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Jevons - A teoria da economia política (Cópia em conflito de Mateus Carneiro 2014-03-01)

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OS ECONOMISTAS
W. STANLEY J EVONS
A TEORIA DA
ECONOMIA P OLÍTICA
T radução de Cláudia Laversveiler de Mora is
Fundador
VICTOR CIVITA
(1907-1990)
Editora Nova Cultura l Ltda .
Copyr igh t desta edição 1996, Círcu lo do Livro Ltda .
Rua Paes Leme, 524 - 10º andar
CEP 05424-010 - São Paulo - SP.
Títu lo or igina l: T he T heory of Political Econom y
Direitos exclusivos sobre a Apresentação de au tor ia de
André Marques Rebelo, Editora Nova Cultura l Ltda ., São Paulo.
Direitos exclusivos sobre as t raduções deste volume:
Círcu lo do Livro Ltda .
Impressão e acabamento:
DONNELLEY COCHRANE GRÁFICA E EDITORA BRASIL LTDA.
DIVISÃO CÍRCULO - FONE: (55 11) 4191-4633
ISBN 85-351-0832-7
AP RESENTAÇÃO
André Marques R ebelo
J e von s: Um dos Art ífice s da Re volu ção Margin alis ta
William Stanley J evons nasceu em Liverpool, Inglaterra, em 1835,
e inicialmente estudou física e matemá t ica. Entre os anos de 1854 e 1857
morou em Sidney, na Austrá lia. Retornando à Inglaterra, passou a estudar
filosofia e moral, posteriormente ensinou lógica e economia em Manchester
(1863-76), período em que publicou a primeira edição da presente obra.
Por fim, foi professor de economia na London University College (1876-81).
Morreu em 1882, na cidade de Bexhill, Inglaterra.
A vida de J evon s coin cide t em pora lm en te com a er a dour ada
de cr escim en to econ ôm ico do sécu lo XIX, qu e cobre o per íodo 1840-81.
Nessa época , a econ om ia m un dia l a presen tou u m a for t e expan são,
devido pr in cipa lm en te à s fer r ovia s, cu jos invest im entos gerava m im -
pu lsos dinâ m icos de em prego e renda , e o fu nciona m en to dim inu ía
os custos de t r an spor t e, u n ifican do m erca dos e r eorgan izan do espa -
cia lm en te a p roduçã o.
À época de J evons, a economia já era um campo de conhecimento
defin ido, estando sedimentadas as obras dos clássicos Adam Smith ,
David Ricardo e J ohn Stuar t Mill.
Cabe ressa lta r , no en tan to, que no per íodo em questão a comu-
nicação en t re os pensadores econômicos não flu ía tão bem quanto as
mercador ias, t an to que o conceito de “ut ilidade margina l decrescente”,
cerne da revolução margina lista , fora desenvolvido independentemente
por t rês au tores dist in tos: J evons, Menger e Walras, sem que um t ivesse
conhecimento da obra do out ro.
J evons publicou sua obra em 1871, embora tenha apresen tado
versões preliminares de sua teor ia em duas ocasiões: a pr imeira na
forma de um comunicado exposto na Br it ish Associa t ion , em Cambr idge
(1862); e como um rela tór io para a Sta t ist ica l Society of London (1866).
Ambas sem maiores repercussões.
Menger publicou seus Princípios de Econom ia Política no mesmo
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ano da obra de J evons, e Walras publicou Princípios de Econom ia Pura
em 1873. Ademais, como pode ser visto no prefácio de J evons à segunda
edição da presen te obra (p.14), foi muito difícil encont ra r a obra de
Gossen , na qua l existe uma forma embr ioná r ia de u t ilidade margina l
decrescente. Este fa to ilust ra a necessidade da compilação bibliográ fica
feita por J evons em apêndice no fina l do livro.
Te orias do valor e a re volu ção m argin alis ta
Preocupações com o tema do va lor sempre est iveram presentes
na obra dos precursores da economia . Qual a explicação para o va lor
das mercador ias, ou “o que determina a taxa de t roca en t re duas mer-
cador ias?” Mais concretamente, “por que um quilo de t r igo é t rocado
por t rês qu ilos de a r roz, ou por uma dúzia de maçãs?”
A in terpretação da obra de Adam Smith , A R iqueza das N ações ,
gerou duas explicações para a pergunta acima, ou seja , podem-se en-
cont ra r nesta obra duas teor ias do va lor : va lor t raba lho e va lor de uso
ou u t ilidade.
A teor ia do va lor t raba lho diz que a taxa de t roca en t re duas
mercador ias é explicada pela razão en t re as quant idades de t raba lho
incorporadas em cada uma delas. Neste sen t ido, t a l t eor ia const itu i
uma invest igação acerca dos custos de produção, revelando as ligações
ent re preços, produção e dist r ibu ição. Esta linha de pensamento é se-
guida por David Ricardo e, poster iormente, por Kar l Marx.
Por ou t ro lado, a t eor ia do va lor de uso, que Smith rest r ingiu à
explicação dos preços de mercado (o que hoje chamar íamos de preços
no cur to prazo), enfocava os aspectos da demanda e escassez, com base
na subjet ividade do agente econômico. Este caminho foi seguido pr in-
cipa lmente por Senior , Say e Bentham.
Como contra-exemplo para a teoria do valor de uso, o próprio Smith
apresenta o paradoxo da água e do diamante: se o que define o valor de
troca das mercadorias é seu valor de uso, como se explicar a relação entre
a água e o diamante? A primeira é um dos bens mais ú teis à humanidade,
enquanto o segundo tem uso extremamente restrito, e, no entanto, o dia-
mante possui enorme valor de troca e a água nenhum.
A chave deste enigma está no conceito que J evons chamou de “grau
final de ut ilidade”, o que hoje denominamos “utilidade marginal”. A re-
volução marginalista foi a retomada da teoria do valor ut ilidade, com o
emprego de conceitos matemá t icos de cá lculo diferencial. Para melhor
entendimento, reconstruiremos a argumentação de J evons, o que torna
necessário o desenvolvimento de alguns conceitos do universo do autor.
Mé todo e m ate m á t ica n a e con om ia
Um a da s pa ssagen s m a is cit a da s de J evons, n ão sem r azão,
é um t r ech o do prefácio à segun da ed içã o, no qu a l ele diz qu e o
OS ECONOMISTAS
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in tu ito de sua obra é a proposição da “mecânica do in teresse individua l
e da u t ilidade” (p. 7).
Com o termo mecânica , o au tor está fazendo uma a lusão aos
progressos obt idos na física a par t ir da aplicação do cá lcu lo newtoniano.
O objet ivo de J evons será en tão o de aplica r o cá lcu lo diferencia l para
ext ra ir explicações para a ciência econômica . Seu pensamento a respeito
do uso deste método em economia pode ser facilmente visto no seu
comentá r io à obra de Cournot :
“...apresen ta um belo exemplo de raciocínio matemá t ico, no
qua l o conhecimento é aparen temente ext ra ído da ignorância .
Na rea lidade, o método consiste em assumir cer tas condições sim-
ples das funções enquanto conformes com a exper iência e en tão
revela r , median te a in ferência simbólica , os resu ltados implícitos
dessas condições”. (p. 13.)
Neste elogio a Cournot , pode ser en tendido todo o método da
obra de J evons, método este que será defin it ivamente incorporado à
economia neoclássica , preva lecendo a té hoje na chamada cor ren te pr in-
cipa l (m ainstream ) do pensamento econômico.1
J evons a ler ta para os “defeitos ineren tes à gramá t ica e ao léxico
para explicar relações complicadas”, conclu indo:
“Os símbolos dos livros matemá t icos não diferem em essência
da linguagem; formam um per feito sistema de linguagem, adap-
tados de conceitos e relações que precisamos expressar . Não cons-
t ituem o modo de raciocínio que corpor ificam; apenas facilit am
sua exposição e compreensão. Se, por tan to, em Economia , t emos
que lidar com quant idades e suas complicadas relações, devemos
raciocinar matemat icamente; não tornamos a ciência menos ma-
temá t ica ao evita r os símbolos de á lgebra — simplesmente nos
recusamos a empregar , numa ciência muito imperfeita , que ne-
cessita de todo t ipo de auxílio, aquele apara to de sina is adequados
comprovadamente indispensáveis em out ras ciências”. (p. 31.)
Ou seja , o au tor vê a matemá t ica não como um fim em si mesma,
mas apenas como uma linguagem mais precisa , por tan to super ior , e
que deve ser t ambém ut ilizada
na economia .
A te oria da u tilidade
J evons par te dos conceitos u t ilit a r istas desenvolvidos por Bent -
ham, en t re ou t ros au tores, segundo os qua is toda ação dos indivíduos
é precedida de uma aná lise prazer versus sofr imento. Se a ação implicar
J EVONS
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1 Ver , por exemplo, Fr iedman, M. (1953), The Methodology of Posit ive Economics, in Essays
in Positive Econom ics, Chicago, The University of Chicago Press.
mais prazer que sofr imento, en tão ter -se-á boa vontade do indivíduo
na consecução da ação; caso cont rá r io, a pessoa terá má disposição
para ela . Ou seja , as pessoas agem de forma ta l a obter o máximo de
prazer com o m ínimo de sofr imento.
As dimensões do prazer ser iam in tensidade e duração. Mant ida
constan te a segunda , uma elevação da in tensidade aumentar ia o prazer .
E se a in tensidade for mant ida constan te, uma ampliação da duração
aumentar ia o prazer .2 O sofr imento ser ia o oposto matemá t ico do prazer
e ter ia também as mesmas dimensões.
Assim, conclu i:
“As par tes mais impor tan tes da teor ia gira rão em torno da
igua ldade precisa , independentemente do sina l, do prazer der i-
vado da posse de um objeto e do sofr imento com que a lguém se
depara na sua aquisição”. (p. 43.)
Para J evons, a u t ilidade é a qua lidade de um objeto, serviço ou
ação que o torna capaz de dar prazer aos indivíduos, ou a fasta r o
sofr imento. Esta qua lidade é circunstancia l, isto é, não é ineren te aos
objetos. Além disso, não é proporciona l à quant idade dispon ível, pois
var ia de acordo com a disponibilidade prévia dos bens. De forma si-
met r icamente oposta , a desu t ilidade é defin ida como qua lidade de cau-
sar sofr imento.
