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Teoria Pura do direito

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Introdução 
Uma teoria pura do Direito, livre de qualquer ideologia social ou política, parece-nos um sonho 
impossível, até mesmo porque todos os grandes progressos do Direito se deram quando o mesmo se 
engajou em libertar o homem das trevas e da opressão, dando-o forças para se levantar trazendo 
consigo a bandeira das revoluções políticas que abalaram o mundo. 
Kelsen (2000) forjou sua teoria num período em que o Direito em si não servia ao bem das nações ou a 
libertação dos povos, mas se ajoelhava aos pés de ideologias políticas servindo-lhes de fundamento, 
fundamento este que almejava para si o status de verdade absoluta, pois segundo ele: “Assim, pois, 
nada parece hoje mais extemporâneo que uma teoria do Direito que quer manter sua pureza, enquanto 
para as outras não há poder, seja qual for que elas não estejam prontas a oferecer-se, quando já não 
tem pejo de alto, bom som e publicamente reclamar uma ciência do Direito política e de exigir para 
esta o nome de ciência “pura”, louvando assim como virtude o que, quando muito, só a mais dura 
necessidade pessoal poderia desculpar.” (KELSEN, 2000, p. XIV). 
É, assim, era dos dois lados da moeda, pois diversos doutrinadores se dedicavam a fundar teorias 
jurídicas para fundamentar os mais diversos regimes políticos. Abalado pelo impacto das grandes 
guerras, ele certamente vê nesta “ciência política do Direito” sua causa mais próxima, e movido por 
grande descrença para com a mesma; inicia a construção de uma ciência jurídica nova, imparcial, 
despida de ideologismos[1], destinada tão somente à análise do Direito em sua forma pura, ou seja 
“[...] uma teoria do Direito que se limita à analise do Direito positivo como sendo a realidade jurídica” 
(KELSEN, 2000, p. XVIII). 
Kelsen (2000) cria uma teoria extremamente tecnicista, limitada ao estudo do Direito positivo, que não 
almeja nada além de explicar “aquilo que é” e “como é”, sem se perder nos idealismo que pensam 
como “deveria ser” e que se cuidam de analisar o que “viria ser”. É curioso, entretanto, que sua teoria 
almeje uma mudança social no que diz respeito ao objeto e ao conceito da ciência jurídica, e se almeja 
tal mudança esta amparado em uma crença idealística de que “se fosse assim seria melhor”[2]. 
Opera-se para tanto uma limitação do campo de conhecimento das ciências jurídicas visando assegurar a 
pureza de seu método de pesquisa próprio, o que nas palavras de Kelsen (2000): “[...] se propõe a 
garantir um conhecimento apenas dirigido ao Direito e excluir deste conhecimento tudo quanto não 
pertença ao seu objeto, tudo quanto não de possa, rigorosamente determinar como Direito. Quer isto 
dizer que ela visa libertar a ciência jurídica de todos os elementos que lhe são estanhos. Este é o seu 
princípio metodológico fundamenta” (2000, p. 01). 
Objetivos 
O objetivo deste trabalho consiste em realizar-se uma análise do impacto da “Teoria pura do Direito” de 
Hans Kelsen sobre o campo da ciência do direito através de um estudo dos fundamentos para a 
existência de uma ciência pura do direito livre de qualquer conexão com os demais campos do 
conhecimento, e da real necessidade desta pureza como única forma do Direito atingir seu objetivo 
primordial, qual seja a paz social. 
1. O ato e o seu significado jurídico 
O ato[3], em si, é motivado pelos contextos sociais, históricos e culturais, ou seja, pelo próprio 
ambiente a sua volta. Já a interpretação jurídica de tal ato, ou o modo como o Direito trata esta 
conduta, é fruto de um longo processo de valoração social que culmina na fixação nas normas 
positivas[4]. Aqui havia uma clara distinção entre fenômenos naturais (ao ato em si) e sociais (a 
interpretação jurídica de tal ato), entretanto, já quase ultrapassada uma vez que atualmente a 
sociedade é interpretada, em si, como parte da natureza ou em estado mais puro no reconhecimento de 
princípios. 
 2. O sentido subjetivo e o sentido objetivo do ato: a sua auto-explicação 
O ato pode carregar significação jurídica, pois o Direito valora tal ato sob os interesses da sociedade, ou 
nas palavras de Kelsen: “Um ato da conduta humana, porém pode muito bem levar consigo uma auto-
explicação jurídica, isto é, uma declaração sobre aquilo que juridicamente significa” (2000, p. 03), e 
tal ato por óbvio é praticado visando se expressar efetivamente de acordo com um conceito social 
predeterminado já vigente no ambiente e assimilado pelo individuo, pois “na verdade o indivíduo que, 
atuando racionalmente, põe o ato, liga a este um determinado sentido que se exprime de qualquer 
modo e é entendido pelos outros” (KELSEN, 2000, p. 03). 
Poder não é dever, e deve-se atentar que embora um ato carregue significação jurídica perante o 
Direito, para ele pode não ser válido, ou sequer existente, pois para tal necessita atentar-se ao dever-
ser formal oriundo do ordenamento jurídico que oferece uma forma dentro da qual tais atos, além de 
possuir significado jurídico, passarão a ter existência e valor perante a esfera positiva. 
Por óbvio também se um ato é praticado por um leigo sem se atentar ao dever-ser oriundo da legislação 
positiva, mas nela se adéqua perfeitamente, possui significação jurídica, existindo e tendo valor, pois o 
conteúdo do acontecer fático se encaixa no conteúdo de uma norma válida. 
