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HISTÓRIA DO TRADUTOR INTÉRPRETE DE LIBRAS

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O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL: 
ONTEM, HOJE E AMANHÃ 
 
Ronice M. de Quadros1 
Silvana Aguiar dos Santos2 
 
 
Resumo 
 
 O tradutor intérprete de língua brasileira de sinais - TILS - no Brasil tem uma história que 
constitui sua identidade profissional a partir da sua relação com a comunidade surda e com a sua 
formação. O presente artigo irá apresentar estas relações na constituição deste profissional 
considerando o ontem, o hoje e o amanhã. No passado, os TILS estavam realizando suas 
atividades a partir de uma relação com a comunidade surda assistencialista. Os tradutores e os 
intérpretes de língua de sinais eram aqueles que estavam disponíveis para a comunidade surda por 
causa de suas relações dentro da comunidade (filhos, vizinhos, amigos, professores). Esta 
realidade foi se transformando à medida que surdos foram participando mais ativamente da 
sociedade em geral e sua formação passou a ser mais acadêmica. Hoje, portanto, os TILS já 
contam com formação acadêmica específica a partir das conquistas sociais e políticas relativas à 
Língua Brasileira de Sinais - Libras (Lei de Libras 10.456/2002 e Decreto 5626/2005). O futuro 
dos profissionais intérpretes é promissor, pois está delineada a sua identidade enquanto 
profissional tradutor e intérprete na sua relação com a Libras e o Português. A formação dos TILS 
passa a ser constituída no campo dos Estudos da Tradução aliada politicamente aos movimentos 
surdos. 
 
Palavras-Chaves: Tradutores e intérpretes de língua de sinais, Comunidade Surda, Formação 
 
SIGN LANGUAGE INTERPRETER TRASLATOR IN BRAZIL: YESTERDAY, TODAY 
AND TOMORROW 
 
Abstract 
 
The sign language interpreter translator – TILS – in Brazil has a history that constitutes his/her 
professional identity from a relationship with deaf community and his/her education. This paper 
presents these relations in the constitution of this professional considering yesterday, today and 
tomorrow. In the past, TILS were working based on assistance (to help Deaf community). Sign 
language translators and interpreters were the people that were part of Deaf community because 
of their relationship with the community (suns, daughters, neighbors, friends, teachers). This 
situation started to change when Deaf people began to participate more actively in the society and 
to have higher education levels. Nowadays, therefore, TILS have already a specific education 
related to sign language social policy gains, for instance with Brazilian Sign Language Law 
(Libras Law 10.456/2002 and Decree 5626/2005). The future of translator and interpreters 
promises to be better, because is already established his/her professional identity with Libras and 
 
1
 Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis – SC, Brasil. 
 
2
 Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis – SC, Brasil. 
 
 
Portuguese. Also, his/her education become to be part of Translation Studies politically related to 
Deaf movements. 
 
Key-words: Sign language interpreter translators, Deaf Community, Education 
 
 
1. Ontem (décadas de 80 e 90 e início do novo milênio) 
 
No passado, os TILS estavam realizando suas atividades a partir de uma relação 
com a comunidade surda de forma assistencialista. Os tradutores e os intérpretes de 
língua de sinais eram aqueles que estavam disponíveis para a comunidade surda por 
causa das suas relações dentro desta comunidade (filhos, vizinhos, amigos, professores). 
As relações entre estes dois grupos, TILS e comunidade surda, com base na caridade, 
benevolência e assistencialismo não era profissional (Quadros, 2004; Rosa, 2003). 
Paralelo a isso, a presença de intérpretes esteve também marcada pela atuação 
política junto à comunidade surda. Muitos dos intérpretes de língua de sinais participaram 
ativamente dos movimentos surdos no Brasil. Nos relatos dos intérpretes, observamos 
vários elementos que indicam o comprometimento político desses intérpretes pelos 
direitos dos surdos. A atuação, neste sentido, apresenta um misto de atividade 
benevolente com atuação política, militante. O trecho a seguir de uma fala de um dos 
intérpretes entrevistados ilustra esta posição política que permeou a atuação do intérprete 
de língua de sinais no Brasil: 
 
[...] porque surgiu esse curso? Porque foi uma luta da 
comunidade surda em 96. Foi toda essa luta da comunidade 
surda e foi oficializada em Porto Alegre a língua de sinais. Então 
havia necessidade de ter esse profissional [intérprete] para estar 
acompanhando os surdos. Eu me lembro que os surdos estavam 
participando do Orçamento Participativo, começou aí. [...]. Mas 
antes disso tinha esse movimento em luta por escola, por língua 
de sinais e ai depois da oficialização de língua de sinais em 96, 
houve a necessidade de ter esse profissional. E aí a FENEIS, a 
recém estava começando aqui no RS e a universidade federal [...] 
proporcionaram esse curso e foi 80 horas que é outra questão 
para se discutir depois, se for o caso, que capacitou pessoas que 
já tinham fluência da língua de sinais, que já vinham trabalhando 
como intérpretes, como intérprete informalmente, e ai que 
fizeram esse curso. 
 
Os primeiros cursos de formação para ILS começaram a acontecer na década de 
90. Eram cursos de curta duração, geralmente, organizados por associações de surdos 
e/ou Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) em parceria 
com universidades ou órgãos do governo. Tomando a caracterização dos tipos de 
formação de profissionais tradutores/intérpretes existentes no Brasil, por Martins (2007), 
os cursos livres, conforme detalhado pela autora a seguir, 
 
[...] são assim denominados por não estarem vinculados ao 
sistema regular de ensino. Promovidos por cursos de idiomas, 
centros binacionais, escritórios ou agências de tradução, 
associações e órgãos da classe, ou mesmo por iniciativa de 
tradutores e professores, podem ser de curta duração (até 200 
horas) e geralmente têm objetivos análogos aos dos cursos de 
extensão universitária (Martins, 2007, p. 173). 
 