Se o indivíduo deve comparar u t ilidade e desu t ilidade dos objetos,
serviços ou ações, a pr imeira dúvida que surge é r ela t iva à un idade
de medida . J evons t inha consciência deste problema, mas a rgumenta
que não é necessá r io ter -se a medida da u t ilidade para t raba lhá -la
teor icamente. Lançando mão de um exemplo da física , lembra que mui-
tos progressos teór icos a respeito da cor ren te elét r ica foram feitos an tes
mesmo de se poder medir cor ren tes e tensão elét r icas. Caso os físicos
t ivessem esperado a possibilidade de medição exa ta para depois teo-
r iza r , provavelmente não se ter ia chegado a lugar a lgum.
Novamente, para defender sua teor ia J evons se u t iliza de ou t ro
exemplo físico, a rgumentando que assim como a gravidade pode ser
medida a par t ir de seu efeito sobre o movimento de um pêndulo, pode-se
est imar a igua ldade e desigua ldade dos sen t imentos de u t ilidade e
desu t ilidade a par t ir das decisões da mente humana .
O problema da mensuração da u t ilidade permanecerá sem reso-
lução a té meados do presen te século, quando da publicação de Valor
OS ECONOMISTAS
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2 É in teressan te nota r a est ru tura matemá t ica desta a rgumentação. O prazer ser ia como
uma função: P = f (i, d), onde P = prazer
 i = in tensidade
 d = du ração
e as der ivadas parcia is em relação aos dois a rgumentos ter iam sina is posit ivos.
e Capital de Hicks, onde é abandonada a abordagem cardina l da u t i-
lidade e proposta a abordagem ordina l.
Utilidade m argin al de cre sce n te
A Lei da Var iação da Ut ilidade enunciada por J evons nada mais
é que a defin ição do que os economistas chamam a tua lmente de uma
função u t ilidade côncava . Ou seja , a u t ilidade é uma função crescente
da quant idade consumida de um determinado bem: à medida que se
aumenta a quant idade do bem, aumenta-se a u t ilidade. Porém, este
acréscimo é cada vez menor . A este acréscimo declinante o au tor chamou
grau fina l de u t ilidade, que ser ia o ganho de u t ilidade associado ao
incremento da ú lt ima porção consumida do bem.
J evons ilust ra como o pr incípio da igua ldade margina l funciona
para o caso de um único bem com dois usos dist in tos. A maest r ia da
argumentação reside no fa to de apresen ta r o conceito a t ravés de um
único bem, o que o torna cr ista lino.
Imagine um bem com dois usos dist in tos: uso 1 e uso 2. Suponha
que a u t ilidade margina l do uso 1 seja super ior à do uso 2. Então, se
diminuirmos o uso 2 e aumentarmos o uso 1, t eremos um ganho na
ut ilidade tota l.
Ora , se existe possibilidade de aumento de u t ilidade tota l, esta
será aproveitada , pois as pessoas desejam a máxima u t ilidade. Sendo
a u t ilidade margina l decrescente com a quant idade, à medida que se
diminui a quant idade a locada no uso 2 e aumenta-se a do uso 1, a
u t ilidade margina l do uso 2 aumentará e a do uso 1 diminuirá , a té
que se a t in ja a igua ldade en t re ambas. Neste ponto, acaba a possibi-
lidade de ganhos de u t ilidade advindos da rea locação do bem nos di-
feren tes usos.
Veja a situação exposta por J evons:
“Numa cidade sit iada , revoluciona-se o emprego dos a r t igos.
Coisas de grande u t ilidade são usadas sem dó pa ra propósitos
inusitados. Em Par is, um grande número de cava los foi comido,
não porque eles fossem inú t eis para ou t ros fins, mas porque eram
mais necessá r ios como a limento. Como efeito, determinada porção
dos cava los teve de ser mant ida como meio necessá r io de loco-
moção, de forma que a equação da u t ilidade nunca deixou de se
aplicar in teiramente”. (p. 57.)
 Em situações de normalidade, a u t ilidade margina l de se comer
carne eqü ina é muito menor do que a desu t ilidade de se perder um
cava lo como meio de locomoção. Em época de guer ra , como o a limento
é escasso, a u t ilidade margina l da carne se eleva a ponto de ser van-
ta joso abr ir mão de par te dos meios de locomoção para sa t isfazer um
necessidade pr imá r ia . Abre-se mão dos cava los a té o ponto em que a
J EVONS
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perda de u t ilidade associada à diminuição de meios de t ranspor te se
igua la ao ganho adiciona l de u t ilidade do aumento de comida .
Uma vez descr ito este pr incípio, a genera lização para o caso de
dois ou mais bens dist in tos é au tomá t ica , e J evons o fa rá na teor ia
da t roca .
Te oria da troca
J evons enuncia o pr incípio da teor ia da t roca : “A relação de t roca
de dois bens qua isquer será cor respondente à r elação dos graus fina is
de u t ilidade das quant idades dos bens dispon íveis para consumo depois
que a t roca se completa .” Em out ras pa lavras, um indivíduo t rocará
suas mercador ias a té o ponto em que as u t ilidades margina is do con-
sumo de cada mercador ia se igua lem. Caso cont rá r io, ele poderá abr ir
mão da mercador ia que tem u t ilidade margina l menor e t rocá -la por
uma que lhe confere maior u t ilidade adiciona l, de ta l forma a aumentar
sua u t ilidade tota l. Ao propor a equa lização da u t ilidade margina l do
uso de todos os bens, o sistema de preços passa a ter o papel funda-
menta l na a locação dos recursos.
Com pr eendido o m ecan ism o da t roca , podem os r et om a r o pa -
r a doxo á gua versu s dia m an te, exam ina ndo-o a gora à lu z dest a t eor ia .
Na s comu nida des onde exist e abast ecimen to su ficien t e, a águ a pos-
su i va lor de t roca nu lo, de t a l for m a que su a u t ilidade m a rgin a l,
ou seja , o au m en to na u t ilidade tot a l devido a o a um ent o de u m
pequ en a porçã o de águ a é qu ase n u lo. J á o diam a nt e, devido à sua
escassez, possu i u t ilidade m argina l a lt a , e, por t a n to, possu i um gr an -
de va lor de t roca .
Com esta exposição, está apresen tada a “mecânica” das decisões
individua is, ou seja , está formulada a regra gera l que J evons se pro-
pusera . Nos tópicos seguin tes, veremos
como esta regra gera l explica
out ros aspectos da rea lidade econômica , a saber , o t raba lho, a renda
e o capita l.
* * *
Trabalh o
A aplicação dos conceitos margina is ao t raba lho nos diz que a
u t ilidade tota l do t raba lho é crescente, porém este crescimento se dá
a taxas decrescentes. Por ou t ro lado, a desu t ilidade margina l do t ra -
ba lho, embora decrescente para as pr imeiras horas t raba lhadas, será
crescente à medida que a jornada se estender demasiadamente. O in-
divíduo irá t r aba lhar a té o ponto em que a u t ilidade margina l do pro-
duto do t raba lho (aquele ganho de u t ilidade associada à ú lt ima unidade
e tempo t raba lhado) for igua l em módulo à desu t ilidade margina l do
t raba lho desta mesma unidade de tempo. O que leva J evons a a firmar :
OS ECONOMISTAS
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“Deve-se considerar que um homem ganha duran te todas as
horas de t raba lho um excesso de u t ilidade; o que ele produz não
deve ser considerado apenas o equiva len te exa to do t raba lho que
ele faz por isso, pois nesse caso ser ia uma questão de indiferença
se ele t raba lha ou não. Enquanto ganha , ele t raba lha , e quando
pá ra de ganhar , cessa de t raba lhar”. (p. 113.)
Re n da da te rra
Em relação à r enda da ter ra , a t eor ia de J evons não apresenta
novidades; como diz o própr io au tor , a mesma se assemelha com a
teor ia que vinha sendo desenvolvida an ter iormente pelos teór icos in -
gleses havia quase um século. Porém, é justamente este o ponto for te:
most ra r a já t radiciona l renda da ter ra , a par t ir dos pr incípios gera is
delineados an ter iormente.
Mant ido fixo o estoque de ter ra , quando se aumenta o número
de t raba lhadores nessa ter ra , aumenta-se a produção, porém este acrés-
cimo se dá a t axas decrescentes, ou seja , a produt ividade margina l da
ter ra é decrescente. O ú lt imo acréscimo é o menos produt ivo e somente
será u t ilizado se o ganho de produção adiciona l for suficien te para
cobr ir os custos (neste caso simplificado, somente o sa lá r io). Desta for -
ma, toda produção an ter ior gerou a lgum excedente, que é justamente
a renda da ter ra .
Capita l e ju ros
J evons in icia lmente define o capita l como o conjunto de bens
ut ilizados para facilit a r a produção, pois possibilit a aos agentes eco-
nômicos despenderem t raba lho an tecipadamente. Novamente, define
uma condição margina l, na qua l os agentes aplica rão recursos em in-
vest imentos a té o ponto em que o acréscimo de produção (benefício
margina l do capita l) for igua l ao custo deste capita l adiciona l.
 Neste sen t ido, o au tor define a igua ldade en t re o benefício mar-
gina l do capita l e a t axa de ju ros. É impor tan te ressa lta r que a taxa
de juros é igua l ao ganho de produção associado à ú lt ima unidade de
capita l u t ilizada na produção, e não ao retorno tota l do capita l. Assim,
pa íses com pouco capita l t erão um benefício margina l do capita l mais
elevado e, por tan to, apresen ta rão taxas de ju ros super iores.
Com e n tário fin al
A T eoria da Econom ia Política, de J evons, const itu i um divisor
de águas na h istór ia do pensamento econômico. A expressão “revolução
margina lista” não en t rou na h istór ia gra tu itamente; na verdade, a obra
de J evons foi o prenúncio da economia do século XX, nas pa lavras de
Keynes, citado por Dobb (1977):
J EVONS
11
“A apt idão de J evons para expor as suas idéias, para as a t ira r
para o mundo, gran jeou-lhe a sua grande posição pessoa l e a sua
incontestada capacidade para est imular ou t ras mentes. Cada uma
das cont r ibu ições de J evons para a economia foi como que um
panfleto”. (p. 239.)
An dré Marqu e s Re be lo
An dré Marqu e s Re be lo é econo-
mista formado pela FEA-USP, mes-
t rando em economia na FGV-SP e
professor de Teor ia Econômica na
Universidade Mackenzie, São Paulo.
OS ECONOMISTAS
12
BIBLIOGRAFIA
AMOROSO, L. (1947) “In t roduzione” in T eoria dell’Econom ia Politica
ed altri scritti econom ici. Tor ino, Unione Tipografica — Edit r ice
Tor inese.
