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Arquitetura Gótica “Se Bizâncio, no Oriente, sucedera a Roma como capital mundial, o mesmo se passou com Paris, no Ocidente. A Ilha da França tornou-se um cofre onde se preservava a civilização. De Paris e das catedrais da Ilha de França – Saint-Denis, Laon, Chartres, Amiens, Beauvais, Le Mans e Bourges – brotaram os princípios estéticos e estruturais do gótico, que irradiaram através da Europa graças aos grandes mestres de obra.” (R. Jordan) O estilo gótico divide-se, basicamente, em duas fases: o clássico e o tardio; Gótico clássico (c.1150-1250) Gótico tardio (c.1250-1500) “Em 1140 foi lançada a pedra fundamental do novo coro da abadia de Saint Denis, perto de Paris, que seria consagrada em 1144. (...) Pode- se dizer com segurança que, seja quem for que tenha projetado o coro em Saint Denis, essa pessoa inventou o estilo gótico.” (N. Pevsner) Vista (atual) do coro de Saint Denis (com as posteriores alterações) Curiosidade: o estilo gótico foi originalmente denominado “estilo francês” (Opus Francigenum). O termo “gótico” surgiu bem mais tarde, quando esse estilo já havia caído em desuso. O termo “gótico”, portanto, em sua referência aos godos (um dos povos “bárbaros” da Europa), surgiu como uma forma de crítica negativa (ainda que inexata). (Jackie Craven) No entanto, praticamente todas as regiões da Europa medieval emprestaram seu cunho próprio à arquitetura gótica (como, aliás, já havia acontecido com a arquitetura românica); A arquitetura alemã, a espanhola, a inglesa etc., cada uma constitui uma variante regional do “grande tema estrutural” desenvolvido pelos construtores franceses. “Um estilo não é apenas um agregado de características, mas um todo integrado.” (N. Pevsner) As principais características do gótico são o uso de: O arco ogival O arcobotante A abóbada nervurada O arco ogival Arcobotante Abóbada nervurada Abóbada nervurada Abóbada nervurada Lembrete: nenhum destes três elementos (arco ogival, arcobotante e abóbada nervurada) foi uma invenção gótica! A novidade decisiva, portanto, foi a combinação desses motivos numa nova proposta estética! Essa proposta, por sua vez, tinha como objetivo “animar massas inertes de pedra, acelerar o movimento do espaço e reduzir toda a construção” a um sistema “inervado de linhas de ação.” (N. Pevsner) Outro ponto fundamental do gótico: “este desejo de substituir a parede por vitrais.” (R. Jordan) Ou seja, o estilo gótico procurou “inundar” de luz aqueles espaços que, até então (estilo Românico) viviam na penumbra. Igreja de St. Chapelle (Paris): 1243-1248 Uma das maiores vantagens estruturais do arco ogival é a expressiva redução no empuxo lateral a ser absorvido pelas paredes (e contrafortes). Em comparação ao arco semicircular (arco pleno) dos romanos, por exemplo, essa redução chega a quase 50%! Arco Pleno (Semicircular) Arco Ogival O arco ogival, portanto, permite ao projetista não apenas aproximar-se da verticalidade desejada, como também construir abóbadas sobre vãos que não “estavam sujeitos à tirania do tramo quadrado” (R. Jordan); Ou seja, resolve-se a questão do uso do tramo retangular sem a necessidade de usar os arcos abatidos (muito mais inseguros). De fato, variando a altura das flechas dos vários arcos ogivais, o tramo podia ter praticamente qualquer forma, adequando-se à função da planta; Exemplos: os tramos em forma de losango dos deambulatórios, as capelas poligonais etc. O arco ogival, permitiu ainda o aparecimento de uma multiplicidade de nervuras de abóbadas; todas arrancando de um mesmo fuste, todas com curvatura diferente; todas podendo ter inclusive a mesma altura. As características estéticas do gótico, portanto, só foram possíveis graças às qualidades técnicas do arco ogival. (R. Jordan) Saint Severin (Paris), coluna construída na reforma de 1489 Com o uso dos vãos retangulares, por sua vez, torna-se possível aumentar o número