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Fundamentos da psicologia social crítica (1)

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TEMAS EM PSICOLOGIA SOCIAL – ON LINE - NP1
MÓDULO 1	
 (1) Fundamentos da psicologia social crítica
 	Estudar a Psicologia Social no Brasil é a oportunidade para discutirmos a inserção profissional do psicólogo num campo distinto daquele onde ele é posto de maneira estereotipada, como profissional liberal, atendendo em consultório uma demanda quase sempre individual. Isto não significa desqualificar a prática clínica, que tem sem dúvida importância e lugar garantido nas atividades do psicólogo, além do que deve se considerar que por muitas vezes o “olhar clínico” treinado nesta prática de atendimento (e investigação) também será requerido quando se pensa na atuação junto a grupos e comunidades. 
Significa, justamente indicar um lugar para a prática da psicologia que escapa aos limites do consultório, de um lado, e que vislumbra uma ação que pretende desafiar o entendimento de questões psicológicas como ocorrendo nos limites do corpo. A compreensão dos fenômenos psicológicos irá ser estendida para outros “corpos”, como o “corpo” grupal e o “corpo” social, reconhecida a importância das relações histórico-sociais construídas nos grupos e na sociedade como determinantes da existência e das possibilidades de ser coletivamente.
 (2) Marxismo
 	Universal e racional, materialista e determinista, estabelecido a partir de Hegel, o método marxista, também chamado de materialismo dialético, propõe que a análise aprofundada de um objeto (a vida econômica, por exemplo), desvela elementos contraditórios, contradição que é entendida como motor da realidade e que, além de Hegel, não havia sido reconhecida em sua importância por outros importantes filósofos como Descartes ou Kant, por exemplo. 
Diferente de outros métodos voltados para o conhecer, o materialismo dialético inclui a compreensão de que a realidade que é objeto de estudo é uma realidade em movimento, e este próprio movimento também é sujeito à análise. Nestes termos ele reconhece a singularidade de cada objeto e a necessidade de alcançar as leis próprias que dirigem esse mesmo objeto.
 (3) Marxismo: fundamento da crítica social
 	A proposta metodológica de Marx que sustenta sua crítica ao capitalismo veio de encontro aos interesses das classes trabalhadoras e orientou e inspirou movimentos que se transformaram em revoluções contra “o capital”, mais especialmente contra a dominação das elites, a opressão dos trabalhadores, a desqualificação do trabalhador como produtor de riqueza. 
A sustentação da desigualdade e da opressão não se mostrava, como Marx indicou, apenas na força. Esta sustentação também estava/está entranhada nas ideias, nas crenças e nas nossas representações. Para entender este processo de dominação e controle, o marxismo vai incluir entre suas categorias de análise o conceito de ideologia, oferecendo um sentido bastante singular a uma concepção que também tinha história.
Texto: Sílvia Lane e o projeto do compromisso social da Psicologia
RESUMO: A Profa. Sílvia Lane foi pioneira nas formulações teóricas que colocaram a Psicologia Social brasileira em questão, ressaltando a necessidade de se explicitar seu vínculo com interesses dominantes e de se redirecionar sua produção no sentido de contribuir para a transformação social. Nessa trajetória aliou teoria e prática, contribuindo para a revisão de conceitos e métodos e para a organização da área. Trabalhou incansavelmente e em várias frentes para produzir uma Psicologia Social que reconhecesse o caráter histórico dos fenômenos sociais e humanos e a pessoa como sujeito ativo e histórico. Teve importante papel na afirmação de uma psicologia comprometida com as realidades brasileira e latino-americana; conhecedora dessa realidade, contribuiu para a construção de instrumental teórico-prático para sua transformação na direção de uma sociedade justa e igualitária. Ou seja, uma psicologia com compromisso social.
O trabalho da professora Sílvia Lane, sempre aliado ao de outras pessoas, produziu novos caminhos para a Psicologia. Sua produção teórica permitiu a construção de novas perspectivas no campo da Psicologia Social, sendo responsável pelo desenvolvimento da perspectiva sócio-histórica na Psicologia Social no Brasil. Suas ideias sobre a prática permitiram a construção da Psicologia Social Comunitária. Seu empenho na América Latina criou intercâmbios e trocas, fortalecendo o diálogo no campo da Psicologia entre profissionais deste continente. Seus princípios permitiram apoio na construção de um novo projeto de Psicologia.
Sílvia Lane foi guiada pelo princípio de que o conhecimento produzido deveria sempre ser útil para a transformação da realidade na direção da criação de condições dignas de vida para todos. O conhecimento e a profissão deveriam estar a serviço da transformação e, com estas ideias, Sílvia Lane contribuiu para uma revolução na Psicologia. Com o rompimento com a tradição elitista da Psicologia, com a preocupação com a construção de um novo projeto para a ciência e para a profissão, com a adesão a uma nova concepção de homem para a Psicologia e com o esforço para aproximar a América Latina, Sílvia Lane apontou as exigências e condições para um novo projeto para a Psicologia. 
Entendia que o conhecimento da psicologia deveria levar à compreensão dos mecanismos que provocam a alienação e contribuir para ampliar a consciência dos homens. Sua teoria sobre o psiquismo teve essa direção.
A obra teórica de Sílvia Lane pode ser lida de várias formas, com diversos recortes. Mas, são fundamentalmente dois aspectos de grande complexidade os que estão na sua base e apontam para essa perspectiva de compreensão do homem: a relação subjetividade e objetividade; e a formação e o papel dos valores. A forma como tratou esses aspectos complexos revela outra marca da produção de Silva Lane: simplicidade de proposições, calcada em pesquisa rigorosa.
A Profa. Sílvia Lane traduziu nessas duas questões a preocupação em investigar e compreender como o indivíduo está implicado com a sua sociedade, como se coloca nela, o que permite ou impede que ele compreenda as determinações sociais e como pode agir sobre elas.
Considerava que a psicologia social cognitivista era uma psicologia que não atentava, realmente, para as questões sociais, já que elas eram apenas “pano de fundo” para os acontecimentos do mundo psíquico.
A Psicologia Social no Brasil era um ‘zero à esquerda’, não interferia em nada, não ajudava em nada, quer dizer, era um saber que estava lá, que partia das teorias americanas para explicar a realidade brasileira. Era preciso compreender como o latino-americano singulariza o universal na constituição particular de sua existência. (Lane, 2000).
A nova perspectiva em Psicologia Social deveria começar explicitando uma nova concepção de homem na psicologia: um homem social e histórico. E, para compreender esse homem e como as determinações históricas estão em relação com ele, seria necessário um outro método. O materialismo histórico e dialético será o método que ela vai adotar e desenvolver na psicologia social.
Sem dúvida, o marxismo, como postura epistemológica, estava na minha cabeça, como proposta para superar a ideologização da nossa ciência. E foi um desafio encontrar um eixo marxista para desenvolver uma nova psicologia social. 
Portanto, juntava-se, aos ingredientes já comentados, o marxismo. Esta perspectiva, como ela mesma disse, epistemológica, vai contribuir para a superação do positivismo na forma de fazer ciência, para a elaboração de novos métodos de pesquisa e para a afirmação do homem como sujeito histórico.
A partir do materialismo histórico e dialético, Lane produziu, então, uma nova psicologia social, cujo objeto, em vez de “relações interpessoais e influências sociais”, como propunha a psicologia social tradicional, seria o homem como ser histórico, a dialética entre indivíduo e sociedade, o movimento de transformação da realidade. O objetivo era compreender o indivíduo em relação dialética com a sociedade; a constituição histórica e social do indivíduoe os elementos que explicam os processos de consciência e alienação; e as possibilidades de ação do indivíduo frente às determinações sociais.
O método materialista histórico e dialético tem recursos para se compreender o homem dentro da totalidade histórica, a partir das categorias da dialética (totalidade, contradição, empírico-abstrato-concreto, mediação). Além disso, esse método considera que sujeito e objeto estão em relação dialética, portanto não há neutralidade no conhecimento, há sempre uma intenção do sujeito sobre o objeto. Essa intenção é histórica e deve ser considerada.
Em outras palavras, o materialismo histórico e dialético permite trabalhar com a historicidade dos fenômenos e, por isso, contrapõe-se à sua naturalização. Boa parte da obra de Sílvia Lane foi para desenvolver uma compreensão do psiquismo fundamentada nesses pressupostos.
E, de maneira coerente, tais formulações foram produzidas a partir de pesquisas realizadas com métodos adequados à compreensão da realidade como contraditória, em processo de transformação constante e do conhecimento como práxis.
Dentre as novas metodologias destacou-se a pesquisa-ação participante. A concepção de pesquisa participante anulava toda discussão sobre a neutralidade da ciência e do pesquisador. Tratava-se, então, de discutir o compromisso social do pesquisador.
Ela foi protagonista em vários eventos, dentre eles debates com Aroldo Rodrigues, o representante no Brasil da psicologia social cognitivista. Nos debates, Aroldo Rodrigues afirmava que aquilo que Sílvia Lane fazia não era ciência, era política. Segundo ele “. . . a Psicologia Social é uma ciência básica e neutra, a ela cabe descobrir as relações estáveis entre variáveis psicossociais a fim de possibilitar ao tecnólogo social a solução dos problemas sociais de forma consciente e não improvisada”. 
Em suas respostas, Sílvia Lane afirmava que: “. . . o fundamental neste momento é a psicologia rever sua prática, pois teoria e prática têm que vir juntas. Não se pode dividir a psicologia social em ciência aplicada e pura”.
