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Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 5 INTRODUÇÃO Caro(a) aluno(a), Esta apostila busca apresentar a você, aluno(a) do curso de graduação em Pedagogia e Licencia- turas da Unisa, na modalidade a distância, os fundamentos da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Nesta disciplina, temos como objetivos: refletir acerca das diferenças entre a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e o Português; entender a importância da Língua Brasileira de Sinais para os surdos; conhecer e respeitar a diferença linguística entre surdos e ouvintes; e capacitar futuros educadores na Libras. Discutiremos aspectos fundamentais sobre língua e linguagem, a diferença entre as línguas orais- -auditivas e visuais-espaciais, a estruturação da língua, assim como aspectos diferenciados da gramática da Libras. Desenvolveremos a competência e habilidade de percepção visual e observação, aprendendo a diferenciar a estrutura linguística das línguas orais e a de sinais, e percebendo as características dos sinais a partir dos seus parâmetros. Iremos estudar, também, o alfabeto datilológico, a composição dos sinais e sua legitimidade enquanto língua. Lembramos que o conteúdo apresentado é introdutório e que, portanto, ninguém, ao término des- te curso, terá proficiência em Libras, mas o foco desta disciplina é propor questionamentos e apontar possibilidades de trabalho com alunos surdos, em relação à sua língua materna. Não há respostas pron- tas em relação à língua, mas temos a certeza de que cada conteúdo aqui discutido irá beneficiar a sua reflexão e o trabalho com seu(sua) aluno(a). Bem-vindo ao mundo das línguas visuais. Bom trabalho! Profa. Marcia Regina Zemella Luccas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 7 MOVIMENTO HISTÓRICO DA LÍNGUA DE SINAIS1 Quando eu aceito a língua de outra pessoa, eu aceitei a pessoa... Quando eu rejeito a língua, eu rejeito a pessoa, porque a língua é parte de nós mesmos... Quando eu aceito a língua de Sinais, eu aceito o surdo, e é importante ter sempre em mente que o surdo tem o direito de ser surdo. Nós não devemos mudá-los, ensiná-los, ajudá-los, mas temos que permitir-lhes ser surdo. Anônimo Caro(a) aluno(a), escrever sobre a história da Libras e do movimento que ocorreu no Brasil é uma tarefa árdua, pois, quando falamos sobre esse assunto, não estamos falando somente de um modo de comunicação, mas de uma concep- ção de sujeitos e nos referindo à possibilidade de respeito a essa população surda, que, muitas ve- zes, é invisível (MONTEIRO, 2006). É importante salientar que é bastante difí- cil conhecer o número de deficientes auditivos e surdos existentes no Brasil, pois, quando é reali- zado o censo populacional, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pela pesquisa, tem dificuldades para especificar este número, uma vez que a pesquisa solicita o nú- mero geral de “pessoas portadoras de deficiên- cias”, não especificando a questão da surdez. Alguns autores, entre eles Monteiro (2006), apontam que, apesar de todas as dificuldades, dados recentes do IBGE estimam que o número total de surdos brasileiros seja de 5,7 milhões (di- vididos em: surdos profundos e deficientes au- ditivos). Esses dados também apontam que, no Estado de São Paulo, há 480.000 e que, na capital paulista, esse número é de 150.000 surdos e defi- cientes auditivos. Podemos observar pelos dados citados que o número de pessoas surdas é gigantesco. En- tendemos, então, que a Lei nº 10.436/02 (BRASIL, 2002), que institui a Libras, é importante não só para que se reconheça uma língua, mas um movi- mento social e político para o resgate dos surdos da marginalização linguístico-educacional viven- ciada por eles durante décadas. Saiba maisSaiba mais Podemos entender a deficiência auditiva quando há uma diminuição da audição, que produz uma redu- ção na percepção de sons e dificulta a compreen- são das palavras. A dificuldade aumenta com o grau de perda. O deficiente auditivo é aquele que, com a utilização de uma prótese auditiva (aparelho de ampli- ficação sonora), poderá reconhecer os sons do meio ambiente, inclusive os sons da fala. A surdez pode ser caracterizada pela impossibilidade de se ouvir, mesmo com a utilização de próteses. DicionárioDicionário Lei: (do verbo latino ligare, que significa “aquilo que liga”, ou legere, que significa “aquilo que se lê”) é uma norma ou conjunto de normas jurídi- cas criadas através dos processos próprios do ato normativo e estabelecidas pelas autoridades com- petentes para o efeito. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Lei. Marcia Regina Zemella Luccas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 8 O Reconhecimento da Libras como Língua Vamos entender agora como, então, a Li- bras passou a ser reconhecida como língua? Foi um processo longo e deveu-se prin- cipalmente ao envolvimento e movimento da comunidade surda. Pensar é produzir conheci- mento, portanto, a partir do reconhecimento da Libras como a língua própria dos surdos, houve uma mudança na caracterização dos surdos bra- sileiros, pois, no momento em que sua língua foi reconhecida socialmente, eles passaram a ser considerados cidadãos. Como você já deve saber, os conhecimen- tos que compõem a sociedade são transmitidos pela classe dominante e esta acaba por “ditar” as normas através das quais os seres humanos serão julgados. Muitas vezes, a sociedade vê no cidadão surdo apenas um ser com um limite na audição e nega reconhecer nessa pessoa um ser de direi- tos e deveres, com uma língua e cultura próprias. A conquista e o reconhecimento da Libras como língua, e a modificação da visão do surdo como uma pessoa que não possui uma deficiência, mas uma diferença no modo de aprender e apreen- der o mundo, ainda são tímidos, mas já houve resultados significativos, como, por exemplo, a aprovação da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que prevê a formação de intérpretes de língua de sinais para possibilitar aos surdos o acesso à informação (BRASIL, 2000). Com a Lei nº 10.436/02, que institui a Libras como língua ma- terna dos surdos, o que passa a existir é a possibi- lidade de uma mudança de comportamento e de visão da sociedade em relação a essa população. Preste atenção agora! Lei nº 10.436, de 24 de Abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional de- creta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasi- leira de Sinais – LIBRAS e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Lín- gua Brasileira de Sinais – LIBRAS a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual- -motora, com estrutura gramatical pró- pria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas con- cessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difu- são da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil. Art. 3º As instituições públicas e empre- sas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor. Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, mu- nicipais e do Distrito Federal devem ga- rantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileirade Sinais – LIBRAS, como parte integran- te dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs, conforme legislação vigente. Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS não poderá substituir a modalidade escrita da Língua Portugue- sa. Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 24 de abril de 2002; 181º da Inde- pendência e 114º da República. FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Paulo Renato Souza. (BRASIL, 2002). Como dito anteriormente, a Lei nº 10.436 foi sancionada a partir do movimento das comuni- dades surdas brasileiras. Vale ressaltar que, apesar Libras Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 9 anteriores. Determina, ainda, que a Libras deve ser disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do ma- gistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia. Assim, todos os cursos de li- cenciatura nas diferentes áreas do conhecimento também deverão oferecer essa disciplina. Assim, caro(a) aluno(a), afirmamos que a lín- gua de sinais preenche as mesmas funções que a língua portuguesa falada, portanto, para ser adquirida, preferencialmente é necessário que crianças surdas tenham o convívio com adultos surdos, que possam inseri-las no funcionamento linguístico-discursivo dessa língua. dessa lei ter sido sancionada em 2002, somente em 22 de dezembro de 2005 é que sua regula- mentação foi aprovada, no Decreto nº 5.626, que define o que são pessoas com surdez, em seu art. 2º: “Considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, mani- festando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais-LIBRAS.” (BRASIL, 2005). Saiba que é importante ressaltar que, nes- sa nova legislação, há uma mudança significati- va: passa-se a utilizar o termo ‘surdo’ no lugar de deficiente auditivo, presente em documentos DicionárioDicionário Decreto: refere-se a atos meramente administrati- vos da competência dos chefes dos poderes exe- cutivos (presidente, governadores e prefeitos). Um decreto é usualmente utilizado pelo chefe do po- der executivo para fazer nomeações e regulamen- tações de leis (como para lhes dar cumprimento efetivo, por exemplo), entre outras coisas. AtençãoAtenção A Lei nº 10.436 aponta um grande avanço na questão do reconhecimento dos surdos enquan- to sujeitos de direito, bem como o reconheci- mento da sua comunicação enquanto uma cul- tura diferenciada. Neste capítulo, observamos a dificuldade que os surdos tiveram para que pudessem ser reconhe- cidos como pessoas que têm uma cultura diferenciada e principalmente uma língua própria. A Lei nº 10.436/2002 e o Decreto nº 5.626/2005 modificam a perspectiva dessa comunidade surda e suas possi- bilidades de interação social. 