de pontos de apoio das coberturas em abóbadas e com isso reduzir o esforço aplicado individualmente em cada um deles (em comparação à abóbada de arestas tradicional e o seu tramo quadrado). Arco abatido ou asa de cesto, sarapanel ou arco rebaixado é um tipo de arco de forma achatada em que o valor da flecha é inferior à metade do raio. É composto de três curvas de centros diferentes. Pode ser aplicado em vários elementos arquitectónicos e artísticos, como portais, janelas, retábulos, etc. A abóbada gótica alongada (retangular) era então construída com nervuras destinadas a reforçar as arestas (uma solução tecnicamente vantajosa); As nervuras dos tramos abobadados, porém, não tinham que atingir necessariamente a mesma altura. Ou seja, com o uso do arco ogival, a altura de cada nervura ficava a critério do autor do projeto. O peso (empuxo) das abóbadas da nave principal, por sua vez, era agora transmitido através dos arcobotantes por cima das naves laterais, e destes para os contrafortes (na parte externa) até o chão. arcobotantes Do século XII ao século XVI, de fato, esse sistema (arcobotantes e contrafortes) foi possibilitando “desbastar a parede”, de modo que, por fim, não restou praticamente parede alguma; nada a não ser janelas enormes entre os contrafortes, vedadas com o uso de impressionantes vitrais. Após a construção do coro em Saint Denis, entre 1140 e 1220, novas catedrais foram iniciadas em escala cada vez maior; Das primeiras igrejas góticas francesas, sabemos que assemelhavam-se muito às igrejas românicas normandas, “onde os primeiros pedreiros góticos da França, (...) foram buscar sua inspiração”; Essas primeiras edificações tinham, portanto, três andares: arcada, galeria e clerestório (lembrete: as abóbadas, a esta altura - a partir do exemplo de Durham - já eram nervuradas). Vista interna de Saint-Denis (Paris, França) Em Noyon, cerca de 15 anos após St. Denis, surgiu um elemento novo : as paredes ganharam um trifório, isto é, uma passagem baixa aberta na parede, entre a galeria e o clerestório. A divisão da parede em quatro andares, em vez de três, “elimina muito da inércia anterior.” (N. Pevsner) Vista interna da catedral de Noyon (França) trifório Em harmonia com esse ritmo, temos ainda, por algum tempo, a abóbada sexpartida (solução típica das igrejas românicas da Normandia); E mais: na fase inicial do gótico, o tramo quadrado ainda é dominante. Abóbadas sexpartidas de Notre Dame de Paris Todavia, em Notre Dame de Paris, testemunhamos um passo adiante da concepção da nave principal: o fim da alternância românica dos pilares (ou seja, nem os pilares cilíndricos e nem as colunas engastadas que se apoiam neles são mais diferenciados. Corte da versão original de Notre Dame de Paris, com a parede dividida em quatro seções, tendo uma fileira de janelas circulares substituído o trifório. A planta baixa de Notre Dame, porém, é ainda mais “audaciosa” que sua elevação: o arquiteto colocou o transepto quase exatamente a meio caminho entre as duas extremidades; Disso tudo resulta um ritmo espacial muito mais suave do que o das catedrais românicas: o espaço não mais se divide em numerosas unidades “que é preciso como que somar mentalmente para ter a ideia do conjunto”,mas concentra-se agora em três áreas: oeste, centro e leste. Vista interna do transepto de Notre Dame de Paris Lembremos ainda “a instituição de peregrinações que, (...) já nos tempos românicos parece ter conduzido a uma maior especialização da planta nas igrejas, com [naves] colaterais, deambulatórios e capelas radiantes. No gótico, a planta destas capelas do lado oriental atingiu o máximo da capacidade inventiva”. (R. Jordan) Chartres BeauvaisMagdeburg c.1150-c.1250 Abóbadas da nave principal voltam a ter apenas nervuras diagonais (ou seja, não são mais sexpartidas); Tramos retangulares (ao invés de quadrados); Colunas cilíndricas que prolongam-se, normalmente, até o início