Sílvia Lane parecia sempre saber para onde caminhar e para onde levar a Psicologia Social, mas todosaqueles que com ela conviveram sabem que ela “inventou junto”, ou seja, prezou sempre os espaços de criação coletiva. Por isto, houvesse mais espaço para traçarmos todas as linhas do desenvolvimento da Psicologia Social no Brasil, a partir de Sílvia, os traços alcançariam a todos que hoje se encontram no campo de uma Psicologia Social comprometida e crítica.
Uma Psicologia Social Sócio-Histórica
A Psicologia Social que veio a ser denominada sócio-histórica surgiu nesse processo de revisão e crítica com vistas à produção de um conhecimento comprometido com a transformação social. Como vimos, foram diversos os atores desse processo, que resultou em um conjunto de elaborações teóricas afinadas com a idéia da desnaturalização dos fenômenos sociais.
Entretanto, vimos também que Sílvia Lane se destacou nesse processo e conduziu um conjunto de pesquisas e elaborações conceituais que são identificadas como psicologia social sócio-histórica.
Seus fundamentos epistemológicos, metodológicos e ontológicos já foram mencionados. Decorrem do materialismo histórico e dialético e permitem abordar os fenômenos sociais e psicológicos na sua historicidade. Também mencionamos anteriormente um recorte da obrateórica de Sílvia Lane, que nos permite perceber a coerente articulação entre suas proposições teóricas e práticas por meio da compreensão de duas importantes questões: a dialética subjetividade-objetividade; e a formação e mudança de valores.
A partir desses fundamentos, então, Sílvia Lane desenvolveu a concepção de uma subjetividade em processo dialético, numa dialética subjetividade-objetividade. Teve acesso à obra dos soviéticos Luria, Leontiev e Vigotski e, a partir deles, desenvolveu o estudo das categorias do psiquismo: atividade, consciência e identidade. Articulou seus estudos sobre linguagem e processo grupal à compreensão das categorias como processos constituídos por mediações. Trabalhou também, nessa perspectiva, com a teoria das representações sociais de Moscovici. (...)
Nesta síntese, toda a riqueza das formulações teóricas de Sílvia Lane pode ser percebida. Estão aí colocadas as suas principais contribuições: devemos compreender o psiquismo como processo constante, um processo constituído na vida concreta, por meio das ações, vivências, experiências do indivíduo e por meio de suas relações. Processo contraditório, revelador da dinâmica entre a totalidade social e a particularidade das situações individuais, entre o universal e o singular das experiências humanas. E processo protagonizado por sujeitos históricos, que, por serem sujeitos trazem emoção, reflexão, ação, movimento.
Em relação à linguagem, Sílvia Lane sempre apontou a necessidade de se considerar os aspectos ideológicos presentes na construção de significados. Dessa maneira, pôde desenvolver a compreensão da linguagem como mediação no processo de consciência fazendo clara referência ao lugar social ocupado pelo indivíduo e às determinações históricas a que está sujeito. Ao mesmo tempo, considerar o indivíduo também como produtor de sentidos recoloca-o em posição ativa, mesmo que de maneira contraditória. 
A linguagem, produção ao mesmo tempo social e individual é expressão da síntese e do movimento entre sujeito e realidade. Significado e sentido, como unidade de contrários, ao mesmo tempo revelam e possibilitam e concretizam a dialética subjetividade-objetividade. 
Exatamente por trazer a questão dos valores e sua constituição na dialética subjetividade-objetividade, sem perder de vista a inserção histórica do indivíduo é que Sílvia Lane realizou uma psicologia social que desvendou a unidade contraditória entre indivíduo e sociedade. A psicologia social sócio-histórica coloca-se como uma psicologia que não aceita o que constata, mas uma psicologia social que se posiciona, porque o reconhecimento da historicidade dos fenômenos que estuda assim o permite.
Um pensar ético, um compromisso ético que alia o conhecimento com a ação. A proposta, o desafio de pesquisar para poder interferir, atuar para que os homens sejam sujeitos, não sejam robôs. Para que os homens se envolvam, não sejam indiferentes. O referencial da psicologia social sócio-histórica, ao apontar a historicidade constitutiva dos fenômenos, ao apontar sua gênese contraditória permite apontar ações de superação, permite usar o conhecimento de forma posicionada.
Uma Psicologia Atenta ao Contexto Social ou “Toda a Psicologia é Social”
Cabe destacar, ainda, a questão do “social” que caracteriza e nomeia a Psicologia de Sílvia Lane. A noção teórica que nos faz colocar o epíteto de social na psicologia merece atenção de todos nós, pois ele não tem o mesmo sentido em todos os lugares onde aparece.
É fácil que ocorra nas áreas de conhecimento a aceitação de nomenclaturas que refletem mais a acomodação dos interesses de seus construtores do que a clareza na delimitação de suas possibilidades e obrigações. Tal é o caso, por exemplo, da Psicologia Social estadunidense que, a despeito de contar uma enorme produção de artigos e livros, ainda na década de setenta tinha vários autores que afirmavam ser prejudicial tentar qualquer definição de seu escopo porque isso tiraria a liberdade das pessoas que estavam engajadas na sua construção. Isto é, para essas pessoas a indefinição era a forma de manter aquela Psicologia Social.
O psicólogo social não seria somente aquele que trabalharia com problemas ou situações de caráter social ou grupal. Um psicólogo clínico (em atendimento individual, em consultório particular), seria também um psicólogo social. Para isso, bastaria que ele procedesse em seu trabalho ao exercício de contextualização do seu cliente no seu momento social e histórico.
A atenção ao contexto do fazer humano foi uma forma de inserir no campo de visão da Psicologia aquilo que nos anos setenta era chamado de “realidade brasileira”.Diante do reconhecimento de que a Psicologia se desenvolvera quase sempre sem atentar para as necessidades, virtudes e problemas vividos pela maioria da população brasileira, o contexto a que se deveria dar atenção era o contexto econômico, histórico e social onde viviam os brasileiros.
Neste sentido é que a expressão “toda a psicologia é social” ganha uma possibilidade de compreensão fértil para o projeto de construção de uma psicologia social efetivamente adequada aos povos brasileiro e latino-americano.
Uma Psicologia com Compromisso Social: Uma Herança de Sílvia Lane
Sílvia Lane tem sua produção e seu exercício, como professora, marcados pela certeza de que a Psicologia deveria se produzir de forma a ser útil para a transformação da realidade social em nossos países de Terceiro Mundo. Perseguiu isto como uma obsessão e sem descuidar de dar-lhe forma acadêmica e rigor científico. Buscou métodos, instrumentos, conceitos e teorias que pudessem dar conta disto. 
Deixou para a Psicologia uma obra importante nesta direção. Mas, mais do que isto, ela deixou um conjunto de psicólogos e pesquisadores, em sua maioria identificados com a ABRAPSO, que buscam de vários lugares teóricos produzir uma nova Psicologia: uma psicologia com compromisso social com a realidade brasileira e da América Latina. Isto nos permite afirmar que Sílvia Lane mudou os rumos da Psicologia no Brasil e permitiu a construção de um novo projeto para a ciência e para a profissão.
COMENTÁRIOS
	- construir uma psicologia voltada para uma realidade brasileira e sulamericana.
- a psicologia deveria levar à compreensão dos mecanismos que levaram à (...) ideologia => se não houver uma transformação da realidade a psicologia não terá cumprido seu objetivo; ela tem que vir com o plano da ação (pensar/falar/agir).
- homem ativo, participante do contexto social. Minhas ações não impactam só a minha vida, mas envolve outras pessoas.
- 4ª exigência: esforço para aproximar a América latina 
* Trabalho Coletivo
* Consciência crítica
* Atenção permanente e comprometida com as necessidades urgentes da população
Para trabalhar com psicologia social => tem que conhecer de políticas públicas.
Para outros autores, ideologia pode ser um conjunto de ideias; etc (outros conceitos).
MÓDULO 2
(1) Ideologia: histórico
O termo ideologia aparece com importância para a Filosofia e as Ciências Sociais há pouco mais de um século, mas sua história pode ser rastreada nas culturas grega e romana. Seu sentido mais corrente é o que trata daquilo que afasta os homens e as sociedades da “realidade”, mais especificamente dos determinantes que nos fazem compreender esta realidade. 
Esta concepção ainda “bruta” vai precisar ser lapidada e transformada em campos como o da filosofia, da sociologia, da política e mesmo da psicologia, por autores que se propuseram a enfrentar as dificuldades de dar suporte teórico a um conceito que articula a materialidade da vida à sua dimensão “imaterial”, ao campo do conhecimento e das ideias.
 De acordo com Chaui (1997), é possível falar de ideologia utilizando uma conceituação fraca e uma outra que poderia ser nomeada como forte. Neste sentido fraco, ideologia diz respeito ao conjunto de ideias que utilizamos nós mesmos, nossos grupos e sociedades, e que irá configurar nossa visão do mundo (ou cosmovisão). Seu valor está no ser o estofo do pensamento e do comportamento humanos construídos através das relações entre os homens e transmitido através das gerações pela cultura e suas instituições, isto é, pela linguagem, pela arte, pelas produções artísticas, científicas, religiosas, na escola, no trabalho, no dia a dia.
(2) Ideologia: definições
 	A definição forte de ideologia está diretamente associada à crítica construída na perspectiva marxista e que a apresenta como possuindo um sentido necessariamente negativo. Neste caso, a ideologia é como uma falsa consciência produzida e sustentada pela classe dominante e que se presta a encobrir os determinantes da dominação exercida por esta classe. Como efeito da ideologia estará o caráter natural da dominação, associada não a condições histórico-sociais, mas a circunstâncias que podem ser buscadas em princípios que são entendidos como universais e imutáveis.
