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Do Maniqueísmo à Complementaridade: perspectivando saberes entre Antropologia e Direito.

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FERREIRA, Francisco Marcelo Gomes. Do Maniqueísmo à Complementaridade: perspectivando saberes entre Antropologia e Direito. R. Ág., Salgueiro-PE, v. 5.1, p.40-50, agos. 2010.
Conforme o autor, a origem da disciplina antropológica possui uma extrínseca relação com o Direito. Maine e Morgan são apontados como estudiosos de destaque dentre os primeiros direcionados a jurisprudência antropológica, ao tratarem do direito primitivo com forte apelo a formulações teóricas postuladas pela escola evolucionista, que passa a pautar-se posteriormente dentro da teoria funcionalista por trabalhos como os de Brown.
Para Malinowiski, o estudo exclusivo da lei criminal entre os selvagens omitira os fenômenos mais importantes de sua vida legal, já que para o autor, o verdadeiro problema é saber como as regras se adaptam a vida. 
Já Gluckma, argumenta a existência de certos paralelos entre o direito romano e a comunidade Barotse, atentando para que os antropólogos adquiram uma perspectiva mais comparativa em suas pesquisas. Bohannan tece algumas críticas a Gluckman e tenta mostra ser possível que determinados fatos encontrados durante a pesquisa de campo pode ter várias interpretações, leituras e modelos da situação.
Gluckman e Bohannan são dois autores que contribuíram de maneira significativa para esquentar o debate entre o conhecimento antropológico e o jurídico, iniciando um conjunto de questionamentos que impulsionara a pensar como estava sendo estabelecida a prática antropológica. 
O antropólogo Clifford Geertz, na Obra O Saber Local (1983), propõe que os antropólogos trabalhem em uma perspectiva menos “desagregante” diante do encontro entre antropologia e direito, apesar de concordar com as distinções existentes entre as duas, aponta caminhos de encontro entre elas e desenvolve determinadas categorias analíticas que marcam a necessidade de um olhar mais relativista para ambos como: a busca por uma “sensibilidade jurídica”, um “ir” e “vir” hermenêutico e o “pluralismo jurídico”.
A importância da discussão entre a Antropologia e o Direito pôde contribuir para a construção e revitalização das duas ciências. O autor aponta características que impedem um diálogo entre ambas ou contribuem para que os saberes se complementem. Desta forma, cita a dificuldade de interação entre elas, apontando a existência de limitações relacionada aos seus saberes específicos e entraves relacionados à dificuldade existente por parte de alguns antropólogos em enveredarem no campo jurídico, sendo criticados pela academia por acharem que estes não estão produzindo um conhecimento verdadeiro científico.
 Bourdieu (1989) chega a afirmar que a ciência jurídica apresenta-se enquanto um “sistema fechado” e autônomo, por outro lado, alega a necessidade da junção de outras categorias de estudos que possibilitem dar uma maior força a esse campo jurídico. 
Grande parte desse distanciamento esta sendo superado permitindo ao antropólogo trabalhar como uma espécie de “tradutor”, existindo, portanto, um maior diálogo entre conhecimento acadêmico e conhecimento aplicado.
No entanto, o diálogo entre essas duas ciências permite uma melhor inserção e fluxo desses dois tipos de conhecimento, de maneira a ambos lucrar com isso, a partir do momento em que novas ferramentas de trabalho passam a ser utilizadas por estes.
Os trabalhos realizados em comunidades remanescentes de quilombos vêm demonstrando o quanto estes dois tipos de saberes estão sendo confrontados cotidianamente em prol das causas dos povos julgados e pesquisados. 
Uma dos importantes exemplos dessa relação dialógica entre Antropologia e Direito ocorreu a partir da promulgação do artigo 68 do ADCT, onde antropólogos da Associação Brasileira de Antropologia foram convocados para que formulassem o conceito de remanescentes de quilombos, transformando assim esse conceito como algo aglutinador de diversas demandas posteriores a aplicação dessa lei.
Porém esta vitória no campo conceitual acaba esbarrando em questões práticas quando ainda tentamos mostrar a eficácia desses conceitos da prática jurídica, que se dá em grande parte em decorrência da visão ainda fechada de juristas em perceber esse conceito um tanto arbitrário.
Aos poucos vem se criando um melhor entendimento entre elas, considerando novas e fortes configurações argumentativas na relação a comunidades remanescentes de quilombos e outros tipos de pesquisas antropológicas para com o direito.
Uma das vitórias conquistadas faz referência à possibilidade de busca por novas estratégias de negociação por parte das comunidades que pleiteiam o reconhecimento com base no artigo 68. 
Compreende-se conforme Geertz que a antropologia e o Direito estão envolvidos em um processo de mutualidade, já que, o pluralismo jurídico “atrai o antropólogo porque é jurídico e o antropólogo porque é plural, parecia ser o tipo de fenômeno que nenhum dos dois poderia deixar, com segurança aos cuidados do outro” (Geertz, 2001, p.340). Nestes termos, acredita-se que exista um profícuo desenvolvimento desses dois saberes.

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