3. A norma 
Norma é aquilo que empresta à conduta valoração, ou seja, que empresta ao ato significado seja ele 
jurídico ou antijurídico conforme a vontade implícita na elaboração da norma (KELSEN, 2000, p.4). 
Nesta linha é importante analisar a norma em si mesma, ou seja, como produção normativa que pode 
validar a si mesma ou outras normas, como esquema de interpretação regulando condutas negativas e 
positivas por parte do indivíduo, bem como a suas características de sua valoração e vigência espaço-
temporal. 
3.1 A norma como esquema de interpretação 
O que transforma um fato em um ato jurídico não é a facticidade em si, mas o sentido que ele assume e 
que dará origem a sua significação jurídica por intermédio da norma a que a ele se refere como 
conteúdo. Neste sentido: “O que transforma este fato num ato jurídico (licito ou ilícito) não e a sua 
facticidade, não e o seu ser natural, isto é, o seu ser tal como determinado pela lei da casualidade e 
encerrado no sistema da natureza, mas o sentido objetivo que está ligado a este ato, a significação que 
ele possui. O sentido jurídico específico, a sua particular significação jurídica, recebe-a o fato em 
questão por intermédio de uma norma que a ele se refere com o seu conteúdo, que lhe empresta 
significação jurídica, por forma que o ato pode ser interpretado segundo esta norma” (KELSEN, 2000, p. 
04). 
Então, adequando-se o fato ao disposto em uma norma, esta o confere significação jurídica (processo de 
“jurisdicização”), por sua vez esta norma tem valoração social oriunda das expectativas sociais que 
motivaram sua criação, a norma funciona então como um esquema de interpretação e valoração da 
conduta social. 
3.2 A norma e a produção normativa 
O ser é um fato real, e o dever-ser por sua vez é um fato real que possui significado perante a norma 
jurídica de tal forma que adquire juridicidade. O dever-ser é a conduta que se adéqua ao prescrito na 
norma, que esta determina como sendo uma permissão, faculdade, competência ou obrigação (KELSEN, 
2000, p. 18). A norma está para o dever-ser assim como o ato de vontade oriundo dela esta para o ser 
(KELSEN, 2000, p. 6). 
O dever-ser se aplica ao ser, mas isso não significa que o ser seja correspondente ao dever-ser, já que a 
realidade positiva estatuída em normas, não necessariamente corresponde à realidade fática, pois uma 
nunca se submete totalmente a outra. Mas é inegável que aquilo que “é” se relaciona a “aquilo que 
deve ser”. Aquilo que se vê na realidade está ligado ao conteúdo na norma, mas não corresponde, em 
regra, a norma[5].Quanto à conduta devida, esta tanto pode ser a prevista na norma - mesmo que não se realize -, quanto 
a que se realiza em consonância com a norma[6]. 
“Dever-ser” é o sentido subjetivo de todo ato de vontade através do qual um indivíduo, 
intencionalmente, visa à conduta de outrem. Entretanto, quando este “dever-ser” objetiva a satisfação 
de uma norma jurídica será o “dever-ser” uma “norma válida”, pois, neste caso, está amparado pelo 
ordenamento positivo-jurídico que lhe confere competência para tal (KELSEN, 2000, p. 09). 
Por sua vez, a validade desta norma se ampara em ser emanada de uma entidade competente, que teve 
tal competência legada pela Constituição, que por gozar de status de “norma fundamental” que é, em 
suma, o pressuposto máximo de validade do dever-ser objetivo emanado das demais normas, e estas por 
sua vez determinam a quê o ato deve se submeter para ser ato jurídico válido (KELSEN, 2000, p. 09). 
Esta norma fundamental é de certa forma um ponto de conexão ao subjetivismo do Direito Natural, já 
que não possui nada que lhe garanta a validade - nenhuma norma ou ato legislativo ou jurídico 
anterior - , mas apenas depende de sua aceitação por parte do povo e um Estado que, respeitando-a, a 
reconhecem como verdadeira e passa assim a existir, podendo sofrer positivação por via legislativa em 
alguns casos[7]. 
As normas através das quais uma conduta é determinada como obrigatória podem também emanar do 
costume. Costume é uma conduta socialmente aceita como válida, que possuiu prática reiterada em um 
determinado meio social. E de se destacar que: “Quando os indivíduos que vivem juntamente em 
sociedade se conduzem durante certo tempo, em iguais condições, de uma maneira igual, surge em 
cada indivíduo a vontade de se conduzir da mesma maneira por que os membros da sociedade 
habitualmente se conduzem” (KELSEN, 2000, p. 10). 
Para que tal conjunto de atos subjetivos que fundam o costume sejam considerados como norma 
objetiva e válida, é necessário que uma norma superior, ou a norma fundamental lhe assegure tal 
capacidade, de modo que se assim não é, o costume, não poderá ser considerado como fato capaz de 
ensejar um “dever-ser” objetivo, neste caso ele será incapaz de assumir tal status, ou seja, “se o 
costume é assumido como fato produtor de normas por uma norma superior” (KELSEN, 2000, p. 10). E é 
claro ainda, que das normas postas e de sua interpretação surgem às normas pressupostas, que visam 
não à legalidade, mas sim a licitude. 