De acordo com Guareschi (1992), a ideologia constitui-se como prática discursiva e material. Isto é, ela se estabelece no campo das ideias, nos discursos, nas conversas. A ideologia também se faz nas práticas cotidianas, na repetição dos papéis sociais, na educação escolar, nas práticas familiares e sociais. Numa sociedade marcada pela extraordinária presença dos meios de comunicação, ela é transmitida não apenas pelas revistas, jornais, TV, mas também e intensamente pela internet, pelas redes sociais nas quais vivemos mergulhados no cotidiano. Nestes casos, a ideologia é literalmente apreendida e assim legitimada. 
Este processo que pode ser reconhecido como brutal e violento, desde que implica a imposição de ideias, valores e comportamentos (o hoje) assim como de possibilidades (o futuro), também tem grandes sutilezas. Sua instituição se faz de tal forma, que os indivíduos não se dão conta deste seu aspecto construído e tutorado, tomando como sendo “natural” o que foi produzido circunstancialmente, apoiado por interesses de classe, mas de tal forma a ocultar estes interesses e a contradição na qual estão apoiados. Como resultado deste processo, a crítica à ideologia é tarefa imensamente complexa que muitas vezes tem se mostrado ineficaz. Embora necessária, a mera apresentação da contradição não desfaz o “feitiço” ideológico.
(3) Ideologia: exemplos
 	A ideologia dominante explica como “natural”, por exemplo, a supremacia de determinados grupos, a incompetência de um determinado grupo étnico, enfim, as diferenças que justificam a exclusão de indivíduos e grupos do poder de conduzir e controlar, seus corpos, sua riqueza e suas vidas. Neste caso, a ideologia sustenta a desigualdade e pretende calar aqueles que se veem fora do jogo da sociedade. Ela sustenta como responsabilidade do indivíduo aquilo sobre o que ele não pode responder e que se encontra em outra instância, fora de seu controle.
Um exemplo: na escola pública, não é incomum ouvir-se que determinada criança tem problemas, que ela é incapaz de aprender, que é preguiçosa. Se há alguma concessão, é na transferência da responsabilidade do insucesso para a família, normalmente caracterizada como “desestruturada”. Ora, não entra neste jogo, na compreensão deste acontecimento que é a “inadequação da criança” o outro lado da moeda, confortavelmente escondido pelo viés ideológico. Isto é, que se trata aqui, de fato, da “inadequação da escola”. 
Este outro lado pode ser verificado, não muito longe, no contexto das políticas públicas de educação, das tremendas dificuldades enfrentadas por esta instituição, do entendimento governamental que tira a educação do lugar privilegiado para a construção da autonomia e da cidadania.
Texto: Livro: O que é ideologia; Marilena Chauí
Sistematizando o pensamento filosófico grego, Aristóteles elaborou algo que, a partir da filosofia medieval, ficou sendo conhecido como a teoria das quatro causas.
Como se sabe, uma das maiores preocupações dos filósofos gregos era a explicação do movimento. Por movimento, os gregos entendiam: (1) toda mudança qualitativa de um corpo qualquer (por exemplo, uma semente que se toma árvore, um objeto branco que amarelece, um animal que adoece, etc.); (2) toda mudança quantitativa de um corpo qualquer (por exemplo, um corpo que aumente de volume ou diminua, um corpo que se divida em outros menores, etc,); (3) toda mudança de lugar ou locomoção de um corpo qualquer (por exemplo, a trajetória de uma flecha, levitar de uma pluma, etc.); (4) toda geração e corrupção dos corpos, isto é, o nascimento e perecimento das coisas e dos homens. Movimento, portanto significa para um grego toda e qualquer alteração de uma realidade, seja ela qual for.
A teoria aristotélica das quatro causas, tal como foi recolhidae conservada pelos pensadores medievais, é uma das explicações encontradas pelo filósofo para dar conta do problema do movimento. Haveria, então, uma causa material (a matéria de que um corpo é constituído, como, por exemplo, a madeira, que seria a causa material da mesa), a causa formal (a forma que a matéria possui para constituir um corpo determinado, como, por exemplo, a forma da mesa que seria a causa formal da madeira), a causa motriz ou eficiente (a ação ou operação que faz com que uma matéria passe a ter uma determinada forma, como, por exemplo, quando o marceneiro fabrica a mesa) e, por último, a causa final (o motivo ou a razão pela qual uma determinada matéria passou a ter uma determinada forma, como, por exemplo, a mesa feita para servir como altar em um templo). Assim, as diferentes relações entre as quatro causas explicam tudo que existe, o modo como existe e se altera, e o fim ou motivo para o qual existe.
Um aspecto fundamental dessa teoria da causalidade consiste no fato de que as quatro causas não possuem o mesmo valor, isto é, são concebidas como hierarquizadas indo da causa mais inferior à causa superior. Nessa hierarquia, a causa menos valiosa ou menos importante é a causa eficiente (a operação de fazer a causa material receber a causa formal, ou seja, o fabricar natural ou humano) e a causa mais valiosa ou mais importante é a causa final (o motivo ou finalidade da existência de alguma coisa).
Sabemos que a sociedade grega é escravagista e que a sociedade medieval se baseia na servidão, isto é, são sociedades que distinguem radicalmente os homens em superiores – os homens livres, que são cidadãos, na Grécia, e senhores feudais, na Europa medieval – e inferiores – os escravos, na Grécia, e os servos da gleba, na Idade Média. Mas, o que teria a concepção da causalidade a ver com tal divisão social? Muita coisa.
Se tomarmos o cidadão ou o senhor e indagarmos a qual das causas ele corresponde, veremos que corresponde à causa final, isto é, o fim ou motivo pelo qual alguma coisa existe é o usuário dessa coisa, aquele que ordenou sua fabricação (por isso, na teologia cristã, Deus é considerado a causa final do universo, que existe “para Sua maior glória e honra”). 
Como foi possível passar da desqualificação do trabalho (na teoria das quatro causas) à sua nova valorização? Ora, estamos agora diante de uma sociedade que eliminou a escravidão e a servidão, uma sociedade onde começa a dominar um tipo de homem que se valoriza a si mesmo não por seu sangue ou família (como é o caso do senhor feudal que vale por sua linhagem), mas por ter adquirido poder econômico e começar a adquirir poder político e prestígio social como recompensa de seu esforço pessoal, de sua capacidade de trabalho e de poupança. Estamos agora diante do burguês.
No entanto, a nova sociedade, que valoriza o trabalho como unidade do corpo (natureza) e do espírito (vontade livre), não é constituída apenas pelo burguês, mas ainda por outro homem livre. Vejamos o perfil desse outro personagem, tal como Marx o apresenta no capítulo “O segredo da acumulação primitiva”, no Capital. Trata-se do moderno trabalhador livre: “Trabalhadores livres num duplo sentido, pois já não aparecem diretamente como meios de produção, como o eram o escravo e o servo, e também já não possuem seus próprios meios de produção, como o lavrador que trabalha sua própria terra; livres e donos de si mesmos (...)
Portanto, o processo que engendra o capitalismo só pode ser um: o processo de separação entre o trabalhador e a propriedade das condições de seu trabalho, processo que, por um lado, converte em capital os meios sociais de vida e de produção, enquanto, por outro lado converte os produtores diretos em assalariados.
Vemos, novamente, como ideias que parecem resultar do puro esforço intelectual, de uma elaboração teórica objetiva e neutra, de puros conceitos nascidos da observação científica e da especulação metafísica, sem qualquer laço de dependência com as condições sociais e históricas, são, na verdade, expressões dessas condições reais, porém de modo invertido e dissimulado. Com tais ideias pretende-se explicar a realidade, sem se perceber que são elas que precisam ser explicadas pela realidade.
“O real não é constituído por coisas. Nossa experiência direta e imediata da realidade nos leva a imaginar que o real é feito de coisas (sejam elas naturais ou humanas), isto é, de objetos físicos, psíquicos, culturais oferecidos à nossa percepção e às nossas vivências.
Assim, por exemplo, costumamos dizer que uma montanha é real porque é uma coisa. No entanto, o simples fato de que essa “coisa” possua um nome, que a chamemos “montanha”, indica que ela é, pelo menos, uma “coisa-para-nós”, isto é, algo que possui um sentido em nossa experiência. 
O que dissemos sobre a montanha, podemos também dizer a respeito de todos os entes reais. São formas de nossas relações com a natureza mediadas por nossas relações sociais, são seres culturais, campos de significação variados no tempo e no espaço, dependentes de nossa sociedade, de nossa classe social, de nossa posição na divisão social do trabalho, dos investimentos simbólicos que cada cultura imprime a si mesma através das coisas e dos homens. Isto, porém, não implica em afirmar o oposto, isto é, se o real não é constituído de coisas, então será constituído por ideias ou por nossas representações das coisas. Se fizéssemos tal afirmação, estaríamos na ideologia em estado puro, pois para esta última a realidade é constituída por ideias, das quais as coisas seriam uma espécie de receptáculo ou de encarnação provisória.
O empirismo (experiência dos sentidos) considera que o real são fatos ou coisas observáveis e que o conhecimento da realidade se reduz à experiência sensorial que ternos dos objetos cujas sensações se associam e formam ideias em nosso cérebro. O idealista, por sua vez, considera que o real são ideias ou representações e que o conhecimento da realidade se reduz ao exame dos dados e das operações de nossa consciência ou do intelecto como atividade produtora de ideias que dão sentido ao real e o fazem existir para nós.