DOBB, M. (1977) T eorias do Valor e Distribu ição desde Adam S m ith .
Lisboa , Presença .
HUNT, E . K. (1984) História do Pensam ento Econôm ico — Um a Pers-
pectiva Crítica. Rio de J aneiro, Campus.
J EVONS, WILLIAM STANLEY. (1987) A T eoria da Econom ia Política .
São Paulo, Nova Cultura l, 2a . Edição.
SCHUMPETER, J . A. (1968) Fundam entos do Pensam ento Econôm ico.
Rio de J aneiro, Zahar .
SMITH, A. (1985) A R iqueza das N ações. São Paulo, Nova Cultura l,
2a . Edição.
13
P REFÁCIO DA P RIMEIRA EDIÇÃO
(1871)
D ificilm en te poderá o con t eú do da s página s seguin t es a lcan ça r
aceit ação im edia t a daqueles qu e ju lgam t er já a ciên cia da E conom ia
P olít ica a t ingido um a form a qu ase per feit a . Acredit o ser gera l a
suposição de qu e Ada m Sm it h est abeleceu os fu ndam entos dessa
ciên cia ; que Ma lt hu s, Anderson e Sen ior acrescen ta r am im por ta n tes
t eor ias; qu e Rica rdo sist em a t izou o con jun to; e, fin a lm en te, qu e J .
S. Mill com pletou os det a lh es e desen volveu plena m en te esse r am o
do con hecim en to. P a rece que Mill a dot ava u m a opin iã o sem elha n te,
pois a firm a va cla ra m en te que n ão ha via n ada na s Leis do Va lor
qu e t ivesse ficado por escla recer , por ele, ou por qua lquer fu t uro
au tor . Sem dúvida , é difícil deixa r de supor que op in iões a ceit a s e
r a t ifica das por h om ens t ão em inentes t enh am gran de probabilidade
em seu favor . Cont udo, na s ou t r as ciên cias nã o se perm it iu que
esse peso da a u tor idade r est r ingisse o livre exa m e de novas idé ia s
e t eor ias; e, com fr eqü ên cia , ficou prova do qu e, n o fin a l da s con ta s,
a au tor ida de est ava no la do er r ado.
Muitas par tes da dout r ina econômica me parecem tão cien t íficas
na forma quanto estão em conformidade com os fa tos. Mencionar ia
especia lmente as Teor ias da População e da Renda , sendo esta ú lt ima
uma teor ia de cará t er eminentemente matemá t ico, que parece fornecer
a chave para a maneira cor reta de t ra ta r o conjunto da ciência . Tivesse
Mill se conten tado em afirmar a verdade inquest ionável das Leis da
Ofer ta e da Procura e eu ter ia concordado com ele. Como estão apoiadas
em fa tos, essas leis não podem ser aba ladas por nenhuma teor ia ; mas
não segue, por isso, que nosso conceito de Valor é per feito e defin it ivo.
Out ras dout r inas gera lmente aceitas têm-me parecido sempre ilusór ias,
especia lmente a assim chamada Teor ia do Fundo de Sa lá r ios. Essa
teor ia aparen ta fornecer uma solução para o pr incipa l problema da
ciência — determinar os sa lá r ios do t raba lho; contudo, num exame
mais minucioso descobre-se que sua conclusão não passa de mero t ru ís-
mo, qua l seja , que a taxa média de sa lá r io é encont rada pela divisão
15
do montan te tota l dest inado ao pagamento dos sa lá r ios pelo número
daqueles en t re os qua is esse montan te é dividido. Algumas out ras pre-
tensas conclusões da ciência têm cará t er menos inofensivo, como, por
exemplo, aquelas concernentes à van tagem da t roca (ver a seção sobre
“O Ganho pela Troca”, p. 95).
Nest e t r a ba lh o, t en t ei t r a t a r a E conom ia com o u m cá lcu lo do
pra zer e do sofr im ent o,3 e esbocei, qu ase sem consider a r opin iões
an ter iores, a form a qu e a ciên cia , t a l qu a l ela me pa rece, deve enfim
tom ar . H á m uito pen so qu e ela , por lida r perm an en tem en te com
qu an t idades, deve ser u m a ciên cia m a tem á t ica no con t eú do, se n ão
na lingua gem . P rocurei ch ega r a conceit os qu an t
it a t ivos precisos
sobre Ut ilida de, Va lor , Tra ba lh o, Ca pit a l et c., e com freqü ên cia m e
sur preen di ao descobr ir quã o cla ram ent e a lgun s dos con ceitos m ais
difíceis, especia lm en te o con ceito m ais in t r in cado, o de Valor, ad-
m it em a ná lise e expressã o m a tem á t ica s. A Teor ia da E conom ia , t r a -
t a da dessa form a , su gere u m a est r eit a a na logia com a ciên cia da
Mecân ica E stá t ica , e ver ifica -se que a s Leis de Tr oca se assem elha m
às Leis do Equilíbr io de u m a a lava nca , det erm ina das sob o p r in cípio
da s velocidades vir t u a is. A n a tu r eza da Riqueza e do Va lor exp lica -se
por meio da con sidera ção de m in úscu la s qua n t ida des de p razer e
sofr im ento, a ssim com o a Teor ia da E stá t ica é feit a de forma a
sust en t a r -se n a igu a lda de de indefin idam ente pequena s qu an t idades
de en er gia . Mas creio qu e podem a in da ser desenvolvidos ou t ros
ra m os d in âm icos da ciência da E con om ia sobre os qu a is nã o t eci,
em absolu to, n en hu m a con sidera ção.
Leitores de matemá t ica podem ta lvez pensar que expliquei com
desnecessá r ia prolixidade a lguns conceitos elementares, como, por
exemplo, aquele do Grau de Ut ilidade. Mas ouso a t r ibu ir as a tua is
dificu ldades e imperfeições da ciência à negligência dos economistas
em obter conceitos cla ros e precisos de quant idade e grau de u t ilidade;
e de caso pensado eu me det ive exaust ivamente sobre esse ponto. Out ros
leitores pensarão, t a lvez, que a in t rodução ocasiona l de símbolos ma-
temá t icos obscurece o assunto em vez de escla recê-lo. Mas devo pedir
a a tenção de todos os leitores para o seguin te fa to: visto que os ma-
temá t icos e os economistas polít icos formaram, a té o momento, duas
ca tegor ias por assim dizer diferen tes de pessoas, torna-se ext rema-
mente difícil preparar um t raba lho matemá t ico em Economia acerca
do qua l ambas as ca tegor ias de leitores não tenham nenhum t ipo de
reclamação.
OS ECONOMISTAS
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3 A pa lavra inglesa pain pode ser t raduzida como dor , sofr imento, pesar , desgosto, pena .
Prefer imos t raduzi-la , no contexto de J evons, por sofrim ento, porque, a lém de expressar
oposição a prazer, t em acepção mais abrangente do que dor, por exemplo, permit indo inclu ir
pequenas var iações subjet ivas que não passam de desconfor to, incômodo, esforço desagra-
dável etc. Dessa maneira , o termo sofr imento é mais adequado à concepção margina lista ,
que opera precisamente com as var iações, por menores que sejam. (N. do E .)
É muito provável que eu tenha incor r ido em er ros de maior ou
menor impor tância , os qua is gosta r ia que fossem apontados; e quero
adian ta r que a pr incipa l dificu ldade de toda a teor ia aparece na seção
do capítu lo IV sobre a “Relação de Troca”, começando na p. 91 (aquela
sobre a “Lei da Indiferença”, p. 72 desta edição). Um excelen te mate-
má t ico, o meu amigo Prof. Barkler , do Owens College, t eve a gent ileza
de examinar cu idadosamente a lgumas das provas t ipográ ficas; mas ele
não deve, por isso, ser considerado responsável pela exa t idão de ne-
nhuma par te deste t raba lho.
Minha enumeração das ten ta t ivas an ter iores de aplica r lingua-
gem matemá t ica à Economia Polít ica não pretende ser completa nem
mesmo em relação aos au tores ingleses; e confesso que esqueci de men-
cionar um notável opúscu lo, S obre a Moeda, publicado anonimamente
em 1840 (Londres, Char les Knight and Co.), no qua l se empreende
uma aná lise matemá t ica das operações do Mercado de Moeda . O método
de t ra tamento não difere do adotado pelo Dr . Whewell, a cu jo ensa io
se faz uma referência ; mas são in t roduzidas pequenas ou ocasiona l-
mente in fin itesimais diferenças. Não formei uma opin ião sobre o êxito
dessa teor ia anônima; mas o tema é um dos que devem ser resolvidos
median te a aná lise matemá t ica . Garn ier , em seu t ra tado sobre Eco-
nomia Polít ica , menciona vá r ios matemá t icos do cont inente que escre-
veram sobre o tema da Economia Polít ica ; mas eu não fu i nem mesmo
capaz de descobr ir os t ítu los de seus ensa ios.
J EVONS
17
P REFÁCIO DA SEGUNDA EDIÇÃO
(1879)
Ao preparar esta segunda edição, a lgumas novas seções foram
acrescentadas, das qua is as mais impor tan tes são aquelas que t ra tam
das dim ensões das quantidades econôm icas (p. 57-61, 69, 114, 142-143).
O tema, na tura lmente, serve de base para todo pensamento cor reto
sobre ciência econômica . Não pode causar surpresa o fa to de inúmeros
deba tes terminarem em logomaquia , visto ser a inda incer to quantos
sign ificados tem a pa lavra Valor, ou mesmo que t ipo de quant idade é
a Utilidade. Imagine a situação in telectua l dos ast rônomos se não pu-
dessem chegar a um acordo sobre o seguin te: Ascensão reta é o nome
de um corpo celeste ou de uma força ou de uma magnitude angula r .
Contudo, isso não ser ia pior do que não conseguir determinar com
exat idão se por va lor queremos expr imir uma relação numér ica ou um
estado menta l ou um volume de mercador ias. J ohn Stuar t Mill reco-
nhece explicitamente4 que “o va lor de um objeto sign ifica a quant idade
de a lgum out ro objeto, ou de objetos em gera l, pelos qua is ele pode
ser t rocado”. Na tura lmente, poder -se-ia explicar que Mill não tencionou
dizer isso; mas, da forma em que é colocada , a preposição t ransforma
o va lor numa coisa , e é tão filosófica quanto a lguém dizer : “Ascensão
reta sign ifica o planeta Mar te, ou os planetas em gera l”.
