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A Metafisica Realista de Sao Tomas de Aq

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMPOS DE ANDRADE 
CURSO DE FILOSOFIA 
 
 
 
HENRIQUE DA SILVA DEZIDÉRIO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A METAFÍSICA REALISTA DE SÃO TOMÁS DE AQUINO: O ATO DE SER 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CURITIBA 
2013
 
 
HENRIQUE DA SILVA DEZIDÉRIO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A METAFÍSICA REALISTA DE SÃO TOMÁS DE AQUINO: O ATO DE SER 
 
Monografia apresentada ao Curso de 
Licenciatura em Filosofia do Centro 
Universitário Campos de Andrade, como 
requisito parcial à obtenção do título de 
licenciado em Filosofia. 
 
Orientador: Prof. MSc. Ir. Irineu Letenski 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CURITIBA 
2013 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a Jesus, Rei e 
Senhor, Santíssimo Sacramento do altar, 
a quem seja dada a honra e a glória pelos 
séculos dos séculos. Ele, e somente Ele, 
é a razão de ser do tema deste trabalho. 
 
E a todos que buscam no pensamento 
filosófico e metafísico o motivo de suas 
existências de coração sincero. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
Agradeço em primeiro lugar a Deus, por ter me concedido adentrar no pensamento 
filosófico. Ele, o Puro Ato de Ser, a razão de nossa existência, que, simplesmente por 
amor, se entregou por nós na pessoa de Jesus e me escolheu para segui-Lo, não por 
meus méritos, mas por Sua misericórdia, é aquele que guia nossos pensamentos e 
os ilumina para contemplar a verdade. Igualmente agradeço à Virgem Maria que 
sempre intercedeu por mim e me acompanhou nessa caminhada. 
 
Agradeço à minha família: meus pais, Vicente e Terezinha, e meus irmãos, Felipe e 
Isabela, que sempre estiveram do meu lado, tanto nos bons quanto nos maus 
momentos. 
 
Agradeço ao meu orientador, Ir. Irineu Letenski, e aos professores que me ajudaram 
fornecendo textos de referência e tirando as principais dúvidas quanto ao tema deste 
trabalho: Monsenhor Diniz Mikosz, Padre Gilberto Aurélio Bordini e Prof.ª Teresinha 
Teixeira Colleone. 
 
Agradeço também aos professores de filosofia, em especial os que despertaram em 
mim o amor pelo pensamento filosófico e a busca pelo ser. Graças à sua ajuda, deixei 
de lado o pobre pensamento analítico, cartesiano e utilitarista para abraçar a filosofia 
do ser e a metafísica realista. 
 
Agradeço a todos que fizeram parte da minha vida nesses três anos de Filosofia. Meus 
formadores, Padre Chemin e Padre Régis e meu diretor espiritual, Padre Antônio 
Luciano. Também a todos os meus colegas, que sempre partilharam comigo alegrias 
e tristezas, em especial os colegas de turma: André, Danilo, Deivid, Leandro e Kerolim. 
 
Meu agradecimento especial ao Padre Mario Renato Barão Filho, bem como a todos 
os paroquianos de Nossa Senhora da Visitação. Foi seu apoio, sua ajuda e suas 
orações, principalmente nos momentos de maior dificuldade, alguns dos principais 
fatores que me permitiram terminar esta etapa filosófica da formação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porque é nele que temos a vida, o 
movimento e o ser. (At 17, 28) 
 
Vós, porém, éreis mais íntimo que o meu 
próprio íntimo e mais sublime que o ápice 
do meu ser! (Confissões, III, 6) 
 
