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Capítulo 5- Esperança, Frustração e Aprendizado: A História da Nova República (1985- 1989) “A democracia não é branca nem preta: é cinza.” Introdução A chamada “Nova República” foi o período de 1985 a 1989. Apesar de ter sido pequena, a “Nova República” é lembrada como um conjunto de experiências malsucedidas de estabilização da inflação. Nesse período foram lançados três planos de tentativas de estabilização: 1-Plano Cruzado (1986); 2- Plano Bresser (1987); 3- Plano Verão (1989). Apesar desses três planos não terem conseguido estabilizar a inflação, colaboraram para o crescimento do produto. No total, o produto cresceu 24% nos dois primeiros anos. Mas isso não impediu que as contas fiscais e externas se deteriorassem. Porém, é preciso lembrar-se do contexto da economia brasileira. Esse período é anterior ao movimento das “Diretas Já”, sentimento generalizado de que a redemocratização seria capaz de resolver todos os problemas do país. Então esse processo de redemocratização foi um aprendizado. Esperança e Frustração: A Campanha “Diretas Já” e a Morte de Tancredo Neves Em 1984, após 20 anos de ditadura militar o movimento por eleições diretas ganhavam força. Para os manifestantes, o sentimento era que a democracia não traria apenas a liberdade de volta, mas o crescimento econômico e a distribuição de renda. Todos esperavam profundas mudanças. Porém, em 10 de abril de 1984, ocorre a primeira frustração. Essa frustração ocorreu porque nesse mesmo dia mais de 1 milhão de pessoas fizeram uma mobilização popular, mas apesar disso tudo não foi aprovada a emenda das diretas (que restabeleceria o direito ao voto popular para presidente de República)por falta de quorum. Mas a solução para isso já estava em andamento, pois um grupo de políticos que já sabiam da dificuldade que seria aprovar a emenda, já vinha se articulando para as eleições indiretas (feitas pelo Colégio Eleitoral). Foi assim, que em 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves foi eleito o primeiro presidente da República civil desde as eleições de 1960. Porém ele não chegou a tomar posse, pois morreu no dia 21 de abril de infecções generalizadas. Quem assumiu foi o seu vice, José Sarney. José Sarney era visto como o elo mais fraco da “Aliança Democrática”, então buscou apoio do povo com o Plano Cruzado. A Economia às Vésperas do Plano Cruzado Após passar por uma recessão de 1981-1983, a economia voltou a crescer em 1984, atingindo um crescimento de 5,4% do PIB, e em 1985, 7,8%. E diferente de períodos anteriores, onde a balança comercial passava de um déficit de US$2,8 bilhões e déficit operacional de 6,3% do PIB em 1980, em 1984 encontrava-se em um superávit de US$13,1 bilhões e déficit operacional de 3%. Esse resultado foi obtido nas contas externas em 1984 por quatro motivos: 1- Ao processo de amadurecimento dos investimentos em substituição de importações e em promoção de exportações, realizados o II PND; 2- À maxidesvalorização da moeda realizada em 1983; 3- À recessão verificada na economia brasileira nos anos anteriores; 4- À recuperação da economia americana em meados de 1980. Era um momento internacional favorável. O preço do petróleo estava caindo no mercado internacional (era um artigo muito importante importado pelo Brasil), o dólar se desvalorizava em relação às moedas européias e ao iene. Em 1985 já Haia uma menor restrição externa, juntamente com o crescimento da economia. Na primeira metade dos anos 1980, o crescimento do déficit público estava ligado ao comportamento da dívida interna e externa, devido ao peso dos encargos da dívida. Em função dos maiores juros internacionais, do processo de estatização da dívida e também da desvalorização de 1981 e 1983, a dívida externa do setor público passou de 14,9% do PIB em 1981, para 33,2% em 1984. E estava cada vez mais difícil rolar a dívida externa, em meio à crise de liquidez na América Latina. Logo, para recolher um mesmo imposto inflacionário sobre uma base menor, era preciso elevar a inflação. Durante 1983-1984, o governo promove um ajuste fiscal com base na queda de salários e do investimento público. Como resultado desses esforços fiscais, o déficit operacional foi reduzido em 1983-1984, mas voltou a subir em 1985. O problema mais visível era a inflação. Nos anos 1980, a inflação havia superado os 100%. Depois da maxidesvalorização em 1983, a inflação acelerou atingindo 224% em 1984. As medidas