Essas seções sobre as dimensões das quant idades econômicas me
causaram grande perplexidade, especia lmente no tocante à r elação en-
t re u t ilidade e tempo (p. 58-60). A teor ia do Capita l e do J uro também
envolve a lgumas su t ilezas. Espero que, de maneira gera l, minhas res-
postas para as questões levantadas sejam consideradas cor retas; mas,
onde não resolvem uma questão, às vezes poderão suger ir uma solução
que out ros au tores hão de desenvolver . Um cor respondente, Capitão
Char les Chr ist ie, R. E ., a quem most rei essas seções após terem sido
19
4 Principles of Political Econom y. Livro Terceiro. Cap. VI, seção 1. Essa defin ição está no
in ício de um sumá r io cu idadosamente preparado sobre os pr incípios da teor ia do va lor .
impressas, objeta com suficien te justeza que mercador ia não dever ia
ter sido represen tada por M, ou Massa , mas por a lgum símbolo, por
exemplo Q, o qua l inclu ir ia quant idade de espaço, ou de tempo ou
força , de fa to qua lquer t ipo de quant idade. Serviços freqüentemente
envolvem tempo ou força aplicada ou espaço percor r ido, assim como
massa . Concordo in teiramente com essa objeção e devo pedir ao leitor
que in terprete M em sen t ido mais amplo do que lhe é dado na p. 58,
ou , de ou t ro modo, que menta lmente subst itua M por ou t ro símbolo.
Ao tratar das dimensões dos juros, indico o fato curioso de que um
matemá tico tão perspicaz como o falecido Deão Peacock perdeu-se total-
mente no tema (p. 149-150). Outras seções novas são aquelas nas quais
incluo a noção de valor negativo e de valor aproximadamente nulo, mos-
trando que o valor negativo pode ser representado sob a forma das equações
de troca, sem nenhuma modificação importante. Leitores das obras de
Macleod estão, sem dúvida, familiarizados com a noção de valor negativo;
contudo, julguei oportuno mostrar quão importante ele é realmente e
quão naturalmente se enquadra nos princípios da teoria. Devo chamar a
atenção também para a seção (p. 77-79) na qual ilustro o cará ter mate-
má t ico das equações de troca ao esboçar uma analogia precisa entre estas
e as equações aplicáveis ao equilíbrio da alavanca.
Alguns cor
respondentes, especia lmente Herr Harold Wester -
gaard, de Copenhague, ressa lta ram que uma pequena manipulação
dos símbolos, de acordo com as regras elementares do Cá lcu lo Dife-
rencia l, fornecer ia muitas vezes os resu ltados que discu t i exaust iva-
mente. Todo problema consiste na determinação de máximos e m ínimos,
as condições matemá t icas tão familia res aos matemá t icos. Todavia ,
mesmo se eu fosse capaz de apresen ta r o tema num est ilo conciso e
simbólico, adequado ao gosto de um exper imentado matemá t ico, pre-
fer ir ia , num ensa io desse t ipo, obter meus resu ltados median te uma
seqüência de a rgumentos que não são apenas fundamenta lmente ver -
dadeiros, mas também cla ros e convincentes para muitos leitores que,
como eu , não são matemá t icos eruditos e profissiona is. Em suma, não
escrevo para matemá t icos, nem tampouco como matemá t ico, mas como
um economista que deseja convencer ou t ros economistas de que sua
ciência só pode ser t ra tada de forma sa t isfa tór ia numa base explicita -
mente matemá t ica . Quando os matemá t icos reconhecerem o tema como
algo com que podem proveitosamente lidar , deixá -lo-ei com sa t isfação
em suas mãos. Em mais de uma passagem, expr imi um pressen t imento
de que toda a teor ia poder ia , provavelmente, ser expressa de maneira
mais gera l, tomando o t raba lho como uma u t ilidade nega t iva , colocan-
do-o assim sob as equações ordiná r ias de t roca . Mas é, de fa to, uma
tarefa in terminável para um economista a de desenvolver e aper feiçoar
sua ciência , e achei necessá r io reedita r este ensa io, como dizem os
bibliopolas, “com todas as fa lhas”. Ent retan to, revisei cu idadosamente
cada página do livro, e t enho mot ivos para esperar que ra ro ou nenhum
OS ECONOMISTAS
20
er ro sign ifica t ivo remanesça nas teor ias expostas. As fa lhas estão na
forma, an tes que no conteúdo.
Ent re as a lterações secundá r ias, devo mencionar a subst itu ição
do nome Economia Polít ica pelo termo simples e convenien te de Eco-
nom ia. Não posso deixar de pensar que ser ia bom desfazer -se, o mais
rapidamente possível, do obsoleto nome composto e problemá t ico de
nossa ciência . Vá r ios au tores ten ta ram in t roduzir nomes completamen-
te novos, t a is como Plu tologia , Cremat íst ica , Ca ta la t íst ica etc. Mas por
que precisa r íamos de a lgo melhor que Economia? Esse termo, a lém de
ser mais familia r e esta r mais diretamente relacionado com o termo
ant igo, é per feitamente aná logo na forma a Matem ática, É tica, Estética,5
e aos nomes de vá r ios ou t ros ramos do conhecimento, e apresen ta ,
a lém disso, a vantagem de ser u t ilizado desde a época de Ar istót eles.
Que eu sa iba , Macleod é o rein t rodutor do nome em época recente,
mas parece que foi adotado também por Alfred Marsha ll, em Cam-
br idge. Deve-se, por tan to, esperar que Econom ia se torne o nome re-
conhecido de uma ciência que, aproximadamente há um século, era
conhecida pelos Economistas franceses como La science économ ique.6
Apesar de empregar o novo nome no texto, era obviamente indesejável
a ltera r o fron t ispício do livro.
Ao publicar uma nova edição deste t raba lho, oito anos após sua
pr imeira apar ição, parece na tura l que eu devesse fazer a lgumas ob-
servações sobre as mudanças de opin ião a respeito da ciência econômica ,
que t iveram lugar nesse in terva lo de tempo. Recentemente, a limen-
tou-se uma notável discussão, nas revistas e publicações especia lizadas,
em torno do método lógico da ciência , abordando a té o problema da
própr ia existência de uma ta l ciência . Chamou a a tenção para esse
assunto o impor tan te a r t igo7 de T. E . Cliffe Leslie “Sobre o Método
Filosófico da Economia Polít ica”, no qua l ele procura desin tegrar in -
teiramente a ciência dedut iva de Ricardo. Os escr itos de W. T. Thorn ton
têm tendência a lgo parecida . A cont rovér sia se in tensificou mais a inda
pela admirável cr ít ica a que foi submet ida no magist ra l discurso do
Prof. J . K. Ingram, na ú lt ima reunião da Associação Br itânica . Esse
discurso foi reeditado em vá r ias publicações8 na Ingla ter ra e t raduzido
nas pr incipa is línguas da Europa ocidenta l. É evidente, por tan to, que
um espír ito de cr ít ica muito a t iva está se difundindo, o qua l dificilmente
pode deixar de superar , a fina l, o prest ígio das fa lsas teor ias an t igas.
J EVONS
21
5 Em inglês, os termos Economia , Matemá t ica , É t ica e Estét ica possuem o mesmo sufixo.
(N. do T.)
6 Em francês, no or igina l. (N. do T.)
7 Herm athena. Nº IV, 1876. p. 1-32. Republicado na coletânea de ensa ios de LESLIE. Essays
in Political and Moral Philosophy. Dublin , 1879. p. 216-242.
8 J ournal of the London S tatistical S ociety. Dezembro de 1878. v. XLI, p. 602-629. J ournal
of the S tatistical and S ocial Inquiry S ociety of Ireland . Agosto de 1878. v. VII, Apêndice.
Também como publicação separada , Longmans, Londres, 1878.
Mas o que se deve colocar em seu lugar? No melhor dos casos, deve-se
supor que a queda das an t igas dout r inas or todoxas deixará um caos
de opin iões divergentes. Muitos fica r iam conten tes se a suposta ciência
desmoronasse por completo e se tornasse um objeto h istór ico, como
Ast rologia , Alquimia e as ciências ocultas em gera l. Cliffe Leslie não
ir ia tão longe assim, mas reconst ru ir ia a ciência de maneira puramente
indut iva e empír ica . Ou ela ser ia , en tão, a agregação de uma miscelânea
de fa tos desconexos ou , de ou t ra forma, dever ia enquadrar -se num dos
ramos da Sociologia de Spencer . Em todo caso, susten to que deve apa-
recer um a ciência do desenvolvim ento das form as e relações econôm icas.
Mas, com referência ao dest ino do método dedut ivo, discordo in-
teiramente do meu amigo Leslie. E le é a favor de sua simples dest ru ição;
eu sou por uma completa reforma e reconst rução. Como expliquei an-
ter iormente,9 o a tua l estado caót ico da Economia decor re da confusão
ent re vá r ios ramos do conhecimento. A subdivisão é o remédio. Devemos
diferencia r o elemento empír ico da teor ia abst ra ta , da teor ia aplicada
e da a r te mais minuciosa das finanças e da administ ração. Assim,
surgirão vá r ias ciências, t a is como esta t íst ica comercia l, t eor ia mate-
má t ica da economia , economia descr it iva e sistemá t ica , sociologia eco-
nômica e ciência fisca l. Pode mesmo haver um t ipo de subdivisão cru-
zada das ciências, isto é, haverá divisão en t re ramos, no que diz respeito
aos temas, e divisão de acordo com a maneira de t ra ta r o ramo do
tema. A maneira pode ser t eór ica , empír ica , h istór ica ou prá t ica ; o
tema pode ser capita l e t raba lho, moeda , sistema bancá r io, t r ibu tação,
posse de ter ra etc. — pa ra não fa la r da divisão mais fundamenta l da
ciência à medida que t ra te do consumo, da produção, da t roca e da
dist r ibu ição de r iqueza . De fa to, o conjunto do tema é tão extenso,
in t r incado e diverso que é um absurdo supor que possa ser t ra tado
num único livro ou de uma única maneira . Tra ta -se de uma ciência ,
tan to quanto está t ica , dinâmica , t eor ia do ca lor , ópt ica , elet romagne-
t ismo, telegrafia , navegação e qu ímica fotográ fica são ciência . Mas,
assim como todas as ciências físicas têm sua base mais ou menos óbvia
nos pr incípios gera is da mecânica , t ambém todos os ramos e divisões
da ciência econômica devem esta r impregnados de cer tos pr incípios
gera is. É à invest igação de ta is pr incípios — ao delineamento da me-
cânica do in teresse individua l e da u t ilidade — que este ensa io foi
dedicado. O estabelecimento de ta l t eor ia é um preâmbulo necessá r io
para qualquer projeto definit ivo da superestrutura
do conjunto da ciência.
