos (FALAVINHA, 2003). Rupturas ligamentares estão presentes em 20% destas fraturas. E são difíceis de diagnosticar até que o fêmur tenha sido estabilizado (WALLING et al.16 apud HELFET e LORICH, 2000). 15 KOLMERT, L.; WULFF, K. Epidemiology and tratment of distal femoral fractures in adults. Acta Orthop Scand 53:957-963, 1982. 16 WALLING, A. K.; SERADGE, H.; SPIEGEL, P. G. Injures to the knee ligaments with fractures of the femur. J Bone Joint Surg 64A:1324-1327, 1982. Com rupturas associadas de ligamentos do joelho, especialmente na luxação posterior, a artéria poplítea está lesionada em 40% destas fraturas (SISTO e WARREN, 1985). As fraturas do platô tibial ocorrem após força em varo ou valgo, e fraturas da diáfise tibial também podem ocorrer. Em lesões de alta energia ou abertas do fêmur distal a artéria femoral pode estar lesada (HELFET e LORICH, 2000). 2.6.6 COMPLICAÇÕES Pode ocorrer rigidez articular, retroversão do fragmento distal do fêmur produzida pela musculatura, pseudo-artrose, consolidação viciosa e osteoartrose precoce (FALAVINHA, 2003). 3 QUEDAS EM IDOSOS 3.1 IDOSOS Young e Ahmad (1999) classificam os idosos de acordo com a idade: idosos jovens são indivíduos entre 65 e 74 anos de idade; os meio-idosos, entre 75 e 84; e os idoso velhos com mais de 85 anos. Santana et al. (2002) relatam que o CENSO 2000, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresenta atualmente uma população brasileira de idosos de 8,6%, considerando as pessoas com mais de 60 anos, o que representa aproximadamente 14,5 milhões de pessoas. Em relação ao ano de 1991 houve um crescimento de 35,5%. O aumento da proporção de idosos na população brasileira traz à tona a discussão a respeito de eventos incapacitantes nessa faixa etária, dos quais destaca-se a ocorrência de quedas (PERRACINI e RAMOS, 2002). Kannus et al. (2001) relatam que a população idosa atualmente apresenta uma saúde diminuída e uma menor capacidade funcional que no passado. 3.2 QUEDAS Queda é um evento em que a pessoa vai involuntariamente repousar no chão ou solo (JENSEN et al., 2002). Nyberg e Gustafson (1997) descrevem a queda como um incidente em que o sujeito, obrigado por uma inesperada diminuição do equilíbrio, vai repousar no chão. 3.2.1 CLASSIFICAÇÃO Kannus et al. (2002) classificam a queda ao solo como um trauma leve-moderado, quando ocorre da posição em pé ou de uma altura menor que esta posição. Salminen et al. (2000) classificam a queda ao solo da posição em pé e queda de altura menor que 1 metro como trauma de baixa energia; enquanto quedas de altura maior que 1 metro, acidente automobilístico e lesões por armas de fogo são traumas de alta energia. 3.2.2 CONTROLE POSTURAL E QUEDAS Para se obter equilíbrio postural, é necessário que o centro de massa (CdM) esteja posicionado sobre a base de sustentação (BdS). O CdM está localizado anteriormente à segunda vértebra sacral, sobre a BdS ou seu limite de estabilidade, que representa a área circunvizinha ou contida entre os pés na posição ereta, representando em torno de 5 a 10 cm. Embora a rigidez muscular passiva seja suficiente para manter uma postura ereta estável sob condições estáticas, na realidade se torna necessário uma ativação muscular coordenada para manter o corpo ereto nas atividades de vida diária (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). O controle da postura e do equilíbrio pode ser definido como o processo pelo qual o sistema nervoso central (SNC) gera os padrões de atividade muscular necessários para regular a relação entre o CdM e a BdS. Essa atividade é um processo complexo que envolve os esforços coordenados de mecanismos aferentes e mecanismos eferentes (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.2.1 Mecanismos Aferentes Os sistemas visual, vestibular e proprioceptivo estão envolvidos no envio de informações para o sistema de controle postural ou de equilíbrio (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). A visão é o sistema mais importante de informações sensoriais e pode compensar pela ausência ou não-confiabilidade dos outros estímulos sensoriais. Os sistema visual fornece informações sobre a localização e distância de objetos no ambiente, o