3.3 Vigência e domínio de vigência da norma 
A palavra vigência designa a existência específica de uma norma, e existência filosoficamente seria: 
“ser desde um determinado momento”. Outro ponto é que tanto existe a norma jurídica quanto o ato de 
vontade a que ela concede sentido objetivo, e esta existência pertencem ao plano do “ser” no primeiro 
caso e do “dever-ser” no segundo caso, mas estas existências são separadas, pois não dependem umas 
das outras com relação a existir, ou seja, uma pode existir sem que seja necessário para isso a 
existência da outra, ou mesmo que a outra tenha perecido pode alguma continuar a existir. 
A existência da norma também difere de sua eficácia, pois esta última presume que algo seja apto a 
atingir o fim a que se destina. Pode-se dizer que seria um “dever-ser” objetivando um “ser” adequando 
ao ordenamento positivo. A vigência está de certa forma conectada com a eficácia, já uma norma 
jurídica apenas seria válida se a conduta humana a que ela se destina lhe corresponde-se ao menos em 
certa medida. Aquilo que não tem reflexo na realidade - que neste caso se consumaria atingindo fim a 
que se destina - não pode existir, pois: “Uma norma jurídica é considerada como objetivamente válida 
apenas quando a conduta humana que ela regula lhe corresponde efetivamente, pelo menos numa certa 
medida. Uma norma que nunca e em parte alguma é aplicada e respeitada, isto é, uma norma que – 
como costuma dizer-se – não é eficaz em uma certa medida, não será considerada como norma válida 
(vigente)” (KELSEN, 2000, p. 12). 
Para assegurar tal eficácia, utiliza-se das sanções que visam assegurar a adequação da conduta social à 
norma. 
Uma norma é vigente dentro de um determinado espaço de tempo que pode ser determinado 
expressamente em seu corpo ou tacitamente, ou ainda estar vinculado à outra norma, e pode também, 
esta vigência, estar condicionada a determinada situação perdurando lado a lado com esta ou em 
determinado local, e ser aplicada apenas dentro dos limites deste (KELSEN, 2000, p. 13). 
A força espaço-temporal das normas é tão grande que embora não possam mudar o que aconteceu 
podem mudar o significado normativo do acontecimento (KELSEN, 2000, p.15), descaracterizando delitos 
e pondo termo às penas por força de revogação do que “antes fora vigente” pelo que “agora se torna 
vigente”. Isso é, em suma, notável no Direito Penal onde a lei apenas retroage em beneficio do réu 
podendo ocasionar o que é conhecido como abolitio criminis, conforme se extrai da análise do Art. 2º do 
Código Penal vigente e do Art. 5º, incisos XXXVI e XL da Constituição Federal de 1988, e que, no 
entanto, sofre mitigação pelo Direito Processual Civil, onde o tempus regit actum e leis já consideradas 
mortas por força da revogação continuam a reger os processos que tiveram origem ainda em sua 
vigência. 
A validade (vigência) desta norma possui dois domínios quais sejam: o pessoal, referente ao elemento 
pessoal da conduta fixada e a relação desta com a pessoa; e o material relacionado ao tema, ou 
conteúdo (da conduta humana) que a norma se destina a regular. Aqui torna-se de suma importância 
mostrar como este domínio material e utilizado para dar limite as competências legislativas no âmbito 
do Estados Federados, conforme nos apresenta Kelsen (2000): “O conceito de domínio material de 
validade encontra aplicação, por exemplo, quando uma ordem jurídica global - como no caso de um 
Estado federal - se desmembra em várias ordens jurídicas parciais cujos domínios de validade são 
reciprocamente delimitados com referência às matérias que lhes cabe regular; por exemplo, quando as 
ordens jurídicas dos Estados membros apenas podem regular matérias bem determinadas, enumeradas 
na Constituição ou - como também se costuma dizer - quando apenas a regulamentação destas matérias 
se enquadra na competência dos Estados-membros, e a regulamentação de todas as outras matérias é 
reservada à ordem jurídica do Estado federal (que também constitui apenas uma ordem jurídica 
parcial), ou, por outras palavras, cai sob a alçada ou no domínio de competência do Estado federal” 
(2000, p.16). 
“Mas atente-se que as normas não regulam através disto a realidade, mas sempre a conduta humana e o 
modo como esta age sobre o ambiente ao seu redor, já que o objetivo das normas é sempre a conduta 
humana”(KELSEN, 2000, p. 16). 
3.4 Regulamentação positiva e negativa: ordenar, conferir poder ou competência, permitir. 
A regulamentação da conduta humana num ordenamento jurídico ocorre de duas formas, sendo uma 
positiva e outra negativa, assim sendo: “Num sentindo muito amplo, toda conduta humana que é fixada 
num ordenamento normativo como pressuposto ou como consequência se pode considerar como 
autorizada por este mesmo ordenamento e, neste sentido, como positivamente regulada. 
Negativamente regulada por um ordenamento normativo é a conduta humana quando, não sendo 
proibida por aquele ordenamento, também não é positivamente permitida por uma norma delimitadora 
de domínio e validade de uma outra norma proibitiva” (KELSEN, 2000, p.17). 
Logo conduta positiva seria aquela que lhe é prescrita a realização ou possibilidade de realização, ou 
ordena a omissão. A conduta negativa por sua vez e aquela que não sendo proibida, torna-se 
automaticamente permitida. 
