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Tribunal de Justiça de Minas Gerais 1.0035.09.169452-7/001Número do 1694527-Númeração Des.(a) Gutemberg da Mota e SilvaRelator: Des.(a) Gutemberg da Mota e SilvaRelator do Acordão: 13/04/2010Data do Julgamento: 07/05/2010Data da Publicação: EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - PRELIMINAR - CLÁUSULA ARBITRAL - INOPONIBILIDADE AO SÓCIO QUE COM ELA NÃO CONCORDOU - ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA - FUNGIBILIDADE - MEDIDA CAUTELAR INCIDENTAL - ALTERAÇÃO DO ESTATUTO SOCIAL PARA PERMITIR A TRANSFORMAÇÃO DO TIPO SOCIETÁRIO SEM UNANIMIDADE - NULIDADE DE ASSEMBLEIA - PREJUDICIALIDADE EM RELAÇÃO A ASSEMBLEIA POSTERIOR - DEFERIMENTO. A cláusula de arbitragem inserta em estatuto ou contrato social não vincula os sócios que a ela não anuíram expressamente, sob pena de violação do art. 5º, XXXV, da Constituição da República. Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. Se o resultado do julgamento da ação de anulação da assembléia que alterou o estatuto social, para permitir a transformação do tipo societário sem a unanimidade dos votos, poderá ser ineficaz caso a transformação ocorra, deve esta ser provisoriamente sustada. Havendo o risco de dano consubstanciado na transformação da sociedade anônima em sociedade limitada, que pode resultar na exclusão de sócios antes do julgamento final do processo, deve- se deferir a medida cautelar para sustar a transformação. Preliminar de cláusula de arbitragem não acolhida e recurso provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL N° 1.0035.09.169452-7/001 EM CONEXÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO DE Nº 1.0035.09.168635- 8/001. - COMARCA DE ARAGUARI - AGRAVANTE(S): ROSANGELA DORAZIO BROCKHAUSEN E OUTRO(A)(S) - AGRAVADO(A)(S): FRIGORIFICO MATABOI S/A - RELATOR: EXMO. SR. DES. GUTEMBERG DA MOTA E SILVA 1 Tribunal de Justiça de Minas Gerais ACÓRDÃO Vistos etc., acorda, em Turma, a 10ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador CABRAL DA SILVA , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR E DAR PROVIMENTO. Belo Horizonte, 13 de abril de 2010. DES. GUTEMBERG DA MOTA E SILVA - Relator NOTAS TAQUIGRÁFICAS Assistiram ao julgamento, pela agravante, a Drª. Karina Rossato e o Dr. Leonardo Pereira Rocha Moreira e, pelo agravado, o Dr. Daniel de Palma Petinati. O SR. DES. GUTEMBERG DA MOTA E SILVA: VOTO ROSÂNGELA DORAZIO BROCKHAUSEN e ELIZABETH DORAZIO GHIONI interpuseram agravo de instrumento pleiteando a reforma da decisão do MM. Juiz plantonista da 3ª Vara Cível da Comarca de Araguari, que indeferiu pedido de antecipação dos efeitos da tutela pretendida nos autos da ação ordinária de nulidade de Assembléia Geral que movem contra FRIGORÍFICO MATABOI S.A., do qual são acionistas minoritárias. Sustentaram que no dia 2-6-2009 foi realizada uma Assembléia Geral dos acionistas da sociedade agravada, mas tanto a sua convocação quanto as suas deliberações contêm vícios legais, como a alteração do estatuto da sociedade anônima para permitir a sua transformação sem que seja necessária a concordância unânime dos sócios, e a aprovação irregular das contas dos administradores. 2 Tribunal de Justiça de Minas Gerais Alegaram que já movem outra ação pleiteando a anulação de assembléia realizada em 23-1-2009, que ampliou o capital social da empresa, resultando em diluição injustificada da participação delas. Afirmaram que foi convocada nova assembléia, para o dia 30-11-2009, que tinha como objeto a transformação da sociedade anônima em sociedade por cotas de responsabilidade limitada, e que esta assembléia foi suspensa por decisão da MM. Juíza titular, proferida na ação cautelar preparatória apensa, sendo posteriormente suspensa tal decisão por este relator, o que resultou na realização de assembléia geral no dia 28-12-2009 e na efetiva transformação do tipo societário de anônima para limitada, assembléia esta também viciada. Alegou mais que a assembléia objeto do pedido de anulação, a de 2-6-2009, foi convocada irregularmente, sem a antecedência exigida pela lei, não sendo disponibilizados previamente os documentos necessários à discussão das propostas, e que as deliberações tomadas na assembléia do dia 28-12- 2009 são dependentes do resultado das ações de anulação das assembléias anteriores, de modo que deve ser deferida a antecipação de tutela para suspender a eficácia da disposição estatutária que permitiu a transformação do tipo societário e, como conseqüência, para anular a referida transformação. Ressaltou