tipo de superfície onde se dará o movimento e a posição das partes corporais uma em relação a outra e ao ambiente (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Os sistemas proprioceptivos, emergente dos receptores tendinosos e musculares, mecanoceptores articulares e baroceptores profundos também fornecem informação sensorial para o controle postural. Os proprioceptores suprem o corpo com informações sobre o ambiente imediato, permitindo o organismo se orientar à medida que ele movimente ou se mantenha ereto em relação às próprias partes do corpo, seu apoio e superfície (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). O sistema vestibular funciona em concomitância com os outros dois anteriores para manutenção postural. Ele consiste de 3 partes: um componente sensorial, um processador central e um componente de controle motor. O sensorial está localizado no ouvido interno; compõe-se dos canais semicirculares, do utrículo e sáculo; detecta os movimentos cefálicos e sua orientação no espaço. Liga-se ao processador central pelo oitavo par craniano, e está localizado na ponte e cerebelo. Recebe e integra os sinais, e após combiná-los com informações visuais e proprioceptivas, envia a informação ao componente motor. Em resposta iniciam-se dois reflexos: o reflexo vestíbulo-ocular (RVO) e o vestíbulo-espinhal (RVE). ORVO controla a estabilidade ocular, para manutenção do olhar fixo no campo visual, e a orientação da cabeça à medida que ela se movimenta. Sem este reflexo as imagens visuais iriam mudar a cada movimento cefálico. O RVE influencia os músculos esqueléticos, gerando movimentos compensatórios do corpo que mantém o controle postural. O sistema vestibular também auxilia na resolução de informações conflitantes, quando as informações visuais e proprioceptivas fornecem estímulos imprecisos, como no caso de um campo visual em movimento (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.2.2 Mecanismos Centrais O SNC exerce um papel importante na manutenção do equilíbrio. Ele avalia e integra a informação sensorial proveniente dos estímulos visual, proprioceptivo e vestibular indicando instabilidade e, como resposta, seleciona a estratégia de correção postural mais apropriada em situações inesperadas ou antecipadas de perda de equilíbrio (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.2.3 Mecanismos Eferentes Quando o equilíbrio se altera, três estratégias de correção podem ser utilizadas para restabelecer a estabilidade. A primeira, denominada estratégia do calcanhar, é utilizada como resposta a um distúrbio pequeno e lento da BdS e realizada mantendo os pés no local de origem. Caracteriza-se por um processo contínuo de movimentos ou balanços na articulação do tornozelo. Esses movimentos procuram alongar ou ativar os músculos do tornozelo e realinhar a BdS e o CdM (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). A segunda estratégia reposiciona o CdM ao fletir ou estender as articulações coxofemorais. Essa técnica é utilizada para reagir a distúrbios mais importantes da BdS, quando esta é reduzida (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). A terceira forma de reação muscular é o sobrepasso, utilizado quando o CdM é deslocado além dos limites da BdS. O sobrepasso realinha o CdM à BdS quando as duas estratégias anteriores não funcionam (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.3 INCIDÊNCIA Aproximadamente um terço das pessoas com mais de 65 anos que moram em comunidades e mais da metade que moram em instituições caem todos os anos, mas apenas 5% resultam em fratura (KANNUS et al., 1999b). Trinta por cento dos idosos em países ocidentais sofrem queda ao menos uma vez ao ano, e destes aproximadamente metade sofrem duas ou mais quedas. A freqüência é menor em países orientais, onde cerca de 15% dos idosos caem uma vez ao ano e apenas 7,2% caem de forma recorrente (PERRACINI e RAMOS, 2002). Perracini e Ramos (2002) relatam que em seus estudos encontraram 30,9% de idosos que afirmam ter caído, e destes 10,8% relatam duas ou mais quedas. Oliver et al. (2000) encontraram, em sua revisão sistemática, a incidência de quedas de pacientes idosos em hospitais de 4 a 12 