das abóbadas; As altas e amplas galerias desaparecem (ou seja, as naves voltam a ter apenas três andares). Com isso, apenas um trifório baixo separa as altas arcadas das janelas do clerestório. Principais características: Catedral de Chartres (França) – 1194 a 1220 Catedral de Chartres (França) “Depois de Chartres ter introduzido seu novo tipo de pilares, sua elevação com três andares e suas abóbadas quadripartidas, Reims, Amiens e Beauvais não fizeram mais do que aperfeiçoar esse tipo para levá-lo aos extremos mais ousados e excitantes”; (Pevsner) Portanto, tanto nas plantas baixas quanto nos interiores, atingiu-se, sem dúvida, um certo equilíbrio na França (país de origem do estilo gótico). AmiensChartres Reims AmiensChartres Reims “O equilíbrio do gótico clássico é um equilíbrio entre dois impulsos de igual força e direções opostas”: um vertical e outro horizontal; (Pevsner) A primeira impressão é a de “uma altura prodigiosa que corta nossa respiração”. Catedral de Amiens Graças à delicadeza de todos os componentes, “o impulso vertical” é tão irresistível quanto o era o impulso na direção leste nas primeiras igrejas cristãs (arquitetura paleocristã); Apesar disso, o impulso em direção ao leste (ao altar-mor) não diminuiu: a estreiteza das arcadas e a uniformidade dos pilares não parecem levar a qualquer mudança de direção (mesmo que momentânea). Catedral de Amiens “Nessa caminhada para a frente, os pilares nos acompanham, surgindo e desaparecendo. (...) No entanto, (...) o transepto nos faz parar e desvia o nosso olhar para a esquerda e a direita. Aí nós nos detemos e tentamos, pela primeira vez, apreender o todo”. (Pevsner) Não havia nada de comparável nas igrejas românicas, onde “o movimento se desenvolvia lentamente, de espaço em espaço, de compartimento em compartimento.” Igreja de St. Madeleine (Vezelay) Catedral de Reims A introdução do rendilhado, uma invenção do estilo gótico, é particularmente significativa; É possível seguir o desenvolvimento dessa técnica de Chartres a Reims e de Reims a Amiens. Chartres Amiens Antes de Reims, o rendilhado não é mais do que o recorte de um certo padrão numa parede cuja superfície permanece intacta; Em Reims, pela primeira vez, encontramos o rendilhado de nervuras, em oposição ao rendilhado plano; A ênfase maior repousa, agora, nas linhas do desenho e não mais na superfície da parede. Catedral de Reims Catedral de Amiens Processo produtivo das grandes aberturas (janelas, rosáceas etc.) góticas O exterior das catedrais góticas do fim do século XII e começo do XIII estava em perfeita harmonia com o interior – pelo menos na forma na qual eram planejadas, pois raras foram as catedrais dessa época que foram terminadas! Uma das exceções: Catedral de Laon (França) O intenso verticalismo dos exteriores vai ser outra inovação do gótico francês; A flecha (“criação do espírito gótico”) é a expressão máxima desse “ímpeto em direção ao céu” e representa um importante avanço quando a comparamos com as “flechas” românicas, que apresentam-se como simples coberturas de formas cônicas ou piramidais. torres românicas torres góticas Tudo nos leva a crer que, nas principais catedrais, as torres deveriam terminar em flecha: Chartres, Laon, Reims, Amiens etc.; A primeira flecha na França é a da torre sul de Chartres e, na Inglaterra, a da catedral de Oxford. Catedral de Chartres Catedral de Oxford Chartres: exemplo da evolução das flechas (norte e sul) Os arcobotantes, elementos que compõe o exterior, aparecem pela primeira vez em Notre Dame de Paris e em Canterbury (Inglaterra), nos anos 1160 e 1170 respectivamente. Notre Dame de Paris Além de atender a necessidade estrutural, a construção dos arcobotantes é “intrincada é fascinante; não é fantasiosa nem inconsequente, mas sim orientada pela lógica, e exprime, de fato, a mesma tensão que governa os interiores.” (Pevsner) Notre Dame de Paris Faziam recair o peso onde era