 
RESUMO 
Esta monografia tem como objetivo geral o estudo da metafísica realista de São 
Tomás de Aquino, especialmente o ato de ser (actus essendi). Primeiramente, define-
se metafísica realista como interpretação da realidade absoluta do ser e também são 
estudadas as contribuições de filósofos anteriores a Tomás. Em seguida, faz-se o 
estudo aprofundado do ato de ser, em especial no que se refere à interpretação do 
ato como ser e não como substância, à distinção entre essência e existência, à relação 
entre Deus e os entes finitos e ao processo de explicitação do ser, em especial às 
propriedades transcendentais, à analogia, ao ato, à potência, à causalidade, aos graus 
de perfeição e à finalidade. Por fim, estuda-se o tomismo na modernidade, incluindo 
o abandono da metafísica do ato de ser pelos seguidores de Tomás na Idade Média, 
a opção da Igreja Católica pela filosofia de Tomás depois da encíclica Aeterni Patris 
de Leão XIII e a redescoberta da metafísica do ato de ser pelos filósofos tomistas do 
século XX, buscando-se estabelecer um diálogo da metafísica realista com a filosofia 
moderna. 
Palavras-chave: Tomás de Aquino; metafísica; ontologia; realismo; ato de ser. 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS 
AP Carta Encíclica Aeterni Patris (Leão XIII – 1879) 
At Livro bíblico dos Atos dos Apóstolos 
C.G. Summa Contra Gentiles (Suma Contra os Gentios) 
E.E. Opúsculo filosófico De Ente et Essentia (O Ente e a Essência) 
Ex Livro bíblico do Êxodo 
FR Carta Encíclica Fides et Ratio (João Paulo II – 1998) 
OT Decreto Optatam Totius (Concílio Vaticano II – 1965) 
S. Th. Summa Theologiae (Suma Teológica) 
 
 
 
SUMÁRIO 
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 8 
2 A METAFÍSICA REALISTA .................................................................................. 10 
2.1 O REALISMO DE SÃO TOMÁS DE AQUINO .................................................... 10 
2.2 ANTECEDENTES DA METAFÍSICA TOMISTA ................................................. 12 
2.2.1 Parmênides: o ser como princípio de todas as coisas .................................... 12 
2.2.2 Platão: a alteridade e a participação ............................................................... 14 
2.2.3 Aristóteles: a metafísica do ato ....................................................................... 15 
2.2.4 Al-Fārābī e Avicena: a distinção real entre essência e existência ................... 16 
3 O ATO DE SER ..................................................................................................... 18 
3.1 O CAMINHO DE SÃO TOMÁS .......................................................................... 18 
3.2 O ATO COMO SER ............................................................................................ 21 
3.3 ESSÊNCIA E EXISTÊNCIA ................................................................................ 23 
3.4 DEUS E OS ENTES FINITOS ............................................................................ 26 
3.5 A EXPLICITAÇÃO ONTOLÓGICA DO SER ...................................................... 30 
3.5.1 Processo de explicitação do ser ...................................................................... 30 
3.5.2 Propriedades transcendentais do ser .............................................................. 31 
3.6 A EXPLICITAÇÃO ÔNTICA DO SER ................................................................. 34 
3.6.1 Analogia .......................................................................................................... 34 
3.6.2 Substância e acidente ..................................................................................... 36 
3.6.3 Ato e potência: a causalidade ......................................................................... 38 
3.6.4 Graus de perfeição .......................................................................................... 39 
3.7 FINALIDADE ...................................................................................................... 40 
4 O TOMISMO NA MODERNIDADE ....................................................................... 43 
4.1 APÓS TOMÁS DE AQUINO ............................................................................... 43 
4.2 A OPÇÃO DA IGREJA CATÓLICA PELA METAFÍSICA REALISTA .................46 
4.3 O TOMISMO NO SÉCULO XX ........................................................................... 47 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 50 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 52 
APÊNDICE – CITAÇÕES DIFERENTES DAS NORMAS ........................................ 54 
8 
1 INTRODUÇÃO 
São Tomás de Aquino1 (1224/25-1274) é até hoje considerado como o maior 
pensador da Escolástica, corrente filosófica da Idade Média. Sua filosofia foi baseada 
na filosofia aristotélica mas, diferentemente de Aristóteles, Tomás mudou o enfoque 
de sua metafísica da substância para o ser. O ato de todas as coisas é o ser. Para se 
compreender a filosofia de Tomás de Aquino, é necessário estudar sobre o ato de ser 
(actus essendi em latim). O início do estudo da filosofia de Tomás de Aquino acontece 
pelo estudo do ser. 
Desde o Papa Leão XIII e a sua encíclica Aeterni Patris que a Igreja Católica 
declarou a metafísica realista de São Tomás de Aquino como filosofia segura para 
sua doutrina. A partir de então houve uma intenção de compreender no que consistiu 
essa filosofia. Mesmo na modernidade, o estudo da metafísica tomista se mostrou 
importante, principalmente porque não houve nenhum filósofo que a contrariasse. A 
Igreja, inclusive, propõe que essa filosofia se coloque numa posição de diálogo com a 
modernidade. 
O objetivo geral desta monografia é o estudo da metafísica realista de São 
Tomás de Aquino, compreendendo o que se entende por ato de ser. Para tanto, ele 
se desdobra em três objetivos específicos: (1) Compreender o que é metafísica 
realista, distinguindo-a de metafísica essencialista e estudando os pensadores que 
colaboraram para seu desenvolvimento; (2) Estudar o ato de ser, especificando-o na 
distinção real entre essência e existência, na relação entre Deus e as criaturas e em 
seu processo de explicitação; (3) Entender a importância do estudo do tomismo na 
modernidade. 
No primeiro capítulo do trabalho, será feita uma definição de metafísica realista 
a partir da definição dos dicionários e do que é o ser para Tomás de Aquino. Em 
seguida, serão estudadas as colaborações de alguns filósofos anteriores a Tomás no 
que diz respeito à metafísica realista: Parmênides e o ser como princípio de todas as 
coisas, Platão e sua definição de participação, Aristóteles e a metafísica do ato, al-
Fārābī e Avicena com a distinção real entre essência e existência. 
 