3.5 Norma e valor 
A norma tem o poder de estatuir umadeterminada conduta humana como devida. Se esta conduta se 
enquadra no disposto na norma ela será valorada, ou seja, considerada “boa”, caso contrário será 
desvalorada, ou seja, considerada “má”. O juízo segundo o qual esta conduta é confrontada com o 
constante na norma e julgada como “boa” ou “má” é chamado de “juízo de valor”, e pode ser 
respectivamente positivo ou negativo conforme o dito acima. Este juízo de valor recai sempre sobre 
fatos da ordem do ser (KELSEN, 2000, p. 19). 
Estes valores que fundamentam os juízos são voláteis e arbitrários, pois possuem origem humana, logo 
podem mudar conforme as concepções dos seres humanos mudam com o passar das eras: “Quer isto 
dizer que a vigência de uma norma desta espécie que prescreva uma determinada conduta como 
obrigatória, bem como a do valor por ela constituído, não exclui a possibilidade de vigência de uma 
outra norma que prescreva conduta oposta e constitua um valor oposto” (KELSEN, 2000, p. 19). 
A única alternativa a estas normas arbitrárias, oriundas da vontade humana, seria algo proveniente de 
uma autoridade supra-humana ou divina, com possibilidade de atravessar as eras e impor com força de 
dogma uma norma que não admita conduta oposta (KELSEN, 2000, p. 20). 
Quanto ao valor, este pode ser subjetivo ou objetivo, conforme se ligue a relação de um objeto com o 
desejo ou vontade de uma pessoa, ou na relação de uma conduta com a norma positiva objetivamente 
válida. Mas atente-se que embora se ouça falar em “juízo de valor objetivo” e “juízo de valor subjetivo” 
na realidade estes dois conceitos se referem somente ao valor, uma vez que o juízo é sempre objetivo, 
ou seja, formula-se independente da vontade do judicante (KELSEN, 2000, p. 22). 
É interessante ainda destacar que a relação de um fato com a conduta real efetiva estatuída pela norma 
é passível de compreensão sem que se compreenda a origem desta norma, logo, tem-se o juízo de valor 
como sendo objetivo, já que não precisa compreender a vontade que deu origem a norma para 
compreender a relação desta com a conduta a que se destina a reger. 
O valor é ainda apontado como uma relação que tem a conduta humana como o fim almejado. Este fim 
poderia ter valor positivo ou negativo, e ser objetivo ou subjetivo. Um fim que se concretiza seria 
positivo; aquele que se desvia ou não se concretiza seria, por óbvio, negativo. Um fim objetivo é algo 
que deve ser realizado por força da legislação positiva que o estatui, já o fim subjetivo é aquele que o 
ser humano mostra, em si mesmo, como um desejo pessoal que anseia por concretizar[8]. 
Se este fim se perde ou se é ignorado, mas subsiste seu meio, o que resta é uma mera relação de causa 
e efeito em que algo é feito e um resultado alcançado, sem que se saiba o porquê de assim ser (KELSEN, 
2000, p. 25). 
4. A ordem social 
A ordem social é aquilo que a sociedade espera do indivíduo, ou seja, a conduta desejada pelo conjunto 
de indivíduos com relação a seus semelhantes, que permita uma existência ordeira e pacífica, a base de 
tal ordem social são as sansões, ou seja, as consequências negativas inerentes a uma conduta 
socialmente indesejável, e que visam obstar tal conduta. 
4.1 Ordens sociais que estatuem sanções 
A conduta de um indivíduo pode se adequar ou não a aquilo que a sociedade espera dele, ou seja, pode 
estar ou não de acordo com relação a um ou vários indivíduos, objeto ou objetos, tal conduta pode 
ainda ser mediata quando atingir indiretamente um objeto ou individuo, ou imediata quando o atingir 
diretamente. Estas condutas são reguladas por uma ordem emanada da coletividade a qual se chama de 
“ordem social”, a esta ordem pertencem o direito e a moral (KELSEN, 2000, p. 25). 
Esta conduta pode ser prejudicial ou útil, mas em ambos os casos é passível de receber sanções que 
podem ocorrer em forma de castigos ou prêmios (KELSEN, 2000, p. 28). O princípio que leva esta ordem 
a reagir a uma determinada conduta com um destes tipos de sanção chama-se Vergeltung, ou princípio 
retributivo. 
A função de tais sansões é capacitar a “ordem social” a obter as condutas desejadas por parte dos 
indivíduos que delas façam parte, já que: “[...] a função de qualquer ordem social consiste obter uma 
determinada conduta por parte daquele que a esta ordenação está subordinado, fazer com que essa 
pessoa omita determinadas ações consideradas como socialmente – isto é em ralação a outras pessoas – 
prejudiciais, e, pelo contrário, realize determinadas ações consideradas socialmente úteis” (KELSEN, 
2000, p. 26). 
Pode haver ainda a prescrição ou proibição de uma determinada conduta. A conduta prescrita é aquela 
que é ordenada pela norma, já a proibida é aquela oposta à prescrita. Tem-se, portanto, que uma 
mesma conduta pode ser prescrita e proibida simultaneamente sem que sejam incompatíveis[9]. Por 
fim tem-se aqui uma relação de causa e efeito, onde a conduta se encontra vinculada a um prêmio ou 
uma punição, conforme seja o valor que lhe é atribuído (KELSEN, 2000, p. 28). 
4.2 Haverá ordens sociais desprovida de sanção? 
Na obra de Kelsen (2000) fica claro que a hipótese de uma ordem social desprovida de sanção e 
inimaginável. A única diferença entre as ordens sociais residiria, então, nas espécies das sanções que 
estatuem (KELSEN, 2000, p. 30). 