Tanto num caso como no outro, a realidade é considerada como um puro dado imediato: um dado dos sentidos, para o empirista, ou um dado da consciência, para o idealista. Ora, o real não é um dado sensível nem um dado intelectual, mas é um processo, um movimento temporal de constituição dos seres e de suas significações, e esse processo depende fundamentalmente do modo como os homens se relacionam entre si e com a natureza. Essas relações entre os homens e deles com a natureza constituem as relações sociais como algo produzido pelos próprios homens, ainda que estes não tenham consciência de serem seus únicos autores.
E, portanto, das relações sociais que precisamos partir para compreender o que, como e por que os homens agem e pensam de maneiras determinadas, sendo capazes de atribuir sentido a tais relações, de conservá-las ou de transformá-las. Porém, novamente, não se trata de tomar essas relações como um dado ou como um fato observável, pois neste caso estaríamos em plena ideologia.
Nossa tarefa será, pois, a de compreender por que a ideologia é possível: qual sua origem, quais seus fins, quais seus mecanismos e quais seus efeitos históricos, isto é, sociais, econômicos, políticos e culturais.
O lema positivista por excelência é: “saber para prever, prever para prover”. Em outras palavras, o conhecimento teórico tem como finalidade a previsão científica dos acontecimentos para fornecer à prática um conjunto de regras e de normas, graças às quais a ação possa dominar, manipular e controlar a realidade natural e social. 
Essa concepção da prática como aplicação de ideias que a comandam de fora leva à suposição de uma harmonia entre teoria e ação. Assim sendo, quando as ações humanas – individuais e sociais – contradisserem as ideias, serão tidas como desordem, caos, anormalidade e perigo para a sociedade global, pois o grande lema do positivismo é: “Ordem e Progresso”.Só há “progresso”, diz Comte, onde houver “ordem”, e só há “ordem” onde a prática estiver subordinada à teoria, isto é, ao conhecimento científico da realidade.
O grande princípio metodológico que permite tratar o fato social como coisa e liberar o cientista da ideologia é: “Tomar sempre para objeto da investigação um grupo de fenômenos previamente isolados e definidos por características exteriores que lhe sejam comuns e incluir na mesma investigação todos os que correspondem a essa definição”. Assim, o fato social, convertido em coisa científica, nada mais é do que um dado, previamente isolado, classificado e relacionado com outros por meio da semelhança ou constância das características externas. Esse objeto imóvel, dado, acabado, é conhecido quando classificado, comparado e submetido a leis de frequência e de constância.
A CONCEPÇÃO MARXISTA DE IDEOLOGIA
Embora Marx tenha escrito sobre a “ideologia em geral”, o texto onde realiza a caracterização da ideologia tem por título: A Ideologia Alemã. Isto significa que a análise de Marx tem como objeto privilegiado um pensamento historicamente determinado, qual seja, os dos pensadores alemães posteriores a Hegel.
Essa observação é importante por dois motivos. Em primeiro lugar, porque Marx não separa a produção das ideias e as condições sociais e históricas nas quais são produzidas (tal separação, aliás, é o que caracteriza a ideologia). Em segundo lugar, porque para entendermos as críticas de Marx precisamos ter presente o tipo de pensamento determinado que ele examina e que, no caso, pressupõe a filosofia de Hegel. Assim, embora Marx coloque na categoria de ideólogos os pensadores franceses e ingleses, procuram distinguir o tipo de ideologia que produzem: entre os franceses, a ideologia é, sobretudo política e jurídica, entre os ingleses é, sobretudo econômica. Os ideólogos alemães são, antes de tudo, filósofos. Se, portanto, podemos falar em ideologia em geral e na ideologia burguesa em geral, no entanto, as formas ou modalidades dessa ideologia encontram-se determinadas pelas condições sociais particulares em que se encontram os diferentes pensadores burgueses.
Sabemos que Marx dirige duas críticas principais aos ideólogos alemães. A primeira é a de que esses filósofos tiveram a pretensão de demolir o sistema hegeliano imaginando que bastaria criticar apenas um aspecto da filosofia de Hegel, em lugar de abarcá-la como um todo. Com isto, os chamados críticos hegelianos apenas substituíram a dialética hegeliana por uma fraseologia sem sentido e sem consistência. A segunda crítica é a de que cada um desses ideólogos tomou um aspecto da realidade humana, converteu esse aspecto numa ideia universal e passou a deduzir todo o real desse aspecto idealizado. 
No restante da Europa, escreve Marx, ocorrem verdadeiras revoluções, mas na Alemanha a única revolução que parece ocorrer é a do pensamento, “uma revolução frente à qual a Revolução Francesa não foi senão um brinquedo de crianças”. Marx afirma que para compreendermos a pequeneza e limitação mesquinha da ideologia alemã é preciso sair da Alemanha, ou seja, fazer algumas considerações gerais sobre o fenômeno da ideologia. 
De maneira esquemática (e, portanto, muito grosseira), podemos caracterizar a obra hegeliana como: 1) um trabalho filosófico para compreender a origem e o sentido da realidade como Cultura. A Cultura são as relações dos homens com a Natureza pelo desejo, pelo trabalho e pela linguagem, as instituições sociais, o Estado, a religião, a arte, a ciência, a filosofia. É o real enquanto manifestação do Espírito. Não se trata, segundo Hegel, de dizer que o Espírito produz a Cultura, mas sim de que ele é a Cultura, pois ele existe encarnado nela; 2) um trabalho filosófico que define o real pela Cultura e esta pelo movimento de exteriorização e de interiorização do Espírito. Ou seja, o Espírito se manifesta nas obras que produz (é isto sua exteriorização) e quando sabe ou reconhece que é o produtor delas, interioriza (compreende) essas obras porque sabe que elas são ele próprio. Por isso o real é histórico. Ele não tem história, nem está na história, mas é história; 3) um trabalho filosófico que revoluciona o conceito de história por três motivos: – em primeiro lugar, porque não pensa a história como uma sucessão contínua de fatos no tempo, pois o tempo não é uma sucessão de instantes (antes, agora, depois; passado, presente, futuro), nem é um recipiente vazio onde se alojariam os acontecimentos, mas é um movimento dotado de força interna, criador dos acontecimentos. Os acontecimentos não estão no tempo, mas são o tempo; – em segundo lugar, porque não pensa a história como uma sucessão de causas e de efeitos, mas como um processo dotado de uma força ou de motor interno que produz os acontecimentos. Esse motor interno é a contradição. 
Esses vários aspectos do pensamento hegeliano (aqui grosseiramente resumidos) constituem a dialética, ou seja, a história como processo temporal movido internamente pelas divisões ou negações (contradição) e cujo Sujeito é o Espírito como reflexão. Essa dialética é idealista porque seu sujeito é o Espírito, e seu objeto também é o Espírito. Em última instância, portanto, a história é o movimento de posição, negação e conservação das ideias – unidade do sujeito e do objeto da história, que é Espírito.
Na Contribuição à Crítica da Economia Política e n'O Capital, Marx afirma que o método histórico-dialético deve partir do que é mais abstrato ou mais simples ou mais imediato (o que se oferece à observação), percorrer o processo contraditório de sua constituição real e atingir o concreto como um sistema de mediações e de relações cada vez mais complexas e que nunca estão dadas à observação. Trata-se sempre de começar pelo aparecer social e chegar, pelas mediações reais, ao ser social. 
A dialética é materialista porque seu motor não é o trabalho do Espírito, mas o trabalho material propriamente dito: o trabalho como relação dos homens com a Natureza, para negar as coisas naturais enquanto naturais, transformando-as em coisas humanizadas ou culturais, produtos do trabalho. Mas o que interessa realmente à dialética materialista não é a simples relação dos homens com a Natureza através (pela mediação) do trabalho. O que interessa é a divisão social do trabalho e, portanto, a relação entre os próprios homens através do trabalho dividido. Essa divisão começa no trabalho sexual de procriação, prossegue na divisão de tarefas no interior da família, continua como divisão entre pastoreio e agricultura e entre estes e o comércio, caminha separando proprietários das condições do trabalho e trabalhadores avançam como separação entre cidade e campo e entre trabalho manual e trabalho intelectual. 
O motor da dialética materialista é a forma determinada das condições de trabalho, isto é, das condições de produção e reprodução da existência social dos homens, forma que é sempre determinada por uma contradição interna, isto é, pela luta de classes ou pelo antagonismo entre proprietários das condições de trabalho e não proprietários (servos, escravos, trabalhadores assalariados). Enfim, da concepção hegeliana Marx também conserva o conceito de alienação, tendo como referência às análises de Feuerbach sobre a alienação religiosa. 
Nas considerações sobre “a ideologia em geral”, Marx e Engels determinam o momento de surgimento das ideologias no instante em que a divisão social do trabalho separa trabalho material ou manual e trabalho intelectual. Para compreendermos por que esta separação aparecerá como independência das ideias com relação ao real e, posteriormente, como privilégio destas sobre aquele, precisamos acompanhar em linhas gerais o processo da divisão social do trabalho, tal como Marx e Engels o expõem na Ideologia Alemã.
“A classe se autonomiza em face dos indivíduos, de sorte que estes últimos encontram suas condições de vida preestabelecidas e têm, assim, sua posição na vida e o seu desenvolvimento pessoal determinado pela classe. Tornam-se subsumidos a ela.Trata-se do mesmo fenômeno que o da subsunção dos indivíduos isolados à divisão do trabalho e tal fenômeno não pode ser suprimido se não se supera a propriedade privada e o próprio trabalho. Indicamos várias vezes que essa subsunção dos indivíduos à classe determina e se transforma, ao mesmo tempo, em sua subsunção a todo tipo de representações”.
Esta última frase de Marx e de Engels é fundamental para compreendermos a relação entre alienação e ideologia. 
