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Políticas educacionais e contribuições para o Serviço Social¹ - Eliana Bolorino Eliana Bolorino Canteiro Martins Docente do Departamento de Serviço Social e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre o Serviço Social na Educação - GEPESSE da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Júlio de Mesquita Filho - UNESP/Campus de Franca (SP). Doutora em Serviço Social pela PUC- SP. Este artigo compõe a Revista Conexão Geraes do CRESS-MG nº 5/2014. INTRODUÇÃO O presente artigo versa sobre as Políticas Educacionais e contribuições do Serviço Social - temática que foi apresentada no III Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais, com o tema central: “Expressões socioculturais da crise do capital e seus rebatimentos na garantia dos direitos sociais no Serviço Social”. O referido evento, promovido pelo Conselho Regional de Serviço Social de Minas Gerais (CRESS-MG), foi realizado nos dias 7, 8 e 9 de junho de 2013, em Belo Horizonte (MG). Para abordar sobre a Política de Educação no atual contexto de acumulação do capital, recorremos às fundamentações de Pablo Gentille (2007) que reflete sobre a desintegração da proposta integradora da política de educação iniciada nas décadas de 1980/1990, quando, em resposta à crise global, a ortodoxia neoliberal apresenta um outro projeto educacional. Nesta conjuntura, recuperamos as determinações que incidem sobre a ampliação da requisição do Serviço Social no âmbito da Política de Educação nas últimas décadas, que coincidem com as transformações societárias em curso e as reformas educacionais, que sofrem influências da égide do neoliberalismo, pautado pelas determinações dos Organismos Internacionais. Considerando as particularidades postas nestes espaços sócio-ocupacionais, também provocamos a reflexão sobre as contradições entre as demandas institucionais e profissionais que estão presentes no universo educacional, ponderando sobre os limites e as possibilidades do trabalho profissional da/o assistente social. 1 - POLÍTICA DE EDUCAÇÃO NO BRASIL NO CONTEXTO CONTEMPORÂNEO Gentille (2007) afirma que as alterações no processo de produção capitalista, que impulsionam a ampliação do desemprego, têm um impacto profundo no campo educacional, considerando principalmente o papel econômico desempenhado pela escola. Ainda segundo Gentille (2007, p. 2): [...] a atual conjuntura do desenvolvimento capitalista tem-se produzido um deslocamento da ênfase na função da escola como âmbito de formação para o emprego (promessa que justificou em parte a expansão dos sistemas educacionais durante o século XX) par uma nem sempre declarada ênfase no papel que a mesma deve desempenhar na formação para o desemprego. A proposta integradora da educação, especificamente na dimensão econômica, no auge do desenvolvimento capitalista que ocorreu no período compreendido entre1950-1970, estava fundada em um mercado de trabalho em expansão e na possibilidade de atingir o pleno emprego. Nesta etapa histórica, o processo de escolarização, interpretado como um elemento fundamental para a formação do capital humano1, tinha como principal objetivo garantir a capacidade competitiva das economias e o incremento da renda individual e da riqueza social. Nesta proposta, o Estado figurava como central, desempenhando a decisiva função de planejamento, captação e distribuição de recursos financeiros destinados ao sistema educacional. Houve a expansão do sistema educacional, considerando a demanda crescente, do sistema produtivo de trabalhadores preparados para atuarem frente às novas tecnologias. No contexto contemporâneo de crise global do capital, dentre os vários indicadores do desempenho diverso das economias, figura com destaque o desemprego, que não parou de crescer, acompanhado do aumento da pobreza e da desigualdade social. A razão que explica esta tendência, de acordo com a perspectiva neoliberal, situa-se nos seguintes fatores: “[...] os mercados eram extremamente rígidos, os custos trabalhistas altos, os sindicatos perigosamente poderosos, o dirigismo estatal irresponsável e as instituições de bem- estar generosas demais” (GENTILLE, 2007, p.3). Diante dessa perspectiva, o capital recorre a uma profunda reestruturação, considerando que não pode haver emprego para todos, sendo este um item dessa mudança e desta forma vivenciamos, na política educacional, a desintegração da proposta integradora, ou seja, [...] passou-se de uma lógica, da integração em função de necessidades e demandas de caráter coletivo (a economia nacional, a competitividade das empresas, a riqueza social, etc.), a uma lógica econômica estritamente privada e guiada pela ênfase nas capacidades e competências que cada pessoa deve adquirir no mercado educacional para atingir melhor posição