4.3 Sanções transcendentes e sanções imanentes. 
As sanções podem ser transcendentes[10] ou imanentes[11] conforme possuam origem supra-humana ou 
divina, típica das sociedades onde Teologia, Direito e Política formam um amalgama sólido, à espécie do 
que ocorre nos países em que vigora “xariá[12]”, em que a punição divina é mais temida que a 
terrena[13] ou humana, quando tal castigo virá diretamente das mãos de seus semelhantes. 
5. A ordem jurídica 
A ordem jurídica tem por base a organização das condutas humanas e da estruturação do Estado num 
todo coeso e cooperativo que seja capaz de resistir a marcha dos séculos, existindo de forma 
independente às ideologias dominantes, para se analisar a ordem jurídica conforme descrita por Kelsen 
(2000). Perfaz-se de suma importância proceder-se a esta análise em tópicos como os elencados pelo 
autor, o que aqui far-se-á na íntegra. 
5.1 O Direito: ordem de conduta humana. 
A palavra Direito do ponto de vista de Kelsen (2000) apresenta para todos os povos um significado 
comum de ordem à conduta humana, ordem esta que emana de uma norma superior responsável por dar 
validade às outras normas, neste sentido “uma norma singular é uma norma jurídica enquanto pertence 
a uma determinada ordem jurídica, e pertence a uma determinada ordem jurídica quando a sua 
validade se funda na norma fundamental dessa ordem” (KELSEN, 2000, p. 33). 
Nos sistemas jurídicos modernos as normas se restringem a regular o comportamento dos seres-humanos 
com relação a seus semelhantes, animais e plantas, ao contrário das sociedades animistas do mundo 
primitivo onde, por ordens supra-humanas, a conduta destes objetos com relação a seres humanos, 
poderia ser regulada de forma legal[14]. Este ato de regular dá-se em relação a aquilo que a autoridade 
judiciária considera ou não valiosa a conduta humana (KELSEN, 2000, p. 35). 
5.2 O Direito: uma ordem coativa. 
Para prevenir as condutas humanas ditas indesejáveis, o Direito reage às mesmas através de coações, 
que pela força do medo que impõe visam assegurar o cumprimento do dever-ser[15]. 
5.2.1 Atos de coação estatuídos pela ordem jurídica como sanções. 
Estes atos têm por objetivo evitar a prática de certas condutas que por serem diametralmente opostas 
às prescritas, tornam-se proibidas. Não que a essência do Direito seja a de impor as condutas mediante 
a força, mas dela necessita para que seja cumprido algum dever-ser de vital importância, neste 
sentido: “[...] dizer que o Direito é uma ordem coativa não significa - como às vezes se afirma - quepertença à essência do Direito "forçar" (obter à força) a conduta conforme ao Direito, prescrita pela 
ordem jurídica. Esta conduta não é conseguida à força através da efetivação do ato coativo, pois o ato 
de coação deve precisamente ser efetivado quando se verifique, não a conduta prescrita, mas a 
conduta proibida, a conduta que é contrária ao Direito. Precisamente para este caso é que é estatuído 
o ato coativo, que funciona como sanção” (KELSEN, 2000, p. 36). 
Logo, o Direito possui antes de tudo o desejo de evitar o mal e apresenta a punição como forma de 
desencorajar as práticas vistas como tais e, só em último caso, aplica-se a punição para evitar que o 
ordenamento caia em descrédito diante da afronta da conduta delituosa. 
5.2.2 Monopólio de coação da comunidade jurídica. 
As diversas comunidades jurídicas coincidem no que diz respeito aos atos de coação por elas estatuídos 
e atribuíveis a comunidade jurídica, mas divergem quanto aos pressupostos que ensejam esta 
coação. Entretanto, pode-se traçar ainda, na evolução do Direito moderno dentre os povos civilizados, 
uma forte tendência a moderar o uso de força e violência nestas coações, sendo que seu uso excessivo 
torna-se por vezes proibido, mas essa proibição dificilmente será absoluta, pois se assim fosse não 
haveria condição sólida de imposição do dever-ser já que sem força não se pode aplicar determinadas 
punições ou medidas de contenção eficazes, necessárias em casos extremos (KELSEN, 2000, p. 39). Esta 
coação pode ser aplicada mediante normas emanadas de um poder central, caso em que teremos um 
monopólio da coação que se dá mesmo quando este ordenamento atribuir tal poder a um indivíduo em 
forma de órgão especializado e descentralizado. Quando este poder residir nas mãos daqueles que são 
ameaçados por condutas antijurídicas e lhes for assegurado reagir por força própria, ocorre, neste caso, 
a autodefesa. 
5.2.3 Ordem jurídica e segurança coletiva. 
A centralização do poder de julgar e aplicar sansões nas mãos de órgãos especializados que excluem até 
certo ponto a autodefesa, visa assegurar a proteção do Estado aos indivíduos que o compõe, a esta 
proteção dá-se o nome de segurança coletiva, e seu objetivo é a paz (KELSEN, 2000, p. 39), uma paz 
que não e incompatível com o emprego da força física (KELSEN, 2000, p. 41), mas a mantém atrelada às 
limitações convenientes, para que as condutas antijurídicas não tenham sequer esperança de prosperar 
por temor a ordem imposta pelos tribunais [16]. 