que "só é possível a alteração do estatuto de uma companhia para nele inserir dispositivo que permita a deliberação assembléia que aprove a proposta de transformação do tipo societário por maioria quando o anterior nada dispuser especificamente sobre o tema (...), nas seguintes situações, a saber: (i) na falta de previsão estatutária específica, se obtido o consentimento unânime dos sócios e (ii) quando houver cláusula expressa permitindo a transformação." Por fim, invocou a presença dos requisitos para o deferimento da antecipação, sendo o fundado receio de dano irreparável configurado pela supressão de direitos essenciais que a Lei das S.A. assegura aos acionistas minoritários, como a existência do conselho fiscal, havendo disposição estatutária que facilita a dilapidação do patrimônio societário. Requereram a atribuição de efeito suspensivo ao recurso. 3 Tribunal de Justiça de Minas Gerais Foi deferido o efeito suspensivo, revogando a decisão proferida no agravo de instrumento nº 1.0035.09.168635-8/001 e antecipando os efeitos da tutela para suspender a eficácia das deliberações que transformaram o tipo societário da sociedade agravada. Contrarrazões da agravada argüindo preliminar de não conhecimento do recurso, por existir no estatuto social cláusula de arbitragem, e, no mérito, pugnando pelo seu desprovimento, com base em pareceres de Fran Martins e Fábio Konder Comparato em casos análogos ao presente. É o relatório. DECIDO. Preliminar de não conhecimento do recurso. Argumenta a sociedade agravada a impossibilidade de conhecimento deste recurso, e, em última análise, de submissão de toda a matéria do processo ao Poder Judiciário, por haver no seu estatuto cláusula arbitral submetendo ao Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá a solução das controvérsias entre as partes. A preliminar improcede. De fato, o art. 30 do estatuto social, introduzido pela questionada assembléia do dia 2-6-2009, prevê que qualquer litígio, disputa ou controvérsia relativa ao presente Estatuto Social será dirimida de forma definitiva por arbitragem. Entretanto, tal cláusula não se aplica aos acionistas que não anuíram expressamente à sua introdução. A cláusula de arbitragem, como forma de limitação voluntária ao constitucional direito de ação, somente é oponível a quem inequivocamente abriu mão de seu direito, ou seja, é possível que a sociedade estabeleça a cláusula de arbitragem para suas relações, mas somente poderá ser invocada caso a parte contrária também tenha concordado previamente. Dispõe o art. 5º, XXXV, da Constituição de República: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou 4 Tribunal de Justiça de Minas Gerais ameaça a direito; Assim dispõem os arts. 3º e 4º da Lei nº 9.307, de 23-9-1996: Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral. Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígiosque possam vir a surgir, relativamente a tal contrato. § 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira. § 2º Nos contratos de adesão, a cláusula com promissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula. Como se observa, não é a lei, mas a própria pessoa, como sujeito do direito de ação, que pode limitá-lo. Se se permitisse, com base no art. 109 da Lei nº 6.404, de 15-12-1976, que a maioria dos acionistas restringisse o direito do acionista minoritário de levar seu conflito ao Poder Judiciário, estaria a lei excluindo da apreciação do Judiciário lesão ou ameaça a direito, o que é constitucionalmente vedado. O § 2º do referido art. 4º deixa claro o objetivo legal de não vinculação compulsória de quem quer que seja ao compromisso arbitral, tanto que nos contratos de adesão, em que a parte, em tese, já concorda com a cláusula se assina o contrato, exige-se assinatura especial em relação à referida cláusula. Diversa é a situação de quem haja ingressado na sociedade quando em seu estatuto já constava o referido compromisso, pois o próprio 5 Tribunal de Justiça de Minas Gerais ato de ingresso significa a concordância com todos os termos do Estatuto, entre os quais o compromisso arbitral. Assim, rejeito a preliminar. MÉRITO As sócias agravantes pretendem a reforma da decisão que indeferiu a antecipação dos efeitos da tutela da ação em que pretendem anular a deliberação que introduziu no estatuto social da sociedade agravada a possibilidade de alteração do tipo societário sem a necessidade de aprovação da unanimidade dos sócios, o que resultaria na impossibilidade da efetiva transformação antes de julgada referida anulatória. A