Como os cursos de formação de intérpretes na década de 90 e início do novo 
milênio foram oferecidos pela FENEIS, com o apoio do Ministério da Educação – MEC - 
podemos caracterizá-los como cursos livres. Assim, nestes primeiros momentos de 
formação dos TILS, uma característica que marca tal período é a mudança de um espaço 
empírico e informal para uma atuação institucional do TILS. Mesmo com cursos livres, 
há efetivamente uma transição de uma atuação mais informal para uma atuação mais 
profissional que irá servir de base para o que está acontecendo hoje na formação destes 
profissionais. 
A Lei de Libras (10.436/2002) juntamente com as políticas de inclusão 
favoreceram o apoio dos órgãos governamentais para o oferecimento de cursos para a 
formação de intérpretes de Libras. O currículo básico destes cursos incluiu aulas de 
Libras, uma vez que as pessoas que atuavam como intérpretes nem sempre eram fluentes 
em Libras, e linguística contrastiva. Estes cursos estavam sendo ministrados com o apoio 
do MEC junto a FENEIS e eram chamados de cursos de multiplicadores de profissionais. 
O objetivo era formar profissionais que pudessem formar outros profissionais em suas 
respectivas regiões. A escassez de intérpretes de Libras era tão grande no país, que esta 
foi à solução em curto prazo para permitir que os intérpretes tivessem o mínimo de 
formação para continuarem atuando e multiplicando esta atividade. 
Com a presença efetiva do ILS nos espaços educacionais vários assuntos 
passaram a ocupar a formação destes profissionais, entre eles: a proficiência lingüística, a 
inserção cultural, habilidades, competências, técnicas e estratégias de interpretação, 
qualidade de interpretaçãoe comportamento ético perante as situações apresentadas. 
Estes são alguns dos temas que ocuparam grande parte dos cursos livres e de extensão na 
virada do milênio. 
Um exemplo deste curso foi o Curso de Formação de Intérpretes de Língua de 
Sinais oferecido pela FENEIS do Rio Grande do Sul em parceria com a Universidade 
Federal do Rio Grande do Sul, em 1997. Conforme informações disponíveis no folder do 
curso, o curso foi de 80 horas. Este curso apresentou a seguinte organização: 
 
O curso está estruturado em duas partes fundamentais: (a) a 
formação teórica que inclui o estudo dos princípios básicos de 
linguagem e comunicação, e (b) laboratórios que inclui as 
atividades de tradução e interpretação com o exercício de 
técnicas e habilidades básicas em diferentes contextos. 
A primeira etapa incluirá as seguintes disciplinas: 
(a) História da Língua de Sinais; 
(b) Lingüística I - Princípios Básicos da linguagem e da 
comunicação; 
(c) Lingüística II - Estrutura da LIBRAS e Estrutura da Língua 
Portuguesa - Estudo Contrastivo. 
(d) Princípios Éticos do profissional intérprete. 
A segunda etapa incluirá diferentes contextos de tradução e 
interpretação onde os alunos desempenharão a função de 
intérpretes com a monitoria de intérpretes e instrutores de 
LIBRAS. Durante esse processo serão analisadas as técnicas e 
habilidades do intérprete. 
(Folder do Curso de Formação de Intérpretes de Libras, 1997, 
s/p) 
 
O programa do curso evidencia a iniciativa da FENEIS e da Universidade 
Federal do Rio Grande do Sul em oferecer um curso com base teórica e prática. No 
próprio folder, foram também incluídas justificativas para o oferecimento do curso. As 
mesmas indicam a necessidade de oferecer formação aos intérpretes objetivando 
qualificação profissional para atendimento às demandas comunitárias e políticas: 
 
1. A inexistência de cursos para formação de profissionais 
intérpretes. 
2. A necessidade de existirem cursos de formação nesta área 
tendo em vista o grau de complexidade da tradução simultânea da 
Língua de Sinais para a Língua Portuguesa e vice-versa. 
3. O contexto sócio-político que favorece o mercado para 
atuação desse profissional tendo em vista a mobilização da FENEIS 
pelo reconhecimento da LIBRAS enquanto sistema lingüístico que 
faz parte da comunidade surda brasileira. 
4. A intensa solicitação deste profissional para intermediar a 
comunicação entre ouvintes e surdos em diferentes contextos, tais 
como, delegacias de polícias, tribunal de justiça, consultas médica, 
seminários, congressos nacionais e internacionais, cursos de 
graduação e pós-graduação. 
5. A falta de disponibilidade de tempo da equipe de intérpretes do 
RS. 
6. A necessidade da criação do cargo de intérprete para atender a 
comunidade em nível municipal (Porto Alegre), tendo em vista o 
projeto lei referente ao reconhecimento da LIBRAS. Tal projeto foi 
aprovado por unanimidade pela câmara de vereadores em setembro 
de 1996. 
(Folder do Curso de Formação de Intérpretes de Libras, 1997, 
s/p) 
 
O item 3 das justificativas apresentadas reflete o papel político ocupado pelos 
intérpretes de língua de sinais na comunidade surda brasileira. Assim como observado 
por Stone (2009), conforme mencionado por Souza (2010), o papel político dos 
intérpretes está relacionado com o envolvimento dos mesmos com uma identidade surda 
constituída com marcações culturais da cultura surda. 
 