Passando agora à própr ia teor ia , a questão pr incipa l não é saber
se a teor ia exposta neste livro é verdadeira , mas se há , r ea lmente,
a lguma novidade nela . A impor tância exclusiva a t r ibu ída na Ingla ter ra
à Escola Ricardiana de Economistas impediu quase todos os leitores
OS ECONOMISTAS
22
9 "The Future of Polit ica l Economy". In: Fortnightly R eview. Novembro de 1876. v. VIII, N. S.,
p. 617 - 631. Traduzido no J ournal des Économ istes. Março de 1877, 3ª sér ie, v. XLV, p. 325.
ingleses de tomarem conhecimento da existência de uma sér ie de eco-
nomistas franceses, assim como de a lguns poucos ingleses, a lemães ou
ita lianos que, de vez em quando, t ra ta ram a ciência de uma maneira
matemá t ica mais ou menos r igorosa . Na pr imeira edição (p. 34-36),
fiz um breve rela to dos escr itos desse t ipo, à medida que me familia -
r izava com eles na ocasião; dos t raba lhos en tão mencionados, t a lvez
de a lgum deles eu tenha ext ra ído a idéia de invest igar matemat ica-
mente a Economia . Provavelmente, devo mais à R ailway Econom e de
Lardner , pois já conhecia bem esse t raba lho desde o ano de 1857. O
livro de Lardner sempre me impressionou por conter uma pesquisa
excelen te, cu jo va lor cien t ífico a inda não foi suficien temente est imado;
e no capítu lo XIII (p. 286-296 etc.) encont ramos as leis da ofer ta e da
procura t ra tadas matemat icamente e ilust radas gra ficamente.
No prefácio à pr imeira edição (p. 4), observei que, em seu t ra tado
sobre Economia Polít ica , J oseph Garn ier mencionou vá r ios matemá t icos
do cont inente que haviam escr ito sobre o tema da Economia , e acres-
centei que eu não t inha sido capaz sequer de descobr ir os t ítu los de
seus ensa ios. Isso, en t retan to, deve ter sido fru to de uma leitu ra des-
cu idada ou de uma fa lha de memór ia , pois se ver ifica que o própr io
Garn ier10 menciona os t ítu los de vá r ios livros e ensa ios. O fa to é que,
escrevendo, como fiz na ocasião, distan te de uma grande biblioteca ,
não ten tei tomar conta to com a lit era tura sobre o tema, sem pensar
que ser ia tão copiosa e, em a lguns casos tão excelen te, como agora se
comprova ser o caso. Com o passar dos anos, en t retan to, meu conhe-
cimento da lit era tura de Economia Polít ica ampliou-se muito, e as
indicações de amigos e cor respondentes me informaram da existência
de muitos t raba lhos notáveis, que an tecipavam mais ou menos os pontos
de vista desenvolvidos neste livro. Enquanto preparava esta nova edi-
ção, ocor reu-me ten ta r descobr ir todos os escr itos existen tes sobre o
assunto. Com essa in tenção redigi uma lista cronológica de todos os
t raba lhos econômico-matemá t icos de meu conhecimento, cerca de se-
ten ta , a qua l, por gent ileza de meu editor , Giffen , foi publicada no
J ournal of the London S tatistical S ociety de junho de 1878 (volume
XLI, p. 398-401), sendo fornecidas separa tas aos pr incipa is economistas,
com um pedido de acréscimos e cor reções. Meu amigo León Walras,
reitor da Academia de Lausanne, depois de fazer consideráveis acrés-
cimos à lista , a t ransmit iu para o J ournal des Économ istes (dezembro
de 1878), a cu jo editor muito devemos por sua publicação. Cópias da
lista também foram enviadas para revistas econômicas a lemãs e it a -
lianas. Para a conclusão da lista bibliográ fica devo obr igações ao Prof.
W. B. Hodgson , Prof. Adamson, Sr . W. H. Brewer , M. A., respeitado
J EVONS
23
10 T raité d ’Économ ie Politique. 5ª ed., Par is, 1863. p. 700-702.
Inspetor de Escolas, o Barão de Auln is de Bourouill, professor de Eco-
nomia Polít ica em Utrecht , M. N. G. P ierson de Amsterdam, Sr . Vis-
ser ing de Leiden , Prof. Luigi Cossa de Pávia , en t re ou t ros.
Assim, fez-se todo o empenho possível para apresen ta r a lista
completa e exaust iva de t raba lhos e a r t igos econômico-matemá t icos,
que agora é publicada no I (atual V) Apêndice deste livro (p. 191-204). É
pouco provável que muitos acréscimos possam ser feitos às par tes in i-
cia is das listas, mas fica rei gra to a qua lquer leitor que possa suger ir
cor reções ou acréscimos. Muito me a legrará t ambém a informação sobre
qua lquer das novas publicações, cu ja inserção na lista seja apropr iada .
Por ou t ro lado, é possível que a lguns dos livros mencionados na lista
não devessem esta r lá . Não consegui examinar pessoa lmente todas as
publicações, de forma que a lguns t raba lhos inser idos por sugestão de
cor respondentes podem ter sido mencionados em razão de uma con-
cepção er rônea do exa to objet ivo da lista . Traba lhos econômicos, por
exemplo, contendo ilust rações numér icas e fa tos esta t íst icos expressos
numer icamente, a inda que em abundância , não foram inclu ídos de caso
pensado, a menos que houvesse também métodos matemá t icos no ra -
ciocínio. Sem essa condição, toda a lit era tura de esta t íst ica comercia l
numér ica ter ia sido inclu ída em minha lista . Em out ros casos, apenas
uma pequena par te de um livro citado pode ser chamada de econômi-
co-matemá t ica ; mas esse fa to é gera lmente ressa ltado pela menção dos
capítu los ou páginas em discussão. A tendência , en t retan to, foi inclu ir
ao invés de exclu ir , de forma que o leitor possa ter à sua disposição
todo campo da lit era tura que requer invest igação.
Para evita r mal-en tendidos, é bom explicar que o cr itér io para
inser ir qua lquer publicação, ou par te de uma publicação, nessa lista
é o fa to de ela conter um reconhecim ento explícito do caráter m atem ático
da Econom ia, ou da vantagem a ser obtida por seu tratam ento sim bólico.
Susten to que todos os au tores econômicos devem ser matemá t icos na
mesma medida em que são cien t íficos, porque t ra tam de quant idades
econômicas, e as relações de ta is quant idades e todas as quant idades
e relações de quant idades estão dent ro do objeto da Matemá t ica . Mesmo
aqueles que, mais veemente e cla ramente, protestavam cont ra o reco-
nhecimento de seu própr io método, cont inuamente revelam em sua
linguagem o cará t er quant ita t ivo de seus raciocínios. O que, por exem-
plo, pode ser mais cla ramente matemá t ico no conteúdo do que a se-
guin te citação do pr incipa l t raba lho de Cairnes:11 “Não podemos en -
cont ra r dificu ldade em ver como o custo, em seus elementos pr incipa is,
deve ser ca lcu lado. No caso do t raba lho, o custo de produzir dada
mercador ia será r epresen tado pelo número da média de t raba lhadores
OS ECONOMISTAS
24
11 S om e Leading Principles of Political N ewly Expounded . Par te Pr imeira . Cap. I, p. 97.
empregados em sua produção — levando-se em conta , ao mesmo tempo,
a dificu ldade do t raba lho e o grau de r isco que ele envolve — mult i-
plicado pela duração de seus t raba lhos. No caso da abst inência , o pr in-
cípio é aná logo: o sacr ifício será medido pela quant idade de r iqueza
da qua l se absteve, tomada em relação ao r isco assumido, e mult iplicada
pela duração da abst inência”. Aqui lidamos com cá lcu lo, mult iplicação,
grau de dificu ldade, grau de r isco, quant idade de r iqueza , duração etc.,
tudo coisas, noções ou operações em essência matemá t icas. Embora
meu est imado amigo e predecessor tenha abjurado expressamente mi-
nhas dout r inas em seu capítu lo preliminar , adotou inconscien temente
o método matemá t ico em tudo, sa lvo na aparência .
Poder íamos com facilidade volta r mais longe no passado e des-
cobr ir que mesmo o pa i da ciência , como ele é com freqüência consi-
derado, most ra -se completamente matemá t ico. No capítu lo V do Livro
Pr imeiro de A R iqueza das N ações, por exemplo, encont ramos Adam
Smith cont inuamente
a rgumentando sobre “quant idades de t raba lho”,
“medidas de va lor”, “medidas de fadiga”, “proporção”, “igua ldade” etc.;
de fa to, o conjunto de idéias é matemá t ico. O mesmo poder ia ser dito
de quase todas as demais passagens das par tes cien t íficas do t ra tado,
que se revelam dist in tas das par tes h istór icas. No capítu lo I do Livro
Segundo (parágrafo 29), lemos: “O produto da ter ra , das minas e das
pescar ias, quando sua fer t ilidade na tura l permanece estável, é propor-
ciona l à extensão e aplicação apropr iada dos capita is nelas empregados.
Quando os capita is são igua is e igua lmente bem aplicados, ele é pro-
porciona l à fer t ilidade na tura l delas”. Ora , todo uso da pa lavra igual
ou igualdade implica a existência de uma equação matemá t ica ; uma
equação é simplesmente uma igua ldade; e todo uso da pa lavra pro-
porção implica uma taxa expr im ível sob a forma de uma equação.
Susten to, por tan to, que a rgumentar matemat icamente, seja cor -
reta ou incor retamente, não const itu i diferença rea l no tocante aos
autores de teor ia econômica . Mas uma coisa é a rgumentar e ou t ra é
compreender e reconhecer explicitamente o método do a rgumento. As-
sim como há t an tos que fazem prosa sem sabê-lo, ou a inda que silogizam
sem ter a menor idéia do que é silogismo, assim também os economistas
têm sido, há muito, matemá t icos sem se aperceberem do fa to. O re-
su ltado nega t ivo é que eles gera lmente têm sido maus matemá t icos e
seus t raba lhos tendem a perder prest ígio. Por isso, o reconhecimento
explícito do cará t er matemá t ico da ciência era uma condição quase
necessá r ia para qua lquer progresso rea l da teor ia . Não segue, na tu-
ra lmente, que ser explicitamente matemá t ico é a ssegurar a obtenção
da verdade, e em escr itos semelhantes àqueles de Canard e Whewell,
encont ramos vá r ios símbolos e equações sem nenhum resu ltado de va-
lor , em vir tude do fa to de que eles apenas t raduziram em símbolos as
teor ias obt idas, e obt idas er roneamente, sem sua u t ilização. Esses au-
tores não entenderam e inverteram por completo a função dos símbolos
J EVONS
25
matemá t icos, que é a de guiar nossos pensamentos no escorregadio e com-
plicado processo de raciocínio. A linguagem comum pode expressar nor-
malmente os axiomas elementares de uma ciência, e com freqüência tam-
bém os resultados finais; mas só da forma mais insat isfatór ia, obscura e
tediosa é que nos pode conduzir através dos labirintos da inferência.