1.1 Resumo do Capítulo Vamos verificar sua aprendizagem? 1. Quem são as pessoas consideradas surdas nessa legislação? 1.2 Atividade Proposta Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 21 Caro(a) aluno(a), neste capítulo você irá conhecer mais sobre as metodologias de ensino para alunos surdos. Como vimos nos capítulos anteriores, as tendências de educação escolar para pessoas com surdez concentram-se basicamente em dois polos: a inserção dos alunos em escolas comuns ou em escolas especiais para surdos. Existem di- versos métodos de ensino para surdos, porém os mais importantes ao longo da nossa história po- dem ser delimitados basicamente a três tendên- cias educacionais: a oralista, a comunicação total e a abordagem bilinguista. As escolas comuns ou especiais que utili- zam o oralismo visam à capacitação da pessoa com surdez para utilizar a língua na modalida- de oral, como única possibilidade linguística, de modo que se utilize a voz e a leitura labial, tanto na vida social quanto na escola. O oralismo não conseguiu alcançar resul- tados muito positivos, pois, de acordo com Sá (1999), ocasiona déficits cognitivos e legitima a manutenção do fracasso escolar, provocando di- ficuldades no relacionamento familiar. Este méto- do não aceita o uso da língua de sinais e discrimi- na a cultura surda. O Oralismo AS TENDÊNCIAS NA EDUCAÇÃO DOS SURDOS3 Na abordagem oralista, a linguagem fala- da é tida como forma prioritária de comunicação com os surdos e a aquisição da linguagem oral como fundamental para o desenvolvimento glo- bal da criança surda. Dentro do processo da orali- zação, ficam proibidos os usos de sinais ou gestos e do alfabeto datilológico. Como você pode ir percebendo, a via sen- sorial priorizada, nessa abordagem educacional, é a oral, sendo enfatizadas as habilidades audi- tivas (restos auditivos) e a leitura orofacial como pré-requisitos para o desenvolvimento da lingua- gem. A abordagem dominou a educação de sur- dos tanto na Europa quanto nas Américas desde 1880, quando ocorreu o Congresso Internacio- nal para Surdos em Milão, no qual foi aprovada a obrigatoriedade do uso exclusivo da linguagem oral na educação de surdos. Diversos autores dis- correram sobre as abordagens do oralismo: há métodos de ensino unissensoriais, em que o indi- víduo só se utilizaria de restos auditivos; e os mul- tissensoriais, nos quais diversos canais (sensoriais, táteis e visuais) são utilizados como pistas para o surdo acessar a informação. Como vimos anteriormente, com a dissemi- nação do oralismo, a imagem social dos surdos foi sendo progressivamente danificada, sendo que passaram a ser tratados apenas como deficien- tes. Como consequência do método oralista e a forte ênfase que era dada à oralização, observou- -se uma dificuldade significativa de aprendiza- gem desses sujeitos e, ao invés de os educado- res questionarem o método de ensino, que dava ênfase somente ao canal sensorial que faltava ao surdo, passou-se a questionar a possibilidade de cognição dos surdos. Capovilla (2000) observa AtençãoAtenção A tendência educacional do oralismo fundamen- ta-se na perspectiva de aquisição da linguagem oral como requisito básico para que o surdo seja integrado à sociedade, que é ouvinte. Marcia Regina Zemella Luccas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 22 que, na Inglaterra, foi analisado que, após anos de escolaridade especial, dos alunos com 15/16 anos somente 25% conseguiam articular-se de modo inteligível aos seus professores e que menos de 10% desses alunos tinha nível de leitura apropria- do à sua idade. Apesar de todas as críticas a esse método, vamos explicitar alguns dos aspectos práticos para que possa ser desenvolvida a aprendizagem dos surdos através do método oralista (ressalta- mos que ainda hoje ele é muito utilizado). Para o máximo aproveitamento auditivo, o Oralismo tem como princípio a indica- ção de prótese individual, que amplifica os sons, admitindo a existência de resí- duo auditivo em qualquer tipo de surdez, mesmo na profunda. Esse método procu- ra assim, reeducar auditivamente a crian- ça surda, através da amplificação dos sons juntamente com técnicas específi- cas de oralidade. Quanto