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1 VOTO OFENSIVO 2 VOTO OFENSIVO RAPHA ËL LIMA 3 ÍNDICE INTRODUÇÃO .............................................................................. 4 O QUE LEGITIMA O ESTADO .............................................. 10 ESTRATÉGIAS POLÍTICAS ................................................... 28 ABSTENÇÃO ............................................................................... 28 DIRETAS E INDIRETAS ......................................................... 32 AS BASES LIBERTÁRIAS ...................................................... 38 A EDUCAÇÃO ............................................................................. 38 O TRABALHISMO ..................................................................... 49 O EMPRESARIADO E O EMPREENDEDOR .................... 54 A CARIDADE .............................................................................. 57 CANDIDATURAS LIBERTÁRIAS – METODOLOGIA E MENSAGEM ............................................................................... 61 O FREE STATE PROJECT ...................................................... 74 A VITÓRIA FINAL – CONSIDERAÇÕES FINAIS ........... 77 4 INTRODUÇÃO Sejamos francos: a política estatal é um empreendimento nojento. Atualmente todos os dias políticos de todos os partidos se reúnem em suas câmaras para decidir o que será feito da vida das outras pessoas, quanto dinheiro delas será tomado, e em que será gasto. Em todos os anos eleitorais vemos promessas de mudanças, mas isto inevitavelmente resulta em mais roubo da propriedade dos eleitores, maior enriquecimento da classe política e seus amigos e mais deterioração da sociedade humana na direção do planejamento completo da ação humana. O sistema político é complexo, com seus vários poderes, câmaras e leis, transformando-se em uma máquina onde nada é feito sem que um bando de outros políticos esteja de acordo, o que naturalmente causa acordos repulsivos, capitulações ideológicas e uma corrida na direção do medíocre, do complexo e do inútil. Não surpreende que isto tenha inspirado o Agorismo de Konkin, que propõe como resposta a tirania estatal o uso de ações contra-econômicas, ações que não colaboram com o estado, não o sustenta e não usam sua estrutura, ações de livre comércio e cooperação numa sociedade comercial libertária e pacífica, com seus próprios sistemas de proteção a propriedade e resolução de disputas, a Agora. Abandone-se o estado e vamos ao mercado. Se queremos uma sociedade livre, vamos viver nela desde já. Onde o estado atrapalha e rouba, 5 criando muros, estruturas devem ser criadas para o comércio e a colaboração, fornecendo uma escada. É difícil imaginar como esta proposta deve ter soado em 1980, quando computadores tinham menos poder de computação do que uma batata, a União Soviética ainda era uma ameaça, a África estava coberta em guerras civis fomentadas por partidos comunistas e a américa latina estava coberta de ditaduras militares. É triste que Konkin não tenha vivido para ver o que a era digital nos trouxe. Hoje podemos trabalhar muito mais livres das amarras do estado via aplicativos de todos os tipos, o que tem trazido grande dor de cabeça para governos pelo mundo todo. Podemos comercializar com milhões em segundos usando uma enorme gama de sites de comércio que exigem praticamente nenhuma burocracia, o que criou toda uma economia informal viva e forte, que por sua vez barateou muito o custo de mercadorias de vários tipos, contribuindo para a qualidade de vida de seus clientes. Podemos transmitir informação a custo quase negligenciável via internet e nela criar veículos de mídia e educação independentes da sanção, fiscalização e censura do estado, o que deu luz a uma mídia inteira paralela a mídia regulamentada pelo estado e um sistema de educação inteiro paralelo ao estado. Uma criptomoeda nova chamada Ethereum permite inclusive a elaboração de contratos automáticos dentro de uma rede digital descentralizada e um país já foi fundado dentro dela, a Bitnation. Tudo isso teria soado como a 6 mais pura loucura 20 anos atrás, mas hoje é uma realidade. As implicações e futuras evoluções destes sistemas são imensas, basta ver que estas possibilidades surgiram anos após a publicação do Novo Manifesto Libertário de Konkin e adicionar a isto o que podemos ter daqui mais 36 anos. Mas o estado ainda existe. A política ainda existe, os políticos ainda existem. O estado apanhou, mas também aprendeu e começou a usar estas ferramentas digitais para reforçar seu domínio sobre a população. O conflito entre o estado e a humanidade ainda existe, o que ocorreu foi uma escalada na complexidade das armas. A tecnologia é uma fantástica porta de combate contra o estado e sua pilhagem, e certamente é uma ferramenta muito bem vinda dado que apenas algumas décadas atrás o único jeito imaginável de afetar ou combater o estado era operar dentro de sua estrutura, uma proposição demorada, complexa, nojenta e enfadonha. O Agorismo teve a visão de uma nova alternativa e tática, mas seu ponto problemático do Agorismo é sua completa rejeição da política partidária, da atuação dentro do estado e da participação em eleições via voto. O motivo dado por Konkin é, acima de tudo, que esta participação legitima o estado perante os outros e compromete a pureza da ideia libertária de não agressão e de uma sociedade livre e horizontal. Entendo, e eu mesmo já fui publicamente um grande defensor deste argumento. No ciclo de eleições de 2016 busquei examinar a teoria política libertária, a aplicação da política e as implicações morais disso, no intuito de sepultar 7 totalmente qualquer ideia de participação libertária na política. E nisso descobri que estava errado. Acontece, e é bom. Não há duvida alguma que a política partidária e estatal como feita hoje é um pântano de imoralidade, corrupção, agressão e decadência humana, porém a participação neste ambiente por parte dos libertários não é necessariamente imoral, nem legitima o estado. Embora a participação da política, das eleições e a eventual operação dentro da estrutura do estado sejam ferramentas antiquadas e ineficientes, são mais uma das ferramentas que o libertário dispõe. Se são moralmente aceitáveis, embora indesejáveis, não podemos descarta-la sem um exame mais completo. Precisamos aprender com o erro dos que riram da proposta de Konkin 36 anos atrás, risos que o tempo transformou em silêncio, e perceber que hoje não podemos rir da política, já que pequenas ações estão calando críticos. Konkin viu o potencial do desenvolvimento tecnológico para a defesa contra a crescente invasão estatal, mas infelizmente não viu como estas mesmas ferramentas poderiam ser usadas para a invasão da estrutura estatal, e obviamente não poderia ver esta aplicação no sistema brasileiro. Os tempos mudaram, as regras mudaram, as armas mudaram, e precisamos nos adaptar. Possivelmente o maior defeito da teoria política atual é que foi praticamente toda escrita por defensores do estado, embora de formas diferentes de estado, e por isso é tão repugnante. Avanços na teoria política libertária foram feitos por alguns importantíssimos pensadores, porém a 8 enorme maioria estava confinada ao sistema político americano, e antes da era digital. A lista é longa, mas vem desde Jefferson até Rothbard, embora atualmente poucos pensadoresse devotem em grande peso a estas questões. Mais escassa ainda é qualquer literatura sobre como a atuação política libertária pode ser posta em prática, e a literatura existente é predominantemente americana, tendo pouca aplicação direta ao sistema eleitoral e político brasileiro. Este é em minha opinião o problema mais grave que o libertarianismo enfrenta hoje no campo teórico, e também na transformação de teoria em prática. Um grande fator que também faz falta é a experimentação e a observação. Como praticamente não existe ação política liberal no Brasil e a ação libertária está em seus primeiros arrastos antes do engatinhar, falta experiência e método para inspirar teorias. Em português claro: praticamente não temos ideia do que fazer. Disso resulta que a maioria dos movimentos e grupos liberais e libertários estão ou tentando praticamente tudo que é possível tentar ou copiando metodologias bem sucedidas já empregadas pela esquerda, e onde não encontram sucesso, encontram aprendizados. A resposta a este cenário não é abandonar o empreendimento político como um todo, mas sim começar os primeiros experimentos e aprender com o tempo, experiência e erros. Não é razoável esperar acertos e sucessos imediatos e definitivos, e sim esperar erros, aprendizados e aceitar que algumas fortes trapalhadas podem acontecer no processo. O movimento libertário 9 está enfrentando uma das estruturas mais profundamente enraizadas na mente e na práxis humana, o estado. Não devemos esperar uma batalha curta nem fácil. Em suma, uma teoria política libertária para o Brasil no século 21 se faz necessária. Pretendo demonstrar que a atuação política não é uma legitimação do estado, assim com o voto não é uma legitimação e em verdade significa absolutamente nada, e para isso preciso examinar o que realmente legitima a estrutura estatal. Mapeados estes, vamos a como o movimento libertário já está se infiltrando nas bases de legitimação do estado, por que isto é importante e como pode ser utilizado para uma amplificação da mensagem libertária, culminando com a necessária candidatura de libertários para cargos dentro do estado e um ensaio sobre a forma destas candidaturas. 