necessário, perpendicularmente à linha de empuxo; Dividiam pelo lado de fora cada um dos tramos internos. Os contrafortes (mais evoluídos que os românicos) também desempenham uma função estrutural e estética ao mesmo tempo: Outro elemento ornamental característico das edificações góticas (a partir do início do século XIII) é a gárgula (provavelmente do francês “gargouille”, que significa garganta); Esses elementos eram originalmente destinados a escoar as águas pluviais dos grandes telhados, conduzindo-as o mais longe possível de paredes e fundações. Gárgulas Gárgula da Catedral de Freiburg (Alemanha) – séc. XIII Algumas gárgulas, contudo, possuem apenas uma função ornamental. Determinados autores fazem essa distinção, denominando esses elementos “quimeras” ou “grotescos”. Notre-Dame de Paris “A catedral gótica apela para toda a nossa capacidade emocional e intelectual. Ora nos descobrimos perdidos na resplandecência mística, púrpura e azulada dos seus vitrais, ora nossa atenção volta a ser atraída pelo percurso preciso dessas linhas ao mesmo tempo delgadas e suficientemente fortes.” (Pevsner) “...o arquiteto gótico, muito mais audacioso em suas construções, com sua alma ocidental de eterno pesquisador e inventor, sempre em busca do inédito, procura criar um contraste entre um interior espiritual e um exterior racional. De fato, quando estamos no interior da catedral, não podemos compreender, e não se espera que compreendamos, as leis que a governam em seu conjunto. Pelo contrário, no exterior o mecanismo complicado da estrutura nos é exposto com franqueza.” (N. Pevsner) Amiens: vista externa Amiens: interior A catedral era trabalhada como uma verdadeira “enciclopédia talhada na pedra”: são retratadas a vida de Cristo, da Virgem Maria e dos santos, cenas e personagens do Antigo Testamento etc. Catedral de Amiens As molduras de cada pedra, além de reduzir o seu peso (sem perda de sua função), enriqueciam a sua natureza decorativa, demarcando as linhas de força em todo o edifício. Todas têm plantas muito largas, mas ainda são cruciformes – isto é, os transeptos representam pequenas projeções. A Catedral de Notre Dame de Paris (1163-1267), por exemplo, com as suas naves laterais duplas e perfeita unidade em todo o seu comprimento, pode ser considerada “a materialização de um ideal”. As edificações religiosas desse período, especialmente as francesas, têm vários pontos em comum: Essas catedrais têm, quase todas, portais profundos.Os de Laon, Reims e Amiens, por exemplo, contam- se entre as grandes obras da arquitetura. ChartresLaon A maior parte das catedrais francesas inclui ainda torres ocidentais (ou infraestrutura preparada para as receber). Lembrete: poucas catedrais chegaram a ser acabadas exteriormente! Chartres Notre-Dame Amiens No interior, como já dissemos, essas grandes catedrais do apogeu do estilo gótico apresentam uma estrutura em três andares: primeiro, há a arcada da nave central (que abre para as naves laterais), acima fica o trifório e finalmente temos o clerestório, que “inunda de luz” a nave central. O arco que separa os tramos, porém, deixa de se diferenciar das outras nervuras – como acontecia no românico – e, por isso mesmo, o que vemos no teto não é tanto uma série de tramos em sequência, mas sim um padrão de nervuras iguais, “crescendo organicamente a partir dos fustes”. Uma vez que os painéis de vidro tinham que ser sustentados, e dado que tais janelas tinham necessariamente de ser resistentes ao vento, eram então dividas por colunelas e rendilhados; Por seu turno, essa circunstância deu uma tal projeção ao artífice de vitrais, que esta arte se tornou um acessório do estilo gótico, tal como o mosaico o fora do bizantino. Em resumo: foi sobretudo alterando as proporções relativas da arcada, trifório e clerestório que os construtores góticos clássicos franceses edificaram catedrais diferentes umas das outras. Os cistercienses, nova ordem