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PROJETO DE COMPONENTES MECÂNICOS AULA 1 Prof. Julio Almeida CONVERSA INICIAL Olá! Seja bem-vindo(a) à nossa primeira aula de Projeto de Componentes Mecânicos. Eu sou o professor Julio Almeida. Sou formado em Engenharia Mecânica pela UFPR, com mestrado em Projeto de Sistemas Mecânicos pela UFSC e doutorado em Métodos Numéricos pela PUCPR. Profissionalmente, atuo com redes de distribuição de gás natural canalizado. Nesta disciplina, iremos abordar conceitos gerais e premissas de projeto convencionalmente adotados para o dimensionamento de importantes componentes mecânicos, presentes numa grande quantidade de dispositivos e sistemas mecânicos em geral. Dentre os temas abordados, veremos a questão dos esforços e solicitações presentes em componentes mecânicos, noções gerais de transmissões mecânicas, transmissões por correias e correntes de rolos, principais tipos de engrenagens, eixos de transmissão, mancais de rolamento e de deslizamento, cabos de aço, além de dispositivos convencionais de fixação, como parafusos e uniões soldadas. Além dos aspectos conceituais, abordaremos também problemas práticos e exemplos gerais, visando fornecer subsídios adequados e suficientes para que um engenheiro de produção tenha condições de acompanhar e entender os princípios de funcionamento, premissas e principais características de uma boa quantidade de componentes mecânicos normalmente presentes em sistemas e dispositivos mecânicos de maior porte. A bibliografia básica desta disciplina é a quinta edição do livro Elementos de máquina em projetos mecânicos de Robert Mott, que está disponível em nossa Biblioteca Virtual (BV). Figura 1 – Capa do livro Elementos de máquina em projetos mecânicos Fonte: Pearson, 2005. 3 Nesta primeira aula, veremos, como introdução da disciplina, importantes conceitos fundamentais sobre as solicitações e esforços atuantes sobre componentes mecânicos em geral, destacando as solicitações de tração, compressão, cisalhamento, torção e flexão, além da condição de esforços combinados e a conceituação de coeficientes de segurança. Particularidades dos materiais classificados como dúcteis e frágeis também serão objeto desta aula inicial. CONTEXTUALIZANDO Todos os sistemas mecânicos de grande porte ou de maior complexidade são estruturados a partir de componentes mecânicos básicos ou convencionais, os quais necessitam ser adequadamente dimensionados de tal forma que os esforços atuantes sobre eles possam ser adequadamente absorvidos com segurança e dentro de dimensões que sejam as menores possíveis, objetivando sempre a redução de custos, de peso e até mesmo do espaço a ser ocupado no sistema global. Da disciplina de Resistência dos Materiais tem-se o conhecimento que os esforços axiais de tração e compressão, os esforços de corte ou de cisalhamento, além das solicitações de flexão e torção, estão presentes, seja de forma isolada ou combinada, em todos os componentes de máquinas que fazem parte de um conjunto maior. O engenheiro, nessas circunstâncias, precisa dominar os conceitos e as formulações matemáticas correspondentes no sentido de poder projetar, validar ou até mesmo acompanhar situações que envolvam dispositivos dessa natureza. Dentro dessa perspectiva, cabe questionar: qual o material a ser selecionado para determinado componente mecânico? Estaria esse componente com dimensões adequadas? Qual o coeficiente de segurança contemplado num determinado projeto? TEMA 1 – A DEFORMAÇÃO DOS MATERIAIS A partir do momento em que determinado componente ou dispositivo mecânico é solicitado por algum tipo de carregamento, desenvolvem-se nele deformações lineares e/ou angulares (ou de cisalhamento). Tais deformações precisam, em termos dos sistemas mecânicos, estar evidentemente 4 compreendidas dentro de faixas toleráveis de aceitação. Nesse contexto se faz, normalmente, aplicação da Lei de Hooke, a qual tem por objetivo relacionar as deformações sofridas pelo corpo com as tensões geradas internamente. Pressupõe-se assim que os materiais analisados permaneçam ou trabalhem dentro do regime elástico, ou seja, que não venham a apresentar deformações permanentes quando da retirada do carregamento externo correspondente. Materiais classificados como dúcteis são aqueles que apresentam grandes deformações quando solicitados para carregamentos externos. Os aços carbono em geral e as ligas de alumínio, por exemplo, enquadram-se nessa classificação. Num segundo grupo de classificação, tem-se os materiais frágeis, os quais apresentam pequenas deformações quando submetidos a carregamentos externos. Cerâmicas e ferros fundidos cinzentos são exemplos dessa natureza. Diagramas tensão X deformação clássicos, obtidos a partir de ensaios de tração simples normalmente realizados em materiais, podem representar claramente a diferença entre os materiais dúcteis e frágeis. Figura 2 – Exemplos de diagramas tensão X deformação de materiais dúcteis e frágeis Fonte: Beer; Johnston, 1982. 