ao trabalho de AtençãoAtenção Os aspectos que devem ser desenvolvidos com o aluno deficiente auditivo são: • diagnóstico precoce (anterior aos dois anos de idade): este é um dos aspectos fundamentais e, de certa forma, determinante até os dias de hoje para que o surdo possa desenvolver fala; • adaptação de Aparelho de Amplificação Sono- ra Individual (AASI), nos dois ouvidos, logo após o diagnóstico de deficiência auditiva; • estimulação auditiva precoce (até os cinco anos de idade); • desenvolvimento da fala através de feedback auditivo; • desenvolvimento de leitura orofacial: discrimi- nação e identificação dos movimentos orais do emissor; • treinamento para o desenvolvimento de pistasvisuais, auditivas e táteis; • treinamento auditivo, que seria a estimulação auditiva (com a utilização de próteses), para reconhecimento e discriminação de ruídos e sons ambientais; • treinamento e desenvolvimento da fala: emis- são e recepção de fonemas utilizando exercí- cios, mobilidade e tonicidade dos músculos da face; • exercícios de relaxamento e respiração para co- locação dos fonemas. linguagem, desenvolvido no Oralismo, procura-se ‘ensinar’ linguagem através de atividades estruturais sistemáticas. (DOR- ZIAT, 2008). Você deve ter percebido que são utilizados para o desenvolvimento da linguagem oral em crianças surdas aparelhos de amplificação sonora, treinamento auditivo, entre outras técnicas. Todas elas, segundo Goés (1999), têm o propósito tera- pêutico de tratar e reduzir os déficits auditivos, ou seja, ela assume o surdo como um deficiente au- ditivo, alguém a quem falta um dos sentidos, a au- dição, mas que pode, através de tratamento, rea- lizar de forma compensatória a leitura orofacial. Ainda, a educação oralista vê no surdo alguém que precisa ser reabilitado, entendendo a língua oral como meta e objetivo final de compreensão e de possibilidade de inserção desses sujeitos na sociedade ouvinte. Você conseguiu perceber a dificuldade dos surdos em desenvolver a língua oral? Pois é, mas houve mudanças ao longo dos anos, apesar de in- felizmente podermos dizer que ainda muitas fa- mílias apostam nessa aprendizagem, bem como médicos, terapeutas e professores. Comunicação Total Vamos agora conhecer outro tipo de ensino, a Comunicação Total! Depois de quase um século envolta em um ensino oralista os surdos puderam ter acesso a outra forma de aprendizagem. Esta era composta de oralização e também de sinais. Vamos conhecê-la um pouco mais. A Comunicação Total envolve o uso de todas as modalidades possíveis de comunicação: língua de sinais, alfabeto digital, amplificação sonora com AASI, fala, leitura orofacial, leitura e escrita, expressão facial, mímica e gestos; todos esses re- cursos podem ser utilizados a fim de potencializar as interações sociais e possibilitar um melhor de- senvolvimento da competência linguística. Libras Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 23 Essa abordagem educacional tem como meta estimular o desenvolvimento linguístico, permitindo que a criança surda tenha acesso ao maior número de códigos possível, de forma que possa eleger aquele que lhe permita ter melhor compreensão. Essa filosofia de ensino possui uma maneira própria de compreender o surdo, ou seja, não o considera portador de uma patologia, mas uma pessoa e a surdez, uma marca, que adquire ca- racterísticas e significações sociais. A Comunica- ção Total é incorporada em diversos lugares, mas, como não é um método, apresenta versões mui- to variadas, caracterizando-se basicamente pela aceitação de vários recursos comunicativos, com a finalidade de ensinar a língua majoritária e pro- mover a comunicação. Como vimos, a Comunicação Total se pro- punha a fazer uso de qualquer meio de comuni- cação (palavras, símbolos, gestos, sinais naturais ou artificiais), tudo para permitir que a criança surda adquirisse linguagem. Aparentemente, essa filosofia de trabalho traria um desenvolvi- mento linguístico e competência em leitura e escrita. Entretanto, esse fato não acontece, pois a comunicação total, apesar de utilizar a comunica- ção de modalidade visual-motora, usava os sinais na estrutura da língua oral. Marchesi (1987) apresenta a variedade desses sistemas: língua falada de sinais (codificada em sinais); língua falada sina- lizada exata (variante do sistema anterior, distinguindo-se pela busca da reprodu- ção precisa da estrutura da língua); asso- ciação de códigos manuais para auxiliar na discriminação e articulação de sons (configuração) de mão perto do rosto, dando apoio à emissão de cada fonema); e combinação diversa de sinais, fala, dati- lologia, gesto, pantomina etc. A abordagem educacional