Stone conclui claramente que, uma norma Surda de tradução 
nasce de uma comunidade coletiva e heterogênea, na qual os 
diferentes membros contribuem com habilidades para o coletivo 
e os T/Is pertencem à mesma comunidade (Stone, 2009, em 
Souza, 2010, p. 99) 
 
Embora haja marcas de benevolência na atuação dos intérpretes, sempre houve 
um comprometimento político destes profissionais ao longo da história de sua atuação no 
país. “Ajudar” os surdos foi a marca desta geração de intérpretes em um contexto em que 
a comunidade surda estava se organizando politicamente para conquistar os seus direitos 
linguísticos e sociais. 
Com relação ao grupo de TILS, Pires e Nobre (2004) registram a existência de 
um departamento específico para tratar das questões relativas aos intérpretes de Libras 
dentro da FENEIS, denominado Departamento Nacional de Intérpretes da FENEIS. 
Segundo os documentos desse departamento, o intérprete era aquele que toma a posição 
de sinalizante ou de falante, transmitindo pensamentos, palavras e emoções do 
sinalizante, servindo de elo entre as duas modalidades de comunicação. A existência 
formal deste departamento dentro da FENEIS também reflete a presença política dos 
intérpretes de língua de sinais no contexto das organizações dos surdos no Brasil. 
À medida que os surdos passam a atuar com maior intensidade na sociedade, em 
especial, na educação, a presença de ILS torna-se mais visível e as políticas lingüísticas 
em torno da língua de sinais passam a constituir-se como uma condição necessária de 
inclusão de pessoas surdas no sistema educacional brasileiro. Sendo assim, torna-se 
fundamental o investimento na formação dos intérpretes de Libras, pois são profissionais 
que estarão atuando diretamente na inclusão de surdos no país. 
Assim, os TILS vão se constituindo com um papel político fortemente 
delineado, pois são profissionais que vão atuar na “inclusão” dos surdos na sociedade 
brasileira. Como a FENEIS é responsável pela formação destes profissionais, há um 
compromisso na formação de intérpretes que tenham um envolvimento direto com a 
comunidade surda, objetivando a formação de um profissional que atue como um tradutor 
cultural. Este envolvimento nas produções culturais surdas situa o intérprete de Libras 
politicamente dentro da comunidade brasileira. 
Na década de noventa, ou mais recentemente ainda, as instituições (escolas, 
universidades ou faculdades) pouco conheciam a respeito da língua de sinais, ou de 
políticas públicas que efetivassem um trabalho de inclusão eficaz no sistema educacional 
brasileiro. Nesse sentido, determinados contextos não tinham claro quais eram as 
competências e/ou habilidades que um profissional TILS deveria apresentar, contratando, 
muitas vezes, pessoas desqualificadas para atuar na tradução e/ou interpretação. Outro 
ponto a ser destacado neste sentido é que os TILS desempenhavam trabalhos voluntários, 
não sendo considerados como tradutores e/ou intérpretes profissionais da área de 
tradução, dificultando, por exemplo, as contratações de seus serviços. 
 
Em algumas instituições de ensino superior utilizam-se de alunos 
da graduação para realizarem esses serviços, em troca de bolsas 
de monitorias, configurando, assim, um ato assistencialista e não 
de uma efetiva política de ensino. Além disso, desconsidera-se o 
grau de conhecimento que esses bolsistas possuem da língua de 
sinais, fato que compromete o próprio valor da tradução. (Rosa, 
2005, p. 87) 
 
A constatação de Rosa confirma a transição pela qual os profissionais TILS estão 
passando de uma postura mais assistencialista para uma atuação mais profissional. A 
própria comunidade surda confunde o papel do intérprete que atua juntamente com os 
surdos nos movimentos surdos pelas conquistas linguísticas e sociais. O TILS é 
companheiro e é profissional a serviço da comunidade surda no contexto da comunidade 
brasileira em geral. A presença política do intérprete é marcada nesta transição, ao 
mesmo tempo em que, o seu reconhecimento profissional é inventado. A invenção do 
intérprete enquanto profissional no Brasil está sendo constituída tanto pela sociedade 
brasileira em geral, como pela própria comunidade surda. Antes da invenção do 
“profissional” intérprete estava aquele que ajudava os surdos na escola, nas associações e 
na igreja. A década de 90 caracteriza a invenção do “profissional” que passa a ser 
nomeadacomo tradutor e intérprete de Libras, por meio de documentos dentro da 
FENEIS e por meio de publicações (Quadros, 2002, 2004). 
Como observa Lopes (2005, p. 37), “a concepção de sujeito a partir da 
centralidade da cultura exige a compreensão desse como uma invenção que se dá a partir 
do olhar do outro e de si sobre si”. Nesse sentido, o tradutor intérprete é inventado como 
profissional a partir do olhar da sociedade em que ele começa a atuar, pelos surdos e 
ouvintes e por ele mesmo. 
Esta relação da questão assistencialista que marca o passado dos TILS no Brasil 
há algumas conseqüências complexas para a atuação profissional deste grupo no presente. 
As condições de trabalho, as formas de contratação, a formação propriamente dita desse 
grupo podem ser tomadas como exemplos das dificuldades enfrentados pelos mesmos 
para o seu reconhecimento profissional. O fato da formação ocorrer por meio de cursos 
livres também teve consequências na atuação dos intérpretes. Os problemas com a 
atuação dos intérpretes têm denunciado a fragilidade deste tipo de formação. É possível 
observar que as relações assistencialistas além de marcarem e constituírem grande parte 
da história dos TILS brasileiros, as mesmas refletem as práticas destes profissionais até 
os dias de hoje. Este fato vem sendo problematizado e desconstruído por meio da 
formação destes profissionais e das pesquisas acadêmicas que sinalizam cada dia mais 
articulação com o campo dos Estudos da Tradução. 
A partir de 2004, começam a haver produções acadêmicas sobre os TILS e a 
formação dos intérpretes em nível superior. Além disso, temos o Decreto 5626/2005 que 
regulamenta a Lei de Libras e marca o momento que estamos vivenciando hoje. 
 