A ideologia não é um processo subjetivo consciente, mas um fenômeno objetivo e subjetivo involuntário produzido pelas condições objetivas da existência social dos indivíduos. Ora, a partir do momento em que a relação do indivíduo com a sua classe é a da submissão a condições de vida e de trabalho pré-fixadas, essa submissão faz com que cada indivíduo não possa reconhecer-se como fazedor de sua própria classe. Ou seja, os indivíduos não podem perceber que a realidade da classe decorre da atividade de seus membros. Pelo contrário, a classe aparece como uma coisa em si e por si e da qual o indivíduo se converte numa parte, quer queira, quer não. E uma fatalidade do destino. A classe começa, então, a ser representada pelos indivíduos como algo natural (e não histórico), como um fato bruto que os domina, como uma “coisa” onde vivem. A ideologia burguesa, através de uma ciência chamada Sociologia, transforma em ideia científica ou em objeto científico essa “coisa” denominada “classe social”, estudando-a como um fato e não como resultado da ação dos homens.
A divisão social do trabalho, ao separar os homens em proprietários e não proprietários dão aos primeiros poder sobre os segundos. Estes são explorados economicamente e dominados politicamente. Estamos diante de classes sociais e da dominação de uma classe por outra. Ora, a classe que explora economicamente só poderá manter seus privilégios se dominar politicamente e, portanto, se dispuser de instrumentos para essa dominação. Esses instrumentos são dois: o Estado e a ideologia.
Cometemos um engano quando imaginamos ser possível substituir uma ideologia “falsa” (que não diz tudo) por uma ideologia “verdadeira” (que diz tudo). Ou quando imaginamos que a ideologia “falsa” é a dos dominantes, enquanto a ideologia “verdadeira” é a dos dominados. Por que nos enganamos nessas duas afirmações? Em primeiro lugar, porque uma ideologia que fosse plena ou que não tivesse “vazios” e “brancos”, isto é, que dissesse tudo, já não seria ideologia. Em segundo lugar, porque falar em ideologia dos dominados é um contra-senso, visto que a ideologia é um instrumento da dominação. Esses enganos nos fazem sair da concepção marxista de ideologia para cairmos na concepção positivista de ideologia.
O vencedor ou poderoso é transformado em único sujeito da história não só porque impediu que houvesse a história dos vencidos (ao serem derrotados, os vencidos perderam o “direito” à história), mas simplesmente porque sua ação histórica consiste em eliminar fisicamente os vencidos ou, então, se precisa do trabalho deles, elimina sua memória, fazendo com que se lembrem apenas dos feitos dos vencedores. Não é, assim, por exemplo, que os estudantes negros ficam sabendo que a Abolição foi um feito da Princesa Isabel? As lutas dos escravos estão sem registro e tudo que delas sabemos está registrado pelos senhores brancos. Não há direito à memória para o negro. Nem para o índio. Nem para os camponeses. Nem para os operários.
História dos “grandes homens”, dos “grandes feitos”, das “grandes descobertas”, dos “grandes progressos”, a ideologia nunca nos diz o que são esses “grandes”. Grandes em quê? Grandes por quê? Grandes em relação a quê? No entanto, o saber histórico nos dirá que esses “grandes”, agentes da história e do progresso, são os “grandes e poderosos”, isto é, os dominantes, cuja “grandeza” depende sempre da exploração e dominação dos “pequenos”, Aliás, a própria ideia de que os outros são os “pequenos” já é um pacto que fazemos com a ideologia dominante.
Graças a esse tipo de história, a ideologia burguesa pode manter sua hegemonia mesmo sobre os vencidos, pois estes interiorizam a suposição de que não são sujeitos da história, mas apenas seus pacientes. (final do livro).
COMENTÁRIOS
Aristóteles
O mundo prometido não é aqui na terra; há um corpo e um espírito; o espírito deve ser mais forte; para chegar ao paraíso após a morte, precisa controlar os instintos do corpo; valorizar o espírito e a mortificação do corpo.
Uns acreditam que as construções científicas dão conta de explicar a realidade. O materialismo dialético parte da realidade para construir a teoria.
Antes, o trabalho era coisa de escravos (menores). Passou a ser valorizado. Agora o trabalho dignifica (porque eu preciso de trabalhadores para que o sistema continue funcionando). Não se falava em subjetividade.
A “normalidade” é construída coletivamente.
Só é possível apreender a realidade a partir de um estudo sócio-histórico. A história não é linear, mas é contínua; tem contradições, mas não descontinuidade.
Ideologia => “ocultamento da realidade social”. (Marx).
“As teorias são produzidas de acordo com a realidade social”
“A realidade é um parâmetro de entendimento das questões teóricas, e não o contrário” (Ex: Freud precisa ser entendido na realidade de sua época, embora sua obra seja um marco e tenha validade em vários aspectos até hoje).
Conceito de ideologia não é aceito unilateralmente: há vários conceitos (como conceito positivo, negativo, prático, etc).
Vamos nos aprofundar sobre o tema sob o aspecto Marxista: propõe 3 reflexões sobre o conceito de ideologia:
(1) Ideias puras como autônomas, eficazes, sem ligação com a realidade. Como se explicasse uma realidade, sem estar conectada com a realidade que a produziu.
(2) Ideologia como sendo as ideias da classe dominante (que detém o meio de produção) (todas elas seriam ideológicas). Nem todos os autores concordam com essas ideias (entendem que elas se tornarão ideológicas na medida em que colocadas em prática).
(3) como um sistema de representações que servem para sustentar relações de dominação (a dominação é uma relação, e se dá quando uma determinada pessoa expropria (subtrai) ... assimétricas, fazendo com que determinado grupo de agentes ... independentemente da base sob a qual tal dominação é levada a efeito).
Zigmund Bauman => as relações são mais líquidas, influenciadas pela Internet, são mais fluidas (?).
MÉTODO => Materialismo Histórico Dialético.
Materialismo => trabalhamos sobre fatos reais (relações sociais), e não sobre ideias. Essas relações são quase palpáveis. Nelas conseguimos observar relações de dominação, de subjugação, de uso, etc.. As pessoas se mostram nas relações. A interpretação é fundada nas relações (reais) entre os homens (materialismo).
Histórico => Cultura historicamente construída (origem e manutenção de certos padrões). Mostra o que fica, muitas vezes, encoberto. Como os padrões são mantidos e transformados.
Dialético => É um movimento que inclui as contradições. No cerne de qualquer realidade existe a contradição dessa realidade, o que permite a mudança (que pode ser lenta). Mesmo numa realidade hegemônica, há espaço para a contradição (elas convivem, e podem gerar uma terceira realidade).
ALIENAÇÃO:
- Hegel => Quando o homem não consegue se reconhecer na obra de sua vida (não consegue fazer a síntese) (premissa/antítese/síntese).
- Marx => é aquele que não se dá conta de como, nas relações com os outros homens ele é dominado, subjugado, e ainda defende a classe que o explora.
MÓDULO 3
(1) A crise dos paradigmas da Psicologia Social: a história brasileira
Durante muito tempo, a psicologia social pode ser entendida como um espelho das atividades científicas que se desenvolviam na metrópole, entenda-se aqui os Estados Unidos. Seguindo este modelo colonial, nossa produção esteve longe de levar em conta a história e as realidades vividas pelos povos latino-americanos e acadêmicos e as universidades se dedicavam com mais ou menos sucesso em repetiras preocupações e os programas das universidades americanas, fazendo nossos os alvos produzidos em outros lugares (SANDOVAL, 2000).
O confronto com a Psicologia tradicional – ou colonial – vai conduzir a um olhar muito mais crítico e inconformado para a realidade brasileira e latino-americana, e uma posição científica que excluía definitivamente o decantado princípio da neutralidade científica e o enfrentamento de questões que passam a ser centrais na agenda da Psicologia Social, como as oposições inclusão-exclusão, igualdade-desigualdade e autonomia-dominação. A ação de descoberta preconizada pela ação científica neutra de inspiração positivista vai se opor a uma prática que busca a transformação e que ganha força como objetivo fundamental do psicólogo social.
 (2) A Emergência do Paradigma Latino-Americano: a realidade histórica e social dos países latino-americanos
 	Durante as décadas de 1970 e 1980, boa parte da América Latina se encontrava, do ponto de vista político, sob regimes de exceção. As ditaduras militares eliminaram direitos civis, suprimiram espaço de debate e a possibilidade de diferenças, eventualmente torturando e produzindo o que, para usar um eufemismo bastante repetido, se chamou de “desaparecidos”, isto é, indivíduos identificados como opositores e que foram mortos por estes regimes. Este movimento de opressão política também ocorreu sobre os meios acadêmicos e científicos (os intelectuais, via de regra, eram dos primeiros a serem perseguidos e exilados) e, sintomaticamente, abriu portas para a disseminação de conceitos e práticas identificados com o status quo, isto é, com o poder vigente.
No que diz respeito à Psicologia Social na América Latina, a oposição aos governos totalitários conduziu inúmeros psicólogos para o confronto, para o desafio dos modelos hegemônicos vigentes e para a proposta de novas formas de produzir conhecimento que pudessem, “subversivamente”, transformar a sociedade. É o caso da peruana Gladys Montecinos, das venezuelanas Maritza Monteiro e Maria Auxiliadora Banchs, do cubano Fernando González Rey e do espanhol radicado em El Salvador, Ignacio Martín-Baró.