reformada francesa do século XII, foram os primeiros a adotar e difundir a arquitetura gótica na Inglaterra (R. Jordan); As construções cistercienses inglesas estão entre as primeiras a usar ativamente os arcos ogivais; Em Canterbury, após o incêndio de 1174 na catedral, Guilherme de Sens teria introduzido o estilo gótico na construção das catedrais inglesas. Ruínas da abadia cisterciense de Melrose (c.1146) Na Inglaterra, Henrique VIII (séc. XVI) e Oliver Cromwell (séc. XVII) infelizmente destruíram a maioria das esculturas das antigas catedrais góticas; Porém, nem a fachada de Wells, nem as estátuas existentes em Lincoln ou Westminster atingiam a perfeição de Reims ou Chartres. Afinal de contas, “os ingleses não são um povo de escultores.” (Pevsner) Detalhe da fachada de Wells Em compensação, sua arquitetura é tão elegante quanto a das catedrais francesas, ao mesmo tempo que permanece tipicamente nacional; Lembrete: o gótico inglês, assim como o estilo românico, encontra suas origens na França (Normandia). Catedral de Lincoln Early English (c.1175 a c.1275), que corresponde ao gótico clássico no resto da Europa; O decorated style (c.1280 a c.1380) foi o estilo dos relevos decorativos e dos rendilhados mais imaginativos, além de incluir novas experiências de espaço; O perpendicular style (c.1360 até o século XVI) despontou depois de 1330, quando desapareceram as características curvilíneas do decorated style e que perdurou com poucas variantes até o século XVI. A partir do século XIX, os pesquisadores dividiram o gótico inglês em três períodos: Entre as particularidades do gótico inglês (ilustrando muito bem a diferença de abordagem entre as arquiteturas da França e da Inglaterra) são os transeptos duplicados, tal como encontramos em Canterbury, Lincoln, Wells, Salisbury e em muitas outras catedrais: tratava-se de um esquema que prolongava todo o braço oriental, possibilitando assim um enorme coro para os religiosos. Catedral de Canterbury Catedral de Lincoln (sem o claustro e a Lady Chapel) Catedral de Wells Na França, como vimos, o estilo gótico tendia para uma concentração espacial. O Early English, por outro lado, não tem essa característica! Uma catedral como a de Salisbury, com sua extremidade leste quadrada e seu transepto duplo quadrado, ainda se compõe de uma soma de unidades (ou seja, uma série de “compartimentos reunidos)”. Catedral de Salisbury Outro exemplo: “Comparando-se (...) Lincoln com Reims, essa diferença se evidencia claramente. Reims parece vigorosamente compacta; Lincoln se esparrama (...).” (Pevsner) Reims Lincoln Early English e a Catedral de Salisbury: “A horizontalidade do interior é (...) característica do gótico inglês. Não há qualquer acentuação vertical, como por exemplo um fuste que ligue os três andares.” (R. Jordan) Catedral de Salisbury Catedral de Salisbury Quando as fachadas, como as de Lincoln (c.1192) e Wells (c.1191) - representantes fiéis do Early English -, se desenvolvem plenamente, sua existência não tem relação com o interior que está por trás delas; “são como telas colocadas diante da igreja propriamente dita, e não o exterior logicamente concebido, como projeção do sistema interior – como as fachadas francesas.” (Pevsner) Catedral de Lincoln Catedral de Wells As naves de Lincoln e Amiens evidenciam outro contraste evidente entre os dois países: às nervuras principais da clássica abóbada quadripartida, os ingleses acrescentam outras nervuras, chamadas terciarões, que, irradiando do mesmo ponto, sobem até a mesma altura. Em Lincoln, por exemplo, de cada mísula irradiam sete nervuras, ficando a abóbada subdividida em 14 partes! Catedral de AmiensCatedral de Lincoln Além dos terciarões, o arquiteto de Lincoln acrescentou também uma nervura contínua na aresta culminante; A nervura da aresta culminante, que se tornou modelo na Inglaterra, sublinha uma vez mais o comprimento (a horizontalidade), minimizando a