2. Hoje (a partir de 2005) 
 
A realidade descrita na seção anterior foi se transformando à medida que surdos 
foram participando mais ativamente da sociedade em geral e sua formação passou a ser 
mais acadêmica. A presença de TILS tornou-se mais visível e as políticas lingüísticas em 
torno da língua de sinais passam a constituir-se como uma condição necessária de 
inclusão de pessoas surdas nos diferentes espaços do cenário educacional brasileiro. 
Nesse sentido, o momento atual é de estruturação da profissão dos TILS 
sistematizando, por exemplo, o papel destes profissionais nos diferentes contextos de 
atuação, especialmente no setor educacional, no mercado de trabalho para TILS, no 
acesso a concursos públicos para estes profissionais, e mais recentemente, na 
regulamentação da profissão de TILS. 
 Além desta sistematização do trabalho, assuntos como: a tradução de metáforas 
surdas para a língua portuguesa, os intérpretes de língua de sinais no ato tradutório: 
referenciação de pessoa, tradução de materiais acadêmicos para libras: estudo do 
processo de formação de neologismos, identidade política dos intérpretes de língua de 
sinais brasileira, metodologias de tradução para a língua brasileira de sinais são alguns 
dos objetos de pesquisas desenvolvidas junto aos programas de pós-graduação de 
diferentes universidades brasileiras. 
Não estamos mais falando apenas da prática de tradução/interpretação de língua 
de sinais, estamos realizando uma meta-tradução, isto é, falando sobre questões, 
conceitos e práticas que enfocam os Estudos da Tradução e interpretação da Libras. 
Deslocamo-nos de (a) pensar somente como são operacionalizados esses conceitos na 
interpretação, que técnicas adequadas devem ser usadas, para (b) buscarmos referenciais 
teóricos que justifiquem as escolhas e explicam a tradução e interpretação da Libras. 
Nos últimos anos, especialmente depois Lei da Libras em 2002 e sua 
regulamentação em dezembro de 2005 por meio do Decreto 5626, a formação e a 
profissionalização dos TILS explodiu, uma vez que a demanda por este profissional no 
mercado de trabalho brasileiro está estabelecida. Os intérpretes de Libras são requisitados 
nos espaços públicos, na educação e na comunidade. Os tradutores de Libras são 
contratados para traduzir literatura e materiais didáticos para a Libras em todo o país. 
Estas demandas acarretam a necessidade de formar mais tradutores e intérpretes de 
Libras. 
Algumas questões foram e continuam presentes até os dias atuais como pontos 
cruciais na construção da identidade profissional dos TILS, a saber: o reconhecimento e a 
valorização da profissão, a formação profissional, o mercado de trabalho e condições 
adequadas para exercício desta atividade profissional, a remuneração, bem como a 
relação profissional entre pessoas surdas e TILS (Santos, 2006). Estas questões começam 
a ser debatidas nos cursos livres de formação de intérpretes que continuam a ser 
oferecidos no país, no entanto, sem base acadêmica. Cursos de graduação e de pós-
graduação para formar tradutores e intérpretes de Libras começam a despontar no Brasil. 
Outro ponto a ser destacado é o Exame de Proficiência na Língua Brasileira de 
Sinais (Prolibras)3 que se constitui na Certificação de Proficiência no Uso e no Ensino da 
Libras (para professores ou instrutores de Libras) e a Certificação de Proficiência em 
Tradução e Interpretação da Libras/Língua Portuguesa/Libras (para tradutores e 
intérpretes) em cumprimento ao Decreto (5626/05). Este exame além de certificar 
evidencia a forma como as políticas em torno da língua de sinais no Brasil têm tomado 
novos rumos (Quadros et al., 2009). 
É possível observar um tratamento diferente por parte do governo no que se 
refere às áreas de Libras e de tradução/interpretação de Libras/Português. Silva (2009) ao 
prefaciar o livro “Exame Prolibras” afirma que se num passado recente não tínhamos 
profissionais oficialmente reconhecidos para a educação de surdos, já não podemos dizer 
o mesmo nos dias de hoje. 
Vale destacar que nesta mesma época no espaço acadêmico, Pereira (2008) 
desenvolveu uma pesquisa sobre a proficiência e a certificação na área, ressaltando a 
 
3
 A primeira edição do Prolibras foi realizada no ano de 2006 promovido pela parceria entre o Ministério da 
Educação, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas “Anísio Teixeira” e a Universidade Federal de Santa 
Catarina. 
 
importância e a necessidade de investigação sobre o tema. 
 
Devido à diversidade de instrumentos, procedimentos e 
concepções do que deve ser avaliado em intérpretes de língua de 
sinais (ILS), faz-se necessária uma investigação sobre a testagem 
de proficiência lingüística e a distinção entre proficiência 
tradutória e certificação profissional, bem como qual o momento 
adequado de suas aplicações nas diferentes etapas da formação e 
do exercício profissional dos ILS. (Pereira, 2008, p.10) 
 
 
Além do Prolibras, outras ações em cumprimento ao Decreto 5626/05 estão 
sendo realizadas, por exemplo, o curso de Letras-Libras Bacharelado promovido pela 
Universidade Federal de Santa Catarina. No ano de 2008 foram oferecidas 450 vagas para 
o curso de Bacharelado em Letras-Libras, na modalidade a distância distribuídas pelo 
país. No mapa a seguir apresentamos os pólos que compõem a rede Letras-Libras 
atualmente. 
 