no mercado de trabalho (GENTILLE, 2007,p.3). Não existindo mais a perspectiva do “pleno emprego” restará aos indivíduos a responsabilidade de conquistarem espaço no competitivo mercado de trabalho, portanto a promessa integradora é substituída pela promessa que abarca um novo paradigma - da empregabilidade.2 Essas mudanças no mundo do trabalho, em decorrência das transformações no processo produtivo, resumidas no mote da “acumulação flexível”3, em última instância, preocupam-se fundamentalmente com o lucro através do controle da força de trabalho, exigindo mudanças na formação profissional e na sociabilidade, portanto também no mundo da cultura. Diante do novo cenário, os organismos internacionais, destacando o Banco Mundial, assumem a função de definidores de políticas econômicas e educacionais para os países de economia periférica, e estabelecem mundialmente princípios jurídicos políticos e padrões socioculturais. De acordo com Gentille (2007): Mas do que pensar a integração dos trabalhadores ao mercado de trabalho, o desenho das políticas educacionais deveria orientar-se para garantir a transmissão diferenciada de competências flexíveis que habilitassem os indivíduos a lutar nos exigentes mercados laborais pelos poucos empregos disponíveis. A garantia do emprego como direito social desmanchou-se diante da nova promessa de empregabilidade como capacidade individual para disputar as limitadas possibilidades de inserção que o mercado oferece. (GENTILLE, 2007 p. 4) Diante dessas análises que refletimos sobre o empenho da Política de Educação brasileira com o processo de expansão da escolaridade que, nas últimas décadas, está estreitamente atrelado a essa nova concepção da função econômica da escola, ou seja, preparar os estudantes, de forma funcional e ideológica para responder aos novos desafios do mercado de trabalho, altamente exigente, competitivo e excludente. Diante dessa realidade e pensando na perspectiva da totalidade, é preciso analisar a ‘escola’ como espaço contraditório. Segundo Frigotto (1999), a escola é uma instituição social que, mediante sua prática no campo do conhecimento, dos valores, atitudes e, mesmo por sua desqualificação, articulam determinados interesses e desarticula outros. Nessa contradição existente no seu interior, está a possibilidade da mudança, haja vista as lutas que aí são travadas. Desta forma, analisar a função social da escola implica repensar o seu próprio papel, sua organização e os atores que a compõem. Portanto, a principal função da educação, sob o prisma do capital, é a internalização dos consensos visando à reprodução ampliada do capital. A Política de Educação, nos tempos atuais tem se figurado marcadamente na perspectiva economicista, segundo Frigotto (1999, p. 26) “[...] trata-se de subordinar a função social da educação de forma controlada para responder às demandas do capital.” Contraditoriamente, sob o prisma do trabalho, a Política de Educação também traz possibilidades da construção histórica de uma educação que contribua com a emancipação humana. Porém, é evidente que a sonhada emancipação humana não depende exclusivamente da educação, mas depende de um amplo processo de universalizaçãodo trabalho e da educação como atividade humana auto realizadora. Desta forma, diferente da perspectiva dominante, para a classe trabalhadora [...] a educação é, antes de qualquer coisa, desenvolvimento de potencialidades e apropriação de ‘saber social’ (conjunto de conhecimentos e habilidades, atitudes e valores que são produzidos pelas classes, em uma situação histórica dada de relações, para dar conta de seus interesses e necessidades) (GRYZYBOWSKI apud FRIGOTTO, 1998, p. 26), objetivando a formação integral do homem, ou seja, o desenvolvimento físico, político, social, cultural, filosófico, profissional, afetivo, entre outros. Considerando a reflexão trazida por Frigotto e compreendendo a realidade e a concepção de educação na perspectiva crítica, portanto concebendo o homem na sua totalidade, enquanto ser biológico, psicológico, social e material, que reconhece a política de educação em sua contraditoriedade, em processo contínuo de construção e desconstrução mediante a ação dos homens, enquanto sujeitos históricos. Neste sentido, pressupondo a educação como prática social desenvolvida nas relações sociais estabelecidas nas diferentes esferas da vida social - inclusive na escola, que se caracteriza este como espaço de disputa hegemônica. Essa disputa ocorre “[...] na perspectiva de articular as concepções, a organização dos processos e dos conteúdos educativos da escola e, mais amplamente, nas diferentes esferas da vida social, aos interesses de classes.” (FRIGOTTO, 1999, p.25). É nestas relações sociais contraditórias que permeiam o campo educacional nos diversos espaços sócio-ocupacionais