10 O QUE LEGITIMA O ESTADO O que defendo como libertário é a interpretação literal de John Locke: o governo legítimo governa com o consentimento dos governados. Vamos conversar sobre o que exatamente significa consentimento, e que ações podem ser entendidas como tal. A maior forma de consentimento é o explícito, racional e livre, e esta forma desautoriza e é superior qualquer outra forma de consentimento implícito inferior. Uma vítima de estupro que repetidamente grita por socorro e pede que seu atacante pare está claramente não consentindo com o processo, e seria um absurdo completo argumentar que como ela não se defendeu fisicamente por medo de ser morta, consentiu com o ataque. Para mim, Locke está falando do livre-mercado, o lugar onde nós, governantes de nossos próprios corpos, interagimos voluntariamente e trocamos a governança de nossas propriedades de maneira livre e consentida, estabelecendo contratos e relações para mútuo ganho. O resultado disso é uma sociedade de laços entre indivíduos, laços que nos protegem, nos ajudam a alcançar nossos objetivos e que refletem as necessidades da população. Governa a minha propriedade quem eu consentir explicita e livremente que o faça. No entanto, a maior parte das pessoas entende a frase incorretamente, imaginando a ideia de um estado democrático. O que a enorme 11 maioria das pessoas não percebe é que a escolha que é imposta pelo estado é análoga à escolha que um estuprador, ladrão ou assassino impõe a sua vítima: obedeça-me ou morra. Não há consentimento. Nenhuma ação que o libertário tome em resposta a esta ameaça travestida de contrato social pode ser considerada como forma de aceitação do estado. O libertário explicitamente não consente com o estado. O libertário explicitamente condena o estado como um agressor, o imposto como roubo, o exercício de seu poder como escravização em massa, sua manipulação da moeda e da economia como fraudes e suas diversas iniciativas de um suposto “bem estar social” como compra de votos e responsável pela erosão dos laços sociais pacíficos. Apenas duas ações poderiam ser consideradas como apoio ao estado: agredir ou defender agressão, isto é, o exercício de um suposto poder estatal para efetuar agressão, ou a alegação explícita, racional e livre de que tal exercício é moral, legítimo ou necessário. Como o libertário, por definição, não faz o segundo, apenas o primeiro precisa ser analisado. O ponto importante é o uso de recursos do estado e a participação em sua estrutura. Se algum libertário usa um serviço que foi pago com dinheiro roubado da população via impostos, ele não legitimou o estado, assim como uma vítima de sequestro que aceita ser alimentada não aceitou ser sequestrada. Entre estes serviços estão coisas como usar as calçadas e ruas, universidades públicas, serviços de empresas estatais, votar e ocupar cargos públicos. Certamente seria 12 preferível evitar estar na situação onde se torna necessário usar a estrutura do estado, e ainda mais óbvia é a necessidade de criação de estruturas alternativas e contra-econômicas como propôs Konkin, e até a necessidade de redes de apoio entre libertários para situações de desemprego e outras necessidades, mas existem situações onde usar a estrutura estatal é inevitável, e se omitir de usar estes serviços não fará com que o dinheiro seja devolvido às pessoas que foram roubadas pelo estado, nem fará com que os serviços deixem de existir e muito menos fará com que o estado decida se extinguir. Se um libertário usa eletricidade que é fornecida por uma agência estatal, ele não concordou com o estado, assim como se ele se filiar a um partido, eleger-se ou até deter um cargo governamental, nenhum consentimento com o estado foi explicitamente dado. Pessoas não familiarizadas com a filosofia libertária podem se confundir e achar tais ações incongruentes, mas isto não é um problema das ações e sim revela uma necessidade de mais divulgação sobre o libertarianismo e sobre a real natureza do estado. Também existem aqueles que não se importam com a verdade e usarão argumentos tortos para dizer que libertários não podem cursar universidades públicas, andar nas calçadas ou usar agua encanada da empresa estatal, mas desonestos sempre existirão e não devemos pautar nossas ações primariamente com base naqueles que estão prontamente dispostos para distorcê-las. A campanha do Brexit foi encampada pelo UKIP mesmo sob todos os tipos de calúnias e distorções, 13 e caso o UKIP e seus apoiadores tivessem se importado com a opinião alheia, ainda estariam presos ao projeto de super-estado da União Europeia. Como dito antes, a única ação do libertário que poderia ser interpretada como apoio ao estado seria a agressão usando o poder estatal, mas isso não está atrelado necessariamente a estar dentro da estrutura estatal. Digamos que alguém construa um lago em sua propriedade e lá comece a criar peixes. Para fazer o lago o sujeito precisaria de autorização governamental, e para isso precisaria pagar uma taxa, mas ele não o fez, afinal esta é uma regulação invasiva a propriedade de alguém que não consentiucom esta governança. Se um fiscal do estado encontrar o lago e emitir uma multa ao proprietário, ele estará legitimando o estado, afinal está sendo um veículo de iniciação de agressão contra alguém pacífico. Emitir multas, impostos, confiscar propriedades, prender pessoas por “crimes” sem vítima, proibir empreendimentos e tantas outras ações agressivas são uma legitimação do estado, pois são exercícios do seu suposto poder. Agora digamos que alguém na cidade do exemplo do lago reporte o suposto criminoso ao estado. Esta é uma ação que legitimaria o estado. Digamos que alguém diga para seus amigos ou filhos que a multa foi correta e que o estado pode sim regulamentar uma propriedade da qual não é dono e punir desobedientes. Esta ação também legitimaria o estado. Digamos que um professor numa escola dessa cidade use este evento para “ensinar” a seus alunos que isto é correto e 14 necessário. Este professor também está legitimando o estado. Também é culpado o advogado que aceitar trabalhar para o estado e processar o construtor do lago, o professor de direito que “ensina” a seus alunos que esta lei é correta e deve ser defendida, e tantos outros que ou colaborarem para esta agressão ou que ensinarem que ela é correta ou necessária, e que os agredidos pelo estado não deveriam se defender, afinal merecem ser agredidos. Isto pode parecer uma acusação contra todas as pessoas que trabalham dentro do estado e dizem que ele é necessário e bom, mas tais pessoas não deveriam ser necessariamente vistas como inimigos, pessoas desprezíveis ou agentes doutrinadores. A triste verdade é que a maioria das pessoas que age para a glória e doutrinação do estado, inclusive uma parte dos políticos, não faz ideia do que ele realmente é, nem do que está realmente defendendo. Desconhecer é certamente uma tragédia, mas nunca um crime. Se soubessem aquilo que libertários sabem, provavelmente mudariam o jeito que atuam dentro destas organizações estatais ou as abandonariam completamente, e a realidade nos mostra que este é o trajeto cursado pelos servidores públicos de todos os tipos que se tornam adeptos do libertarianismo. Servidores públicos não devem ser odiados nem agredidos verbal ou fisicamente, e sim educados sobre a estrutura da qual participam, e naturalmente uma resistência grande será oferecida, pois é de se esperar que um humano normal resista a ideia de que está, sem saber, participando de uma organização que 15 pratica roubo, fraude e sequestros sistematicamente. Agora, caso um libertário se encontre em qualquer uma destas posições e atue como um libertário, seja no cargo de um advogado do estado que se recusa a processar pessoas pacíficas, de um professor do estado que não ensina qualquer coisa a favor do estado e sim ensina a filosofia do libertarianismo, seja ele a pessoa que avista o lago e não o denuncia, e mesmo seja ele o fiscal que avista o lago e não multa o sujeito, desobedecendo assim ordens do estado de agredir pessoas pacíficas, nada de imoral foi feito. De fato, muito bem seria feito a toda a sociedade se todos os cargos de fiscais da receita fossem ocupados por libertários que estão eternamente em greve, ou se todos os juízes de uma região fossem libertários e simplesmente se recusassem a emitir sentenças favoráveis ao estado, ignorando completamente a constituição e emitindo decisões embasadas apenas na lei natural. O mesmo vale para um cargo político. Libertários como Rothbard e Block defende que se um libertário em exercício de um cargo eleitoral ou não eleitoral decidir não fazer valer as leis imorais do estado e se comprometer a apenas prejudicar o estado em todas as