Texto: História da Psicologia Social no Rio de Janeiro
RESUMO
A psicologia social de meados da década de 1960 e início da década de 1970 conheceu, segundo alguns autores, o que se denominou “crise”. Nas décadas seguintes, as discordâncias teóricas e metodológicas presentes neste campo evidenciaram não apenas posições antagônicas em relação a temas importantes no campo da psicologia social, como também deram visibilidade a alguns autores que representavam estas rivalidades. No Brasil e, mais especificamente no Rio de Janeiro, dois personagens importantes tiveram seus nomes e suas obras relacionados a estes antagonismos: Schneider e Rodrigues. Nosso objetivo será apresentar um relato da história destes importantes personagens da psicologia social no Rio de Janeiro.
Ao longo das décadas de 60, 70 e 80, dois importantes personagens influenciaram a Psicologia Social no Rio de Janeiro: Eliezer Schneider e Aroldo Rodrigues. O primeiro atuou no campo da institucionalização da psicologia, junto com outros professores como Antonio Gomes Penna e Franco Lo Presti Seminério. O segundo fez parte da primeira turma de psicologia da Pontifícia Universidade Católica (PUC) e foi o mais considerado representante da Psicologia Social norte-americana no Brasil. Em função das contribuições de ambos, tanto teóricas como na formação de pesquisadores no campo da Psicologia Social no Rio de Janeiro, apresentaremos algumas de suas posições sobre temas importantes no campo da psicologia social.
A partir de meados da década de 60 e início da década de 70, a Psicologia Social se depara com o que alguns autores denominaram “crise” no campo da Psicologia Social. Esta crise pode ser compreendida como um momento de reflexão sobre as bases teóricas e metodológicas da Psicologia Social cognitiva norte-americana. Tanto Schneider como Aroldo Rodrigues participaram ativamente deste processo de discussões.
A CONTRIBUIÇÃO DE ELIEZER SCHNEIDER
Destaca-se a importância dada à abordagem histórica e à influência da cultura. Discordando de toda uma tradição experimentalista na psicologia, sendo Spence um dos representantes citados, Schneider afirma que sua opção está longe daquela apresentada por Wundt, que distinguia a Psicologia Experimental Fisiológica da Psicologia dos Povos. Para Schneider, haveria uma Psicologia Social da Cultura e da História que, não sendo isolada do restante da psicologia, poderia fazer uso de seus conceitos básicos na busca da compreensão de processos micro e macrossociais. Schneider não reprovava a existência da psicologia experimental, mas considerava seus limites. 
Schneider se voltava, desde o início do seu ingresso na psicologia, para aproblemática humana e talvez esse interesse tenha sido decisivo na sua inclinação para o campo da Psicologia Social. Segundo Krüger (2001), essa predileção por tal área da psicologia teria ocorrido em função da sugestão, dada por um dos professores de Schneider, de que ele explorasse, no seu retorno ao Brasil, temas relativos à dinâmica de grupo. Apresentava uma preocupação com a necessidade de a Psicologia Social se voltar para temas que não serviriam apenas para a formulação de teorias generalistas, mas que pudessem contribuir para o entendimento do humano em sua diversidade histórica e cultural.
Embora Schneider tenha feito sua formação em psicologia nos Estados Unidos, isso não o impossibilitou de apresentar uma visão crítica sobre os caminhos que a psicologia tomou naquele país. Diferentemente de Aroldo Rodrigues, e talvez por pertencerem a gerações distintas, não buscou simplesmente, no seu retorno ao Brasil, reproduzir os conhecimentos da psicologia norte-americana.
É ainda importante destacarmos que Schneider estava atento às renovações no campo da Psicologia Social não apenas nos Estados Unidos, mas também na Europa. Schneider (1978) afirma que Moscovici e Argyle teriam contribuído com as obras Sociedade contra Natureza e A Interação Social para importantes reflexões no campo da Psicologia Social. Para Sá (2001), Schneider teve uma importante participação na discussão crítica do campo da Psicologia Social no Rio de Janeiro.
A compreensão de Schneider sobre a Psicologia Social era muito própria à história desse acadêmico que, ao longo de sua vida, apresentou um espírito aberto às contribuições das várias psicologias e aos conhecimentos oriundos de outras áreas. Para esse pesquisador brasileiro, a Psicologia Social deveria reunir o estudo dos processos micro e macrossociais com temas da cultura e da história. Segundo Krüger (2001), Schneider teria se aproximado do projeto de Lucien Febvre de integração das ciências sociais, entre elas a psicologia. No entanto, se esse ideal multidisciplinar estava presente em Schneider ele “reservava à psicologia uma posição epistemológica mais relevante” (KRUGER, 2001, p. 63).
Não encontramos em Schneider um interesse claro pelo tema da transformação social, o que seria característico de algumas psicologias sociais no Brasil a partir da década de 80. Não era certamente partidário dos ideais positivistas, mas buscou pensar o campo da Psicologia Social integrado à psicologia geral. Houve na sua análise da Psicologia Social no Brasil2 um entendimento da importância do psicólogo social para o desenvolvimento social do país.
Schneider não buscou estabelecer uma Psicologia Social que se afastasse completamente dos conceitos mais gerais da psicologia, diferentemente do que aconteceria com a Psicologia Social no Brasil a partir da década de 80. Desde então, muitos psicólogos passariam a trazer influências de outros campos, a partir das leituras de Marx, Foucault, Deleuze e Guattari e tantos outros interlocutores, o que levaria à constituição de diversas psicologias sociais com bases teóricas predominantemente não-psicológicas.
A INFLUÊNCIA DE AROLDO RODRIGUES
A Psicologia Social no Brasil, antes da denominada “crise da PsicologiaSocial”, apresentava uma forma predominantemente norte-americana. O grande representante dessa Psicologia Social no Brasil e no Rio de Janeiro, como afirmamos, foi Aroldo Rodrigues. Nesse período não havia maiores contestações de uma psicologia que tinha como grandes representantes pesquisadores que estavam do outro lado do Atlântico. Como afirmamos anteriormente, no Rio de Janeiro, Schneider talvez tenha sido uma das poucas vozes dissonantes.
Aroldo Rodrigues retornou ao Brasil no ano de 1966, com Ph.D. em psicologia, e retomou suas atividades como professor na PUC. 
O clima inamistoso identifi cado por Aroldo Rodrigues talvez já representasse os efeitos da “crise da Psicologia Social”, no Brasil. No entanto, o confronto com o modelo norte-americano se acirrou nas décadas de 70 e 80. Segundo Rodrigues (2008), os psicólogos no Brasil não se interessavam por metodologia nem por teoria, mas, quase exclusivamente, por política. Para Bomfim (2003), a “crise” no Brasil se refletiu em fóruns de discussão que buscavam repensar os impasses teóricos e metodológicos. Em outubro de 1970, realizou-se no Rio de Janeiro, o “Fórum de Psicologia Social”, promovido pela Associação Brasileira de Psicologia Aplicada. Entre os participantes desse evento, estavam: Antonio Gomes Penna, Aroldo Rodrigues, Ataliba Crespo, Arrigo Angelini, Célio Garcia e Eliezer Schneider. 
Em 1973, Aroldo Rodrigues foi eleito presidente da Associação Latino-Americana de Psicologia Social (ALAPSO). Tal fato ocorreu provavelmente em função do destaque que o professor carioca alcançara, não apenas no Rio de Janeiro, mas no restante do país e na América Latina. Essa mesma associação tinha algumas ramificações, como a Associação Chilena de Psicologia Social (ACHIPSO) e a Associação Venezuelana de Psicologia Social (AVEPSO). A AssociaçãoBrasileira de Psicologia Social (ABRAPSO) surgiria, em 1980, a partir de uma discordância com a ALAPSO, e tendo como principal personagem desse rompimento Silvia Lane. Nos anos que se seguiriam, a professora da PUC de São Paulo seria a principal personagem do confronto com o professor da PUC do Rio de Janeiro. Um dos temas em destaque nessa contraposição, além do modelo de homem e sociedade, girou em torno da neutralidade do pesquisador em Psicologia Social e do status de ciência deste campo da psicologia. Sobre essas diferenças, Rodrigues (1986, p. 43) afirma:
Um exemplo eloquente da divergência existente entre os psicólogos sociais sobre o que seja a Psicologia Social pode ser visto, aqui entre nós, ao compararmos os livros de Psicologia Social de minha autoria e o livro intitulado Psicologia Social editado por Silvia Lane e Wanderley Codo. Um leigo que pretendesse inteirar-se acerca do que seria este setor do conhecimento chamado de Psicologia Social e lesse esses livros, seguramente fi caria mais confuso do que antes de fazê-lo.
Silvia Lane defendeu uma posição diferente da sustentada por Aroldo Rodrigues. O debate entre essas propostas foi registrado na revista Psicologia: ciência e profissão, com o título: “A tecnologia social na psicologia: controvérsias” (LANE, 1985). Se, para Rodrigues, a Psicologia Social é uma ciência básica e neutra que permitiria a solução de problemas sociais, através de suas aplicações, para Lane (1985) tal concepção poderia transformar o psicólogo em agente da adaptação. Segundo essa autora, “o fundamental, [...] é a psicologia rever sua prática, pois teoria e prática têm de vir juntas. Não se pode dividir a Psicologia Social em ciência aplicada e pura” (LANE, 1985, p. 19).
Não há dúvida que Aroldo Rodrigues assegurava a separação entre psicologia e política a partir de uma visão de conhecimento científico consolidada na Psicologia Social norte-americana e na sua forma de pensar a psicologia. A necessidade de se adequar à exigência de fazer pesquisas, que levasse em conta a realidade brasileira e a solução de problemas sociais, levou Aroldo Rodrigues à denominada Tecnologia Social, apresentada por Jacob Varela.