1
 Optou-se, neste trabalho, a usar a nomenclatura “São Tomás” e não “Santo Tomás”. Isso para 
obedecer à regra de nomes de santos que diz que o santo é nomeado “Santo...” se seu nome iniciar 
com vogal e “São...” se o nome iniciar com consoante. O ano de seu nascimento é incerto. 
9 
O segundo capítulo estudará de forma esquemática o ato de ser, concebido por 
São Tomás de Aquino. Será visto o caminho que Tomás fez na sua definição de Deus 
e que permitiu perceber a primazia do ser em sua filosofia. Em seguida, será 
especificada a diferença entre Tomás e Aristóteles na metafísica do ato e como Tomás 
definiu que o ato é, não a substância, mas o ser. Definir-se-á então a distinção real 
entre essência e existência que se iniciou com os filósofos árabes e ganhou força na 
metafísica realista de Tomás. Como consequência dessa distinção, será estudada a 
relação entre Deus e os entes finitos. Por fim, far-se-á o estudo do processo de 
explicitação do ser: primeiro a explicitação ontológica com as propriedades 
transcendentais do ser, depois a explicitação ôntica e suas formas (analogia, 
substância e acidente, ato e potência e causalidade e os graus de perfeição) para, 
enfim, falar da finalidade, que é uma explicitação do ser tanto ontológica como ôntica. 
O terceiro capítulo fará um pequeno estudo sobre a importância do tomismo 
para a modernidade. Primeiro, com base nos estudos de Étienne Gilson, conferir-se-
á que os seguidores de Tomás prescindiram do estudo do ato de ser em suas 
filosofias, reduzindo o tomismo a uma espécie de aristotelismo. Depois será 
constatada a opção feita pela Igreja Católica pela metafísica realista de São Tomás 
de Aquino para, finalmente, estudar-se brevemente o trabalho dos filósofos que 
estudaram o tomismo no século XX, em especial no seu estudo do ato de ser, tirando 
o tomismo daquela concepção errônea de “aristotelismo cristão”. 
A metodologia utilizada será da pesquisa bibliográfica em obras do autor: a 
Suma Teológica, a Suma Contra os Gentios e o opúsculo filosófico O Ente e a 
Essência. Os principais comentadores utilizados serão Étienne Gilson, Aniceto 
Molinaro, Battista Mondin, Régis Jolivet, H. D. Gardeil e o historiador da filosofia 
Johannes Hirschberger, entre outros. 
 