ocasiões possíveis, votando contra qualquer lei que o expanda e votando a favor de qualquer lei que o reduza, atuando diariamente para reduzir o poder estatal e denunciando-o sempre, esforçando-se para acordar seus colegas para a realidade da agressão estatal, nada de imoral foi feito, nem em momento algum qualquer tipo de consentimento foi dado ao estado. Só porque alguém entrou na 16 igreja não quer dizer que o sujeito virou cristão. Para isso é preciso ajoelhar, rezar e acreditar na oração. Novamente concedo que operar dentro da estrutura mais intima do estado, especialmente dentro da política eleitoral é um trabalho desgastante e que colocará o libertário diariamente em contato com algumas das piores personalidades e ideias que a humanidade pode oferecer, mas nem tudo que cai no esgoto é dejeto, embora certamente venha a ficar cercado deles. Uma analogia comum feita como argumento contrário ao envolvimento na política é de que usar eleições para destruir o estado seria como infiltrar um grupo terrorista para destruí-lo por dentro, e é uma analogia correta, embora tenha suas limitações como todas as analogias. Caso alguém se infiltre num grupo terrorista e lá faça absolutamente nada de útil, se comprometendo apenas a sabotar todas as iniciativas dos terroristas, nada de errado está sendo feito. Ninguém toma o fato de que agências de inteligência estatais infiltram organizações terroristas como uma validação do terrorismo pelos agentes estatais. A falha na analogia é assumir que a atuação política e infiltração no estado é a única maneira de destruí-lo, o que não é verdade. Assim como existem várias maneiras diferentes de combater o terrorismo, existem diversas maneiras de combater o estado. O limite da analogia é que a infiltração tem implicações, dificuldades e outras características mais muito diferentes entre a política e a célula terrorista. O ponto aqui colocado é que a participação na 17 máquina do estado não é imoral e é apenas uma das várias ferramentas disponíveis aos libertários. Sua eficácia, aplicação, tempo para sucesso e tantas outras coisas podem ser discutidas, mas não é imoral per se. Resolvido o problema da operação dentro do estado, ficamos então com o problema do voto em si, e ele não pode ser entendido como uma legitimação do estado nem como uma agressão. Lysander Spooner já encerrou a questão em seu livro “A Constituição de Nenhuma Autoridade” de 1867, onde ele argumenta (e aqui resumo) que: (Nota: nesta citação o termo “constituição” pode perfeitamente ser entendido como “estado”. Mantive a grafia apenas por apreço a forma original). 1) O voto só pode criar um vínculo entre o eleitor e a constituição do país, e como nem todos podem votar isto implica que os “não eleitores” não estão obrigados a apoiar ou defender a constituição. 2) Dos que podem votar, nem todos votam, e muitos dos que podem nunca vão votar. E quando estes votam, estão declarando apoio apenas pelo tempo do mandato em questão, não eternamente. 3) E nem por votar pode ser dizer que o eleitor escolheu apoiar a constituição, a não ser que o ato de votar seja voluntário, mas votar não pode ser 18 considerado voluntário, pois quer vote ou não, o estado vai agredir o eleitor quer ele consinta ou não. Quem vota vê na eleição uma possibilidade de se defender num conflito que foi imposto a ele. Para que o voto fosse voluntário, a proposta deveria ser “se você não votar o estado não alegará autoridade sobre você”, o que evidentemente jamais é o caso, ou seja, não é possível afirmar que todos os votos dados são consentimentos com a constituição. 4) Como taxação é imposta em todas as pessoas,muitos votam para evitar serem roubados. Tomar a propriedade de uma pessoa sem consentimento e inferir seu consentimento porque a pessoa votou para evitar que seja roubado não é prova de consentimento. 5) Em quase todas as eleições votos são dados a vários candidatos para o mesmo cargo. Não é possível supor que votaram a favor da constituição, pois podem ter votado apenas para evitar o outro candidato, portanto pode-se supor que estes votaram contra a constituição. 6) Muitos votos são dados a candidatos que certamente não serão eleitos. Quem votou nestes candidatos pode não ter votado em apoio à constituição, mas para obstrui-la. 7) Como os votos são secretos, não há modo de saber quem votou contra ou a 19 favor da constituição, ou seja, votar não prova consentimento de qualquer individuo em particular. Como não há prova alguma que um indivíduo sequer apoia a constituição, não pode ser dito que alguém a apoia. 8) Como não há prova das intenções dos eleitores, elas podem ser apenas alvo de conjecturas. É possível então que muitos dos que votam querem apenas usar a constituição contra seus oponentes, mas caso seus oponentes vençam, os primeiros deixariam de apoiar a constituição. 9) Como todos votam secretamente e não podem ser responsabilizados pelos atos dos eleitos, não se pode dizer que alguém apoia a constituição ao votar. Apenas o consentimento público e voluntário, e a aceitação de responsabilidade pelos seus eleitos, desde que atuem dentro dos limites dados, pode ser entendida como consentimento. 10) Como o voto é secreto, e como todo governo é secretamente um bando de ladrões, tiranos e assassinos, o fato de que o governo é feito através do voto secreto só prova que existe entre nós um bando oculto de ladrões, tiranos e assassinos, cujo propósito é escravizar e matar dissidentes conforme necessário. A existência deste bando 20 não prova nada sobre o consentimento com a constituição. Ou seja, do jeito que eleições são realizadas hoje, votar significa absolutamente nada, nem prova qualquer tipo de coisa. É um ato sem sentido lógico próprio, um ritual aleatório que não liga causa e efeito, assim como civilizações antigas sacrificavam pessoas na crença de que isso faria o sol nascer. Para que o voto pudesse ser considerado uma legitimação do estado ele precisaria ser um contrato não anônimo, voluntário e com regras e duração definida, porém se os diferentes governos se limitassem apenas a governar quem livre e explicitamente assinasse este contrato, não seriam estados, afinal o estado é definido pela imposição violenta de uma governança. Vale observar também que o voto em um político em específico não significa absolutamente nenhuma relação contratual entre político e eleitor, já que o político pode simplesmente fazer o que bem entender e não sofrerá sanções por isso. Argumentar que votar é participar da agressão estatal é inferir que o voto tem alguma relação com o exercício de poder pelo estado, e como vimos isto é completamente falso. Só respeitamos o voto por uma crença sem fundamento de que ele pode autorizar o estado a fazer certas coisas, mas como poderia isso ser verdade? Como podemos transferir, via voto, um poder que não temos, nomeadamente o poder de decidir quem será agredido e quem será beneficiado com isso? Se nenhum de nós pode 21 cobrar impostos, invadir propriedades, encarcerar pessoas ou recruta-las para nossa defesa, nem nenhuma ação que o estado faz, como podemos então autoriza-lo a cometer estes atos? Assim como é impossível vender uma propriedade que não é sua, é impossível autorizar o estado a agredir, pois este não é um direito seu para ser transferido. O estado somente é legitimado, em última análise, pela crença popular de que certas pessoas podem agredir outras pessoas, ou seja, que existem superiores e inferiores, e os inferiores não devem ter o direito de se revoltar contra seus superiores. Ao longo da história existiram discordâncias apenas sobre o método pelo qual estes supostos superiores seriam encontrados: vitórias em guerras, assassinato do superior anterior, um suposto apontamento divino ou, como hoje se acredita: o voto através de um “processo democrático”. A enorme maioria das pessoas não percebe que acredita que é perfeitamente normal que o estado mande em nossas vidas, tome nossa propriedade via impostos e puna com multa, prisão ou morte caso alguém resista este acordo supostamente tão benéfico. Curiosamente, se a mesma relação fosse imposta por uma gangue de mafiosos armados ou uma empresa, organização ou religião, reconheceríamos isso imediatamente como uma exploração criminosa e escravagista, mesmo se esta gangue limpasse as ruas, nos presenteasse com barras de chocolate uma vez por semana ou presumisse poder ensinar sua versão de filosofia para nossos filhos. 