fiscais não tiveram impacto sobre a inflação. E mesmo as vésperas do Plano Cruzado à inflação continuava acelerando. O Debate sobre as Causas da Inflação no Brasil Diante das ineficácias das medidas tomadas na primeira metade dos anos 1980, a idéia de que o princípio da correção monetária introduzido pelo PAEG trazia dificuldade ao combate á inflação se fortaleceu. Porém não havia um consenso de como fazer a desindexação da economia. Mas haviam quatro propostas sendo discutidas: 1- “Pacto Social”, proposto por economistas do PMDB e da Unicamp. Defendiam que a inflação era resultado de uma disputa entre os diversos setores da sociedade por uma participação maior na renda nacional, o chamado “conflito distributivo”. Para os economistas do PMDB, esse “conflito distributivo” só seria resolvido numa economia democratizada, em um governo de coalizão, onde através de um acordo arbitrado ou promovido pelo governo, seria possível convencer empresários e trabalhadores de que a estabilização era um bem maior. Bastaria que todos concordassem em não aumentar seus preços por um período para dar fim a inflação; 2- “Choque Ortodoxo”, defendido por alguns economistas da FGV. Era baseado na teoria quantitativa da moeda. A inflação era causada por excesso de gasto público numa economia em que o Estado crescera demais. Então era preciso: severos cortes de gastos, aumento de receitas e tributos e corte brusco da emissão de moeda e de títulos da dívida. E ao mesmo tempo deveria ser promovida a desindexação da economia e a liberalização total de seus preços; 3- “Choque Heterodoxo” de Francisco Lopes, da PUC-Rio. Baseado em estudos econométricos, e que o componente inercial era a principal causa da inflação pelo ponto de vista estatístico. 4- “Reforma Monetária” de André Lara Resende e Pérsio Arida, ambos da PUC-Rio. Também baseado em modelo econométrico. Indicava que a influência sobre a inflação de variações no hiato do produto era muito pequena. Os economistas questionavam também a relevância do déficit público como causa da inflação. A ineficácia dos planos do FMI para estabilizar a economia brasileira era vista como a maior prova de que a inflação não era resultado de um sobreaquecimento da demanda em relação à oferta. Mas seria resultado de cláusulas de indexação que continuavam ao longo do tempo. Existiam dois grandes atrativos nas propostas dos economistas da PUC: 1- Prometia a estabilização dos preços sem adotar políticas restritivas de demanda. Seria até possível aumentar a oferta de moeda; 2- Caráter neutro do ponto de vista distributivo. Embora a desindexação não trouxesse a solução para a má distribuição de renda, a sua adoção colocaria salários e outras rendas em valores médios de equilíbrio. E depois, com o fim da inflação, melhoraria a situação dos mais pobres (que são os que mais sofrem com a inflação). Para o economista Francisco Lopes, a estabilização poderia ser alcançada através de um pacto de congelamento de preços. Já para Pérsio Arida e André Lara Resende, o congelamento “engessava” a economia, eliminando o mecanismo de autorregulação dos mercados via preço. A proposta alternativa (Proposta Larida) era desindexar a economia através da indução de uma moedaindexada que circularia paralelamente à moeda oficial (que era o Cruzeiro). Os planos de estabilização da Nova República seguiram a proposta de congelamento. O Plano Real seguiu a Proposta Larida, mas com algumas modificações. No debate pré-Plano Cruzado, há uma tese defendida por Franco sobre a estabilização vivida pela Alemanha em 1920. De acordo com esse autor, diante de uma grande restrição externa, em função da obrigatoriedade do pagamento de elevadas reparações de guerra, a taxa de câmbio alemã teria se tornado a chave para fechar as contas de Balanço de Pagamento. Nesse contexto a elevação da taxa de câmbio constituía-se em uma fonte de inflação de custos para a economia. Essas elevações se propagavam para diversos produtos da economia em função da indexação salarial existente. As desvalorizações eram cada vez mais elevadas. Diante desse quadro, a solução para o fim da inflação passava pela fixação da taxa de câmbio,mas também pela elevação dos salários reais e pela redução da restrição externa. Por essa perspectiva, a piora das contas ficais se deterioraria na Alemanha em conseqüência da inflação pelo chamado “efeito Tanzi”. Esse efeito ocorre quando se verifica um aumento do déficit público em função da perda real das