10 
2 A METAFÍSICA REALISTA 
2.1 O REALISMO DE SÃO TOMÁS DE AQUINO 
Realismo, para Ferrater Mora (2001), possui quatro definições. A primeira, 
científica, está relacionada a ater-se aos fatos tais como são. A segunda fala da 
posição tomada em relação aos universais, ou seja, a crença na existência real dos 
universais e não apenas dos entes singulares. A terceira é o realismo que se 
contrapõe ao idealismo, tanto na Teoria do Conhecimento quanto na metafísica e a 
quarta trata do realismo em filosofia da ciência que se contrapõe ao instrumentalismo, 
em relação à natureza e função das teorias científicas. 
Aqui, detenha-se em primeiro lugar no realismo de acordo com a terceira 
definição. Ferrater Mora (2001, p. 2472) diferencia aqui o realismo gnosiológico do 
realismo metafísico: 
O realismo gnosiológico às vezes se confunde com o realismo metafísico, 
mas essa confusão não é necessária; com efeito, pode-se ser realista 
gnosiológico e não ser realista metafísico, ou vice-versa. O realismo 
gnosiológico afirma que o conhecimento é possível sem necessidade de 
supor (como fazem os idealistas) que a consciência impõe à realidade – em 
ordem a seu conhecimento – certos conceitos ou categorias a priori; o que 
importa no conhecimento é o dado e de maneira alguma o posto (pela 
consciência ou pelo sujeito). O realismo metafísico afirma que as coisas 
existem fora e independentemente da consciência ou do sujeito. Como se vê, 
o realismo gnosiológico se ocupa unicamente do modo de conhecer; o 
metafísico, do modo de ser do real. 
Tratar-se-á aqui do modo de ser do real, ou seja, do realismo metafísico. No 
entanto, dentro do realismo metafísico, há ainda outras divisões existentes, ligadas ao 
segundo conceito de Ferrater Mora (2001) quanto à existência dos universais, 
contrária ao nominalismo. A posição de São Tomás de Aquino neste ponto é a do 
realismo moderado, ou seja, aquele que acredita que o universal está fora da mente, 
mas não como uma coisa entre outras e sim como res concepta, “coisa concebida”, e 
está na mente, não somente na mente como um simples nome, segundo afirma o 
nominalismo, mas também na mente como conceptio mentis, “concepção mental”, ou 
seja, “conceito”. Embora não esteja fora da mente, o universal tem um fundamentum 
in re, está fundado na coisa, na realidade, porque senão ele seria apenas mera 
“imaginação”, simples “posição” de algo. 
Essa definição realista dos universais, contrária ao nominalismo, influencia a 
metafísica porque o ser, fundamental em toda a filosofia tomista, em muitas 
11 
concepções, é visto como simples conceito, submisso à essência das coisas. Tomás, 
contudo, defende que o ser é real e que é o que tem primazia sobre tudo na filosofia. 
Segundo Gilson (1962, pp. 52-53): 
Se algum filósofo ou teólogo, ainda que se considere tomista, ensinar uma 
metafísica na qual a noção de ser é concebível separadamente da noção de 
existência atual, êle pode ficar certo de que, desde o primeiro momento de 
sua especulação,já se separa de Tomás de Aquino. Tais filósofos existem. 
E acreditam que se tomarmos o ser como um nome (ens ut nomen), êste 
prescinde da existência atual. E noutras palavras, definindo o significado da 
palavra ser, êsses metafísicos excluem intencionalmente tôda consideração 
do ato de ser. 
Tomás, no entanto, vai defender que o ser “designa um ato” (C.G. I, XXII, 4)2 e 
é “a actualidade de tôda forma ou natureza” (S. Th. I, III, IV)3. Há, na Suma Teológica 
(I, IV, I, 3r)4, um resumo esclarecedor da definição tomista sobre isso: “O ser em si é 
mais perfeito de todos por actualizar a todos; pois, nenhum ser é actual senão 
enquanto existente. Por onde, o ser em si é o que actualiza todos os outros e, mesmo, 
as próprias formas”. 
Essa concepção de ser indica que, para Tomás, o ser não é um detalhe nas 
coisas ou um acidente ou, muito menos, um simples nome como Gilson exemplificou 
acima, mas é real. E, mais do que real, é a realidade em si. É, acabou-se de ver, a 
atualidade de todas as coisas, ou seja, o ato de tudo o que é. Adiante ficará clara a 
definição do Aquinate5 a respeito do ato. 
Pode-se compreender então no que consiste a metafísica realista de São 
Tomás. Não é o simples realismo metafísico que Ferrater Mora definiu, apesar de 
estar contido nele. Tampouco é, não obstante esteja intimamente relacionado, o 
realismo em relação aos universais, visto que o ser não é um universal ou um gênero 
porque “nada lhe é estranho ou extrínseco, nada se lhe pode ajuntar de fora, nada 
pode se dar de separado e de independente dele” (MOLINARO, 2002, p. 57). 
Este realismo é, como já se constatou, relacionado ao ser: o ser é real, ou 
melhor, é a maior realidade existente. Em poucas palavras, a metafísica de Tomás é 
chamada realista porque compreende o ser como sendo real. A metafísica que 
 