que constituem a Política de Educação, que se amplia a requisição da intervenção do assistente social. Para adentrar na discussão sobre o Serviço Social na educação, sem sucumbir à armadilha da educação como “salvadora” ou como “reprodutora” da sociedade capitalista, é preciso partir do pensamento do grande educador Paulo Freire, quando afirma que: [...] se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da equidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, não temos outro caminho senão viver plenamente a nossa opção. Encarná-la, diminuindo assim a distância entre o que dizemos e o que fazemos (FREIRE, 1998). Assim, acredita-se que é preciso reconhecer a incontestável função social da escola, ou seja, a contribuição no processo de sistematização e socialização da cultura historicamente produzida pela humanidade. 2 - CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO Inicialmente é preciso esclarecer que a inserção do assistente social na Educação não é recente, remonta as origens da profissão, porém também é de suma importância considerar as determinações do tempo atual que redesenham a interface do Serviço Social com a Política de Educação, principalmente nas últimas décadas. Neste sentido a breve reflexão sobre as contribuições do Serviço Social na Educação, no contexto contemporâneo, tem que partir da análise dos determinantes que justificam a requisição desta inserção do Serviço Social nos diferentes níveis de ensino neste momento da história brasileira, em especial da Política de Educação. Conforme discutido anteriormente, o significado estratégico que a educação vem assumindo nos últimos tempos em decorrência das transformações no processo produtivo, visando à formação de um novo perfil de trabalhador coerente com as demandas do trabalho, reflete no novo desenho que a Política de Educação brasileira está assumindo. Por outro lado, contraditoriamente, a classe trabalhadora, que sempre lutou pelo acesso à educação escolarizada, amplia essa luta pela universalização do direito à educação principalmente após o processo de redemocratização do Brasil (década de 1980). É notório que a luta pelo acesso à educação escolarizada se fundamenta tanto na ótica de possibilidade de melhorar a inserção no mercado de trabalho como, mais implicitamente, conforme discutem os intelectuais da educação, no sentido de forjar processos de autoconsciência da população contribuindo na construção de uma contra hegemonia, contribuindo na construção de uma nova cultura (de acordo o pensamento de Gramsci). Por sua vez o Serviço Social - profissão inserida na divisão social e técnica do trabalho, e que tem em sua gênese o ethos de constituir no processo de intervenção, em várias políticas sociais - a reprodução de consensos necessários à reprodução ampliada do sistema metabólico do capital, vêm sendo requisitado, com maior incidência para atuar nos espaços sócio-ocupacionais em diferentes níveis da Política de Educação. A marca histórica das políticas sociais brasileiras, entre elas a política de educação, sempre foi a fragmentação, a parcialização do atendimento às reais demandas da classe trabalhadora, porém, com o ideário neoliberal os direitos sociais duramente conquistados pela luta da classe trabalhadora tendem a ser usurpados em decorrência das políticas sociais, especificamente a Política de Educação, que tem se reorganizado sob uma perspectiva ainda mais economicista, mercadológica, privatista. Nesta abordagem se incluem várias determinações desta requisição para o Serviço Social na educação, tais como: a incidência de projetos e programas assistenciais que possuem como condicionalidade a frequência escolar; a presença acirrada de expressões da questão social no universo escolar com a ampliação da educação escolarizada para classe empobrecida; a necessidade de garantir o acesso, a permanência das crianças/adolescentes e jovens na educação desta forma minimizando os índices vergonhosos de analfabetismo, repetência e evasão escolar que marcam a trajetória da política de educação brasileira, entre outros. Para pensar o trabalho do assistente social inserido no trabalho coletivo desenvolvido, no âmbito das instituições educacionais, tanto na dimensão do planejamento, gestão e execução, é essencial compreender as demandas institucionais e profissionais existentes no complexo jogo de interesses contraditórios, de classes sociais antagônicas que permeia as relações sociais na sociedade capitalista e, especificamente as pertinentes ao campo da política de educação. Inicialmente se faz necessário compreender a concepção de demandas institucionais e demandas profissionais que nortearam as ponderações posteriormente descritas. Segundo Pontes (1995), a demanda institucional representa a requisição de resultados esperados dentro dos