altura das edificações. A Lady Chapel , por vezes considerada “a obra-prima” do estilo gótico inglês, é outro elemento típico desse estilo no país; Ela consiste normalmente de uma pequena igreja-salão, com abóbadas quase sempre suportadas por fustes monolíticos bastante delgados. Exemplos: Salisbury (Early English) e Ely (decorated style) Planta baixa da catedral de Ely Lady Chapel de Salisbury Lady Chapel de Ely “O clássico é apenas um momento na história de uma civilização. Nas mais avançadas, França e Inglaterra, ele foi atingido ao final do século XII.” (Pevsner) Por volta de 1275, contudo, os franceses “perderam o vigor”. As novas catedrais construídas a partir deste momento não trouxeram qualquer elemento novo, permanecendo fiéis às regras estabelecidas em Saint Denis e Beauvais décadas antes; A Inglaterra, pelo contrário, manteria sua energia criadora por mais um século. De fato, a arquitetura inglesa entre 1250 e 1350 foi a mais avançada, a mais importante e a mais inspirada da Europa. c.1250-c.1500 “O gótico tardio, embora ainda faça parte do estilo gótico em virtude do uso predominante do arco ogival, é essencialmente diferente do gótico clássico das grandes catedrais”; (Pevsner) Em termos de ornamentação das edificações religiosas, nota-se uma tendência para um maior refinamento e também para uma maior complexidade; Destaque para as edificações inglesas. Realmente não existe qualquer ornamento esculpido em sua nave e, no entanto, dos feixes de nervuras à aglomeração dos pilares, raros são os trechos de parede lisa; As nervuras das abóbadas foram multiplicadas até a nave central parecer uma “floresta de pedra”. O melhor exemplo do decorated style inglês é representado pela Catedral de Exeter (c.1280): Catedral de Exeter O clerestórioe o trifório desaparecem e com isso as naves laterais são da mesma altura da principal; Na abóbada central, vemos um novo tipo de nervura: os liernes; Tal como a nave central de Exeter, a de Bristol também se encontra mais dependente do jogo de luz e sombra do conjunto de molduras do que propriamente dos ornamentos em si. O desenvolvimento do perpendicular style, por sua vez, pode ser evidenciado na Catedral de Bristol (c.1298): Catedral de Bristol – os LIERNES são pequenas nervuras na abóbada, que ligam uma nervura principal a outra, formando desenhos de estrelas, um motivo que atingiu a máxima complexidade nas abóbadas perpendiculares, na Inglaterra, e nas abóbodas do gótico tardio, na Alemanha. Catedral de Bristol 1. A criação de um espaço unificado, com a forma de uma “igreja-salão” (ou seja, com naves laterais da mesma altura da nave central e sem o clerestório). Esta tendência, ao que tudo indica, teve sua origem nos dormitórios e refeitórios da arquitetura monástica. Em termos da disposição dos espaços no gótico tardio, os aspectos relevantes são: Corte da catedral de Ely 1. Pilares compósitos (apresentam capitéis apenas em fustes de menor importância; os outros lançam-se para o alto e se inserem nas abóbadas, sem nenhuma interrupção). Catedral de Bristol Em termos da disposição dos espaços no gótico tardio, os aspectos relevantes são: 1. As abóbadas se assentam inteiramente sobre uma rede em forma de estrela, constituída de nervuras primárias (ogivais), secundárias (terciarões) e terciárias (liernes). Catedral de Ely Em termos da disposição dos espaços no gótico tardio, os aspectos relevantes são: Dessa forma, em catedrais como Bristol, Ely e Wells, “nossos olhos são constantemente atraídos para perspectivas fugidias e oblíquas, para cima e para os lados”(ao contrário do que ocorria no gótico clássico, com a predominância de apenas duas direções). Catedral de Bristol Enquanto na Inglaterra a nova experiência de um espaço em movimento se exprime de modo complexo com o perpendicular style, no continente europeu “procura-se obter um resultado semelhante com meios opostos”; “As tendências predominantes em todos