5 Figura 3 – Exemplo de barra em tração sendo alongada Fonte: Beer; Johnston, 1982 .TEMA 2 – SOLICITAÇÕES DE TRAÇÃO, COMPRESSÃO E CISALHAMENTO SIMPLES As cargas ou solicitações de tração atuam ao longo do eixo longitudinal do componente (normalmente uma barra ou componente similar) e tendem a ocasionar um aumento no seu comprimento. Contrariamente, as cargas de compressão também atuam ao longo do eixo longitudinal do componente, mas tendem a ocasionar um encurtamento no comprimento dele. Ambos os esforços geram tensões normais (sobre a secção transversal da peça ou componente solicitado. Em termos práticos, podemos dizer, por exemplo, que um cabo de aço sustentando um determinado carregamento se encontra tracionado, enquanto uma coluna de uma estrutura qualquer estará normalmente submetida a uma condição de compressão. Figura 4 – Exemplos de barras submetidas a cargas de tração e de compressão Fonte: Gere; Goodno, 2017. 6 Matematicamente: Onde: = tensão normal P = carregamento externo A = área da secção transversal Por outro lado, parafusos, pinos, rebites e chavetas são bons exemplos de componentes mecânicos submetidos à condição de cisalhamento simples. Nessas circunstâncias, o carregamento ocorre de forma perpendicular à secção transversal da peça em análise e tensões de cisalhamento (é que acabam sendo desenvolvidas. Figura 5 – Exemplos de componentes submetidos a cargas de cisalhamento simples Fonte: Gere; Goodno, 2017. 7 Matematicamente: Onde: = tensão tangencial (ou de cisalhamento) P = carregamento externo A = área da secção transversal TEMA 3 – SOLICITAÇÕES DE FLEXÃO O esforço de flexão, correspondente a uma combinação dos esforços de tração e compressão, encontra-se presente na totalidade dos casos em que existem carregamentos perpendiculares a uma determinada viga ou eixo apoiado em dois ou mais pontos. Geram-se novamente tensões normais na secção transversal da peça considerada em decorrência do momento fletor (M) atuante nesta mesma secção. Atente-se ainda para que o momento fletor atuante sobre a viga em análise é variável e depende da posição relativa em relação aos apoios, justificando a necessidade da construção do conhecido “diagrama de momentos fletores”. Figura 6 – Exemplos de vigas submetidas a cargas transversais Fonte: Gere; Goodno, 2017. 8 Figura 7 – Exemplo deviga encurvada devido à solicitação de flexão Fonte: Beer; Johnston, 1982. Figura 8 – Exemplo de viga nas configurações original e deformada Fonte: Gere; Goodno, 2017. 9 Matematicamente: Onde: = tensão normal M = momento fletor y = distância medida a partir do eixo de simetria da peça (linha neutra) até o ponto de interesse I = momento de inércia da secção transversal TEMA 4 – SOLICITAÇÕES DE TORÇÃO Eixos de transmissão correspondem a um excelente exemplo de componentes submetidos a esforços de torção. O esforço de torção gerado sobre a secção transversal em análise, para o caso dos eixos de transmissão, é decorrente da potência transmitida numa determinada rotação especificada. Existem, evidentemente, outras situações que geram casos de torção, como o simples aperto de um parafuso, por exemplo. Em ambas as situações, tensões tangenciais são desenvolvidas na secção transversal em análise em decorrência do momento torcedor, momento torçor ou simplesmente torque (T) atuante na mencionada secção. Figura 9 – Exemplos de componentes submetidos a cargas de torção Fonte: Gere; Goodno, 2017. 10 Figura 10 – Exemplo de eixo de transmissão submetido a torção Fonte: Beer; Johnston, 1982. Matematicamente: Onde: = tensão tangencial (ou de cisalhamento) T = momento torcedor (torque) y = distância medida a partir do eixo de simetria da peça até o ponto de interesse Jp = momento polar de inércia da secção transversal TEMA 5 – SOLICITAÇÕES OU ESFORÇOS COMBINADOS E COEFICIENTE DE SEGURANÇA As equações matemáticas até então apresentadas e descritas, para os casos de solicitações atuantes sobre peças ou componentes mecânicos, são válidas apenas para o dimensionamento em situações nas quais o elemento em análise esteja submetido exclusivamente a um único tipo de carregamento 11 de cada vez. São os chamados esforços ou solicitações simples. Na prática, porém, tais solicitações normalmente