quedas por 1000 leitos, isto é, entre 3 a 10 quedas por mês. 3.2.4 COMPLICAÇÕES As quedas têm severas conseqüências: 5 a 10% das quedas resultam em fraturas (KANNUS et al., 2000a; RANDELL et al., 2001; PERRACINI e RAMOS, 2002). Nos Estados Unidos, as quedas representam a maior incidência de lesões em idosos, e a segunda causa de morte por lesões não intencionais. As fraturas representam a maior incidência de lesão após a queda (KANNUS et al., 1999b). Young e Ahmad (1999) relatam que na Austrália a nona causa de morte, em pessoas com mais de 75 anos, são as quedas acidentais. As quedas em idosos têm como conseqüências, além de possíveis fratura e risco de morte, o medo de cair, a restrição de atividades, o declínio na saúde e o aumento do risco de institucionalização (PAIXÃO e HECKMANN, 2002; PERRACINI e RAMOS, 2002). A restrição das atividades físicas é devida a dores persistentes ou incapacitantes por lesões associadas ou por aconselhamento de profissionais da saúde (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). As pessoas que caíram experimentam o medo de novas quedas. A perda de confiança pode resultar em restrição de atividades e transferência para um ambiente mais limitado. As quedas produzem sintomas de ansiedade e depressão, pelos prejuízos impostos pelas limitações funcionais geradas. Estas pessoas podem apresentar ptofobia, que é caracterizada pela fobia de quedas em idosos (PAIXÃO e HECKMANN, 2002; RUBENSTEIN et al., 2001). Cinqüenta por cento dos idosos que caem não conseguem levantar-se sozinhos. (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Segundo Carvalho e Coutinho (2002), as quedas, além de produzirem considerável perda de autonomia e qualidade de vida entre os idosos, podem também repercutir entre seus cuidadores, principalmente familiares, que devem se mobilizar em torno de cuidados especiais, adaptando toda sua rotina de recuperação ou adaptação do idoso após a queda As quedas geram não apenas prejuízos físico e psicológico, mas também aumento dos custos com cuidados de saúde, expressos pela utilização de vários serviços especializados e aumento das hospitalizações (JENSEN et al., 2002; KANNUS et al., 1999b; KANNUS et al., 2002; PERRACINI e RAMOS, 2002; COUTINHO e SILVA, 2002). 3.2.5 FATORES QUE INFLUENCIAM A QUEDA NOS IDOSOS Tinetti (2003) encontrou, em seu estudo coorte, que 8% dos idosos não apresentavam fatores de risco para quedas, mas 78% apresentavam quatro ou mais fatores de risco. Rubenstein et al. (2001) relatam que 65 a 100% dos idosos com três ou mais fatores de risco referem uma queda no período de 12 meses. 3.2.5.1 Envelhecimento Com o envelhecimento muitas funções fisiológicas diminuem gradualmente. Muito deste decréscimo pode estar relacionado ao descondicionamento ou desuso (Gráfico 01). Entretanto, através do treinamento apropriado a curva pode se redirecionar para cima, isto é, melhorar a função (HONG e TOBIS, 1994). O SNC pode sofrer com o envelhecimento, ocorrendo perda neuronal, perda dendrítica e ramificações reduzidas, metabolismo cerebral diminuído, perfusão cerebral reduzida e metabolismo alterado dos neurotransmissores. Além disso, também ocorre uma lentificação geral no processamento de informações, em sincronia com a diminuição na velocidade de condução nervosa relacionada à idade (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 1 10Idade (por década) % d a fu nç ão Gráfico 01 - Deterioração da função geral em sujeitos idosos (curva inferior) e a influência do treinamento (curva superior). Fonte: HONG, C. Z.; TOBIS, J. S. Reabilitação Fisiátrica e Cuidado do Paciente Geriátrico. In: KOTTKE, F. J.; LEHMANN, J. F. Tratado de Medicina Física e Reabilitação de Krusen. São Paulo: Manole, 1994, 4ª ed., v. II, p. 1201. 