Em síntese, as dificuldades de Aroldo Rodrigues podem ser compreendidas em função das novas exigências que os psicólogos sociais no Brasil se faziam: a necessidade de uma pesquisa que pensasse a realidade social brasileira e a possibilidade de sua transformação.
UM DEBATE EM TORNO DA NEUTRALIDADE E DA LIBERDADE ACADÊMICA
O debate que se estendeu ao longo de vários artigos poderia nos levar a análises distintas sobre a denominada crise da PUC-RJ. No entanto, nos restringimos ao comentário de algumas ideias de Aroldo Rodrigues sobre a liberdade acadêmica, a neutralidade científica e a psicologia como ciência. Seus argumentos sobre esses temas estariam na base de suas discordâncias e contraposições a uma Psicologia Social que começava a se estabelecer institucionalmente no Rio de Janeiro, no fi nal da década de 70 e que teve influências de teóricos como: Marx, Foucault, Deleuze, etc.
Em 1991, após muitos desgastes, Aroldo Rodrigues deixa o Brasil e vai lecionar na Universidade do Estado da Califórnia, em Fresno, Estados Unidos. Os embates com os psicólogos no Rio de Janeiro ocorreram, sobretudo, em função da discordância quanto ao modelo de ciência e psicologia. Na PUC-RJ, a discordância relativa ao predomínio da clínica psicanalítica, considerada por Aroldo Rodrigues como não científica, retirou-lhe, aos poucos, o respaldo que tinha da direção da instituição.
Quanto aos psicólogos sociais do Rio de Janeiro, a figura que poderia lhe impor mais ressalvas seria Eliezer Schneider. A forma que este construía as aulas de Psicologia Social permitiu-lhe escapar do simples uso dos manuais norte-americanos e utilizar referências de áreas como a sociologia, a antropologia e a filosofia. No entanto, não havia produção bibliográfica tão sistematizada como os vários livros que apresentavam a Psicologia Social norte-americana. Além disso, a partir de 1972, o livro Psicologia Social (RODRIGUES; ASSMAR; JABLONSKI, 2000) passou a ser uma referência no estudo da Psicologia Social. Tal livro encontra-se atualmente na 18ª edição no Brasil, sendo também editado em vários outros países da América Latina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A apresentação da história destes dois personagens nos aproxima das discordâncias e confrontos presentes no campo da Psicologia Social no Rio de Janeiro, nas décadas de 1960, 70 e 80. As contribuições destes autores ainda se fazem sentir, seja a partir das discordâncias que ainda geram, seja em função de suas colaborações teóricas, metodológicas e pela formação de pesquisadores no campo da Psicologia Social.
A partir da “crise”, como sustenta Rodrigues (1979c), a Psicologia Social passou a se preocupar com a relevância social das pesquisas em psicologia. Todavia, diferentemente desse autor, que fez uso da solução apresentada por Varela com a Tecnologia Social, os psicólogos sociais críticos à posição de Aroldo Rodrigues sustentaram a necessidade de a psicologia transformar a realidade social brasileira.
Um trabalho que busque apresentar a constituição recente do campo da Psicologia Social no Rio de Janeiro, mais do que contribuir para a apresentação de temas que promoveram uma reflexão sobre as rupturas teóricas e metodológicas neste campo, permite pensarmos sobre os outros caminhos que começam a se delinear na Psicologia Social em nosso país.
COMENTÁRIOS
- professor Eleizer Schneider => importância da Psicologia Social fazer uma ponte, uma conversa, dialogar com outros saberes: questão fundamental: cultura. Psicologia não só do indivíduo, mas também diretamente relacionada com as questões culturais (conjunto de crenças, valores, rituais, etc). Destaca o método histórico. Cultura como importante aspecto no estudo do comportamento do sujeito. A Psicologia Social deve contribuir para o entendimento do ser humano na sua diversidade histórica.
Psicologia Intercultural => estuda comparações entre culturas, aspectos de aculturação (sobreposição de uma cultura sobre outra). Para ele é importante conhecer as normas de conduta, os códigos não ditos, os xistes. Ex:“jeitinho brasileiro”.
Incentivava uma liberdade intelectual. Não apresentava um interesse claro pelo tema da transformação social. Isto veio com a Silvia Lane, que pregava que a Psicologia não servia de nada caso não trouxesse uma transformação social (era o aspecto principal; ocorre a partir de 1984).
- professor Aroldo Rodrigues: tenta colocar em prática uma psicologia social científica, no Brasil (livro dele muito famoso: Psicologia Social; está na 38ª edição). Defende a “neutralidade” para poder reconhecer os fenômenos psicológicos (visão de fora; defende a solução dos problemas). Sílvia Lane discorda: o conhecimento deve vir de uma vivência. (o psicólogo não deve liderar nem propor soluções, mas deverá ser o mediador que vai ajudar aos participantes a encontrarem a solução; práxis: prática reflexiva).
Texto: História da Psicologia Social no Rio de Janeiro
A TECNOLOGIA SOCIAL NA PSICOLOGIA: CONTROVÉRSIAS
AROLDO RODRIGUES
Psicologia, Ciência e Profissão:Quais as implicações éticas, políticas e ideológicas do uso da Psicologia Social?
AR: É claro que toda atividade prática envolve problemas de natureza ética, política e ideológica. A Tecnologia Social não está isenta desses problemas. É preciso que o tecnólogo social deixe bem claro quais são os seus valores, para que as pessoas que com ele lidam possam julgar as soluções que apresenta. O trabalho do tecnólogo social há de ser franco, aberto, sincero e honesto. Isso se consegue através da explicitação de seus valores às pessoas a quem sua atuação possa vir a influenciar. Não há como evitar a influência dos valores pessoais em sua atuação.
PCP: Qual o papel da Psicologia Social nesse quadro?
AR: A Psicologia Social, como ciência básica que é, tem muito a contribuir para a atividade do tecnólogo social. Embora a quase totalidade das pessoas discordem de mim, eu pessoalmente estou seguro de que a ciência é neutra em sua procura das relações não-aleatórias entre variáveis. Admito que a escolha do tema e até o relatório do cientista possam não ser neutros. O produto final, isto é, o conhecimento novo que surge, este é inexoravelmente neutro, pois toda a comunidade cientifica o fiscaliza. Ninguém acredita ingenuamente no que um cientista diz; é necessário que ele prove o que diz. Na publicidade e na necessidade de o cientista descrever em detalhes como chegou ao conhecimento por ele apresentado é que reside a grande salvaguarda da ciência contra tendenciosidade e vieses pessoais. Penso, pois, que assim devem marchar a Psicologia Social e a Tecnologia Social: a primeira procurando séria, honesta e objetivamete, o conhecimento da realidade social em que vivemos; a segunda, baseada nesse conhecimento, planejando intervenções dedicadas à resolução de problemas sociais.
SÍLVIA LANE
Penso que o futuro da Psicologia Social no Brasil dependerá muito dos seguintes fatores: a conscientização de que a Psicologia Social tem muito a oferecer às áreas aplicadas da psicologia e a outros setores de atividades; a aceitação de que a Psicologia Social é uma ciência básica e que a ela cabe descobriras relações estáveis entre variáveis psicossociais a fim de possibilitar ao tecnólogo social a solução dos problemas sociais de forma consciente e não improvisada; que os cursos de Psicologia Social em nossas universidades sejam concebidos de forma tal que possam fornecer ao aluno um treinamento adequado em Psicologia Social. Se as coisas marcharem nessa direção, as perspectivas para o futuro são boas; do contrário, continuaremos limitados ao pequeno espaço de que dispomos atualmente no cenário da Psicologia Social em nosso país. “TEORIA E PRÁTICA TÊM DE VIR JUNTAS”.
COMENTÁRIOS
Wanderley Codo
- O mundo interno não existe desconectado do mundo externo.
Sílvia Lane
	- a teoria e a prática devem vir juntas
	- o psicólogo não deve chegar como o detentor do saber, mas o mediador.
	- o que muda não é o saber, mas a ação.
Livro: Psicologia Social: O homem em movimento 
A Psicologia Social e uma nova concepção do homem para a Psicologia - Silvia Lane
A relação entre Psicologia e Psicologia Social deve ser entendida em sua perspectiva histórica quando, na década de 50 se iniciam sistematizações em termos de Psicologia Social, dentro de duas tendências predominantes: uma, na tradição pragmática dos Estados Unidos, visando alterar e/ou criar atitudes, interferir nas relações grupais para harmonizá-las e assim garantir a produtividade do grupo - é uma atuação que se caracteriza pela euforia de uma intervenção que minimizaria conflitos, tomando os homens "felizes" reconstrutores da humanidade que acabava de sair da destruição de uma II Guerra Mundial. A outra tendência, que também procura conhecimentos que evitem novas catástrofes mundiais, segue a tradição filosófica europeia, com raízes na fenomenologia, buscando modelos científicos totalizantes, como Lewin e sua teoria de Campo.
A euforia deste ramo científico denominado Psicologia Social dura relativamente pouco, pois sua eficácia começa a ser questionada em meados da década de 60, quando as análises críticas apontavam para uma “crise” do conhecimento psicossocial que não conseguia intervir nem explicar, muito menos prever comportamentos sociais. As réplicas de pesquisas e experimentos não permitiam formular leis, os estudos interculturais apontavam para uma complexidade de variáveis que desafiavam os pesquisadores e estatísticos - é o retorno às análises fatoriais e novas técnicas de análise de multivariância, que afirmam sobre relações existentes, mas nada em termos de "como" e "por quê". 