objetivos institucionais e colado ao esperado pelos objetivos do profissional, logicamente em consonância com o perfil ideológico da organização. A demanda profissional é estabelecida como a legítima demanda advinda das necessidades sociais dos segmentos demandatários dos serviços sociais. A demanda profissional incorpora a demanda institucional, mas não se restringe a ela, devendo ultrapassá-la. O referido autor afirma ainda que, a construção da demanda profissional impõe ao profissional a recuperação das mediações ontológicas e intelectivas4 que dão sentido histórico a particularidade do Serviço Social, numa totalidade relativa. Portanto, é preciso interpretar as reais necessidades sociais dos sujeitos sociais que fazem parte do universo de trabalho do assistente social. Para considerar que as demandas institucionais não explicitam as reais necessidades da classe trabalhadora, desta forma, é primordial recuperar as mediações presentes no tecido social para compreender além do imediato, ou seja, utilizar-se da razão dialética para ter uma perspectiva crítica dos processos sociais. O assistente social tem que ter clareza da contradição que atravessa o exercício profissional, atuando na tensão entre os interesses do capital e do trabalho, porém tendo como norte os princípios do Código de Ética Profissional. Compreender, conforme nos alerta Iamamoto (2008, p. 83) que: [...] a demanda de suaatuação não deriva daqueles que são alvo de seus serviços profissionais - os trabalhadores - mas do patronato, que é quem diretamente o remunera, para atuar, segundo metas estabelecidas por estes, junto aos setores dominados. Estabelece-se, então, uma disjunção entre intervenção e remuneração, entre quem demanda e quem recebe os serviços do profissional. É primordial para o assistente social, comprometido com a materialização do projeto ético-político da profissão, desvelar as reais necessidades da classe trabalhadora, que não se reduz, conforme nos alerta Heller (1986) a concepção de necessidade apenas no aspecto econômico, de acordo com o significado imposto pela sociedade capitalista. Ainda segundo Heller (1986), necessidade, conceito complexo, muito além da mera carência material, “[...] necessidade é desejo consciente, aspiração, intenção dirigida em todo momento para certo objeto e que motiva a ação para tal” (HELLER, 1986). Portanto, as necessidades são sempre ‘sociais’, pois são sempre satisfeitas em um meio social. É notório que as políticas sociais, na sociedade capitalista, não atendem as reais necessidades dos usuários, porém, contraditoriamente, os assistentes sociais, inseridos nos espaços sócio- ocupacionais dessas políticas sociais, imprimem ações que visam, em última instância, ampliar e universalizar os direitos sociais pertinentes a cada política setorial. Retomando a problematização da Política de Educação e a inserção do assistente social nos mais diferentes níveis de ensino, com suas particularidades, refletindo sobre as demandas institucionais e profissionais que permeiam este universo, é condição sine qua non para identificar as reais contribuições que este profissional poderá oferecer para a efetivação da educação como direito social. Conforme descrito no Documento: Subsídios para a Atuação de Assistentes Sociais na Política de Educação (2012), as dimensões que particularizam a inserção dos assistentes sociais na Política de Educação estão voltadas para garantia: do acesso, da permanência, da qualidade da educação escolarizada e da gestão democrática da escola e da Política de Educação. Conforme afirma Almeida (2012), a ampliação da inserção de assistentes sociais na Política de Educação nas últimas décadas respondem: [...]sobretudo, às requisições socioinstitucionais de ampliação das condições de acesso e de permanência da população nos diferentes níveis e modalidades de educação, a partir da mediação de programas governamentais instituídos mediante as pressões dos sujeitos políticos que atuam no âmbito da sociedade civil. Desse modo, se por um lado resulta da histórica pauta de luta dos movimentos sociais em defesa da universalização da educação pública, por outro se subordina à agenda e aos diagnósticos dos organismos multilaterais, fortemente sintonizados às exigências do capital, quanto à formação e qualificação da força de trabalho. Inscreve-se, portanto, na dinâmica contraditória das lutas societárias em torno dos processos de democratização e qualidade da educação, cujo resultado mais efetivo tem se traduzido na expansão de condições de acesso e permanência, a partir do incremento de programas assistenciais, o que caracterizou a intervenção do Estado no campo das políticas sociais na primeira década deste século (CFESS-Documento Subsídios para o Trabalho do Assistente Social, 2012). Tendo como referência as