ocorrem de forma combinada. Um eixo de transmissão, por exemplo, normalmente encontra-se carregado numa condição de flexo-torção: flexão devido a cargas e pesos das polias e engrenagens eventualmente dispostas sobre o eixo e torção decorrente da transmissão de potência do sistema. Nessas circunstâncias, as tensões atuantes não podem ser simplesmente somadas ou subtraídas diretamente, até porque se contemplam, em muitas situações, tipos de tensões diferenciadas (normal e tangencial, por exemplo). Torna-se necessário assim efetivar a combinação das tensões atuantes, sendo o círculo de Mohr uma boa referência gráfica para a visualização dessa combinação de tensões. Figura 11 – Exemplo de combinação de tensões mediante o Círculo de Mohr Fonte: Gere; Goodno, 2017. 12 Pela análise da figura anterior, é possível observar que o círculo gerado a partir da combinação das tensões originais corta o eixo horizontal (eixo das tensões normais) em dois pontos distintos (e ), respectivamente. Essas tensões, assim designadas, correspondem às chamadas tensões principais. Tais tensões correspondem à máxima e mínima tensões normais atuantes sobre o elemento solicitado. Matematicamente, tem-se: Da mesma forma, através da figura, é possível destacar o raio do referido círculo gerado, o qual corresponde à tensão tangencial máxima atuante sobre o elemento submetido ao carregamento combinado. Matematicamente: De posse das tensões principais e da tensão tangencial máxima, o projeto poderá ser finalizado a partir de um critério de falha correspondente. Na prática, existem alguns critérios de falha específicos e válidos para materiais dúcteis ou para materiais frágeis. No presente estudo, daremos ênfase para o critério da máxima energia de distorção, ou critério de Von Mises, o qual é válido para materiais dúcteis e comumente aplicado nos projetos de componentes mecânicos em geral. A premissa do referido critério é identificar uma tensão equivalente (eq), em função das tensões principais, e na sequência compará-lo com o limite de escoamento do material em análise. Matematicamente: Onde: eq= tensão equivalente de Von Mises = tensões principais esc= limite de escoamento do material 5.1 CS = coeficiente de segurança O coeficiente de segurança ou fator de projeto corresponde a uma garantia adicional que o projetista contemplará, a seu critério, no projeto desenvolvido. Via de regra, não existe uma normatização para esse parâmetro 13 em termos de valores numéricos, devendo estar o projetista envolvido ciente dessa condição e atento para o fato de que a escolha desse parâmetro poderá afetar de forma bastante significativa os resultados finais obtidos. Coeficientes de segurança elevados, apesar de representarem uma maior margem de segurança, exigirão peças ou componentes com dimensões às vezes exageradas, caracterizando uma desvantagem em termos de custos, peso agregado e desperdícios. Por outro lado, coeficientes de segurança muito pequenos (próximos da unidade) poderão ocasionar problemas do contexto de eventuais sobrecargas que possam vir a atuar ou surgir no sistema em análise, caracterizando em algumas circunstâncias a própria falha do sistema. Dessa forma, torna-se evidente que a escolha de um fator de projeto adequado é uma tarefa que exige, muitas vezes, experiência e bom senso. Na prática, para materiais dúcteis, encontram-se uma boa variedade de projetos que contemplam coeficientes de segurança compreendidos entre os limites de 2 a 5. FINALIZANDO Finalizando, em nossa aula, vimos, em forma de revisão, os esforços clássicos e fundamentais presentes em todos os sistemas e componentes mecânicos existentes e disponíveis na prática. Discutiu-se também a conceituação de esforços combinados e o critério de falha convencionalmente utilizado para o projeto ou verificação de um determinado sistema. Após esta aula, você será capaz de reconhecer e identificar esses carregamentos em sistemas mecânicos gerais, como também avaliar os parâmetros de projeto envolvidos em termos do material selecionado, das dimensões finais adotadas e até mesmo do coeficiente de segurança considerado. 14 REFERÊNCIAS BEER, F. P.; JOHNSTON JR, E. R. Resistência dos materiais. São Paulo: MacGraw Hill, 1982. BEER, F. P., JOHNSTON JR, E. R., DEWOLF, J. T., MAZUREK, D. F. Mecânica dos materiais. São Paulo: MacGraw Hill, 2015. GERE, J. GOODNO, B. Mecânica dos materiais. Cengage Learning, 2017. HIBBELER, R. C. Resistência dos materiais. São Paulo: Prentice Hall, 2009. MOTT, R. Elementos de máquinas em projetos mecânicos. São Paulo: Pearson, 2005.
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