3.2.5.2 Alterações Neurológicas A epilepsia aumenta a prevalência com a idade e se associa à perda da consciência, e os pacientes demenciados apresentam distúrbios cognitivos que impedem o reconhecimento do ambiente, distúrbios da marcha e déficit no controle postural, ambos fatores aumentam os risco de quedas (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Remnemark et al. (2000) relatam que a doença de Alzheimer tem se mostrado como um acréscimo no risco de quedas. A doença de Parkinson está relacionada como um acréscimo no risco de quedas que resultam em fraturas (HERNDON et al., 1997), pelo distúrbio da marcha, postura e equilíbrio (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Setenta e três por cento dos pacientes que tiveram um acidente vascular encefálico, relatam um episódio de queda nos 6 meses subsequentes. Os dois maiores fatores que determinam se ocorrerá uma fratura nestes pacientes hemiplégicos são: densidade óssea do fêmur e habilidade do membro superior contralateral em amortecer a queda (POOLE et al., 2002). Estes acidentes vasculares levam a um déficit cognitivo, distúrbios posturais e da marcha(PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Déficits sensoriais múltiplos, como a diminuição da sensibilidade cutânea, pela redução na densidade e na sensibilidade dos mecanoceptores da derme; e neuropatias periféricas sensitivas podem contribuir para quedas por distúrbios na informação sensorial postural e por exigirem um trabalho maior de recursos do SNC como o sistema atencional, em uma tentativa de compensação destes distúrbios, dificultando o caminhar e conversar concomitantemente (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.5.3 Sistema Vestibular Segundo Paixão e Heckmann (2002), o sistema vestibular apresenta, com o envelhecimento, uma perda rápida das células ciliares dos canais semicirculares, bem como das células ganglionares vestibulares e fibras nervosas. Há também alterações no RVO coerentes com essas modificações anatômicas. 3.2.5.4 Cognição e Memória Os déficits cognitivos levam ao comprometimento da atenção e da memória, em especial a memória recente ou de aquisição. Isso pode dificultar, por exemplo, a adaptação do idoso a ambientes novos. A simples mudança de um móvel, o acréscimo de um degrau ou até a mudança para outra casa pode significar aumento do risco de quedas, devido à dificuldade de memorização de informações novas para esse grupo, e com repostas protetoras também comprometidas (CARVALHO e COUTINHO, 2002). 3.2.5.5 Sistema Visual A percepção subjetiva da visão mostra-se o mais forte e independente fator preditivo de quedas e sua recidiva. A limitação visual sobre o desempenho do idoso no cotidiano é mais importante que a presença de doenças relacionadas ao sistema visual, como a catarata. Idosos com anormalidade no campo visual tem 1,5 vezes mais chances de experimentar quedas recorrentes do que idosos sem anormalidades no campo visual (IVERS et al., 2000). Para Paixão e Heckmann (2002), as alterações visuais relacionadas com quedas incluem acuidade, sensibilidade ao contraste e percepção de profundidades reduzidas e menor adaptação ao escuro. 3.2.5.6 Sistema Muscular A fraqueza nos músculos posturais (NYBERG E GUSTAFSON, 1997) e presença de miopatias periféricas que afetam principalmente os membros inferiores aumentam o risco para quedas (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Existe uma redução da força muscular, associada à diminuição no tamanho e número das fibras musculares e na quantidade de motoneurônios, lentidão na contração dos músculos e uma maior rigidez do sistema motor nos idosos. Fatores que diminuem a ação antigravitacional, aumentando as quedas (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). Simpson (2000) cita que um fator de importância crítica é a fraqueza dos músculos responsáveis pela flexão dorsal do tornozelo. Lamb et al. (2003) referem que os idosos que apresentam fraqueza muscular nas mãos e no quadríceps apresentam um aumento na incidência de quedas. 3.2.5.7 Estado Funcional Um idoso aumenta a chance de sofrer uma queda quando ele apresenta certos sinais, como diminuir a velocidade da marcha enquanto carrega um copo d’água ou parar de caminhar enquanto conversa com a pessoa que o acompanha (JENSEN et al., 2002). O aumento na dependência para atividades diárias (como banho, vestir-se, ir ao banheiro, transferências e alimentação) aumenta o risco para quedas (HERNDON et al., 1997). A dificuldade na realização de atividades físicas e do dia-a-dia tem um efeito cumulativo de prejuízos funcionais, que aumenta o risco de quedas e sua recidiva em idosos. Quando há comprometimento, as atividades físicas significam prejuízos no equilíbrio, limitação da força muscular, da mobilidade e da marcha. Idosos com baixa autoconfiança em realizar atividades do dia-a-dia, pelo medo de cair, tendem a ter um comprometimento progressivo das atividades funcionais (PERRACINI e RAMOS, 2002). 