22 A ideia de democracia representativa encontrou solo fértil nas mentes infantilizadas das pessoas acostumadas com a existência do estado e nas mentes perversas que visavam elas serem as detentoras do poder. Nos vários casos onde estados anteriores foram destituídos, por exemplo, a revolução francesa, independência americana, brasileira ou de qualquer outro país, a queda da união soviética e tantos outros, certos grupos interessados em serem os novos donos do poder precisavam convencer a população a aceita-los como governantes, e uma das alternativas para fazê-lo é invocar a ilusão do voto, isto é, a ideia de que se uma porção da população nos aceitar, os outros devem se calar e aceitar também, reduzindo o problema de aceitação do novo estado a um mero suborno de parte da população com poder e riquezas. A população acostumada com a ideia ilógica de que um estado precisa ou deve existir aceitou esta ideia, pois se cria uma ilusão de que ela detém mais poder agora do que antes, ou de que de alguma forma bizarra este novo estado é, na verdade, propriedade do povo quando o contrário é o correto, isto é, o povo é propriedade do estado, assim como sempre foi em todos os outros esquemas de organização estatal da história. Esta fraude intelectual se mantém viva primariamente por dois motivos, embora vários outros menores existam: doutrinação e subornos. A formatação da educação moderna foi criada na Prússia por monarcas sanguinários que precisavam normalizar e domesticar a população de regiões anexadas, evitar revoltas internas, criar 23 uma relação de adoração da monarquia pelo povo, incentivar a participação nas forças militares, semear desconfiança e aversão a outras nações e povos e genericamente falando criar uma mentalidade nacionalista e patriótica (Rothbard, Educação Livre e Compulsória). Embora a Prússia não exista mais, seu modelo de educação estatal compulsória foi amplamente copiado na Europa, América e América Latina, pois era extremamente eficiente no que se pretendia e governantes de todos os tipos a reconheceram como um excelente sistema de domesticação em massa. No Brasil, assim como em vários lugares do mundo, a educação como um todo é regulamentada pelo estado direta e indiretamente, e seu currículo e vários outros detalhes são obrigatórios e fiscalizados, ou seja, a população é obrigada a comparecer as escolas para lá aprender o que o estado quer que elas aprendam. Como um adicional temos o ENEM, que cobra no fim do ensino médio oque os seus criadores resolverem cobrar, e como o exame é estruturado dentro do MEC, o governo pode desviar significativamente do currículo convencional e inserir perguntas de forte conteúdo ideológico na prova, mesmo que em pequena quantidade, assim sinalizando para as escolas que devem ensinar a ideologia que o governo defende, ou seus alunos terão um desempenho fraco na prova. Filósofos e ideólogos de vários tipos também se prestam a escrever livros exaltando o estado, mas estão ou em sua folha de pagamento e o fazem por ganância ou pior, agem por crença de que de fato existem pessoas superiores que devem controlar as 24 inferiores. O resultado disso é que a educação estatal não ensina conhecimentos realmente úteis para o trabalho, o empreendedorismo ou uma vida moral, mas praticamente todos os alunos saem do sistema escolar com baixíssimas capacidades de pensamento crítico, pouquíssimo conhecimento sobre história, uma aceitação passiva e normalizada com a autoridade imposta e um flagrante desconhecimento sobre direitos naturais. Isto foi recentemente temperado no Brasil com um molho adicional de doutrinação socialista, pois era conveniente aos que controlavam o estado. A mídia também opera como um veiculo de doutrinação, afinal seus repórteres e editores também são formados na educação estatal, e portanto são incapazes de perceber o estado como raiz dos vários problemas que jornais de todos os tipos reportam no dia-a-dia. Culpa por crimes, crises e desastres é atribuída a qualquer entidade, organização, ideia ou pessoa, e até mesmo é atribuída ao governo atual que não exerceu seu poder de coerção de maneira “correta”, mas jamais o estado é questionado, ocasionalmente frequentemente por pura incapacidade dos repórteres e editores de identificar este problema, mas muito frequentemente por suas orientações e alianças políticas. Ademais governos rapidamente reconheceram que a mídia possui amplos poderes de convencimento e se empreenderam em cooptar e censurar mídias de todos os tipos, criando autorizações e licenças de todos os tipos que podem ser revogadas a praticamente qualquer momento e oferecendo benefícios a jornalistas que estejam dispostos a glorificar o status-quo, seja lá 25 qual for. Finalmente, no caso Brasileiro, vimos no governo do PT como dinheiro de empresas estatais ou dinheiro desviado de esquemas de corrupção não só financiava bases políticas, mas também era orientado para uma estrutura de mídia digital que exaltava as ações do governo e atacava seus opositores, embora obviamente esta estratégia não tenha sido criada pelo PT em si. O segundo método é o simples suborno. Num governo qualquer haverá os que o apoiam, os que não o apoiam e os indecisos, e este governo fará a coisa mais lógica imaginável: usar uma perversão da lei para roubar dos que não o apoiam para distribuir o esbulho entre seus apoiadores e caso seja necessário num ano eleitoral, entre os indecisos também. Na mente do estatista os que não apoiam o governo atual nem estão dispostos a vender seu apoio não importam, pois não possuem poder algum. Opositores não precisam necessariamente ser vistos como parte da população e sim como a fonte de riqueza que será “redistribuída” entre os apoiadores do governo, já que os opositores também estão domesticados a aceitar passivamente que o estado tem autoridade para roubar a quantia que quiser. Os que o apoiam recebem benesses na forma de serviços, cargos, poder de agressão ou em vários casos pagamentos diretos, garantindo assim que continuarão defendendo o governo atual. Este modelo de doutrinação e suborno para manutenção do poder já é velho. Já foi feito por uma combinação do clero como doutrinador e exército como repressor, de divisão de terras e feudos como suborno, de expansão do governo 26 para abrigar apoiadores em cargos diversos e, via repressão e fuzilamento de opositores e no sistema democrático atual, com a monopolização do ensino e o suborno via o “estado de bem-estar social”. Adicionado a estes dois métodos temos no Brasil o trabalhismo de Vargas, a implantação de sindicatos nas profissões mais cruciais – e eventualmente em todas as profissões – e a obrigatoriedade de filiação e sustentação destas organizações, restringindo o acesso ao trabalho honesto e pacífico e criando mais uma camada de controle entre o estado e a população domesticada. É interessante como hoje sindicatos de todos os tipos são análogos a uma concessão feudal, onde um grupo de pessoas tem o direito de explorar o trabalho de “inferiores” e os trabalhadores não possuem direito de contestar esta estrutura. Assim sendo, estes sindicatos farão o lógico: ao invés de representar os trabalhadores daquela classe, se empreenderão em fazer alianças políticas para continuar vivendo do trabalho alheio e para estender sua capacidade de controle. Para isso precisarão gastar amplas somas, quase sempre confiscadas dos próprios trabalhadores que eles alegam defender, para enganar seus filiados com ideias protecionistas e mercantilistas, criando uma virtual abominação do livre-mercado e uma necessidade narcótica de proteção estatal. A infiltração destas estruturas (educação, mídia, sindicatos e política) por libertários não é uma violação do princípio de não-agressão e pode fazer muito para destruir sua influência e ligação com o estado, libertando as pessoas submetidas a 27 elas, sejam eles estudantes de audiência cativa e presença obrigatória, leitores desavisados que são enganados por mídias estatistas, sindicatos que buscam criar uma mentalidade permanente de Síndrome de Estocolmo e, no ponto mais alto da pirâmide, a população escravizada e domesticada pela classe política e seus associados. 28 ESTRATÉGIAS POLÍTICAS ABSTENÇÃO Antes de analisar que possíveis medidas e ações políticas podem ser tomadas, vamos analisar a proposta de abstenção completa e suas possíveis implicações. Em 2014 nas eleições presidenciais 34,4 milhões de pessoas votaram nulo ou se abstiveram do processo. Mais 4,4 milhões votaram em branco, mas é difícil avaliar estes números já que muitos não sabem a diferença entre um voto branco ou nulo. Somados, temos 38,8 milhões de pessoas, ou 27% do eleitorado. Isto conta apenas pessoas que podem votar, os 143 milhões de eleitores de 200 milhões de habitantes, ou seja, 38,8 milhões de pessoas que podem votar escolheram nada, e mais 57 milhões sequer podem escolher alguma coisa, resultando em 95,8 milhões de pessoas, praticamente metade da população brasileira. Um em cada quatro eleitores desprezou o processo e apenas uma em cada dois brasileiros escolheu algum político. Apenas uma em quatro escolheu Dilma Rousseff, indicando que 75% da população não votaram a favor do governo atual. O numero é ainda menor quando se leva em conta de que muitos que votaram pelo governo atual somente o fizeram por medo do seu concorrente, e não porque aprovavam o projeto que venceu o pleito. O verdadeiro número de eleitores do governo atual pode bem ser 15% da população ou menos. O estado se incomodou com isso? 29 Absolutamente não. O assunto sequer foi erguido, e os 38,8 milhões que escolheram ninguém são um número extremamente expressivo, maior que os 34,9 milhões de votos que Aécio Neves teve no primeiro turno da eleição, e ainda assim o segundo turno foi Dilma versus Aécio, e não Dilma versus ninguém ou versus a abolição do estado. Quanto aos deputados