2
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 60. Quando houver citações diferentes das normas, as citações 
segundo as normas serão disponibilizadas em notas de rodapé. Cf. apêndice. 
3
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 26 
4
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 34 
5
 No decorrer do trabalho, para evitar repetições ao se referir a São Tomás de Aquino, serão usados 
alguns dos nomes como ele ficou conhecido: Aquinate, Doutor Angélico, etc. 
12 
compreende o ser como nome, a que Gilson se referiu, será chamada, com os termos 
do mesmo autor, de metafísica essencialista, ou essencialismo, porque, ao se 
conceber o ser como um simples nome, ele se reduz “à realidade da sua essência” 
(GILSON, 1962, p. 53). 
Doravante, ao se referir à metafísica realista, entenda-se o realismo de Tomás. 
Vale notar que não há realismo tão absoluto como o tomista no que diz respeito à sua 
concepção de ser, mas houve antecedentes históricos, que serão estudados agora 
para compreender melhor as raízes desta metafísica. 
2.2 ANTECEDENTES DA METAFÍSICA TOMISTA 
Antes de abordar a metafísica de São Tomás de Aquino, convém falar 
brevemente dos filósofos que desenvolveram os temas usados em sua filosofia. 
Convém também lembrar que a filosofia tomista foi original, mas recebeu influências 
de vários filósofos. Algo em comum entre esses filósofos é que cada um desenvolveu 
um tema abordado por Tomás na sua metafísica; porém, com algumas modificações. 
Falar-se-á primeiramente de Parmênides e o ser como princípio de todas as 
coisas e depois de Platão com a sua interpretação sobre alteridade e participação. Em 
seguida, serão abordados o conceito de metafísica do ato e noção de causalidade em 
Aristóteles para, por fim, ver-se o início da distinção real entre essência e existência 
concebida por al-Fārābī e Avicena. 
2.2.1 Parmênides: o ser como princípio de todas as coisas 
 Todos os filósofos pré-socráticos tiveram em comum a busca pela arché 
(ἀρχή), ou seja, o princípio de todas as coisas. Esse princípio, segundo Molinaro 
(2002, p. 17), seria aquilo de que todas as coisas são constituídas, aquilo a partir de 
que originariamente derivam, aquilo em que se resolvem em última análise e aquilo 
sobre que estão e subsistem. Ele deve ser a unidade que unifica e mantém a 
multiplicidade, a imutabilidade que se torna o princípio do devir e, consequentemente 
à definição anterior, o eterno que não está sujeito ao tempo que o devir exige. Em 
poucas palavras, portanto, o princípio deve ser o uno no múltiplo, o imutável no devir 
e o eterno no tempo. 
Muitos pré-socráticos (Tales, Anaxímenes, Empédocles, etc.) viam o princípio 
como sendo uma determinação particular e limitada (água, ar, terra, fogo, os quatro 
13 
elementos). Anaximandro, contudo, percebeu que o princípio não poderia ser uma 
determinação porque tornar-se-ia apenas uma coisa entre tantas e propôs o mesmo 
como uma indeterminação (ἄπειρoν – ápeiron), que nega toda determinação, 
compreendendo a todas sem reduzir-se a nenhuma. Heráclito, em seguida, vai propor 
como princípio o devir, ou seja, o processo de geração e corrupção das coisas, já que 
a indeterminação não poderia explicar esse processo, mas sendo o devir o princípio, 
seria o que permaneceria enquanto faria com que as coisas se gerassem e se 
corrompessem. O devir seria o uno, imutável e eterno em meio às demais coisas 
(MOLINARO, 2002). 