 
 
Figura 1. Pólos do curso de Letras-LIBRAS da turma de Bacharelado/2008 
(Fonte: Guia do Tutor, 2008) 
 
O curso de Letras-Libras (Bacharelado) tem duração mínima de quatro anos e 
três eixos principais que o sustentam: (a) eixo de formação básica (envolvendo 
principalmente conhecimentos básicos de lingüística e tradução-interpretação); (b) eixo 
de formação específica (envolvendo conhecimentos de aspectos educacionais da surdez e 
aspectos lingüísticos de Libras); e (c) eixo de formação profissional (envolvendo 
conhecimentos técnicos e práticos de tradução e interpretação de línguas). 
O curso de Letras-Libras Bacharelado possibilitou a criação de uma comunidade 
on linede TILS, onde todos os alunos de diferentes pólos podem interagir e produzir 
conhecimento na área de tradução e interpretação, minimizando as distâncias geográficas 
que até então criavam obstáculos de uma participação mais efetiva. Este fator é 
fundamental para a formação dos TILS fortalecendo, também, a identidade profissional 
deste grupo no país. 
Outro ponto importante é a rede de TILS criada a partir do curso de Letras-
Libras que, além de fortalecer a identidade profissional, oportuniza que os mesmos 
desenvolvam maior autonomia em seu aprendizado e tornem-se sujeitos ativos e críticos 
em sua formação. O aumento da interação e o estreitamento dos laços proporcionados por 
meio dos ambientes digitais, das iniciativas de congressos, pesquisas e trabalhos 
desenvolvidos nos respectivos pólos são possibilidades de re-significar suas práticas 
tradutórias, além de articular-se com firmeza ao campo dos Estudos da Tradução. 
Na medida em que os TILS passam a se perguntar a respeito da sua própria 
constituição enquanto profissional da tradução e interpretação, suas relações com as 
línguas e comunidades implicadas no ato da interpretação a partir de um panorama 
teórico tornam-se evidente a mudança de enfoque na forma de conceber os papéis do 
tradutor, das línguas e de todos os elementos que compõem o ato tradutório. 
Estamos diante de um curso que demarca uma das formas de institucionalização 
efetiva no sentido político e acadêmico, com respeito à formação de tradutores/intérpretes 
de língua de sinais no Brasil. Hoje, portanto, os TILS já contam com formação acadêmica 
específica a partir das conquistas sociais e políticas relativas à Libras (Lei de Libras 
10.456/2002 e Decreto 5626/2005). 
 É possível observar que as relações estabelecidas atualmente entre TILS e a 
comunidade surda passa a ser profissional, pois a comunidade surda transita em 
diferentes contextos sejam eles sociais, políticos, educacionais e acadêmicos exigindo 
que o TILS seja um profissional qualificado para exercer a função de tradução ou de 
interpretação. Há uma mudança no reconhecimento deste profissional, a partir de uma 
formação considerada socialmente legítima, a formação em nível superior. 
Os critérios exigidos pelo mercado de trabalho e pelo espaço acadêmico forçam 
cada vez o profissional TILS a atualizar-se cotidianamente, pois não basta ter apenas 
fluência nas línguas envolvidas no ato tradutório ou aprender a traduzir e/ou interpretar o 
que é solicitado em um determinado texto ou situação. 
 A presença de pesquisadores surdos e ouvintes, professores bilíngües nos 
diferentes meios exige que o profissional TILS esteja em constante busca de novos 
conhecimentos e atualizações, sejam elas técnicas ou científicas. Demonstrar maior 
autoconfiança e segurança dos conceitos e nas tarefas que terão de desempenhar qualifica 
a presença deste profissional no mercado de trabalho e satisfaz as comunidades que 
contratam seus serviços. 
Paralelamente a formação em nível de graduação, vários pesquisadores tradutores 
e intérpretes ingressaram na pós-graduação. A pós-graduação tem contribuído 
significativamente na formação de pesquisadores TILS por meio de cursos de 
especializações, mestrado e doutorado em algumas universidades brasileiras e institutos 
federais4. Inicialmente, as pesquisas produzidas estavam calcadas na educação, mas 
gradativamente, passaram a se constituir como parte dos Estudos da Tradução 
Vasconcellos, Quadros, Pereira e Santos (2010). Essa passagem situa as pesquisas em 
tradução e interpretação no campo dos Estudos da Tradução com consequências muito 
importantes para o delineamento e identidade dos profissionais tradutores e intérpretes de 
língua de sinais. 
Um exemplo desta afirmação foi o trabalho apresentado no XXV ENTRAD por 
Vasconcellos et al. (2010) que dialogou com as seguintes perguntas: o que éramos ontem, 
o que somos hoje, o que queremos ser amanhã? Esta atividade era parte de uma interação 
inter-GT (GT de Estudos da Tradução e GT de Linguagem e Surdez). O trabalho foi 
produzido em co-autoria por pesquisadores e professores da Universidade Federal de 
Santa Catarina argumentando pela filiação das áreas de pesquisa “Tradução” e “Tradução 
e Interpretação de Línguas de Sinais” (TILS) e dos profissionais e pesquisadores que 
nelas atuam ao campo disciplinar Estudos da Tradução (ET), o qual, a partir de seu 
 
4
 Especialização para Tradutor e Intérprete de Língua Brasileira de Sinais/Português oferecido pelo 
Instituto Federal de Santa Catarina. 
 