federais, 8,8 milhõesde pessoas votaram em branco e 7,8 milhões votaram nulo. Somados aos 27,7 que nem sequer foram votar, temos 44,3 milhões de eleitores, ou 31% do eleitorado. Se somarmos aos que não podem votar, temos 101,3 milhões de pessoas, a maioria da população brasileira. Eleições para deputado usam o truncado coeficiente partidário, então é impossível dizer exatamente quantos deputados teriam sido eleitos pelo partido do “dane-se”, mas os 70 deputados do PT somados aos 66 do PMDB são 26% dos deputados totais, ou seja, o partido do “dane-se” muito provavelmente seria uma fortíssima bancada na câmara. Ainda assim, isto não é levado em consideração, nem as votações dos deputados são corrigidas para levar este fator em conta, forçando leis a serem aprovadas por uma maioria real, ou seja, os a favor contra os contrários mais os que escolheram nada. O partido do “dane-se”, por regimento da câmara, seria presidente, vice-presidente ou relator na maioria das comissões do legislativo, e talvez até conseguisse eleger um presidente da câmara, tornando-se capaz de ditar o andamento dos projetos, aceitar ou recusar pedidos de Impeachment e estar na linha sucessória a presidência. Novamente pergunto: em 30 algum momento isto incomodou o estado ou levantou alguma palha de dúvida sobre se ele deveria existir ou é legítimo? Nos estados unidos, onde o voto é opcional, a situação é mais bizarra ainda: 45,1% das pessoas que podem votar simplesmente não votaram. Em algum momento isto trouxe um pingo de incômodo aos poderes do estado americano? De maneira alguma. Apenas 126 milhões de americanos votaram em 2012, de uma população de 320 milhões, ou seja, 60% da população votaram em absolutamente ninguém, e tudo continua como sempre. O atual presidente Obama foi eleito com 20% dos votos da população do país, e novamente preciso lembrar que enorme parte deles votou não em Obama, mas contra seus concorrentes, reduzindo o numero de apoiadores do governo Obama a algo na ordem de 10% da população, talvez menos. Estes números mostram um fato: o estado simplesmente não se importa se você vota ou não, ou se você aceita ele ou não. Ele continuará seu processo e continuará alegando propriedade sobre você, confiscando seu dinheiro via impostos e punindo você por evadir as arbitrariedades agressivas do estado. Não me parece fazer sentido especular que o estado se incomodaria se as abstenções não fossem 60% mas sim 80% ou 90% da população. E mesmo se tais números de abstenção fossem alcançados, governantes podem resolver que dado que a maioria das pessoas não vota e aparenta não se importar com o processo, talvez seja mais prático simplesmente cancelar as eleições e governar eternamente os mesmos 31 cargos, o que resultaria ou em aceitação por parte da população ou manifestações massivas pedindo o poder de voto, o que por sua vez não mudaria muito a situação atual. A abstenção que de fato exerceria um enorme efeito no estado é a abstenção de tributação, isto é, se o estado não consegue captar dinheiro da população que controla, não consegue se sustentar já que não consegue manter suas estruturas de doutrinação e suborno. O problema é que a estrutura do estado que tende a ser mais eficiente, rápida e violenta é seu departamento de receita, ou seja, existe enorme desincentivo para que pessoas não paguem seus impostos já que o estado cada vez melhor monitora nossas vidas e cada vez mais rápido nos pune por não aceitar ser seu escravo. É evidente que ações contra-econômicas como o uso de moedas digitais, aplicativos de trabalhos que conectam indivíduos sem intermediadores, comércio on-line e outros sistemas podem ajudar a libertar pessoas e devem ser fortemente incentivadas, mas é mais correto dizer que elas usarão estas iniciativas não para acabar com o estado, mas para se proteger dele, assim como quem usa um agasalho quer se aquecer, e não exterminar o frio. De qualquer forma não existe sentido em exigir que libertários se abstenham completamente de pagar todos os impostos e sejam encarcerados ou mortos, até porque o confisco de sua propriedade, ato que será conjunto a prisão, acabará por dar ainda mais recursos ao estado, e o movimento libertário se jogará no suicídio rapidamente, muito para a conveniência do estado. 32 Se libertários completamente se ausentarem da ação política e da infiltração da estrutura do estado, dedicando-se a converter todos os outros ao libertarianismo e ao abandono da política, é de se imaginar que ficarão dentro do estado apenas os mais ferrenhos defensores da agressão estatal, especialmente os socialistas e comunistas. Conceder todo o poder do estado a eles por desistência implica que eles poderão doutrinar a população como quiserem e criar seus grupos cada vez mais militarizados, como vimos no caso da Venezuela. A implicação disso é que eventualmente podemos chegar num cenário onde o estado, tomado pelos piores socialistas e comunistas, passa leis que ordenam a perseguição, confisco de propriedade, prisão e execução de libertários, liberais ou mesmo qualquer um que não abertamente se declare socialista ou comunista. Não faltam exemplos históricos. Já existem grupos hoje que defendem tais políticas, e abandonar o estado para estes grupos resultará em enorme violência. A política estatal é nojenta, mas não podemos deixa-la para os piores dos estatistas. DIRETAS E INDIRETAS Até 2016 defensores da liberdade foram forçados a tarefa humilhante de escolher qual candidato destruiria a sociedade mais vagarosamente. A escolha de um candidato dentro da lógica do voto defensivo é um dos maiores exercícios em futilidade imagináveis, já que é uma 33 certeza dada que o candidato escolhido não defende valores libertários e será uma enorme decepção, mesmo para quem tiver baixas expectativas. Como podemos esperar que os políticos atuais sejam amigáveis a ideias contrárias a estrutura do estado se em muitas ocasiões sequer são amigáveis as próprias ideias que eles defendem e aos partidos que os acolhem? Obviamente somos forçados a este recorrente debate quando nenhuma opção libertária se apresenta, mas não é uma estratégia que dará algum resultado além de um retardo da implantação do totalitarismo, onde os libertários serão apenas mais uma frente de idiotas úteis que avaliza candidatos estatistas, embora em menor grau. Outra possibilidade é a tentativa de influenciar candidatos perifericamente, estabelecendo estruturas de educação e informação, promovendo uma visão libertária dos problemas que se apresentam aos governantes e criando uma base de pessoas interessadas em propostas de redução e eliminação do estado, simultaneamente sinalizando a políticos propostas libertárias, apresentando uma grande base popular que as apoiaria e direcionando o voto destas pessoas para políticos que já defendem ideias mais liberais. Esta estratégia tem mostrado alguma capacidade de influência já que nos últimos anos, ou em mais verdade nos últimos meses, vemos mais e mais políticos citando mídias libertárias, inclusive apresentando-as em discursos e em propostas de lei. 34 A limitação desta estratégia é que fundamentalmente trata-se de vitória por conversão, e rapidamente fica evidente que não podemos esperar derrotar os maiores defensores do estatismo via conversão por mídias majoritariamente digitais, além dofato de que tal estratégia só encontra espaço nos políticos já céticos do tamanho do estado e que sentem falta de orientação, já que os socialistas, os nacionalistas paternalistas, os protecionistas e os políticos que se elegem com o puro intuito de comércio de poder dificilmente darão ouvidos a causa libertária. Estas duas estratégias chamo de indiretas, pois nelas os libertários estão fora do sistema eleitoral de maneira completa, porém sua aplicação não pode ser o centro do método já que como vimos estão fadadas ao fracasso, devendo ser utilizadas como estepes, como posições indesejáveis na ausência de um envolvimento direto. Aprendi desde cedo que se você realmente se importa com algo, faça você mesmo, e que não é razoável esperar que outros se importem tanto com a sua causa tanto quanto você. O caminho político direto, embora não seja simples, é a de candidaturas de libertários, sejam elas dentro de um partido de ideologia libertária ou não, porém não podemos imaginar que essas candidaturas podem acontecer sozinhas, num vácuo social quase perfeito, e sim devem ser entendidos como uma ponta de lança de um corpo libertário maior. Se esperarmos apenas o período eleitoral para propor candidatos, expor ideias e provocar debates no curtíssimo tempo permitido, levaremos 35 milênios para conseguir alguma coisa. Segue-se que precisamos compreender qual é este corpo que embasa um partido, como este corpo funciona e onde podemos operá-lo. Felizmente já temos uma pequena experiência para aprender. Até o ano de 2016 era inimaginável propor candidatos libertários já que o estabelecimento político não os aceitaria e a criação de um partido no Brasil é extremamente difícil, mas o cenário mudou. Uma piada recorrente hoje é que todos os libertários do Brasil antes de 2010 caberiam dentro de uma Kombi, sentados. Saímos