5.2.4 Atos coercitivos que não tem caráter de sanção. 
Uma sanção é o modo pelo qual a ordem jurídica reage a uma conduta indesejável visando, em último 
caso, retribuí-la. Deseja, em suma, que seja possível prevenir a prática desta através da coação que 
teria por objetivo inibir a exercício desta conduta. Mas se esta sanção é aplicada anteriormente a 
prática da conduta, é uma forma de prevenir a possibilidade que esta se consume. Se ampliarmos o 
conceito de sanção, estes atos de coerção podem encaixar-se neles, já que são um meio – perigoso, aliás 
- de prevenir a prática de atos indesejáveis que se presume que irão ser praticados, vale ressaltar que 
KELSEN (2000) atenta-se ao fato de que: “[...] distinguem-se destas sanções, como já notamos, apenas 
na medida em que estes atos de coerção não são ligados, como consequências, a uma determinada ação 
ou omissão de certo indivíduo, ação ou omissão socialmente indesejável e juridicamente fixada [...] 
casos em que o ato de coerção seja executado, na verdade, como reação contra uma determinada 
conduta humana, contra um delito, mas contra um delito cuja comissão por um determinado indivíduo 
ainda não foi juridicamente averiguada, como sucede no caso da privação compulsiva da liberdade, pela 
polícia, do suspeito de ter cometido o delito, e nos casos em que o ato de coerção se processa contra 
um delito ainda não cometido mas que é de esperar como possível no futuro [...]” (2000, p. 44). 
Formas simples de se notar a aplicação destas sanções prévias no direito brasileiro são as prisões 
cautelares, aplicadas a hipóteses que visam resguardar a aplicação da lei penal e a segurança do Estado, 
atreladas fortemente as disposições legais, e ao fummus comissi delicti, aplicadas antes de concluído o 
julgamento e proferida a sentença. 
5.2.5 O mínimo de liberdade 
Toda conduta que não nos é proibida pelo direito é, por óbvio, permitida. Mas esta permissão se dá por 
via negativa; por via positiva se dará se for assegurado pelo ordenamento o direito de prática desta 
conduta de forma a impedir que outros nos obstem em seu exercício. Em ambos os casos vemos reflexos 
de liberdade pessoal[17], que só será plena caso esta seja assegurada pelo ordenamento, caso se 
consolide como direito. 
Grandes problemas geram condutas que não sendo proibidas, nem asseguradas, são de livre prática, mas 
podem sofrer obstáculos pela vontade de outrem que, por sua vez, se não é impedido por lei de agir 
contra esta liberdade, relação que pode dar margem a conflitos entre os interesses opostos. Para dirimir 
este conflito é comum que as ordens jurídicas proíbam a tentativa por parte de alguém de intervir uma 
conduta que a outrem não é proibida, ou como diria Kelsen (2000): “O que pelas modernas ordens 
jurídicas é - pode afirmar-se - proibido sem exceção é o obstar à conduta não proibida de outrem pelo 
recurso à força física.” (KELSEN, 2000, p. 47) 
Assim, tutela-se a liberdade assegurada pelo Estado de Direito, obstando-se condutas arbitrárias de um 
indivíduo que venha a lesar outrem no exercício do que não lhe é proibido. 
5.3 O Direito como ordem jurídica de coação. Comunidade jurídica e “bando de salteadores” 
Um ato de coerção possui sentido objetivo e subjetivo. Seu sentido subjetivo é de um dever que almeja 
um ser, mas apenas adquire caráter objetivo quando emanada de uma ordem jurídica consolidada pelo 
tempo e oriunda de uma Constituição subjetivamente[18] validada pelas eras, através da qual se dá 
competência ao Legislativo e por meio deste ao Judiciário: “E fazemos isto porque consideramos o ato 
de produção legislativa como a realização da Constituição, isto é, de normas gerais que, de 
conformidade com o seu sentido subjetivo, conferem àqueles mesmos indivíduos competência para 
estabelecer outras normas gerais que estatuam atos de coerção” (KELSEN, 2000, p. 50). 
O que emana desta relação são normas que constituem um “dever-ser” e objetivam um “ser”, de forma 
válida. 
Resta, ainda, um último quesito para ser considerada norma jurídica válida e fazer jus a coerções, qual 
seja, sua aplicação ampla, ou seja, quando for globalmente eficaz (KELSEN, 2000, p. 51), pois se não for 
aplicada ou se o for apenas a pequenos territórios carecerá de eficácia, e por óbvio não poderá sequer 
ser norma. O que difere, pois, um ato de coerção imposto pela norma jurídica, do ato de um mero 
bandido, seria sua eficácia e sua origem. 
5.4 Deveres jurídicos sem sanção 
Uma ordem jurídica dissociada da imposição de sanções é inimaginável, pois se vale delas para impedir 
a prática de condutas indesejáveis à segurança social que impeçam o estabelecimento da paz: “É, por 
isso, de rejeitar uma definição do Direito que o não determine como ordem de coação, especialmente 
porque só através da assunção do elemento coação no conceito de Direito este pode ser distintamente 
separado de toda e qualquer outra ordem social, e porque, com o elemento coação, se toma por 
critério um fator sumamente significativo para o conhecimento das relações sociais é altamente 
característico das ordens sociais a que chamamos "Direito"; e mais especialmente ainda porque só então 
será possível levar em conta a conexão que existe - na hipótese mais representativa para o 
conhecimento do Direito, que é a do moderno direito estadual - entre o Direito e o Estado, já que este 
é essencialmente umaordem de coação e uma ordem de coação centralizadora e limitada no seu 
domínio territorial de validade” (KELSEN, 2000, p. 60). 