bimodalista destaca-se nesses sistemas. As práticas são qualificadas como bimodais ou si- multâneas porque envolvem combina- ções de uso concomitante de duas mo- dalidades, isto é, os sinais e a fala. Para Stewart (1983), entretanto, a utilização da fala codificada em sinais, caracteriza- -se como duas modalidades da mesma língua, porque baseia-se apenas na lín- gua majoritária. Góes (1994) diz que essa idéia é variável entre pesquisadores e educadores, porque existe também a no- ção de um instrumento de comunicação em que se inserem parâmetros de uma língua de sinais para acompanhar a fala. (DORZIAT, 2008). Nos Estados Unidos, como os resultados esperados não foram alcançados, as aulas de pro- fessores que utilizavam a língua inglesa sinalizada foram filmadas e, posteriormente, analisadas. O que pode ser percebido é que, com a criação de muitos sinais artificiais para se marcar flexões ver- bais, conjunções e outros aspectos utilizados na língua oral, o discurso não fazia sentido nem para os professores nem para os alunos. Saiba maisSaiba mais A Comunicação Total foi importante na história da educação dos surdos, pois possibilitou depois de qua- se um século o retorno dos sinais na vida dessa co- munidade. Apesar de ter como objetivo o desenvol- vimento da fala e a utilização do sinal somente como apoio. Saiba maisSaiba mais “Apesar da idéia generalizada de oposição entre Co- municação Total e Oralismo, devido à inclusão de si- nais na prática daquela, Marchesi (1987) afirma que a Comunicação Total não está em oposição à utilização da língua oral, mas apresenta-se como um sistema de comunicação complementar. Os adeptos da comuni- cação total consideram a língua oral um código im- prescindível para que se possa incorporar a vida social e cultural, receber informações, intensificar relações sociais e ampliar o conhecimento geral de mundo, mesmo admitindo as dificuldades de aquisição, pelos surdos, dessa língua.” (DORZIAT, 2008). Marcia Regina Zemella Luccas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 24 A sociedade educacional percebe que a uti- lização dos sinais auxiliou no desenvolvimento dos alunos surdos, pois o canal de comunicação era visual. Nessa época, início da década de 1980, vários linguistas estudavam as línguas de sinais e perceberam a riqueza dessas línguas; assim, a sociedade começou a perceber que talvez o bi- linguismo fosse a saída para o desenvolvimento integral dos surdos. Bilinguismo Apesar de variações entre os profissionais de diferentes países, em relação à época em que vai se introduzir as duas línguas e se a segunda língua será a oral ou a escrita, o consenso entre todos é a importância do contato da criança sur- da com a língua de sinais logo cedo. Um dos primeiros países a adotar o bilin- guismo foi a Suécia, que reconheceu politicamen- te os surdos como minoria linguística, com direi- “Para tanto, eles filmaram as aulas em comunica- ção total ministradas pelas professoras em que elas sinalizavam e falavam ao mesmo tempo [...] mostraram as professoras a filmagem sem som, e quando estavam impossibilitadas de ouvir a fala que acompanhava a sinalização, as professoras exibiram uma grande dificuldade em entender o que elas próprias haviam sinalizado. [...] A con- clusão desconcertantemente obvia é a de que durante todo o tempo, as crianças não estavam obtendo uma versão visual da língua falada na sala de aula, mas sim, uma amostra lingüística in- completa e inconsistente, em que nem palavras faladas e nem os sinais.” (CAPOVILLA, 2000, p. 108). CuriosidadeCuriosidade tos assegurados à educação em línguas faladas e de sinais. Vários autores, baseados em diversas pes- quisas realizadas na Dinamarca, Suécia e Estados Unidos, apontama importância da educação bi- língue. Veja um aspecto importante: a maioria dos alunos surdos chega à escola sem o desen- volvimento da linguagem, muito diferente das crianças ouvintes que chegam à escola com a linguagem desenvolvida, cabendo à instituição educacional trabalhar e desenvolver o conheci- mento da linguagem escrita. Para os surdos, dife- rentemente, cabe à escola, muitas vezes, desen- volver a linguagem desse aluno, principalmente a língua de sinais. Para Ferreira Brito (1993), numa linha bi- língue, o ensino do Português deve ser ministrado para os surdos da mesma for- ma como são tratadas as línguas estran- geiras, ou seja, em primeiro lugar devem ser proporcionadas todas as experiências lingüísticas na primeira língua dos surdos (língua de sinais) e depois, sedimentada a linguagem nas crianças, ensina-se a língua majoritária, (a Língua Portugue- sa) como segunda língua. Apesar dos argumentos favoráveis à aprendizagem da língua de sinais, existem obstáculos para sua concretização. Esses vão além da habilidade manual. A competência na língua de sinais depende também do conhecimento de como a própria comu- nidade de surdos se organiza, através do DicionárioDicionário Bilinguismo: aplicado ao indivíduo, pode significar simplesmente a capacidade de expressar-se em duas línguas. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Bilinguismo. AtençãoAtenção “A aprendizagem do bilinguismo inclui, o desen- volvimento adequado de competências linguís- ticas e comunicativas, aquisição espontânea da linguagem, com o desenvolvimento intuitivo de regras linguísticas e em contextos sociais motiva- dos linguisticamente a conexão baseada na ex- periência entre o uso da linguagem e a formação de conceitos, o desenvolvimento de padrões de linguagem apropriados a faixa etária, e finalmen- te o respeito e identidade próprios como pessoa surda.” (CAPOVILLA, 2000, p. 112). Libras Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 25 contato extra-institucional do professor com os surdos. Tal contato é reduzido de- vido às limitações de oportunidades para que isso ocorra. Além disso, os surdos, no contato com os ouvintes, realizam adap- tações e ajustes na língua de sinais (lin- guagem pidgen), visando a um melhor entendimento, que acaba dificultando a exposição dos professores à língua de si- nais. (DORZIAT, 2008). E no Brasil? Aqui no Brasil, concebemos a perspectiva da educação bilíngue a partir da ideia de que a Libras é a primeira língua dos surdos, é sua língua natural, e a Língua Portuguesa, em sua modali- dade escrita, a segunda língua. É por esse motivo que hoje você está estudando esta disciplina! A partir dessa concepção, entendemos que a criança surda deve viver “a” e “na” língua de si- nais, não somente restrita ao ambiente escolar, mas em todos os ambientes em que habita so- cialmente. Se a língua de sinais é uma língua natu- ral adquirida de forma espontânea pela pessoa surda em contato com pessoas que usam essa língua e se a língua oral é AtençãoAtenção O bilinguismo, como o próprio nome indica, pro- põe a exposição do surdo a duas línguas, sendo a primeira a língua de sinais. adquirida de forma sistematizada, então as pessoas surdas tem o direito de ser ensinadas na língua de sinais. A proposta bilíngüe busca captar esse direito. (QUA- DROS, 1997, p. 49). Para finalizar, a educação bilíngue tem como meta o desenvolvimento da criança sur- da, para que ela possa perceber e compreender o interlocutor surdo. Para isso, deverá conhecer e utilizar a língua de sinais para realizar pedidos, estabelecer uma comunicação, estabelecer con- versas informais, dando sua opinião, concordan- do ou discordando de seus interlocutores. A partir da aprendizagem e desenvolvimento da língua, como qualquer outra pessoa que vive em uma so- ciedade, o surdo terá possibilidades de desenvol- ver a aprendizagem da língua escrita e ter acesso a todo o conhecimento desenvolvido pela socie- dade. Podemos concluir, então, caro(a) aluno(a), que o oralismo e a comunicação total obtêm resul- tados questionáveis. Os enfoques, tanto da comu- nicação total quanto do oralismo, negam a língua natural das pessoas surdas e provocam perdas consideráveis nos aspectos cognitivos, socioafe- tivos, linguísticos, político-culturais e na apren- dizagem desses alunos. Por fim, o bilinguismo é visto, hoje, como a melhor forma de abordagem educacional para o surdo, pois visa a capacitá-lo na utilização de duas línguas: a língua de sinais e a língua escrita da comunidade em que vive. A lín- gua de sinais é, certamente, o principal meio de comunicação entre as pessoas com surdez. Para você conhecer um pouco mais sobre a sur- dez e os métodos de ensino, assista aos filmes: Mr. Holland: Meu Adorável Professor Filhos do Silêncio MultimídiaMultimídia Marcia Regina Zemella Luccas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 26 Caro(a) aluno(a), pudemos verificar neste capítulo as diferentes metodologias de ensino para os surdos ao longo da história, porém ainda hoje há muita controversa quanto à melhor forma de ensinar o surdo. Sabe-se por meio de pesquisas que o bilinguismo tende a ser a melhor metodologia, pois a criança irá desenvolver em primeiro lugar a comunicação em sinais e depois irá aprender a língua escrita de seu país como segunda língua. Apesar desse fato, ainda há muitas famílias e profissionais da medicina que apostam no oralismo. 3.1 Resumo do Capítulo Vamos checar sua aprendizagem? 1. Descreva brevemente: a) Oralismo. b) Comunicação Total. c) Bilinguismo. 3.2 Atividade Proposta
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