estabelecimento na década de 70, tem se expandido constantemente em resposta à 
diversidade da investigação sobre línguas e culturas em contato, inclusive entre 
modalidades diferentes, como é o caso de línguas orais e línguas de sinais. 
Vasconcellos et al. (2010) encerra a apresentação enfatizando que a gradual 
entrada da pesquisa em TILS na agenda dos Estudos da Tradução no Brasil e o 
movimento estratégico mútuo de aproximação de pesquisadores em TILS e pesquisadores 
em tradução e interpretação são concretizados, no âmbito da UFSC, por meio da força 
aglutinadora do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (PGET) reafirma 
nossa crença na possibilidade de empoderamento dos dois grupos de pesquisadores, 
quando estrategicamente filiados a um campo disciplinar comum e já estabelecido, cujo 
objeto de estudo é a tradução, em sua mais ampla acepção e em suas mais variadas 
manifestações. 
É possível observar que a busca pela filiação estratégica de TILS aos Estudos da 
Tradução não é recente. Uma das primeiras pesquisas que aproximou o conceito de 
(in)visibilidade dos tradutores/intérpretes de língua de sinais foi o trabalho de Rosa 
(2005). A autora visita teóricos como: Paulo Rónai, Erwin Theodor e Jacques Derrida, 
discutidos no campo dos Estudos da Tradução e busca aproximar as contribuições destes 
autores para a prática do intérprete de língua de sinais. De acordo com Rosa (2005, p. 9) 
“Tomar esta perspectiva, no caso da educação de surdos, é uma novidade, uma vez que a 
tarefa do intérprete de língua de sinais tem sido normalmente discutida a partir do 
enfoque da educação especial.” A pesquisa de Rosa (2005) além de colaborar para a 
formação de tradutores e intérpretes de língua de sinais, cooperou também para a reflexão 
a respeito do conceito de “neutralidade” deste profissional. Com o intuito de desconstruir 
tal mito, a autora dialoga com a visão de linguagem e tradução assumida pelo pós-
estruturalismo, onde uma das questões abordadas é a multiplicidade dos significados. 
A partir de 2005 ocorre um boom em relação às produções acadêmicas sobre 
TILS fortalecendo ainda mais a identidade deste profissional. Em 2006, Santos apresenta 
uma pesquisa sobre a identidade dos intérpretes de Libras. A autora entrevista intérpretes 
de Libras e analisa as narrativas sobre os próprios intérpretes e identifica elementos que 
compõem a identidade desses intérpretes, entre eles, “a questão do assistencialismo, do 
voluntariado, da precária formação e a busca pela profissionalização, assim como o 
trânsito entre as múltiplas identidades em que esses sujeitos estão inseridos por atuarem 
enquanto mediadores lingüísticos e culturais entre duas culturas diferentes” (Santos, 
2006, p. 07). A questão das múltiplas identidades é o foco do trabalho de Santos. A 
autora analisa as narrativas que retomam de forma contundente a dualidade surdo e 
ouvinte e discute a identidade desses intérpretes neste contexto moderno. Com base nas 
produções dos Estudos Culturais, a autora faz um exercício de desconstrução desta 
relação oposicional que constitui alguns dos intérpretes entrevistados, tecendo múltiplas 
identidades que emergem destes contextos. 
Os TILS se constituem em uma comunidade surda, aprendem com elaa 
produzirem textos com marcas surdas, bem como, aprendem a produzirem textos 
culturais tanto em Libras como em Português. Exatamente por transitarem entre as 
comunidades e tornarem-se sensíveis e parte das duas, indo e vindo, fazendo escolhas, 
tomando decisões e traduzindo textos culturais é que são reconhecidos e legitimados 
enquanto TILS. Stone (2009) retoma a discussão sobre as identidades múltiplas dos 
intérpretes de línguas de sinais em sua tese de doutoramento produzida na Inglaterra. O 
autor, da mesma forma que Santos (2006), conclui que os intérpretes transitam entre as 
comunidades e realizam traduções culturais eminentemente políticas, exatamente pela 
identificação dos intérpretes com a comunidade surda. Na língua de sinais americana há 
um sinal que traduz essas relações dos intérpretes com a comunidade surda: 
 
 
 
IMERSÃO 
 
Com este sinal, os surdos referem os bons tradutores intérpretes como aqueles que 
“imergem” na comunidade surda, uma tradução mais literal seria a seguinte: “aqueles que 
caem/se jogam dentro da comunidade e ficam completamente envolvidos”. 
Esta questão a respeito das múltiplas identidades, dos diferentes contextos, dos 
aspectos subjetivos que constituem os TILS dentro das comunidades é um tema bastante 
presente nas publicações no Brasil. Masutti (2008) apresenta em sua tese de doutorado 
um diálogo com questões acerca da representação, do poder e da historicidade por meio 
da análise de traduções culturais em zonas de contato entre surdos e ouvintes. A autora 
busca nos referenciais do Pós-Estruturalismo e dos Estudos Culturais desconstruir 
conceitos que constituem as práticas logofonocêntricas presentes nos processos 
tradutórios. Além disso, a autora 
 
Desenvolve uma leitura do movimento destas textualidades de 
interpretação e das idiossincrasias de tradução cultural 
desenvolvidas pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e 
Tratados, conhecida como Testemunhas de Jeová, a partir do 
seu contato com as culturas surdas. Destaca-se, além disso, os 
desdobramentos teóricos dessa experiência tradutória 
transferida por intérpretes de língua de sinais a outros locus de 
enunciação e práticas sociais. (Masutti, 2008, pp. 7) 
 
Atualmente, além dos trabalhos continuarem discutindo aspectos que envolvem a 
interpretação de libras/português, novas pesquisas despontam sobre a questão da tradução 
e seus processos. Segala (2010) busca definir o tradutor de português escrito para a 
Libras considerando as produções dos Estudos da Tradução. O autor define a tradução 
como aquela que apresenta características de uma tradução interlinguística e 
intersemiótica. A atuação do tradutor para a Libras incorpora a base intersemiótica e ao 
mesmo tempo apresenta o conhecimento linguístico do Português e da Libras para 
proceder com o ato tradutório. Além do interlinguístico (conhecimento das línguas 
presentes no ato tradutório), além do intersemiótico (conhecimento cultural e social), o 
autor traz o aspecto intermodal, considerando Quadros e Souza (2008). O intermodal 
envolve o conhecimento de duas línguas de duas modalidades diferentes, o Português 
com base oral-auditiva expresso por escrito e a Libras, uma língua visual-espacial. Segala 
(2010) compõe o tradutor de português escrito para a Libras com estes três aspectos do 
ato tradutório para produzir um texto na língua de chegada, a Libras, compreensível aos 
surdos com os sentidos da língua de origem, o Português. 
Souza (2010) apresenta uma pesquisa que descreve os métodos usados para 
traduzir os textos em português escrito para a Libras no contexto do Curso de Letras 
Libras, da Universidade Federal de Santa Catarina. A pesquisa é realizada com base nos 
Estudos da Tradução (segundo contribuições trazidas por Gile, 1995, por exemplo). O 
autor identifica a tipologia textual dos textos produzidos no contexto do curso e descreve 
como os tradutores construíram estratégias e métodos para realizarem as traduções. O 
autor identifica três tipos de tradução permeando a tradução para os textos em Libras, 
corroborando, de certa forma, as conclusões de Segala (2010): 
 