A lista bibliográ fica , à qua l me refiro, é, sem dúvida , muito he-
terogênea e pode prontamente ser decomposta em vá r ias classes dis-
t in tas de t raba lhos econômicos. Numa pr imeira classe, devem ser co-
locados os escr itos dos economistas que não ten ta ram, em absolu to,
um t ra tamento matemá t ico de maneira expressa ou sistemá t ica , mas
que apenas incidenta lmente admit iram seu va lor ao in t roduzir expo-
sições simbólicas ou grá ficas. Ent re esses au tores podem cita r -se em
especia l Rau (1868), Hagen (1844), J . S. Mill (1848) e Courcelle-Seneuil
(1867). Muitos leitores podem esta r surpresos ao ouvir que J ohn Stuar t
Mill usou símbolos matemá t icos; mas, ao passar para o Livro Terceiro,
capítu los XVII e XVIII, dos Princípios de Econom ia Política, capítu los
difíceis e tediosos nos qua is Mill conduz o leitor a t ravés da Teor ia do
Comércio In ternaciona l e dos Valores In ternaciona is, por meio de ja rdas
de linho e de tecido o leitor descobr irá que Mill por fim cede, expres-
sando-se concisa e cla ramente12 por meio de equações de m , n , p e q.
Sua matemá t ica é muito grosseira ; mesmo assim chega a um cor reto
t ra tamento matemá t ico e o resu ltado é que esses capítu los, embora
tediosos e difíceis, provavelmente serão considerados as par tes mais
cor retas e mais sólidas de todo o t ra tado.
Uma segunda classe de economistas abrange os que empregaram
em abundância o aparato matemá t ico, mas, por entenderem mal seu uso
correto ou por serem de outra forma desviados da teoria correta, cons-
tru íram sobre areia. Desventuras desse t ipo não se restr igem à ciência
da economia; nos ramos mais exatos da Ciência F ísica, como Mecânica,
F ísica Molecular, Astronomia etc., seria possível citar tratados matemá-
t icos quase inumeráveis que devem ser considerados contra-senso. Na
mesma categoria devem ser colocados os escritos matemá t icos de econo-
mistas como Canard (1801), Whewell (1829, 1831 e 1850), Esmenard du
Mazet (1849 e 1851) e talvez Du Mesnil-Marigny (1860).
A terceira classe forma uma an t ít ese com a segunda , pois abrange
os au tores que, sem nenhuma osten tação de linguagem ou método ma-
temá t ico, porém com cuidado, t en ta ram a t ingir precisão no t ra tamento
de noções quant ita t ivas e levaram, assim, a uma compreensão mais
ou menos completa da teor ia cor reta da u t ilidade e da r iqueza . Ent re
esses au tores, Francis Hutcheson , fundador ir landês da grande escola
escocesa e predecessor de Adam Smith em Glasgow, a linha-se prova-
velmente como pr imeiro. Seu emprego de símbolos13 matemá t icos pa-
OS ECONOMISTAS
26
12 Livro Terceiro. Cap. XVIII, seção 7.
13 1720. HUTCHESON. An Inquiry. 1729 etc. p. 186-198.
rece um tanto grosseiro e prematuro, mas a precisão de suas idéias sobre
a est imativa de quantidades de bem e de mal está acima de elogios. Ele
antecipa perfeitamente os fundamentos do sistema moral de Bentham,
mostrando que o Momento do Bem e do Mal é também, numa proporção
composta de Duração e Intensidade, afetado pelo Acaso ou incerteza de
nossa existência.14 Quanto às idéias de Bentham, elas são adotadas como
ponto de partida da teoria fornecida neste t rabalho, e são citadas no in ício
do capítulo II (p. 41). Bentham repetiu sua exposição sobre a maneira de
medir a alegria, em vár ios t rabalhos e panfletos diferentes, como, por
exemplo, o importante t rabalho int itulado “A Table of the Springs of Ac-
t ion”. (Londres, 1817. p. 3); e também no “Codification Proposal, Addressed
by J eremy Bentham to all Nations Professing Liberal Opinions” (Londres,
1822. p. 7-11). Aqui, fala explicitamente da aplicação da aritm ética às
questões da ut ilidade, querendo dizer, sem dúvida, a aplicação de métodos
matemá ticos. Descreve mesmo (p. 11) as quatro circunstâncias que go-
vernam o valor de um prazer ou de um sofrimento como as dim ensões
de seu valor, apesar de estar incorreto ao tratar de propinqü idade e da
certeza como dimensões.
É digno de nota que Destu t t de Tracy, um dos mais filosóficos
de todos os economistas, reconheceu , em poucas pa lavras, o método
cor reto de t ra tamento, embora não tenha seguido sua própr ia idéia .
Refer indo-se às circunstâncias que, em sua opin ião, tornam todos os
cá lcu los econômicos mora is muito delicados, diz:15
“On ne peut guère em ployer dans ces m atières que des considé-
rations tirées de la théorie des lim ites”.16
O tão conhecido economista inglês Malthus também most rou em poucas
linhas seu apreço pela na tureza matemá t ica das questões econômicas.
Num de seus excelen tes opúscu los,17 observa : “Muitas das questões,
ambas na Mora l e na Polít ica , parecem ser da na tureza dos problemas
de m áxim os e m ínim os em cá lcu lo diferencia l; neles há sempre um
ponto em que cer to efeito é o maior possível, enquanto em qua lquer
um dos dois lados desse ponto ele diminui gradua lmente”. Mas não
achei desejável aumentar a lista bibliográfica incluindo todos os trabalhos
nos quais se encontrem observações breves ou casuais desse tipo.
Devo observar aqui que em todos os seus escr itos o Sr . Henry
Dunning Macleod apresen ta for te tendência a t ra tá -los de forma ma-
J EVONS
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14 1728. HUTCHESON. An Essay etc., p. 34-43, e em out ras passagens.
15
É léments d’Idéologie. Partes Quar ta e Sexta . Traité de La Volonté et de ses Effects. Paris,
1815. In-octavo. p. 499. Edição de 1826, p. 335. Edição amer icana. A Treatise on Political
Econom y, Translated from the Unpublished French Original, Georgetown, D.C. 1817. p. XIII.
16 Nestes assuntos só se podem empregar considerações t iradas da teor ia dos limites. Em
francês, no or igina l. (N. do T.)
17 Observations on the Efects of the Corn Laws, and of a R ise or fall in the Price of Corn on the
Agriculture and General Wealth of the Country. Londres, 1814. p. 30; da 3ª Ed., 1815, p. 32.
temá t ica. Alguns de seus trabalhos ou ensaios, nos quais esse espír ito
matemá tico se manifesta de forma mais acentuada, foram postos na lista.
Não é meu objetivo criticar suas concepções engenhosas ou determinar
até que ponto ele realmente criou um sistema matemá tico. Embora cer-
tamente divirja dele em muitos pontos importantes, sou obrigado a reco-
nhecer a ajuda que consigo com o uso de vár ios de seus trabalhos.
Na quar ta e mais impor tan te classe de au tores econômico-mate-
má t icos devem ser colocados aqueles que conscien te e decla radamente
ten ta ram inventa r uma teor ia matemá t ica para a matér ia e que con-
seguiram, se meu ju lgamento est iver cer to, chegar a uma visão cor reta
da ciência . Nessa classe, cer tos filósofos franceses que se dist inguiram
têm precedência e pr ior idade. Dever íamos, t a lvez, retornar com razão
ao t raba lho de Condillac, O Com ércio e o Governo, publicado pela pr i-
meira vez no ano de 1776, o mesmo ano em que apareceu A R iqueza
das N ações. Nos pr imeiros capítu los desse fascinante t raba lho filosófico
encont ramos, t a lvez, a pr imeira exposição cla ra da verdadeira conexão
ent re va lor e u t ilidade. Contudo, o livro não está inclu ído na lista
porque não há uma ten ta t iva explícita de t ra tamento matemá t ico. É
ao engenheiro francês Dupuit a quem, provavelmente, se deve a t r ibu ir
a pr imeira compreensão per feita da teor ia da u t ilidade. Tentando ela -
borar uma mensuração precisa da u t ilidade dos t raba lhos públicos,
observou que a u t ilidade de uma mercador ia não apenas var ia enor -
memente de um indivíduo para ou t ro, mas é t ambém muito diferen te
para uma mesma pessoa de acordo com as circunstâncias. Diz ele:
“N ous verrions que l’utilité du m orceau de pain peut croître pour
le m êm e ind ividu depuis zéro jusqu ’au ch iffre de sa fortune en-
tière”18 (1849, Dupuit , De l’In fluence des Péages etc., p. 185).
Estabelece, de fa to, uma teor ia da gradação da u tilidade, exposta com
beleza e per feição por meio de diagramas geomét r icos; essa teor ia in -
dubitavelmente coincide, na essência , com a cont ida neste livro. Não
leva , en t retan to, a té o fim suas idéias em forma a lgébr ica . A teor ia
de Dupuit foi objeto de a lguma cont rovér sia nas páginas do Annales
des Ponts et Chaussées, mas não recebeu muita a tenção em out ros
lugares e não tenho conhecimento de que a lgum economista inglês
tenha chegado a saber a lgo a respeito desses notáveis ensa ios.