Conceber uma ordem assim seria postular o fim do Estado e com ele pereceria também o Direito, e 
concretizado estaria o sonho de Marx e Angels[19], pois não haveria nada além do comunismo que se 
converteria em uma anarquia, tal seria - tendo-se em vista a natureza humana -, insustentável. 
5.5 Normas jurídicas não autônomas 
Normas não autônomas são aquelas que possuem sua aplicação vinculada ao disposto em outra norma, 
visto a primeira ser autônoma embora relacionada com a segunda, mas a segunda apenas é valida com a 
existência da primeira. Exemplo claro disso é a prescrição de uma conduta em uma norma e a descrição 
da sanção em outra. Tal ainda existe nos dias atuais, embora em desuso. A maioria das normas 
associadas a sanções são descritivas ao passo que descrevem e seu corpo a conduta indesejada e já no 
mesmo corpo legal a associam a uma sanção[20]. Outro exemplo de norma não autônoma que é 
essencial são as normas derrogadoras, tão importantes a evolução do direito, e que sem uma norma 
autônoma sobre a qual se destinam a sobrepor, perdem por completo sua eficácia e razão de ser. 
6. Direito e Moral 
A complexa relação entre direito e moral a muito atormenta a mente dos juristas, que por vezes 
confundem ambos fundindo-os num amalgama inseparável, o que de fato constitui-se num grande erro. 
Outro erro seria comparar moral e ética, visto que a primeira e algo inerente à sociedade e sua 
construção histórica, ao passo que a segunda se constitui num estudo da moral sob a ótica jurídica e 
cientifica. É de suma importância que se compreenda que as diferenças entre normais morais e normas 
jurídicas não obstam que as mesmas por vezes estejam conectadas pelo liame da sociedade na qual 
vigem, mas primeiro é necessário analisar as normas morais como normas sociais. 
6.1 Normas morais como normas sociais 
Kelsen (2000) ressalta o quanto é importante distinguir ética de moral, visto que a primeira cuida da 
análise da segunda, e esta, por sua vez, é oriunda daquilo que a sociedade considera como bom e justo 
(KELSEN, 2000, p. 67). Logo, pode-se dizer que a moral é oriunda do espírito de época de uma 
determinada sociedade. 
6.2 Moral como regulamentação da conduta interior 
Sendo a moral algo valorado pela sociedade como bom, é importante refletir que se esta conduta 
humana lhe fosse intrínseca não seria necessário uma prescrição moral, para tanto a mesma visa criar no 
indivíduo uma inclinação a agir de acordo com aquilo que a sociedade, por intermédio da moral, tem 
como sendo “bom”, pois: “Na verdade, só por causa dos efeitos que esta conduta tem sobre a 
comunidade é que ela se transforma, na consciência dos membros da comunidade, numa norma moral. 
Também os chamados deveres do homem para consigo próprio são deveres sociais. Para um indivíduo 
que vivesse isolado não teriam sentido” (KELSEN, 2000, p. 68). 
É ultrapassada a ideia de que uma ordem social, por intermédio da moral, possa forçar o indivíduo a 
reprimir seus instintos egoísticos, uma vez que se ele escolhe se adequar a moral é justamente para 
satisfazer a si próprio e ter aceitação social, sem, entretanto, reprimir tal instinto egoístico, mas sim 
agindo movido por ele. Logo: “Nenhuma ordem social pode precludir as inclinações dos homens, os seus 
interesses egoísticos, como motivos das suas ações e omissões. Ela apenas pode, se quer ser eficaz, 
criar para o indivíduo a inclinação ou interesse de se conduzir em harmonia com a ordem social e se 
opor às inclinações ou interesses egoísticos que, na ausência daquela, atuariam” (KELSEN, 2000, p. 69). 
Tem-se, portanto, que se a moral age internamente impondo uma conduta por pressão social, age o 
Direito externamente impondo-a por força legal. 
6.3 Moral como ordem positiva sem caráter coercitivo 
Para distinguir Direito de Moral, Kelsen (2000) parte do princípio que o primeiro prescreve uma conduta, 
atribuindo a conduta oposta um ato de coerção, já que o Direito seria uma ordem de coação. A moral 
seria então uma ordem social desprovida deste tipo de sanção, sendo suas sanções baseadas somente 
em aprovação ou desaprovação social. À parte dos conceitos kelsenianos é importante lembrar que as 
sanções impostas pela desaprovação social podem ser mais cruéis do ponto de vista psicológico que as 
impostas pelo Direito, e por vezes produzem os grupos tidos como outsiders que, sob o efeito da 
estigmatização social, podem formar um risco a esta ordem. 
6.4 Direito como parte da moral e a relatividade moral 
Sendo o Direito destinado a satisfazer os anseios da sociedade no que diz respeito a sua organização e 
limitação das condutas humanas, ele é, por óbvio, um reflexo da moral dominante, que sob a ótica de 
determinados grupos sociais poder adquirir caráter imoral, pois: “O que sobretudo importa, porém - o 
que tem de ser sempre acentuado e nunca o será suficientemente - é a idéia de que não há uma única 
Moral, "a" Moral, mas vários sistemas de Moral profundamente diferentes uns dos outros e muitas vezes 
antagônicos, e que uma ordem jurídica positiva pode muito bem corresponder - no seu conjunto - às 
concepções morais de um determinado grupo, especialmente do grupo ou camada dominante da 
população que lhe está submetida - e, efetivamente, verifica- se em regra essa correspondência - e 
contrariar ao mesmo tempo as concepções morais de um outro grupo ou camada de população” 
(KELSEN, 2000, p. 77). 