Nesse contexto que surge a filosofia de Parmênides. O devir, de fato, pode ser 
explicado como princípio eterno e imutável de todas as coisas, mas não explicaria o 
fato do próprio devir existir. O devir exerce sua função enquanto é e, por isso, o 
princípio precisa ser aquilo pelo qual o devir é. O princípio, então, não é o devir, mas 
o ser (MOLINARO, 2002, p. 22). 
É esclarecedora a explicação de Reale e Antiseri (2007a, p. 51, grifos do autor) 
neste ponto: 
No contexto do discurso de Parmênides, “ser” e “não ser” são tomados em 
seu significado integral e unívoco: o ser é o positivo puro e o não ser é o 
negativo puro, um é o absoluto contraditório do outro. Mas como Parmênides 
justifica esse seu grande princípio? A argumentação é muito simples: tudo 
aquilo que alguém pensa e diz, é. Não se pode pensar (e, portanto, dizer) 
senão pensando (e, portanto, dizendo) aquilo que é. Pensar o nada significa 
não pensar absolutamente e dizer o nada significa não dizer nada. Por isso, 
o nada é impensável e indizível. Assim, pensar e ser coincidem. 
Entende-se, portanto, o pensamento como manifestação do ser. Isso implica 
(MOLINARO, 2002, p. 22): 
a) Só o ser pode exercer a função de princípio porque não é possível ir 
além do ser. Ultrapassar o ser significa cair no nada, no não-ser, que 
não é. 
b) O ser não pode ser outra coisa senão ser. O outro diferente do ser é 
o nada, essencialmente. 
c) O ser, por causa disso, não pode devir (ser gerado, se corromper ou 
perecer). É imperecível e eterno. 
d) A lei, a lógica do ser é o princípio de não contradição: o ser é e não 
pode não ser, o não-ser não é e não pode ser, é impossível que seja. 
14 
e) Consequentemente, o ser na sua totalidade é necessidade de ser e 
permanência no ser. 
Neste caso, a multiplicidade implicaria a existência do outro diverso do ser ou, 
em outras palavras, dizer que o não-ser é. Da mesma forma, o devir implicaria a 
passagem do ser ao não-ser e vice-versa e, portanto, a multiplicidade e o devir 
estariam contrariando o ser. Parmênides não vai negar a multiplicidade e o devir 
porque negá-los seria negar a experiência. Ele vai dizer, ao contrário, que não estão 
contra o ser, mas também não vai solucionar este problema (MOLINARO, 2002). 
2.2.2 Platão: a alteridade e a participação 
Platão empenhou-se no problema acima exposto sobre Parmênides: como 
pode o outro ser sem cessar de ser o outro ou o ser ser outro sem cessar de ser. 
Numa palavra: o problema da alteridade ou da multiplicidade. Deve-se examinar como 
aquilo que verdadeiramente é, como definiu Parmênides, ao mesmo tempo é aquilo 
quemultiplamente é (MOLINARO, 2002, p. 26). 
Hirschberger (1957, p. 97-98) vai sintetizar da seguinte forma a colaboração 
platônica, como tentativa de conciliar a filosofia de Heráclito e de Parmênides: 
Se compreendemos bem o segrêdo da comunidade das Idéias (χoινωνία τῶν 
γενῶν), então chegaremos a entender que não é exata a alternativa: ou 
Heráclito ou os eleatas [Parmênides e seus discípulos Zenão e Melisso], ou 
unidade ou multiplicidade, ou identidade ou sòmente diversidade. Mas a 
simultaneidade é o verdadeiro: cada alternativa considerou um aspecto 
verdadeiro do ser, pois coexistem a unidade e a multiplicidade, a identidade 
e a variedade, o ser e o não-ser. E a idéia de participação é a chave 
conducente a uma síntese que é como a ponte a ligar os dois extremos. Leva 
em conta a identidade, sem perder a variedade de vista. 
Isto é, Platão vai solucionar o aparente embate entre os pré-socráticos com a 