os países do continente europeu não eram no sentido de uma maior complexidade tridimensional do espaço, mas sim da amplidão ininterrupta.” (Pevsner) Essas tendências, na Espanha, Alemanha, Itália e França, estavam ligadas ao desenvolvimento de duas ordens religiosas - os franciscanos e os dominicanos, fundadas em 1209 e 1215 respectivamente - que rapidamente se expandem a partir de 1225; O que caracterizava todas as igrejas dos frades era, mais do que qualquer coisa, o fato de serem igrejas onde eram feitos grandes sermões. Ou seja, eram igrejas grandes, simples e funcionais, apresentando “poucos elementos que sugerissem uma atmosfera especificamente eclesiástica”; Eram necessárias, portanto, naves espaçosas para abrigar as multidões que vinham ouvir as pregações dos religiosos. “Os frades, como se sabe, pertenciam a ordens populares. Desprezavam a existência fácil e segregada das outras ordens em seus domínios retirados no interior; instalavam-se em cidades movimentadas, e lá desenvolviam sua notável técnica de pregação, como um veículo de propaganda religiosa (...). Assim, só precisavam de um amplo auditório, de um púlpito e de um altar”. (Pevsner) Essa simplicidade exterior, independente do que acontecia no interior, também é típica das igrejas dos frades na Alemanha; Na Alemanha, os interiores inicialmente não tinham naves laterais, mas depois, sobretudo após 1300, assumiram, praticamente como regra, a forma das igrejas-salão (ou Hallenkirche), aquelas igrejas em que – como vimos - naves laterais têm a mesma altura da nave principal. Catedral de St. Marien - Freiberg (final do séc. XV) A decoração, tal como na França e na Inglaterra, tornou- se progressivamente mais ornamentada, mas por quase 300 anos a forma básica permaneceu a mesma: o clerestório e o trifório desapareceram e a igreja transformou-se num salão com colunas, iluminado pelas janelas altas das naves laterais. Catedral de St. Marien - Freiberg Igreja de São Lourenço (Nuremberg) Igreja de São Lourenço (Nuremberg) Igreja de São Lourenço (Nuremberg) As nervuras flutuantes são também “uma especialidade das mais audaciosas” dessas igrejas do gótico alemão tardio; Surgem pela primeira vez na catedral de São Vito em Praga (c.1352). Exemplo de uma “abóbada esquelética” (nervuras flutuantes) A partir do século XIV, ocorrem uma série de mudanças sociais na Europa; Uma nova classe social surgiu - a classe à qual pertenciam os administradores reais, os homens de negócio, os líderes da Liga Hanseática alemã etc. – a mesma classe que agora seria responsável pela construção de dezenas de esplêndidas igrejas paroquiais; Ou seja, a antiga aristocracia, aos poucos, dividiu o poder com os burgueses, os “novos ricos”, cuja proporção nas cidades aumentaria cada vez mais. “Os mercadores, os burgueses e as guildas fundaram cidades. O poder destas associações (...) teve enorme importância. Câmaras municipais, casas de guildas, armazéns e grandes praças de mercado (...) mostram que, muito antes do final da Idade Média, os edifícios monumentais deixaram de provir apenas da Igreja e tornaram-se igualmente um símbolo de sucesso mundano.” (R. Jordan) Prefeitura de Gouda (Holanda) – séc. XV Prefeitura de Louvain (Bélgica): 1448-1469 Palazzo Ducale (Veneza) – c. 1345-1365 Referências: CRAVEN, Jackie. 1100-1450: Gothic. Architecture reaches new heights. Disponível em: <http://architecture.about.com/od/periodsstyles/ig/Historic- Styles/Gothic.htm>. Acesso em: 21 abr. 2014. FRANKL, Paul. Gothic Architecture. London: Yale University Press, 2001. JORDAN, Robert Furneaux. História da Arquitetura no Ocidente. São Paulo: Editorial Verbo, 1985. MACDONALD, Fiona. JAMES, John. Fique por dentro da história: uma catedral medieval. São Paulo: Editora Manole Ltda., s.d. PEVSNER, Nikolaus. Panorama da Arquitetura Ocidental. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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