análises formuladas no documento supracitado, destaca-se quais são as principais demandas institucionais na área da educação, mas propriamente nas unidades educacionais sendo: - a demanda por uma ação educativa que visa a forjar consensos sociais coerentes com a ideologia dominante que é camuflada com rótulo de educação “inclusiva, cidadã”, porém desconexa com as condições concretas para efetivar a inclusão; - a demanda por atendimento das mais variadas expressões da questão social que, apesar de não estarem diretamente relacionadas ao processo de ensino-aprendizagem incidem sobremaneira no mesmo. Porém, essas demandas são consideradas de caráter individual, muitas vezes culpabilizando os estudantes e famílias pelas mazelas sociais que vivenciam. Desta forma, reconhece-se as expressões da questão social, mas sem análise histórica e econômica contextualizada com as transformações societárias em curso; - no que tange à qualidade da educação se destacam os seguintes discursos hegemônicos: da “pedagogia das competências”, do “empreendedorismo”, da “empregabilidade”, dos projetos voltados para eficiência e eficácia da gestão educacional. Reveste-se a educação do manto da visão empresarial, tornando a unidade escolar uma “empresa” que precisa atingir aos índices educacionais coerentes com os ditames dos organismos multilaterais, mas sem condições condizentes para tal. Além disso, fica em segundo plano a função primordial da educação, conforme afirma Frigotto (1999), o desenvolvimento das potencialidades e apropriação dos conhecimentos culturais, políticos, filosóficos, historicamente produzidos pelo homem; - a gestão democrática é privilegiada nas legislações educacionais, porém considerando-se que a escola faz parte da trama societária, numa sociedade em que perduram traços de uma cultura autoritária, ainda há uma longa trajetória a percorrer no processo de democratização da gestão educacional envolvendo nesta todos os atores sociais pertencentes à comunidade escolar. Também a gestão democrática é revestida pela racionalidade gerencial, portanto estritamente voltada à razão instrumental. Realizar o contraponto das demandas institucionais identificando as reais demandas advindas da classe trabalhadora, ou seja: de todos os segmentos da comunidade escolar (direção, docentes, funcionários, estudantes e suas famílias), considerada demanda profissional, eis o desafio profissional dos assistentes sociais que atuam na Educação. O primeiro aspecto a ser considerado como demanda profissional é ampliar o conhecimento sobre a Política de Educação, com suas peculiaridades relacionadas aos diferentes níveis e modalidades de ensino, compreendendo-a no bojo da luta de classes sociais, portanto cravejada de ideologias, interesses contraditórios próprios à constituição das políticas sociais na sociedade capitalista. Reconhecer o traço classista que permeia as diferentes políticas educacionais, inclusive as legislações que a orientam. A demanda profissional do assistente social na educação está relacionada à tarefa de elucidar, desvelar as contradições, as manifestações da desigualdade social existentes na Política de Educação, expressas no contexto das instituições educacionais buscando estratégias na luta pela conquista do acesso, regresso, permanência e sucesso das crianças, adolescentes e jovens em todos os níveis de ensino da educação escolarizada, como um direito social. Contribuir para decodificar o social através de ação sócio-educativa, envolvendo todos os segmentos da comunidade escolar, é uma demanda profissional essencial, pois contribui com o processo de politização desfazendo mitos, preconceitos e concepções deturpadas sobre o processo de produção e reprodução social referente à sociedade capitalista. Também proporcionará o acesso dos usuários a informações sobre os serviços prestados pelas políticas sociais facilitando o alcance aos seus direitos sociais. Constitui-se também uma demanda profissional o processo de coletivizar as demandas individuais existentes no espaço educacional dando a elas visibilidade, publicizando-as através da participação efetiva nos espaços democráticos de controle social, como os conselhos de direito, levando informações que possam contribuir no planejamento das políticas educacionais. Participar efetivamente da elaboração do projeto político-pedagógico da unidade educacional, oferecendo subsídios referentes ao perfil dos alunos/ família e dos próprios educadores se constitui uma demanda profissional essencial. Desta forma será possívelampliar o horizonte pedagógico da escola com os aspectos sociais, inclusive do território onde a instituição está inserida. Tendo como pressuposto a perspectiva de educação que contribua com a emancipação humana, o trabalho do assistente social no âmbito da Política de Educação