desta situação para em 2016 apresentar candidatos a vereador em ao menos quatro partidos diferentes, vários com chance de eleição, e uma candidatura a prefeitura de Porto Alegre, mesmo que todas as campanhas estejam sendo organizadas com praticamente zero experiência eleitoral e financiamento. E de onde veio este crescimento explosivo que em alguns poucos anos saiu de um punhado de libertários declarados para hoje um numero mais próximo de 100mil, ou talvez mais? Ora, do recém nascido mas crescente corpo libertário brasileiro. É importante compreender as bases deste corpo e suas chaves para sucesso especialmente comparado ao desastre que foi o Partido Libertário americano por muito tempo. O Partido Libertário foi fundado nos EUA em 1971 com virtualmente nenhuma base, estrutura ou organização libertária no país, e o próprio Murray Rothbard, criador do termo “Anarcocapitalismo” e maior teórico vivo do libertarianismo abertamente fez troça ao fato de que o partido, com seus menos de 100 afiliados, o 36 convocou para ser candidato a presidência com o que Rothbard chamou de um “dilúvio de 5 cartas e telefonemas”. Algumas décadas precisaram se passar para que o PL tivesse maior projeção e capacidade, e isto só ocorreu quando organizações libertárias em outras instituições libertárias surgiram para sustenta-lo, já que até então era uma cabeça sem corpo, uma mente que não tinha pernas para andar. Ninguém sabia o que era Libertarianismo nem se interessava porque, antes de tudo, não haviam libertários suficientes para explicar o tema calmamente. Um partido não é uma organização fechada em si, mas sim parte de uma rede maior que promove educação e divulgação das ideias, uma rede que conecta instituições pessoas que estão nas diferentes organizações da sociedade, entre elas a educação básica e superior, a arte, a mídia, os sindicatos, as forças armadas, os clubes e associações comunitárias, e mais recentemente na internet. A esquerda ocupa praticamente todos estes espaços e por isso não é surpresa sua enorme influência, já que transforma este corpo numa arma extremamente letal de atuação política e eleitoral, provocando o que é chamado de uma morte por mil cortes. Libertários no Brasil conseguiram encontrar um espaço muito importante no veículo mais potente para estrutura estatal no longo prazo: a educação, e estão encontrando outro lugar na mídia. Além destes também precisamos entender o papel do trabalhismo e o sindicalismo que estão enraizados no pensamento do trabalhador, o curioso caso do setor empresarial que pede mais intervenção 37 estatal e a ação social de caridade. A limitação a estes cinco casos não quer dizer que são os únicos, mas os que são mais influentes hoje no aparato político. 38 AS BASES LIBERTÁRIAS A EDUCAÇÃO Nossa situação educacional atual encontra vários paralelos com a reforma da linguagem descrita por Orwell em 1984: o governo do livro estava alterando a linguagem e apagando palavras para evitar que as pessoas fossem capazes de pensar sobre certos conceitos e questionar o que estava acontecendo. Similarmente a enorme maioria dos brasileiros toma a estrutura do estado como absolutamente necessária e inquestionável, uma obviedade tão forte que sequer lhes ocorre refletir sobre isso. Esta situação não é uma criação da esquerda atual, já que ela na verdade apenas tomou o controle da educação da mão dos positivistas e estatistas de diferentes tipos, e assim como Orwell aponta que quem controla o presente controla o passado, e quem controla o passado controla o futuro, os estatistas, positivistas e depois a esquerda apagaram do passado brasileiro a tradição liberal, pintaram os governantes trabalhistas como a salvação da população e retrataram o período monárquico como uma ditadura escravocrata. A história comercial do Brasil é retratada como uma história de exploração, onde primeiro éramos roubados por Portugal, depois pela Inglaterra e atualmente somos roubados pelos Americanos. O período de desenvolvimento forçado e intervencionista que dominou a primeira parte do século 20 é retratado como bem intencionado e bem sucedido, embora 39 não tenha sido intervencionista o suficiente, e a grande inflação da época e enorme atraso em relação a outros países que adotavam políticas liberais é simplesmente ignorada. A cereja do bolo é o suposto neoliberalismo que supostamente destruiu o Brasil na presidência de Fernando Henrique Cardoso, provando de uma vez por todas que qualquer tentativa de política fora do populismo intervencionista certamente matará a população inteira de fome em menos de 6 meses. Com uma visão tão distorcida da história a conclusão sequer precisa ser dita para os estudantes. Segue-se logicamente que o país deveria nacionalizar praticamente tudo, eleger presidentes mais intervencionistas, atacar o livre comércio e regulamentar pesadamente o empreendedorismo e colocar o empresariado maligno de joelhos para a glória do trabalhador explorado. Se existe um problema, este problema deve ser imediatamente resolvido pelo governo, afinal a iniciativa privada, embora bem intencionada, é incapaz de coordenar coisas sozinha e explorará a população inteira através de monopólios e salários irrisórios. Tal nível de condicionamento, cegueira histórica e econômica significa que os conceitos mais básicos terão que ser ensinados, que palavras terão que ser aprendidas e reaprendidas, e que alguns entenderão a ideia rapidamente e outros não. Isto significa que libertáriosprecisarão exercitar extensivamente sua paciência e habilidades de comunicação. Estamos tentando derrubar uma cadeia de montanhas de proporções continentais de filosofia estatista, intervencionista 40 e socialista, e onde antes da internet só tínhamos um cinzel e uma picareta como ferramentas, agora temos dinamite, mas ainda é um trabalho árduo e por vezes muito frustrante que demorará muito tempo a ser concluído. Felizmente este trabalho já está em andamento, embora em seus primeiros ensaios. Com o advento da internet uma porta dos fundos para a educação foi aberta, e por ela entraram os libertários. Antes disso a presença na educação poderia se dar somente com aval governamental ou, no caso da esquerda durante o regime militar, a doutrinação em universidades. Quando os militares se retiraram do poder a esquerda já havia treinado duas gerações de professores, estes que depois se espalharam por toda a rede de educação básica e de outras tantas disciplinas do ensino superior, criando uma hegemonia de pensamento que dominou o sistema formal de educação até recentemente. Esta hegemonia recebeu grande ajuda do excelente trabalho empreendido pelo regime militar em destruir quase todas as bases, organizações e partidos conservadores e liberais de longa tradição, enquanto deixou florescer a ação socialista na educação, especialmente no nível superior. Finalmente há de se reconhecer que o positivismo nacionalista e intervencionista característico da ditadura foi um bom ponto de partida para a doutrinação e condicionamento que se seguiram nos anos após o regime, já que educadores socialistas não precisaram demonizar o capitalismo nem o empreendedor, pois os militares já tinham feito isso. 41 Esta hegemonia pedagógica da esquerda só foi desafiada quando a porta dos fundos da internet trouxe vários veículos diferentes de divulgação libertária, e com a determinada ação de divulgação de alguns libertários que correram o país dando palestras, fomentando grupos e promovendo debates contra as outras escolas econômicas, políticas e históricas, além da vital participação do Estudantes Pela Liberdade, uma organização internacional dedicada a treinar e educar estudantes para serem lideres na defesa da liberdade. Estas vozes encontraram ouvidos naqueles que sentiam um cheiro estranho no ideário socialista mas não sabiam o que era, que ainda mais sofriam com a crença de estarem sozinhos, imersos numa aparente hegemonia absoluta da esquerda, quando em verdade os dissidentes eram uma grande massa silenciosa, órfã de ideias, sozinha em seu silêncio. Tão fértil era o solo que rapidamente estes veículos saltaram para milhões de acessos mensais, palestras e eventos aparecem mais e mais e grupos de estudo começaram a se formar nas universidades e escolas de ensino médio em várias regiões do Brasil. Estes grupos concorreram a eleições e começaram a capturar Centros Acadêmicos, e mesmo onde não ainda o fizeram estão sendo capazes então de reverter a doutrinação e condicionamento socialista e estatista, promovendo uma educação mais livre e trazendo pensadores liberais e libertários para dentro das salas de aula. Este evento não pode de maneira alguma ser subestimado, afinal justamente no 42 ponto mais forte da doutrinação estatista os libertários encontraram um porto onde atracar. Destes grupos e associações mais e mais veículos surgiram, como sites de notícias completamente libertários, ou mesmo apenas defensores do livre-mercado, grupos locais com reuniões recorrentes não ligadas a atividade acadêmica e hoje apresentam candidatos e bases eleitorais. Fora da educação formal a capacidade de divulgação via internet encontrou muito solo nos ouvidos dos “revoltados sem respostas”, as milhões de pessoas que sabiam quase instintivamente que algo fundamental estava errado, exigem respostas e mudanças, mas não fazem ideia de como consertar o sistema. Ao oferecer uma nova explicação, uma explicação diferente, coesa e filosoficamente embasada, uma explicação com propostas simples e que atacam diretamente a raiz do problema, muitos puderam finalmente ver que é na estrutura do estado que devemos buscar a origem dos problemas que hoje se manifestam na sociedade. Foi com uma mensagem simples e clara que luz foi jogada onde antes só havia enrolação, politicagem e repetição de tentativas falhas. Ao ouvir que “Imposto é roubo”, “o estado é uma gangue de criminosos”, “tudo deve ser privatizado” e tantas coisas mais, a mente de muitas pessoas se abriu para uma nova possibilidade que nunca é questionada, o que por sua vez cada vez mais está forçando políticos e estatistas de todos os tipos a defender suas posições com relação a impostos, a CLT, restrições de comércio, burocracias e bloqueio de aplicativos. 