3.2.5.8 Alterações Cardíacas As arritmias cardíacas estão associadas a aumento de risco de queda, lesões e fraturas, mas sem relação entre a causa e o efeito (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). A insuficiência cardíaca congestiva leva a uma redução da perfusão cerebral levando à perda de consciência e quedas (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.5.9 Estado de Saúde A presença de anemia, infecções, dor e depressão aumenta o risco de queda em pacientes idosos (JENSEN et al., 2002). Lamb et al. (2003) acrescentam a osteoporose, artrite reumatóide, doenças pulmonares, doenças arteriais periféricas, câncer e diabete como fatores que aumentam a probabilidade de queda. Baixa massa corporal, enfisema pulmonar, asma e bronquite crônica predispõem as quedas nos idosos (HERNDON et al., 1997). As patologias pulmonares também levam a uma redução da perfusão cerebral levando às perda de consciência e quedas (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). A estenose cervical pode diminuir o estímulo proprioceptivo dos mecanoceptores da medula espinhal podendo provocar vertigens leves e desequilíbrios em pacientes idosos. Também pode estar associada a espasticidade dos membros inferiores (PAIXÃO e HECKMANN, 2002). 3.2.5.10 Osteoartrose Arden et al. (1999) dizem que a osteoartrose (OA) tem sido associada como um fator no risco de queda, pela fraqueza do músculo quadríceps e o aumento na oscilação postural. Em seu estudo observaram que pacientes que relatam ter OA apresentam um aumento em 40% no risco de quedas recorrentes, mas as mulheres que apresentam sinais radiológicos de OA do quadril tem 30 a 40% de redução no risco de quedas recorrentes. A associação de relatos de OA e de sinais radiológicos de OA do quadril com quedas são independentes uma da outra. A presença de sinais radiológicos de OA severa reduz o risco de fraturas do colo do fêmur, fato que pode estar associado ao aumento da massa óssea em 10% no colo do fêmur. O aumento do risco de queda em pacientes com OA é compensado pelo aumento da massa óssea. Em caso de fratura este aumento de massa óssea protege o colo do fêmur contra fraturas, mas não a região intertrocanteriana (WANDS et al., 1992). 3.2.5.11 Atividades de Lazer Perracini e Ramos (2002) relatam que os idosos que não apresentam como atividade de lazer a leitura tem maior chance de experimentar quedas recorrentes. A leitura envolve algumas habilidades cognitivas específicas, como atenção e concentração, sendo estas importantes para a manutenção do equilíbrio. Os idosos com risco aumentado de perda de equilíbrio e queda podem não ter condições de alocar recursos cognitivos relacionados à atenção suficiente para controle postural. 3.2.5.12 Reposição Hormonal Randell et al. (2001) relatam que em mulheres que não fazem a reposição hormonal quando comparadas às que fazem o uso contínuo, a incidência de quedas diminui de 31,1% para 29,1%. Nas mulheres que a fizeram no passado, mas não continuam, não apresentam decréscimo no risco de queda. O estrógeno aumenta a velocidade de processamento central, melhorando a estabilidade postural. A baixa concentração de estrógeno diminui a força muscular, refletindo diretamente no equilíbrio. 3.2.5.13 Medicamentos Benzodiazepínicos, antidepressivos, neurolépticos, drogas para glaucoma, diuréticos e dopamina aumentam o risco de quedas, principalmente quando as doses estão incorretas (JENSEN et al., 2002). Lamb et al. (2003) acrescentam os medicamentos psicotrópicos, e Nyberg e Gustafson (1997), sedativos como influentes no risco de quedas. O aumento do risco e fraturas entre os usuários de benzodiazepínicos tem sido atribuído a duas propriedades destes medicamentos: atividade seletiva e bloqueio adrenérgico. A primeira seria responsável por alterações
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