Isto hoje é bem claro, pois ao contrário do que afirmam as escolas clássicas, não existe moral absoluta 
senão princípios morais, mesmo raros, mas universalmente aceitos. O Direito também constitui-se em 
moral no sentido de que a sociedade valora sua violação ou lesão como sendo contrários aos seus 
interesses, o que faz nos crer que é natural, já que, na maioria das vezes, é criado pela sociedade para 
assegurar os interesses da sociedade. 
6.5 Separação do Direito e da moral 
Tal separação implica que seja admitida a inexistência de uma moral absoluta, pois caso contrário 
apenas seria justo o Direito se de acordo com esta moral. Mas sendo tais valores relativos, assim como a 
valoração do justo e injusto através das eras, tem-se que o Direito, este sim, em seu objetivo de 
assegurar os interesses sociais, nunca muda, o que muda é seu conteúdo vez que: “[...] não há valores 
absolutos, mas apenas valores relativos, que não existe uma Justiça absoluta mas apenas uma Justiça 
relativa, que os valores que nós constituímos através dos nossos atos produtores de normas e pomos na 
base dos nossos juízos de valor não podem apresentar-se com a pretensão de excluir a possibilidade de 
valores opostos” (KELSEN, 2000, p. 76). 
Desta forma, a moral acompanha o desenvolvimento da sociedade pari passu sem até hoje ter se 
tornado fixa e imutável, ou seja, absoluta. 
6.6 Justificação do Direito pela moral 
Tal justificação se dá de modo relativo, já que cada ordem social valora o Direito sob a ótica de sua 
moral própria, e segundo o que lhe convém. Mas a ciência do Direito kelsenina não julga se são “bons” 
ou “ruins” os valores em tese, apenas cuida do estudo do Direito em vigor. Neste ponto se situa uma 
forte crítica ao envolvimento do Direito com o idealismo, pois pretendendo-se justificar o Direito pela 
moral e considerando-se como justo apenas aquilo que se adéqua numa moral específica, o Direito pode 
ser utilizado politicamente para justificar as ações de Estados que almejam o poder e, para tanto, 
pressupõe uma moral universal que lhes beneficie nestas intenções, e que justifique o Direito que 
impõem, assim sendo: “Uma tal justificação do Direito positivo pode, apesar da sua insuficiência lógica, 
prestar politicamente bons serviços. Do ponto de vista da ciência jurídica ela é insustentável. Com 
efeito, a ciênciajurídica não tem de legitimar o Direito, não tem por forma alguma de justificar - quer 
através de uma Moral absoluta, quer através de uma Moral relativa - a ordem normativa que lhe 
compete – tão somente - conhecer e descrever” (KELSEN, 2000, p. 76). 
Como exemplos do que foi dito, podemos citar, as Cartas outorgadas por regimes extremistas movidos 
por um forte idealismo que justificam todas as suas ações com base em uma moral indiscutível, 
considerada como superior a tudo e a todos. 
 Conclusão 
A complexa obra de Kelsen (2000) funde em seu corpo filosofia e ciência para 
trazer de um modo didático conceitos abstratos que muitas vezes passam despercebidos aos operadores 
e estudantes da ciência jurídica, que em seu dia-a-dia utilizam estes conceitos de forma mecânica sem 
compreender seu real significado. A obra “Teoria pura do Direito” realiza os propósitos do autor, já que 
é capaz de nos propiciar uma visão concisa e sistemática do universo jurídico puro despido de quaisquer 
ideologias. Nenhum monumento pode ser construído sem antes lhe serem lançados os alicerces, e esta 
obra consiste no mais puro alicerce do conhecimento jurídico-positivo, é um estudo fundamental 
àqueles que desejam se aprofundar na ciência jurídica já que nos oferece a base sobre a qual edificar as 
colunas de nosso conhecimento. Resta ainda, com muito cuidado, que seja analisada a parte que trata 
sobre a moral, pois em nossos dias não só a mídia cunha seus próprios conceitos de moral e muito 
perspicazmente os impõe na mente dos cidadãos, bem como defende conceitos que sejam do agrado 
daqueles que por força financeira manipulam os meios de comunicação, mas também teorias jurídicas 
dispõem para impor a aceitação de conceitos que se mostram como universalmente bons e válidos, mas 
que não são nada além de conveniências a determinados grupos. Certo é que moral é aquilo que a 
sociedade considera justo, mas é necessário voltarmos a chamar atenção para a mídia manipuladora do 
bom senso de grande parte da população. Se Hans Kelsen tivesse presenciado esta realidade, 
certamente se desdobraria para 
de alguma forma evitar esta influência e, certamente, seria sua maior contribuição ao nosso, já 
decadente, sistema jurídico. 
A moral, como Kelsen (2000) explica, pode ser um instrumento eficaz de controle político. Indica 
também que relativa é a justiça, já que a esta serve a moral, e a moral também poder servir a justiça. 
Entretanto, em nosso entender, a justiça deve, em si, estar acima da moral. Como exemplo de justiça, 
temos o respeito à liberdade, a qual deve visar não ferir qualquer livre arbítrio senão quando este 
ameace a subsistência de outro livre arbítrio, respeitar a opinião das massas sem permitir que oprimam 
e controlem as minorias, mas isso não é ciência do Direito e, sim filosofia, e é assunto para outro artigo.

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