O t ra tado an ter ior de Cournot , seu admirável R echerches sur les
Principes Mathém atiques de la T héorie des R ichesses (Par is, 1838), se
assemelha aos ensa ios de Dupuit por ser , a té há poucos anos, bastan te
desconhecido para os economistas ingleses. Em out ros aspectos, o mé-
todo de Cournot se cont rapõe ao de Dupuit . Cournot não elaborou
nenhuma teor ia defin it iva do fundamento e da na tureza da u t ilidade
OS ECONOMISTAS
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18 "Veremos que a u t ilidade de um pedaço de pão pode crescer , para um mesmo indivíduo,
desde zero a té o montan te de toda a sua for tuna". Em francês, no or igina l. (N. do T.)
e do va lor , mas, tomando os fa tos evidentes e conhecidos, concernentes
às relações de preço, produção e consumo de mercador ias, invest igou
essas relações ana lít ica e diagramat icamente com um dom ínio e acer to
que deixa pouco a deseja r . Esse t raba lho deve ocupar posição de des-
taque na h istór ia da matér ia . É est ranho que, en t re os ingleses, t enha
ficado para mim a descober ta de seu va lor . Alguns anos depois (1875),
Todhunter escreveu-me o seguin te:
“Quis saber a lgumas vezes se há a lgo de impor tan te num livro
publicado há muitos anos pelo Sr . A. A. Cournot , in t itu lado R e-
cherches sur les Principes Mathém atiques de la T héorie des R i-
chesses. Nunca o vi e quando mencionei o t ítu lo, não encont rei
nenhuma pessoa que t ivesse lido o livro. Contudo, Cournot foi
eminente em Matemá t ica e Metafísica , de modo que deve haver
a lgum mér ito nesse livro”.
Consegui uma cópia do t raba lho já em 1872, mas apenas recentemente
o estudei com cuidado suficien te para formar uma opin ião defin it iva
sobre seu va lor . Mesmo agora , de forma a lguma dominei todas as suas
par tes, sendo meu dom ínio da Matemá t ica insuficien te para me capa-
cita r a seguir Cournot em todas as par tes de sua aná lise. Minha im-
pressão é a de que o capítu lo I do t raba lho não é sign ifica t ivo; o capítu lo
II contém uma impor tan te an tecipação das discussões concernentes ao
método apropr iado de t ra ta r os preços, inclu indo uma an tecipação (p.
21) de meu método logar ítmico de ver ifica r var iações no va lor do ouro;
o capítu lo III, t ra tando das t rocas com o exter ior , é a lt amente enge-
nhoso, senão par t icu la rmente ú t il, mas, de longe, a par te mais impor-
tan te do livro começa com o capítu lo IV sobre a “Loi du débit” (Lei do
consumo). O restan te do livro, de fa to, contém uma aná lise maravilhosa
das leis da ofer ta e da procura e das relações de preços, produção,
consumo, gastos e lucros. Cournot par te da h ipót ese de que o consumo
ou a demanda por uma mercador ia é função do preço, ou D = F (p);
e da í, após estabelecer empir icamente umas poucas condições dessa
função, passa a desenvolver com dom ínio surpreendente as conseqüên-
cias que seguem daquelas condições. Mesmo à pa r te sua impor tância
econômica , essa invest igação, na medida em que possa me aventurar
a ju lgá -la , apresen ta um belo exemplo de raciocínio matemá t ico, no
qua l o conhecimento é aparen temente ext ra ído da ignorância . Na rea-
lidade, o método consiste em assumir cer tas condições simples das
funções enquanto conformes com a exper iência e en tão revela r , me-
dian te a in ferência simbólica , os resu ltados implícitos dessas condições.
Mas estou in teiramente convencido que a invest igação é de a lta im-
por tância econômica e, quando as par tes da Economia Polít ica às qua is
se refere a teor ia vierem a ser t ra tadas adequadamente, como nunca
o foram, o t ra tamento deve ser baseado na aná lise de Cournot , ou pelo
menos deve seguir seu método gera l. Deve-se acrescenta r que sua in -
J EVONS
29
vest igação tem pouca relação com o conteúdo deste t raba lho, porque
Cournot não retoma nenhuma Teor ia da Ut ilidade, mas começa com
as singula res leis da ofer ta e da procura .
Aparentemente desencora jado pela pequena a tenção dispensada
a seu t ra tado matemá t ico, Cournot , em ano poster ior (1863), apresen tou
um t raba lho sobre Economia , mais popular e sem símbolos matemá -
t icos; mas esse t raba lho poster ior não é comparável em in teresse e
impor tância a seu pr imeiro t ra tado.
Dificilmente os economistas ingleses podem ser censurados por
sua ignorância dos t raba lhos econômicos de Cournot quando encont ra -
mos os au tores franceses em situação igua lmente ru im. Assim, os au-
tores do excelen te Dictionnaire de l’Économ ie Politique de Guillaumin
que é, no gera l, o melhor t raba lho de referência na lit era tura da ciência ,
ignoram completamente Cournot
e seus t raba lhos, e da mesma forma
o faz Sandelin em seu copioso R épertoire Général d ’Économ ie Politique.
J oseph Garn ier , em seu manual,19 admirável sob out ros aspectos, con -
funde Cournot com matemá t icos muito in fer iores dizendo:
“Dans ces derniers tem ps M. Esm enard du Mazet, et M. du Mesnil-
Marigny, ont aussi fait abus, ce nous sem ble, des form ules algébri-
ques; Les Recherches sur les Principes Mathématiques des Richesses
de M. Cournot, ne nous ont fourni aucun m oyen d’élucidation”.20
MacCulloch , na tura lmente, não conhece nada de Cournot . H. D. Ma-
cleod tem o mér ito pelo menos de mencionar o t raba lho de Cournot ,
mas gra fa mal o nome do au tor , e dá apenas o t ítu lo do livro, o qua l
provavelmente nunca viu .
Passamos agora a uma descober ta verdadeiramente notável na
histór ia desse ramo da lit era tura . Faz a lguns anos, meu amigo Prof.
Adamson notou num dos t raba lhos de Kautz sobre Economia Polít ica21
uma breve referência a um livro que, dizia -se, cont inha uma teor ia do
prazer e do sofr imento, escr ito por um autor a lemão chamado Hermann
Heinr ich Gossen . Apesar de ter publicado um anúncio para obtê-lo, o
Prof. Adamson não conseguiu ver esse livro a té agosto de 1878, quando
felizmente o descobr iu num ca tá logo de um vendedor de livros a lemão,
conseguindo comprá -lo. O livro foi publicado em Brunswick, em 1854;
consiste em 278 páginas cheias, e leva o t ítu lo de Entwickelung der
Gesetze des m enschlichen Verkehrs, und der daraus fliessenden R egeln
für m enschliches Handeln , que pode ser t raduzido como Desenvolvi-
m ento das Leis do Com ércio Hum ano e das Conseqüentes R egras de
OS ECONOMISTAS
30
19 T raité d ’Économ ie Politique. 5ª ed., p. 701.
20 "Nesses ú lt imos tempos, o Sr . Esmenard du Mazet e o Sr . de Mesnil-Mar igny também
abusaram, assim parece-nos, das fórmulas a lgébr icas; As investigações S obre os Princípios
Matem áticos das R iquezas não nos forneceram nenhum meio de elucidação." Em francês,
no or igina l. (N. do T.)
21 T heorie und Geschich te der N ational-Oekonom ik . 1858. v. I, p. 9.
Ação Hum ana. Descreverei o conteúdo desse notável livro da forma
como ele me foi t ransmit ido pelo Prof. Adamson.
Gossen , evidentemente, t inha no mais elevado conceito a impor-
tância de sua própr ia teor ia , pois ele começa reivindicando honras na
Ciência Econômica igua is às de Copérn ico na Ast ronomia . E imedia-
tamente insiste que o t ra tamento matemá t ico, sendo o único acer tado,
deve ser aplicado em toda par te, mas, sem consideração para com o
leitor , a mais a lta aná lise será explicitamente in t roduzida apenas quan-
do requer ida para determinar máximos e m ínimos. O t ra tado en tão
abre com a consideração da Economia como uma teor ia do prazer e
do sofr imento, o que equiva le a uma teor ia do procedimento pelo qua l
o indivíduo e o conjunto dos indivíduos que const ituem a sociedade
podem a t ingir o máximo de prazer com o m ínimo de esforço doloroso.
A lei na tura l do prazer é en tão exposta cla ramente, mais ou menos
como segue: Aum ento do m esm o tipo de consum o produz prazer conti-
nuam ente decrescente até o ponto de saciedade. Ilust ra essa lei geome-
t r icamente e da í prossegue invest igando as condições sob as qua is o
prazer tota l de um ou mais objetos pode ser elevado a um máximo.
O termo Werth é introduzido em seguida e pode, acredita o Prof.
Adamson, ser t raduzido com absoluta precisão como Utilidade; Gossen
assinala que a quantidade de ut ilidade, material ou imaterial, é medida
pela quantidade de prazer que ela proporciona. Ele classifica os objetos
ú teis como: 1) os que possuem poderes em si mesmos de dar prazer; 2)
os que só possuem tais poderes em combinação com outros objetos; 3) os
que apenas servem como meio para a produção de objetos que dão prazer.
Toma cuidados de assinalar que não há tal coisa como utilidade absoluta,
sendo a utilidade meramente uma relação entre uma coisa e uma pessoa.
Prossegue dando as leis derivadas da ut ilidade, mais ou menos da seguinte
maneira: Partes separadas do mesmo objeto que dá prazer têm graus
muito diferentes de ut ilidade, e em geral, para cada pessoa, apenas um
número limitado dessas partes tem utilidade; qualquer acréscimo além
desse limite é inú t il; mas o ponto de inutilidade só é alcançado depois de
a ut ilidade ter passado por todos os estágios ou graus de intensidade.
Disso t ira a conclusão prá t ica de que cada pessoa deveria distr ibuir seus
recursos de forma a fazer com que os aumentos finais de cada mercadoria
que dá prazer lhe sejam de igual utilidade.
Em seguida , Gossen t ra ta do t raba lho, par t indo da proposição
de que a u t ilidade de qua lquer produto deve ser est imada depois da
dedução dos esforços de t raba lhos requer idos para produzi-lo. Descreve
a var iação do esforço de t raba lho, em grande medida como eu fiz,
apresen tando-a gra ficamente e in fer indo que devemos cont inuar o t ra -
ba lho a té o ponto no qua l a u t ilidade do produto igua la o esforço de
produção. Ao t ra ta r da teor ia da t roca , most ra como o in tercâmbio dá
lugar a um imenso aumento da u t ilidade e in fere que a t roca prosse-
guirá a té o ponto no qua l as u t ilidades das porções a serem ent regues
J EVONS
31
e recebidas em seguida são igua is. Uma complicada represen tação geo-
mét r ica da teor ia da t roca é apresen tada . A Teor ia da Renda da Ter ra
é invest igada de maneira mais gera l, e o t raba lho conclu i com a lgumas
vagas especulações socia is, as qua is, na opin ião do Prof. Adamson, são
de mér ito in fer ior se comparadas com as par tes an ter iores do t ra tado.