converge para ações interdisciplinares, interinstitucionais, intersetoriais, sempre articulando a educação a outras políticas sociais e aos movimentos sociais, tendo como principal referência a razão crítica dialética. À GUISA DE CONCLUSÃO O desafio posto para o Serviço Social inserido nas diversas instituições que compõem os vários níveis de ensino da Política de Educação brasileira inicia-se pelo empenho em analisar e compreender os processos de formulação, organização e efetivação desta política social e desvelar os meandros que a particularizam apesar ser parte integrante da nova forma como o Estado tem desenhado as políticas sociais para garantir consensos sociais. Vencida essa primeira etapa, os desafios continuam e requer dos profissionais assistentes sociais competência: teórico-metodológica, técnica-operativa e ético-política, tendo como premissa a razão dialética articulando a dimensão investigativa, educativa e interventiva da profissão para realizar, no trabalho coletivo desenvolvido no âmbito da Política de Educação, ações na conquista desta como direito social. Neste sentido, propor ações de resistência a lógica meramente instrumental, gerencial da Política de Educacional, que vislumbre resgatar a principal função da educação escolarizada, a transmissão dos conhecimentos eruditos acumulados historicamente pela sociedade, suscitando nos sujeitos sociais a visão crítica da realidade social da qual fazem parte. Para tanto é preciso que os assistentes sociais articulem-se com educadores que comungam essa visão crítica e com os movimentos sociais que lutam pela educação pública, laica, presencial, para todos e de qualidade. NOTAS 1 - Teoria do Capital Humano: Segundo Paul Singer a abordagem ‘capital humano’ é produtivista, enfatiza a educação como uma peça da complexa engrenagem do mercado capitalista e, embora não negue a necessidade da sua universalização, prefere que ela resulte da livre preferência dos indivíduos e menos da ação do poder público (SINGER,1996). 2 - Empregabilidade: “[...] necessidade crescente de qualificar-se melhor e preparar-se mais para conseguir trabalho. Parte importante do tempo livre dos trabalhadores está crescentemente voltada para adquirir empregabilidade, palavra fetiche que o capital usa para transferir aos trabalhadores as necessidades de sua qualificação, que anteriormente eram, em grande parte, realizadas pelo capital” (ANTUNES; ALVES, 2004, p.6). 3 - Segundo Antunes, (1998) “[...] um processo produtivo flexível que atenda a esta ou aquela demanda com mais rapidez, sem aquela rigidez característica de produção em linha de montagem do tipo fordista [...] um sistema de produção flexível supõe direitos do trabalhador também flexíveis, ou de forma mais aguda, supõe a eliminação dos direitos do trabalho” (ANTUNES, 1998, p.81). 4 - Segundo Pontes (1995), mediações: são expressões históricas das relações que o homem edificou com a natureza e consequentemente das relações sociais, daí decorrentes nas várias formações sócio humanas que a história registrou. Funciona como condutos por onde fluem as relações entre as várias instâncias da realidade, são elas que possibilitam conceber-se a realidade como totalidade (PONTES, 1995). Para aprofundamento da temática, ver Pontes (1995); Guerra (1997). REFERÊNCIAS ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaios sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 1998. ______; ALVES, G. Globalização e educação: precarização do trabalho docente. Educação & Sociedade, Campinas, v.25, n. 87, maio/ago. 2004. CFESS. Conselho Federal de Serviço Social. Subsídios para a atuação dos assistentes sociais na política de educação. Brasília, DF: CFESS, 2012. (Série 3: Trabalho e projeto profissional nas políticas sociais). GENTILI, P. Educar para o desemprego: a desintegração da promessa integradora. 2007. Disponível em: <http://portalmultirio.rio.rj.gov.br/sec21/ chave_artigo.asp?cod_artigo=209> Acesso em: 2 set.2013. _____.O direito à educação e as dinâmicas de exclusão na América Latina. Educação & Sociedade, Campinas, v. 30, n.109, p. 1059-1079, set./dez. 2009. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996. FRIGOTTO, G. A produtividade da escola improdutiva. 5. ed. São Paulo: Cortez, 1999. HELLER, A. Una revisión de lateoría de lasnecesidades. Barcelona: EdicionesPaidós; 1996. IAMAMOTO, M. V.; CARVALHO, R. Relações sociais e Serviço Social no Brasil:esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 25. ed. São Paulo: Cortez, CELATS, 2008. PONTE, R. Mediação e serviço social: um estudo preliminar sobre categoria teórica e sua apropriação pelo serviço social. São Paulo: Cortez, 1995. SINGER, P. Poder, política e educação. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 1, 1996.
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