43 Este é outro ponto que não pode ser subestimado. Creio fortemente que milhões de brasileiros prontamente se identificariam como libertários se soubessem que a proposta de fechar o estado, abolir os impostos e privatizar tudo é possível, válida e melhor do que o sistema atual e não só um pensamento que nos ocorre em momentos de raiva e revolta. Onde na época de Konkin a educação era extremamente centralizada e verticalizada, praticamente imune a influências exteriores, e no caso do Brasil onde praticamente inexistem influenciadores que não sejam do campo socialista, hoje temos uma superfície extremamente porosa a ideias externas e avessas ao programa governamental e ao controle de professores. Antes da internet alunos dissidentes precisariam empreender uma enorme pesquisa para encontrar algum livro de qualidade capaz de contradizer a doutrina socialista, mas hoje artigos de todos os níveis de complexidade, vídeos, livros traduzidos e mídias sociais permitem um acesso facílimo ao contraditório. Se alguém quisesse criticar as ações do Banco Central, por exemplo, precisaria possuir livros e manuais de outros países e outras vertentes econômicas, mas como isso seria possível se praticamente ninguém os conhecia também? Onde você começaria a procurar, sendo que nem imagina o que está procurando? Como poderíamos chegar a uma forma diferente de conhecimento se os livros precisariam ser traduzidos por editoras que dificilmente o fariam, já que não havia incentivo financeiro para tal? Os que não viveram esta era já estão acostumados 44 com o fato de que podemos divulgar a custo negligenciável quase toda a bibliografia da Escola Austríaca de Economia, os livros de liberais clássicos como Mill e Locke, os tratados mais obscuros de Oakeshott, Burke e Tockeville, e finalmente autores extremamente contemporâneos como Hoppe, de Soto e Block. Mais importante ainda, temos acesso praticamente gratuito e imediato a milhares de horas de palestras de economistas, filósofos, historiadores e tantos mais via YouTube. Sem esta revolução digital seria impensável uma infiltração libertária na educação, mas hoje o acesso é tão fácil que se torna quase banal. Vamos colocar este esforço e resultado em perspectiva. O estado gasta dezenas de bilhões de reais todos os anos com a doutrinação de sua população jovem, e a décadas implanta no sistema de educação uma mentalidade intervencionista, anti-capitalista, anti-empreendedorismo e infantilizadora. Os socialistas controlam este aparato já a algumas décadas e já foram hegemônicos. Eles possuemdezenas, talvez centenas de milhares de professores direta ou indiretamente, consciente ou inconscientemente treinando jovens para o pensamento socialista. Com a ação dedicada de algumas centenas de pessoas e poucos recursos ao longo de cinco anos nós libertários já abrimos um grande buraco na hegemonia socialista, conquistamos milhares de alunos e estamos em franco crescimento. Mais e mais professores aderem as ideias liberais e libertárias, e cada vez mais possuem mais material e fontes para ensinar adequadamente seus alunos. 45 Assim como o Uber quebrou o monopólio dos táxis, a infiltração libertária está quebrando o monopólio das escolas. A assimetria de resultados é brutal, e demonstra assim a eficácia e eficiência destes métodos. Contrário a situação do Partido Libertário americano, temos cada vez mais pessoas educadas no libertarianismo e com capacidade de divulga-lo e defende-lo, e esta é a base mais fundamental para uma ação política de sucesso e para servir como incubadora para futuros candidatos libertários. A penetração cada vez maior das ideias de livre-mercado e direitos naturais na educação, especialmente sua crescente presença na academia transforma-as em ideias cada vez mais aceitáveis, sendo portanto uma enorme força para mover a janela de Overton para longe das ideias socialistas e na direção de mais liberdade. A participação política de libertários e o aumento das chances de que sejam eleitos está fundamentalmente ligada a educação, seja ela formal ou a educação disponível fora das salas de aula. Ajudar uma é ajudar a outra. A MÍDIA A queda da hegemonia da mídia tradicional é mais uma das grandes portas abertas pela revolução digital e pelo advento das mídias sociais. Emitir opinião costumava ser um trabalho duro e visto por poucos. Para publicar em um jornal precisa-se vencer o crivo de dois editores e potencialmente dos patrocinadores do veículo, 46 resultando que discordantes eram reduzidos a jornais locais, facilmente censuráveis e de custo relativamente alto. A televisão e sua devoção maníaca pela mediocridade então eram um veículo inalcançável, e o máximo de crítica dissidente do status-quo poderia ser emitido em uma ou duas novelas, ou numa reportagem sobre um fato qualquer que desagradasse o governo. O sistema passado gerava uma opinião homogênea e rasa, facilmente influenciada por políticos e ideólogos que controlavas as prensas e as câmeras, mas hoje pequenas pessoas podem discordar fortemente do status-quo, afinal com um celular ou um computador qualquer um se torna um veículo de mídia, e isto é um enorme perigo para o estado e uma enorme oportunidade para libertários. Adicione isto a uma pesquisa recente da FGV que indicou que 45% das pessoas confiam na mídia impressa e 34% confiam na televisão, ou seja, 55% não confiam nos jornais e revistas e um brutal 66% não confiam na televisão, e vemos que existe um enorme espaço vazio na comunicação de eventos e narrativas. Uma verdadeira guerra de narrativas foi empreendida na campanha presidencial de 2014, com o lado socialista vermelho do PT e seus aliados pintando um país lindo e melhorando, enquanto o lado socialista azul do PSDB e seus aliados pintava um país e declínio e risco. A narrativa dos vermelhos acabou por ganhar, mas a duras penas e talvez apesar da narrativa que tentaram retratar. Veículos de todos os tipos questionavam a narrativa empreendida pelo governo com dados de uma crise iminente, e isto 47 forçou o governo a se explicar e tentar desviar do que posteriormente seria provado como realidade. Obviamente teria sido mais fácil para o governo sustentar sua narrativa fantástica do Brasil se ainda estivesse no campo mais controlado dos anos 80 ou 90. Tanto é verdade que o governo empreendeu grandes quantias de dinheiro para se fazer presente no espaço digital para tentar rebater as acusações que sofria, e posteriormente foi revelado e provado como usava dinheiro oriundo de esquemas de corrupção para financiar blogs que o apoiassem. O perigo das mídias digitais é ainda maior por sua capacidade de potencializar uma mensagem. Um pequeno vídeo pode alcançar milhões de pessoas, um artigo bem escrito em um site razoável pode eliciar respostas de veículos maiores. O Instituto Mises Brasil com seu humilde site, alguns colunistas dedicados e traduções bem escolhidas lançou uma nova vertente de pensamento econômico no país, agora começando a estabelecer parcerias com universidades para ter influência no meio acadêmico, algo que dificilmente aconteceria caso seus defensores apenas tivessem pedido educadamente sem uma massa de centenas de milhares de acessos mensais. Sites como o Spotniks e o Mercado Popular ofereceram uma narrativa libertária menos acadêmica e mais popular, cativando milhões de leitores todos os meses e se tornando referencia até para o discurso de deputados e senadores. Seus artigos são agora parte influente da mídia digital e também estão sendo grande incômodo para a estrutura estatal. Embora não 48 seja uma iniciativa libertária, O Antagonista hoje atinge dezenas de milhões de visualizações todos os meses e embora a mídia convencional resista fortemente em valida-lo, se tornou referencia entre aqueles que buscam saber sobre a política brasileira, e forçou os políticos a mudarem seus discursos várias vezes, e isso sendo que um dos seus criadores sequer está no país. A mídia digital é uma arma ainda maior em campanhas eleitorais, já que o tempo convencional alocado para partidos pequenos e emergentes é praticamente nulo, uma estrutura desenhada para manter o status-quo e forçar ideias menores a se reduzirem e entrarem em acordos medíocres com poderes maiores. Hoje uma campanha pode ser feita quase inteiramente pela internet via vídeos e textos, a um custo muito inferior do que a panfletagem clássica de não mais que dez anos atrás. O estado criou um muro contra novas ideias, e agora temos uma escada. Possivelmente a maior demonstração atual disso no Brasil seja o fenômeno Bolsonaro, que embora tenha uma mensagem longe do ideal libertário, mostrou como uma ideia diferente pode ir longe com um público que espontaneamente o defende e divulga. Nos Estados Unidos a campanha de Gary Johnson conseguiu sair de 1% de votos em 2012 para uma presença de 12% nas pesquisas até agora, e embora isso possa ser em parte atribuído ao completo desastre que são seus oponentes, não se pode negligenciar o fato de que sua presença digital e a capacidade de gerar mídia de maneira irrestrita e relativamente barata também tem um efeito forte. 