[...] Demandas de tradução do tipo intralingual, interlingual e 
intersemiótica permeiam o trabalho da equipe de vídeo. Assim, 
conforme mencionado, o tipo intralingual emerge nas 
adaptações de linguagem feitas nos textos-base das disciplinas 
durante o procedimento de produção dos roteiros de gravação. 
O tipo interlingual, por exemplo, aparece quando o texto do 
roteiro é repassado àqueles que Quadros, Cenry e Pereira 
(2008) chamam de “atores surdos usuários da Língua de Sinais 
e por tradutores da Língua de Sinais”, os quais, encaminham 
suas traduções em Libras a partir do conteúdo-fonte em 
português. Além dessas, a tradução intersemiótica é outro tipo 
que se faz presente no trabalho da equipe de video. Segundo 
Jakobson (2002: 114), a tradução intersemiótica ou 
transmutação, “é um tipo de tradução em que acontece uma 
interpretação de signos verbais por meio de signos de sistemas 
não-verbais”. Nesse sentido, Diniz (2001: 09-10) reitera que a 
tradução intersemiótica incluiria também a procura por 
equivalentes, ou seja, a busca, em um determinado sistema 
semiótico, de elementos cuja função se assemelhe à função de 
elementos de outro sistema de signos. (Souza, 2010, p.42) 
 
O autor faz uma análise exaustiva da retextualização do texto em Português na 
Libras. Analisa a tipologia textual como crucial para determinar a forma da tradução e 
observa as características dos textos escritos e textos orais como tendo um papel 
fundamental na forma do texto traduzido para a Libras, versão “oral” (sinalizada) da 
língua. A retextualização passa também pelos aspectos que vão determinar a “fidelidade” 
ao texto original (por Gile, 1995). As ferramentas que os “atores-tradutores” usam 
passam pela recriação do texto em Português, que no caso investigado, utiliza glosas do 
português e elementos da escrita de sinais para indicar a forma do texto na Libras. Os 
sinais são escolhidos a partir dos sinais da Libras, bem como, por neologismos utilizados 
pelos tradutores. Além disso, o uso do espaço apresenta um papel central no resultado da 
tradução composta na Libras. 
Como podemos observar o curso de Letras-LIBRAS tem sido um espaço profícuo 
para novas pesquisas. Recentemente, Avelar (2010) defendeu sua dissertação intitulada: “ 
A questão da padronização lingüística de sinais nos atores-tradutores surdos no curso de 
Letras-LIBRAS da UFSC: estudo descritivo e lexicográfico do sinal cultura” . A autora 
parte do conceito de variação linguistica presente na prática de tradução e identifica as 
dificuldades que tais tradutores enfrentam indicando caminhos alternativos para esta 
problemática. Avelar (2010, p.6) explicita melhor a pesquisa ao afirmar que: 
 
Como metodologia de trabalho, os atores-tradutores foram 
entrevistados sobre as dúvidas, sugestões e dificuldades em lidar 
com as variações na tradução de sinais para um curso virtual e, 
posteriormente, houve conversas informais com alunos do curso 
sobre o resultado das alterações propostas para o processo de 
tradução e padronização Linguística. 
 