receitas. Essa situação poderia se agravar pelo adiamento do pagamento de impostos por parte da população, quando não existe um sistema de multas eficientes com correção monetária. Mas as contas fiscais melhorariam, em conseqüência da recuperação do valor real das receitas do governo. Os questionamentos acerca do fracasso dos três planos da “Nova República” ajudariam a criar um bom plano de desindexação. O Plano real conseguir vencer a alta inflação brasileira, mas é importante entender que isso se deu em um contexto de liquidez internacional muito mais favorável. A Inflação Inercial De acordo com Francisco Lopes, a inércia inflacionária decorre da existência de contratos com cláusula de indexação. Numa economia indexada, a tendência inflacionária torna-se a própria inflação passada e pode ser agravada, ocasionalmente, por flutuações decorrentes de choques de oferta ou choques de demanda. O ponto fundamental é que essas possíveis flutuações são incorporadas a tendência. De acordo com Simonsen (1974), a taxa de inflação em um período (rt) possui três componentes: rt=at+brt-1+gt onde: at=componente de “inflação autônoma”, ou “componente de custos de inflação” ou “ componente dos choques de oferta”. Representa a influência de reajustes de preços decididos institucionalmente (com o salário mínimo), ou a influência resultante de variações de preços causadas por fatores de natureza acidental. brt-1= inércia da inflação. O parâmetro b constitui em que proporção a inflação de um período se transmite ao período seguinte. gt= “excesso de demanda”. Quando gt=0, o produto cresce à taxa de crescimento potencial da economia, sem que haja nenhum excesso de demanda. O ponto crucial da inércia inflacionária é a assincronia dos picos de renda no tempo, entre as diversas categorias da sociedade. E é isso que permite certa estabilidade inflacionária. A única posição sustentável, simultaneamente, para a economia como um todo é aquela em que os rendimentos se encontrassem todos em seus patamares médios. Esse era o ponto mais importante do programa de desindexação. Dois pontos finais merecem destaque: 1- A tentativa de taxonomia dos diagnósticos de inflação; 2- Advertência teórica quanto ao modelo de formação de expectativas subjacente à teoria da inflação inercial. O Plano Cruzado é geralmente referido como um plano “heterodoxo”, pois as teses ortodoxas vêem a inflação essencialmente como um resultado do excesso da demanda, provocado por um governo que gasta mais do que arrecada, com seus gastos financiados pela expansão monetária. As teses heterodoxas da inflação admitem a possibilidade teórica da inflação de demanda, mas que estamos frequentemente diante de inflação de custo. Diferente dos ortodoxos, há uma ênfase nos efeitos da inflação sobre a distribuição de renda e/ou em problemas estruturais da economia. Nessas condições a expansão monetária é vista como primordialmente acomodatícia, sendo um resultado da inflação e não a sua causa. Então cortes fiscais e monetários só aumentariam o sacrifício do produto sem eliminar a inflação. Primeiro é necessário que a inflação deixe de ser inercial, o que passa pela desindexação da economia, para depois a política fiscal e monetária se tornar eficientes. A ênfase na inconsistência da renda desejada entre os agentes e a negação da importância do desequilíbrio do setor público como causa última da inflação fazem do Plano Cruzado um plano heterodoxo. O segundo ponto a ser ressaltado é que se costuma associar inflação inercial com modelos de inflação com expectativas adaptativas. A identificação da teoria inercialista com a de expectativas adaptativas é recorrente, mas não precisa. Isso porque as cláusulas de indexação periódica dos contratos sofrem revisões, quando mudam as expectativas inflacionárias, permanecendo as mesmas apenas quando se espera que a inflação seja relativamente constante. Conclusão Em meio aos demais fatores, pode-se dizer que o processo de redemocratização e a esperança de que os novos governos conseguiriam compatibilizar crescimento, políticas anti inflacionárias eficazes e resgate da dívida criou na sociedade brasileira grandes expectativas de que a “Nova República” traria não apenas a liberdade política e civil, mas também um desenvolvimento econômico e social. Bibliografia GIAMBIAGI, Fábio |et al| Economia Brasileira Contemporânea (1945-2010). Rio de Janeiro: Elservier. 2011, p. 97 – 110.
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