49 É notório o dizer de Mises que somente ideias podem iluminar a escuridão, e a assimetria de forças com mídias digitais transforma nossas tochas em verdadeiros incêndios, forçando assim o conflito de ideias que antes era evitado com o acobertamento de opositores. Agora podemos ser ouvidos. Aproveitem para falar. O TRABALHISMO A politização e estatização da estrutura sindical, quase totalmente infiltrada por socialistas ou mesmo comunistas dos tipos mais antiquados, é uma fortíssima base para a expansão do poder estatal e a disseminação da influencia socialista contra a sociedade. Não é por acidente. Durante a segunda guerra mundial o Reino Unido mobilizou fortemente sua população, organizando brigadas de trabalho e sindicatos e criando várias leis que os davamvastos poderes. O resultado foi que apenas dois meses após a rendição da Alemanha nazista, Winston Churchill e o partido conservador foram derrotados por uma margem de 11% nas eleições nacionais, o que colocou o partido trabalhista no poder, e o Reino Unido sofreu a estagnação brutal do sindicalismo e o planejamento central por três décadas até que Margaret Tatcher finalmente desafiou o poder dos sindicatos. Nos Estados Unidos os sindicatos de professores controlam a educação do país, garantindo seus empregos de maneira quase eterna em detrimento da qualidade de educação, além de serem abertamente de esquerda. 50 O Brasil não foge a regra, e o uso do sindicalismo como uma base de poder do governo Vargas, e sua mecanização como ferramenta estatal foi fortalecida junto com a criação da CLT. As leis sindicais e trabalhistas foram elaboradas ou por influência do fascista Vargas ou por influência de pensadores abertamente socialistas e comunistas. É óbvio que o intuito desta estrutura é o controle da população, a nacionalização das relações e um forma de estender o poder federal e infiltra-lo para dentro de todas as empresas. Sindicatos possuem tantas regalias que frequentemente me refiro a eles como as capitanias hereditárias modernas. A chamada “contribuição sindical” nada mais é do que um imposto destinado a sustentar a classe dos dirigentes de sindicato, confiscando 3,1 bilhões de reais dos trabalhadores brasileiros apenas em 2015, recursos que ou foram desperdiçados por sindicatos parasíticos ou pior, usados para erodir ainda mais a liberdade de trabalho, e recentemente as organizações sindicais propuseram ainda mais uma taxação no trabalhador, embora o projeto esteja longe de ser aprovado. Todo mês uma nova profissão é “regulamentada” e colocada embaixo da asa de um sindicato que poderá fazer desta profissão praticamente o que bem entender, estes sindicatos novos se tornam braços de partidos e veículos de financiamento político, divulgação de ideias, pressão política e centros de treinamento e promoção de futuros políticos socialistas. Vários sindicatos agem para imobilizar profissões regulamentando salários e fechando 51 recém formados para fora do trabalho, encarecendo o acesso ao serviço fornecido e piorando a vida de praticamente todos os envolvidos, ou seja, não agem para proteger o seu representado, mas para proteger os profissionais já inseridos no mercado contra a competição de novos trabalhadores. Um caso notório é o sindicato dos bancários, que faz greve todos os anos com dia marcado mesmo que a maioria dos bancários seja contra e considere o ato todo uma enorme palhaçada, furando as greves, trabalhando “clandestinamente” e frequentemente pedindo desculpas aos clientes pelas politicagens de um grupo que não identificam como seus “defensores”. Os resultados são que alguns recebem um pequeno aumento que é pago pela demissão de funcionários e aumento de taxas para os clientes, e mais e mais empregos são cortados pelos bancos que progressivamente enxergam seus funcionários como problemas em potencial. Outra influência nefasta dos sindicatos é a quase incansável defesa dos supostos benefícios da CLT, que na verdade nada mais é do que um conjunto de impostos, a reserva de mercado, o encarecimento do trabalho e portanto aumento forçado do desemprego e a obrigatoriedade de participação num esquema de pirâmide chamado INSS. Praticamente nenhum político ousa atacar os sindicatos e suas quase infinitas fontes de renda e poder, resultando que o poder sindical apenas cresce e torna-se cada vez mais um partido político se encaminhando para status de quarto poder. 52 É justamente por isso que sindicatos podem ser uma base de atuação para libertários: para libertar as pessoas desta relação de exploração travestida de cuidado. Sindicatos obviamente tem uma função como uma associação de trabalhadores que busca aumentar seu poder de negociação e melhorar as condições de sua profissão. O problema é que esta relação foi completamente pervertida e imposta coercitivamente a todos os trabalhadores, sendo obrigados a sustentar um sindicato que não talvez não queiram e obedecer regras que talvez achem estúpidas e desnecessárias. Estes trabalhadores insatisfeitos com a representação forçada em muitos casos se sentem isolados, presos ou abandonados, e caso se oponham são discriminados, difamados, perseguidos e até agredidos fisicamente. Existe portanto uma enorme demanda de milhões de trabalhadores silenciosos que bem gostariam de ficar com o dinheiro de sua “contribuição” sindical e trabalhar nas condições que quiserem, sem sustentar uma enorme classe política. Libertários precisam ouvir esta demanda e ajudar a defender estes trabalhadores da coerção dos sindicatos. Obviamente é recomendável estar numa profissão com menos intervenção estatal, e é verdade que parte do poder sindical está sendo erodido pela economia digital, mas ainda existem casos onde isto demorará para acontecer, mas isto ainda está longe de ser universal e uma grande massa de pessoas não tem condições de simplesmente abandonar suas profissões. Caso o libertários encontrem-se em uma profissão onde 53 sindicatos exercem forte controle, é importante que busquem unir os dissidentes e tomar este controle das mãos de intervencionistas e socialistas, retornando a função original de representação do trabalhador e associação de profissionais, reduzindo os custos aos trabalhadores que anualmente tem um dia de seu trabalho confiscado. Sindicatos precisam ser expostos e denunciados, pois não realmente protegem seus trabalhadores e sim os utilizam como fonte de renda e poder político. Isto deve ser feito pelos trabalhadores libertários, por candidatos libertários e por políticos libertários eleitos. É de se esperar que os lideres sindicais nos ataquem como inimigos dos trabalhadores, mas são eles os inimigos e devem ser apontados como tal, afinal são eles que precisam usar o poder coercitivo do estado para roubar o salário de trabalhadores e são eles que querem impor suas ideias a força nos seus supostos representados. É fundamental quebrar esta relação de doutrinação de defesa dos supostos direitos dos trabalhadores para que as massas acordem para o fato de que defendem algo que os prejudica. Os libertários são os que realmente defendem os trabalhadores e sua liberdade de trabalhar, e devem se apresentar como tal, enquanto os sindicatos defendem apenas seus líderes e suas ideologias e devem assim ser denunciados. Devemos perguntar sempre: se sindicatos são tão importantes e benéficos, por que tem medo que a filiação e pagamento possam deixar de ser obrigatórios? 54 O EMPRESARIADO E O EMPREENDEDOR No capitalismo de compadrio brasileiro já tradicional de séculos, o empresariado aprendeu de um jeito ou de outro que seu sucesso está atrelado a sua colaboração com o governo, e em específico com os governantes. Logicamente quanto mais intervencionista a política de um país, mais valioso é o poder da caneta dos políticos e mais comercializado ele será. Não surpreende então a observação de que grande fatia do grande empresariado brasileiro está na cama com o governo, de maneira geral pouco importando qual é o governo, desde que esteja no poder, e que as campanhas vitoriosas nos recentes ciclos tenham sido as que mais receberam
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