Uma das significativas contribuições no trabalho de Avelar (2010) é a elaboração 
de um glossário técnico que tem como intuito viabilizar o projeto de padronização 
linguística nas traduções realizadas no curso de Letras-LIBRAS. 
 Nicoloso (2010) realizou em sua pesquisa uma investigação sobre as marcas de 
gênero na interpretação de língua de sinais brasileira. Nicoloso (2010, p. 9) foca a 
“análise de decisões tradutórias baseadas nas modalidades de tradução descritas por 
Aubert (1998) como: escolhas léxico-gramaticais, omissões, explicitações, modulações, 
transposições e tempo de interpretação tomados pelos ILS homens e pelas ILS mulheres, 
considerando seporventura acontecem de maneiras diferentes”. A partir destas análises a 
autora identificou que a maioria das ILS mulheres investigadas nesta pesquisa, na 
tentativa de esclarecer melhor a informação, utiliza-se mais da explicitação e da 
modulação que os ILS homens. Em contrapartida, a transposição e a soletração foram 
mais frequentes no processo tradutório realizado pelos ILS homens investigados, 
emitindo uma interpretação mais direta e literal. 
 As pesquisas mais recentes estão cada vez mais baseadas nos Estudos da 
Tradução. Com as produções cada vez mais consistentes aprofundando questões relativas 
à tradução e interpretação de Libras, o Programa de Pós-Graduação em Estudos da 
Tradução passa a realizar o Congresso Nacional de Pesquisas em Tradução e 
Interpretação da Libras. 
Este evento objetiva afirmar as pesquisas em tradução e interpretação da língua de 
sinais brasileira filiando-as estrategicamente ao campo dos Estudos de Tradução no 
Brasil. Neste sentido, o tema central deste Congresso foca nas pesquisas produzidas 
relativas a atuação dos intérpretes e tradutores de língua de sinais, profissionais que nos 
últimos anos, vem se destacando nos cenários acadêmicos em decorrência do crescimento 
no número de pesquisadores e acadêmicos surdos no espaço universitário. 
Por outro lado, apesar da visibilidade lingüística (Língua de Sinais – Português) 
que está presente na atuação do intérprete e do tradutor, a atenção dispensada a este 
profissional tem demandado um esforço para que o espaço acadêmico seja conquistado, 
exigindo produção de conhecimento na área. Este evento está em sua segunda edição. O 
objetivo é manter a periodicidade do mesmo de dois em dois anos para socializar estas 
produções. 
O evento, de certa forma, marca a invenção do profissional tradutor e intérprete 
de Libras no campo dos Estudos da Tradução. O tradutor intérprete de língua de sinais 
passa a contar com uma formação e produções de pesquisas neste campo de estudos que 
redefine suas práticas tradutórias. Os tradutores intérpretes de Libras passam a contar 
com a afiliação ao campo que está possibilitando estudar as práticas tradutórias sob 
diferentes perspectivas teóricas para a compreensão e qualificação da formação destes 
profissionais. O tripé pesquisa, prática tradutória e formação compõem o futuro dos 
tradutores e intérpretes de Libras no país. 
Ainda mais um elemento compõe este profissional no Brasil. Diferentemente dos 
tradutores e intérpretes de línguas orais, os TILS na década de noventa, não contavam 
ainda com associações, sindicatos, federações que pudessem orientar e auxiliar a melhor 
forma de absorver estes profissionais no mercado de trabalho. No entanto, no ano de 
2008, a FEBRAPILS – Federação Brasileira das Associações dos Profissionais 
Tradutores, Intérpretes e Guiaintérpretes de Língua de Sinais – é fundada. A 
FEBRAPILS marca a organização dos profissionais desta área em grupos com o objetivo 
de regular as funções de tradutor, intérprete e guiaintérprete de Libras. A federação conta 
com 15 associações filiadas. Esse processo de organização de associações vinculadas à 
uma federação demonstra a organização política de uma classe de profissionais. A 
constituição de organizações formais deste tipo são fundamentais a medida em que a 
profissão é regulamentada e reconhecida. Este processo institucionaliza os profissionais 
com representação política diante dos órgãos governamentais. 
Dessa forma, a partir de 2005, percebe-se que houve a profissionalização dos 
tradutores e intérpretes de Libras a partir de um conjunto de questões que foram 
determinando esse processo. Em síntese, a formação qualificada, a produção de 
pesquisas, a organização política institucional desses profissionais foi fundamental para o 
grupo obter reconhecimento e tornarem-se de fato profissionais. 
Todos estes processos apresentados anteriormente culminaram na regulamentação 
da profissão de TILS ocorrida em 07/07/2010. O parecer favorável apresentado pelo 
Senador Cristovam Buarque, relator do PL 4673 que regulamenta a profissão além de 
ressaltar a importância deste profissional, reconhece que as pessoas surdas terão maior 
participação social e garantidos seus direitos enquanto cidadãos se intermediados por um 
tradutor/intérprete. Por fim, a Deputada Maria Helena, relatora da matéria na Comissão 
de Trabalho, de Administração e de Serviço Público da Câmara dos Deputados conclui 
que: 
 
O profissional tradutor-intérprete de Libras – Língua Brasileira 
de Sinais - é figura capital na integração lingüística entre 
surdos e ouvintes. Sua atuação é, também, decisiva para que a 
pessoa surda tenha pleno acesso aos meios de comunicação, 
cultura e lazer. Esse aspecto da atuação profissional do 
tradutor-intérprete permite-nos relacionar sua atividade com a 
concretização de uma política pública de Estado elevada à 
condição de dever constitucional pela Carta de 1988, conforme 
se lê no inciso II do parágrafo 1º do art. 227 da CF. 
(Parecer_Relator_Sen.Cristovam Buarque_PL4673, 2010) 
 
3. Amanhã 
 
O futuro dos profissionais intérpretes é promissor, pois está delineada a sua 
identidade enquanto profissional tradutor e intérprete na sua relação com a Libras e o 
Português. A formação dos TILS passa a ser constituída no campo dos Estudos da 
Tradução aliada politicamente aos movimentos surdos e aos movimentos de TILS. O 
futuro promete produções de pesquisa neste campo de investigação que estarão 
consolidando as práticas tradutórias de e para a Libras no Brasil. Com este 
desenvolvimento, a formação dos TILS será mais sólida. Os alunos de bacharelado de 
cursos de Letras Libras que estão se formando para atuarem como tradutores intérpretes 
de Libras terão uma formação com base mais acadêmica aliada à prática que já 
desempenhavam. Além disso, a questão política que fundamenta as práticas tradutórias 
dos TILS estará permeando os cursos de formação destes profissionais no sentido de 
viabilizar traduções culturais. As traduções na Libras serão cada vez mais surdas (no 
sentido empregado nos Estudos Surdos), assim como as traduções para o português serão 
cada vez mais organizadas culturalmente na Língua Portuguesa. Ao mesmo tempo, os 
hibridismos resultantes dos contatos intensos nas comunidade bilíngües de Libras e 
Português estarão sendo discutidas e analisadas pelos tradutores intérpretes de Libras. As 
produções de conhecimento nesta área vão oferecer mais elementos para as práticas 
tradutórias de e para Libras, de e para a Língua Portuguesa. Os TILS terão mais 
ferramentas para se apropriarem e utilizarem na sua atuação profissional. 
Por fim, haverá uma mudança nas relações com o profissional tradutor intérprete 
de Libras, considerando sua qualificação e status tanto por parte dos seus “clientes” 
(surdos e ouvintes), quanto por parte dos próprios tradutores intérpretes, assim como por 
parte dos pesquisadores. 
 
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