Dessa exposição fica bastan te evidente que Gossen me an tecipou
completamente no tocante aos pr incípios gera is e ao método da teor ia
da Economia . Até onde eu possa deduzir , seu t ra tamento da teor ia
fundamenta l é a inda mais gera l e completo do que aquele que fu i
capaz de a rquiteta r . Ao discu t ir o livro, estou su jeito à sér ia dificu ldade
de não ser capaz de lê-lo; mas, a ju lgar pelo que o Prof. Adamson
escreveu ou leu para mim, e pelo exame dos diagramas e das par tes
simbólicas do t ra tado, dever ia conclu ir que Gossen foi in feliz no de-
senvolvimento de sua teor ia . Ao invés de lidar , como Cournot e eu
mesmo fizemos, com funções indeterminadas e in t roduzir o m ínimo
possível de h ipót eses, Gossen supôs, por mot ivo de simplicidade, que
as funções econômicas obedecem a uma lei linear , de forma que suas
curvas de u t ilidade são gera lmente tomadas como retas. Essa h ipót ese
lhe permite t raba lhar grande quant idade de fórmulas precisas e re-
su ltados tabula res que ocupam muitas páginas do livro. Mas visto que
as funções da ciência econômica ra ramente, ou nunca , são de fa to li-
neares e normalmente divergem muito de uma reta , penso que as
ilust rações simbólicas e geomét r icas e os desenvolvimentos in t roduzidos
por Gossen devem, na maior par te, ser considerados en t re os muitos
produtos do ta len to mal aplicado. Devo acrescenta r , em meu própr io
nome, que ele não parece rea lmente obter as equações de t roca conforme
estabelecido nesse livro; a Teor ia do Capita l e do J uro é insuficien te
e há total ausência de qualquer semelhança entre o desenvolvimento do
assunto, salvo na medida em que resulta de uma base comum de verdade.
No en tan to, a coincidência en t re as idéias essencia is do sistema
de Gossen e as minhas própr ias é tão impressionante que desejo de-
cla ra r peremptor iamente, em pr imeiro lugar , que nunca vi, nem tam-
pouco ouvi, nenhuma a lusão à existência do livro de Gossen an tes de
agosto de 1878, e explicar , em segundo lugar , como aconteceu de eu
não fazê-lo. Minha
infeliz insuficiência de capacidade lingüíst ica me
impediu , apesar de vá r ias ten ta t ivas, de me familia r iza r o bastan te
com o a lemão para ler um livro a lemão. Uma vez consegui decifra r ,
com a juda , par te das notas de conferências sobre Lógica de Kant ; mas
essa é minha única façanha em lit era tura a lemã . Até o momento, esse
t raba lho de Gossen permaneceu desconhecido mesmo para grande par te
dos maiores leitores da Alemanha . O Prof. Adamson observa que o
t raba lho não parece ter chamado a a tenção na Alemanha . O eminente
e erudito economista de Amsterdam, Prof. N. G. P ierson , me escreve:
“O livro de Gossen é tota lmente desconhecido para mim. Roscher
não o menciona na sua muito extensa History of Political Econom y
in Germ any. Nunca o vi citado; mas ten ta remos consegui-lo. É
OS ECONOMISTAS
32
muito cur ioso que o t raba lho tão notável t enha permanecido to-
ta lmente desconhecido mesmo para um homem como o Prof. Ros-
cher , que leu tudo”.
Cliffe Leslie, que fez dos economistas a lemães o seu pr incipa l estudo,
também me informa que ele ignorava completamente a existência do
livro.22 Sob ta is circunstâncias ter ia sido muito mais provável que eu
devesse descobr ir a Teor ia do Prazer e do Sofr imento do que devesse
descobr ir o livro de Gossen , e assina lei com cuidado nas duas edições,
na pr imeira e nesta , cer tas passagens de Bentham, Senior , J ennings
e ou t ros au tores a par t ir dos qua is meu sistema foi desenvolvido, mais
ou menos conscien temente. Não posso a firmar ser tota lmente indife-
ren te aos direitos de pr ior idade; e a par t ir do ano de 1862, quando
minha teor ia foi publicada pela pr imeira vez num breve esboço, fre-
qüentemente me deleitei com o pensamento de que ela era , ao mesmo
tempo, uma teor ia nova e impor tan te. Daquilo que agora expus neste
Prefácio, é evidente que a novidade não pode ser tomada como uma
das pr incipa is ca racter íst icas da teor ia . Muito dela deve-se cla ramente
a Dupuit , e do restan te grande parcela deve ser a t r ibu ída a Gossen .
O desapontamento pode ser facilmente absorvido pela sa t isfação se
porventura conseguir fazer com que seja en tendido e va lor izado o que
foi tão lamentavelmente negligenciado.
Não sei quase nada com relação a Gossen; não tenho cer teza se
ele está vivo ou não. No fron t ispício do livro ele se apresen ta como
königlich preussischem R egierungs-Assessor ausser Dienst, que pode
ser t raduzido como “Assessor do Governo Rea l Prussiano, aposentado”;
mas o tom de suas observações às vezes parece indicar que ele era
um homem decepcionado, se não in jur iado. O acolh imento dado a seu
único t raba lho não pode ter servido como a lívio para esses sen t imentos;
ao cont rá r io, deve tê-los aprofundado. O livro parece conter sua única
teor ia de est imação; pois não posso encont ra r sob o nome de Gossen
nenhum sina l de qua lquer ou t ra publicação ou escr ito cien t ífico, qua l-
quer que seja . A h istór ia desses t raba lhos esquecidos é, de fa to, uma
histór ia est ranha e desencora jadora ; mas chegará o dia em que os
olhos daqueles que não podem ver serão aber tos. Então a devida honra
será dada a todos os que, como Cournot e Gossen , t raba lharam num
campo ingra to do conhecimento humano e deram com a negligência
ou o r idículo que ta lvez tenham a té esperado. Cer tamente não é por
mot ivo de honra que ta is homens na rea lidade t raba lham: eles produ-
zem uma teor ia como a á rvore produz seus fru tos.
Resta refer ir -me aos escr itos matemá t ico-econômicos de Léon
J EVONS
33
22 Um exemplar do livro de Gossen pode ser encont rado na Biblioteca do Museu Br itânico
(n úmero 8 408 cc. 10). Ele n ão foi adquir ido por aqu ela in st it uição an tes de 24.05.1864,
conforme most ra a da ta car imbada no exemplar .
Walras, Reitor da Academia de Lausanne. É cur ioso que Lausanne,
já famosa pelo t raba lho precoce de Isnard (1781), devesse recentemente
dar cont r ibu ições tão impor tan tes à ciência como os escr itos de Walras.
Pois eles são impor tan tes não apenas porque completam e comprovam
aquilo que foi publicado an tes, em out ros lugares, nos t raba lhos des-
cr itos acima, mas porque eles contêm uma terceira ou quar ta descober ta
independente dos pr incípios da teor ia . Se devêssemos seguir o curso
da “filiação de idéias” pelas qua is Walras foi conduzido à sua teor ia ,
dever íamos na tura lmente volta r para o t raba lho de seu pa i, Auguste
Walras, publicado em Paris em 1831, int itulado De la N ature de la R i-
chesse, et de l’Origine de la Valeur. Nesse trabalho não encontramos, é
verdade, um reconhecimento claro do método matemá tico, mas a aná lise
do valor é amiúde aguda e filosófica. O ponto principal do trabalho é,
além disso, verdadeiro, qual seja, que o valor depende da escassez — “La
valeur”, diz Auguste Walras, “dérive de la rareté”. Assim, é precisamente
sobre a idéia do grau de escassez das mercadorias que Léon Walras baseia
seu sistema. O fato de que uns quatro ou mais autores independentes,
como Dupuit, Gossen, Walras e eu mesmo, por vias tão diferentes, che-
garam, essencialmente, aos mesmos conceitos fundamentais da ciência
econômica não pode deixar de emprestar grande probabilidade, para não
dizer quase certeza, àqueles conceitos. Alegra-me saber que Walras pre-
tende publicar uma nova edição de seus ensaios matemá t ico-econômicos,
para os quais peço a atenção de meus leitores. Os títulos de suas publi-
cações serão encontrados no apêndice I (VI desta edição).
Os t raba lhos de Von Thünen e de vá r ios ou t ros economistas a le-
mães contêm invest igações matemá t icas de muito in teresse e impor-
tância . Um considerável número de ta is t raba lhos encont ra -se men-
cionado na lista , que, no en tan to, é especia lmente deficien te no tocante
à lit era tura a lemã . Lamento que não seja capaz de t ra ta r esse ramo
do tema de maneira adequada .
Minha lista bibliográ fica most ra que nos anos recentes, isto é,
desde o ano de 1878, houve grande aumento no número dos escr itos
econômico-matemá t icos. Os nomes de Fontaneau , Walras, Avigdor , Le-
fèvre, Petersen , Boccardo reaparecem muitas vezes. Em per iódicos como
o J ournal des Actuaires Français ou o N ational-Oekonom isk T idsskrift
— uma revista tão honrosa para a energia e o ta len to da escola eco-
nômica dinamarquesa — a t eor ia matemá t ica da Economia é t ra tada
como uma das verdades e in teresses estabelecidos, com os qua is os
leitores esta r iam na tura lmente familia r izados. Na Ingla ter ra , não dis-
pomos absolu tamente de nenhum per iódico no qua l t a is discussões
pudessem ser levadas. O leitor não deixará de observar que esse tema
tão impor tan te está passando rapidamente para as mãos dos au tores
franceses, it a lianos, dinamarqueses ou holandeses. E les desenvolverão
aquela ciência que apenas provoca o r idículo e a incredulidade en t re
os seguidores de Mill e Ricardo. Há apenas uns poucos matemá t icos
OS ECONOMISTAS
34
ingleses, como Fleeming, J enkin , George Darwin , Alfred Marsha ll ou
H. D. Macleod, e um ou dois amer icanos, como o Prof. Simon Newcomb,
que se aventuraram a escrever sobre o desagradável t ema da ciência
econômico-matemá t ica . Devo acrescenta r , no en tan to, que em Cam-
br idge (Ingla ter ra ) o t ra tamento matemá t ico da Economia está se tor -
nando gradua lmente reconhecido devido à an t iga in fluência de Alfred
Marsha ll, a tua lmente diretor do University College em Br istol, cu jas
engenhosas questões econômico-matemá t icas, elaboradas m ore geom e-
trico,23 acabam de ser publicadas em cará t er pr ivado em Cambr idge.
Se não consideramos Hutcheson , que não escreveu especia

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