Na América Latina, Terceiro Mundo, dependente econômica e culturalmente, a Psicologia Social oscila entre o pragmatismo norte-americano e a visão abrangente de um homem que só era compreendido filosófica ou sociologicamente - ou seja, um homem abstrato. Os congressos interamericanos de Psicologia são excelentes termômetros dessa oscilação e que culminam em 1976 (Miami), com críticas mais sistematizadas e novas propostas, principalmente pelo grupo da Venezuela, que se organiza numa Associação Venezuelana de Psicologia Sovial (AVEPSO) coexistindo com a Associação Latino-Americana de Psicologia Social (ÁLAPSO). Nessa ocasião, psicólogos brasileiros também faziam suas críticas, procurando novos rumos para uma Psicologia Social que atendesse à nossa realidade. Esses movimentos culminam em 1979 (SIP — Lima, Peru) com propostas concretas de uma Psicologia Social em bases materialista-históricas e voltadas para trabalhos comunitários, agora com a participação de psicólogos peruanos, mexicanos e outros. 
O primeiro passo para a superação da crise foi constatar a tradição biológica da Psicologia, em que o indivíduo era considerado um organismo que interage no meio físico, sendo que os processos psicológicos (o que ocorre "dentro" dele) são assumidos como causa, ou uma das causas que explicam o seu comportamento. Ou seja, para compreender o indivíduo bastaria conhecer o que ocorre "dentro dele", quando ele se defronta com estímulos do meio.
Porém o homem fala, pensa, aprende e ensina, transforma a natureza; o homem é cultura, é história. Este homem biológico não sobrevive por si e nem é uma espécie que se reproduz tal e qual, com variações decorrentes de clima, alimentação, etc. O seu organismo é uma infra-estrutura que permite o desenvolvimento de uma superestrutura que é social e, portanto, histórica. Esta desconsideração da Psicologia em geral, do ser humano como produto histórico-social, é que a torna, se não inócua, uma ciência que reproduziu a ideologia dominante de uma sociedade, quando descreve comportamento e baseada em freqüências tira conclusões sobre relações causais pela descrição pura e simples de comportamentos ocorrendo em situações dadas. Não discutimos a validade das leis de aprendizagem; é indiscutível que o reforço aumenta a probabilidade da ocorrência do comportamento, assim como a punição extingue comportamentos, porém a questão que se coloca é por que se apreende certas coisas e outras são extintas, por queobjetos são considerados reforçadores e outros punidores? Em outras palavras, em que condições sociais ocorre a aprendizagem e o que ela significa no conjunto das relações sociais que definem concretamente o indivíduo na sociedade em que ele vive.
O ser humano traz consigo uma dimensão que não pode ser descartada, que é a sua condição social e histórica, sob o risco de termos uma visão distorcida (ideológica) de seu comportamento. 
Um outro ponto de desafio para a Psicologia Social se colocava diante dos conhecimentos desenvolvidos - sabíamos das determinações sociais e culturais de seu comportamento, porém onde a criatividade, o poder de transformação da sociedade por ele construída. Os determinantes só nos ensinavam a reproduzir, com pequenas variações, as condições sociais nas quais o indivíduo vive.
A ideologia nas ciências humanas
A afirmativa de que o positivismo, na procura da objetividade dos fatos, perdera o ser humano decorreu de uma análise crítica de um conhecimento minucioso enquanto descrição de comportamentos que, no entanto, não dava conta do ser humano agente de mudança, sujeito da história. O homem ou era socialmente determinado ou era causa de si mesmo: sociologismo vs biologismo? Se por um lado a psicanálise enfatizava a história do individuo, a sociologia recuperava, através do materialismo histórico, a especificidade de uma totalidade histórica concreta na análise de cada sociedade. Portanto, caberia à Psicologia Social recuperar o individuo na intersecção de sua história com a história de sua sociedade - apenas este conhecimento nos permitiria compreender o homem enquanto produtor da história.
Deste modo, quando as ciências humanas se atêm apenas na descrição, seja macro ou microssocial, das relações entre os homens e das instituições sociais, sem considerar a sociedade como produto hístórico-dialético, elas não conseguem captar a mediação ideológica e a reproduzem como fatos inerentes à "natureza" do homem. E a Psicologia não foi exceção, principalmente, dada a sua origem biológica naturalista, onde o comportamento humano decorre de um organismo fisiológico que responde a estímulos. Lembramos aqui Wundt e seu laboratório, que, objetivando construir uma psicologia científica, que se diferenciasse da especulação filosófica, se preocupa em descrever processos psicofisiológicos em termos de estímulos e respostas, de causas-e-efeitos.
Skinner aponta para a complexidade das relações sociais e as implicações para a análise dos comportamentos envolvidos, desafiando os psicólogos para a elaboração de uma tecnologia de análise que dê conta desta complexidade, enquanto contingências, presentes em comunidades. A história individual é considerada enquanto história social que antecede e sucede à história do Indivíduo. Nesta linha de raciocínio caberia questionar por que alguns comportamentos são reforçados e outros punidos dentro de um mesmo grupo social. Sem responder a estas questões, passamos a descrever o status quo como imutável e, mesmo querendo transformar o homem, como o próprio Skinner propõe, jamais o conseguiremos numa dimensão histórico-social. 
Também a psicanálise, em suas várias tendências, enfrenta este problema, desde as críticas de Politzer a Freud até as análises atuais dos franceses, que procuram fazer uma releitura da obra de Freud numa perspectiva histórico-social do ser humano.
Não negamos a psicobiologia nem as grandes contribuições da psiconeurologia. Afinal, elas descrevem a materialidade do organismo humano que se transforma através de sua própria atividade, mas elas pouco contribuem para entendermos o pensamento humano e que se desenvolve através das relações entre os homens, para compreendermos o homem criativo, transformador - sujeito da história social do seu grupo.
Se a Psicologia apenas descrever o que é observado ou enfocar o Indivíduo como causa e efeito de sua individualidade, ela terá uma ação conservadora, estatizante – ideológica - quaisquer que sejam as práticas decorrentes. Se o homem não for visto como produto e produtor, não só de sua história pessoal mas da história de sua sociedade, a Psicologia estará apenas reproduzindo as condições necessárias para impedir a emergência das contradições e a transformação social.
A psicologia social e o materialismo histórico
Se o positivismo, ao enfrentar a contradição entre objetividade e subjetividade, perdeu o ser humano, produto e produtor da História, se tornou necessário recuperar o subjetivismo enquanto materialidade psicológica. A dualidade físico X psíquico implica uma concepção idealista do ser humano, na velha tradição animística da psicologia, ou então caímos num organicismo onde homem e computador são imagem e semelhança um do outro. Nenhuma das duas tendências dá conta de explicar o homem criativo e transformador. Tornou-se necessária uma nova dimensão espaço-temporal para se apreender o Indivíduo como um ser concreto, manifestação de uma totalidade histórico-social - daí a procura de uma psicologia social que partisse da materialidade histórica produzida por e produtora de homens.
É dentro do materialismo histórico e da lógica dialética que vamos encontrar os pressupostos epistemológicos para a reconstrução de um conhecimento que atenda à realidade social e ao cotidiano de cada individuo e que permita uma intervenção efetiva na rede de relações sociais que define cada indivíduo - objeto da Psicologia Social.
A partir de críticas à psicologia social "tradicional" pudemos perceber dois fatos fundamentais para o conhecimento do Indivíduo: 1) o homem não sobrevive a não ser em relação com outros homens, portanto a dicotomia Indivíduo X Grupo é falsa - desde o seu nascimento (mesmo antes) o homem está inserido num grupo social -; 2) a sua participação, as suas ações, por estar em grupo, dependem fundamentalmente da aquisição da linguagem que preexiste ao indivíduo como código produzido historicamente pela sua sociedade (langue), mas que ele apreende na sua relação especifica com outros indivíduos (parole), Se a língua traz em seu código significados, para o indivíduo as palavras terão um sentido pessoal decorrente da relação entre pensamento e ação, mediadas pelos outros significativos. 
O resgate destes dois fatos empíricos permite ao psicólogo social se aprofundar na análise do Indivíduo concreto, considerando a imbricação entre relações grupais, linguagem, pensamento e ações na definição de características fundamentais para a análise psicossocial.
Assim, a atividade implica ações encadeadas, junto com outros indivíduos, para a satisfação de uma necessidade comum. Para haver este encadeamento é necessária a comunicação (linguagem) assim como um plano de ação (pensamento), que por sua vez decorre de atividades anteriormente desenvolvidas.
Refletir sobre uma atividade realizada implica repensar suas ações, ter consciência de si mesmo e dos outros envolvidos, refletir sobre os sentidos pessoais atribuídos às palavras, confrontá-las com as conseqüências geradas pela atividade desenvolvida pelo grupo social, e nesta reflexão se processa a consciência do indivíduo, que é indissociável enquanto de si e social. 
A análise do processo grupal nos permite captar a dialética individuo-grupo, onde a dupla negação caracteriza a superação da contradição existente e quando o indivíduo e grupo se tornam agentes da história social, membros indissociáveis da totalidade histórica que os produziu e a qual eles transformam pôr suas atividades também indissociáveis.
Esta análise das categorias fundamentais para a compreensão do ser humano nos leva à constatação da impossibilidade de delimitarmos conhecimentos em áreas estanques que comporiam o conjunto das Ciências Humanas. Psicologia, Sociologia, Antropologia, Economia, História, Pedagogia, Linguística são enfoques a partir dos quais todas as áreas contribuem para o conhecimento profundo e concreto do ser humano. Suas fronteiras devem ser necessariamente permeáveis, ampliando o conhecimento, seja do indivíduo, do grupo, da sociedade e da produção

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