decisão agravada, de fls. 145 a 147, fundamentou-se basicamente em decisão anterior deste relator, quando analisou o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao agravo de instrumento nº 1.0035.09.168635-8/001, na qual foi demonstrada a irrelevância do resultado do processo nº 0035.09.160641-4 na efetivação da transformação do tipo societário, o que, contudo, é objeto diverso do que se pretende na demanda que ensejou este agravo. O pedido das agravantes, apesar de chamado de antecipação dos efeitos da tutela, tem natureza cautelar, pois visa a resguardar o resultado útil da referida demanda, de modo que provimento final eventualmente favorável seja plenamente eficaz. Segundo o art. 273, § 7º, do CPC, se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. É o caso dos autos, cabendo a aplicação do princípio da fungibilidade. A discussão de fundo é a possibilidade de se acrescentar ao estatuto social, sem concordância de todos os acionistas, cláusula que permita 6 Tribunal de Justiça de Minas Gerais a transformação do tipo societário por maioria absoluta. O fundamento é relevante, pois a lei das sociedades anônimas, na ausência de previsão estatutária, exige unanimidade na deliberação de transformação (art. 221 da Lei nº 6.404, de 15-12-1976), de modo que a alteração do estatuto para dispensar tal unanimidade, feita por decisão não unânime, pode ser considerada como violadora da lei, permitindo uma transformação indireta por vontade da maioria, quando seria necessária a unanimidade. É evidente que a anulação da segunda assembleia, a de 2-6-2009, pelo motivo acima, resultaria na impossibilidade de transformação da sociedade de anônima para limitada, ou seja, seria questão prejudicial à terceira assembleia, a de 28-12-2009. Ademais, a cautela recomenda a manutenção da situação que é a mesma já por vários anos, a de atuação do frigorífico como sociedade anônima, não se havendo demonstrado substancial alteração do contexto econômico que justifique a abrupta mudança na vida societária. É certo que, ao final da ação anulatória, o quadro poderá ser outro, pois as partes já terão demonstrado suficientemente suas razões. O risco de dano irreparável às agravantes é evidente, pois a permissão de transformação da sociedade anônima em sociedade limitada poderá resultar até mesmo na sua retirada compulsória, em razão da quebra da affectio societatis, requisito da existência de sociedade limitada. Tal situação seria irreversível, tornando inútil o resultado de todos os processos que tramitam na Justiça. É importante ressaltar a irrelevância, neste momento, dos pareceres juntados pelo MATABOI, pois o agravo de instrumento trata de situação liminar, ou seja, anterior ao regular desenvolvimento do processo, não sendo dele objeto as teses jurídicas expostas pelas partes, que serão consideradas ao final do processo, mas, apenas, a necessidade de se acautelar o direito das acionistas minoritárias. Dito de outro modo: o órgão de segunda instância não poderia se 7 Tribunal de Justiça de Minas Gerais manifestar peremptoriamente neste momento a respeito da possibilidade ou não de alteração do estatuto da forma como foi feita, sob pena de prejulgar o processo principal. Deve o Tribunal, sim, verificar se a situação provisória deve ser mantida ou alterada, de modo a resguardar o resultado útil do processo. Por fim, cumpre observar o prejuízo em que persistem as partes na evidente situação de litigância compulsiva, anotando-se que a composição amigável é certamente a melhor solução para a controvérsia sócio-familiar que já se estende por vários meses e processos judiciais, em detrimento do desenvolvimento da empresa e da paz entre os irmãos. Diante disso, rejeito a preliminar e dou provimento ao agravo, reformando a decisão agravada para deferir, como medida cautelar incidental, a suspensão da deliberação que alterou o estatuto social do FRIGORÍFICO MATABOI para permitir a alteração de seu tipo societário sem o consenso unânime de seus sócios, até o julgamento final do processo, e, como conseqüência, para invalidar as deliberações da assembléia geral realizada no dia 28-12-2009 que sejam incompatíveis com esta decisão. Custas recursais pelo agravado. O SR. DES. ALBERTO ALUÍZIO PACHECO DE ANDRADE: VOTO De acordo. O SR. DES. CABRAL DA SILVA: VOTO De acordo. SÚMULA : REJEITARAM A PRELIMINAR E DERAM PROVIMENTO. 8 Tribunal de Justiça de Minas Gerais TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL Nº 1.0035.09.169452-7/001 9
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