ideia de participação. Segundo Molinaro (2002, p. 27), a solução platônica consiste 
em afirmar o ser que aparece absolutamente e que se contrapõe absolutamente ao 
não-ser absoluto. Mas nessa linha absoluta aparece um ser certo e determinado que 
necessariamente é, mas que é aquele ser e não é outro ser certo e determinado. Por 
exemplo: a árvore é, e é árvore, mas não é a pedra. Neste ponto, percebe-se a 
presença da alteridade, e não da contraditoriedade. A oposição de contradição 
acontece no plano absoluto: absoluto ser e absoluto não-ser. A oposição de alteridade 
ou diversidade acontece no plano relativo: ser outro e não ser outro. 
15 
Esta constituição do outro implica dois tipos de relação: primeiro com o ser e o 
não-ser absolutos e segundo com os outros entes. A estrutura da relação que o outro 
implica com o ser absoluto e com o absoluto não-ser é vista, como já se afirmou, na 
figura metafísica de participação, contributo de Platão que se configura de vários 
modos (MOLINARO, 2002, p. 29): 
a) Participação como tal (µέθεξις – metessi), um “ter parte em”, tomar 
parte do ser (partem capere); 
b) Imitação ou mimesi (µίµησις), donde resulta a semelhança; 
c) Comunhão ou koinonia (χoινωνία), que surge entre o que participa e 
aquilo do que participa; 
d) Presença ou parusía (παρoυσία): pela presença do ser os entes são 
(presença, presentificação, apresentação do ser). 
2.2.3 Aristóteles: a metafísica do ato 
Aristóteles, ao refletir sobre o devir em uma perspectiva diferente de Heráclito, 
buscando, assim como Platão com a multiplicidade, uma resposta para o problema do 
devir não respondido por Parmênides, desenvolveu uma metafísica do ato, que foi 
fundamental para a metafísica realista de São Tomás. 
Na linha de raciocínio exposta por Molinaro (2002, p. 35), Aristóteles vai 
percebendo que o devir é um processo de um ente ou sobre um ente. Percebe-se, 
então, que há no ente deveniente, isto é, que sofre o devir, um substrato idêntico, 
estável, permanente e imutável e que sem o mesmo não se dá o devir. O devir acaba 
ocorrendo numa base permanente e imóvel. 
O devir seria então a passagem do substrato idêntico de um estado de privação 
a um estado de forma. Por exemplo: passagem do não-branco ao branco. Esse estado 
de privação não é nada, mas uma realidade: é o ser em potência, a respeito do qual 
o estado de forma correlato é o ser em ato. Toda privação é privação referente àquela 
forma e toda potência é potência referente àquele ato. O devir não é, portanto, uma 
passagem do não-ser absoluto, mas de um certo qual não-ser, que é tal referente à 
forma ou ao ato, ao qual termina (MOLINARO, 2002, p. 36). 
Vale notar, contudo, que o devir, mesmo com a introdução do substrato, 
continua sendo uma passagem do não-ser ao ser. A potencialidade não só não é o 
ato, mas também não pode tornar-se ato por si mesma: isso seria gerar o ser a partir 
16 
do nada. Exige-se, então, a introdução de um quarto elemento: a causa, um princípio 
que já é em ato. É a tese do primado do ato: nada passa da potência ao ato senão em 
virtude de um ente em ato. Aristóteles (1969, p. 200) vai dizer: 
Pois do que existe em potência nasce o que existe em ato pela ação de um 
ser existente em ato, p. ex. o homem do homem, o músico pelo músico; há 
sempre um primeiro motor, que já existe em ato. [...] tudo quanto é produzido 
o é de alguma coisa e por alguma coisa, e é da mesma espécie desta 
(Metafísica IX, 8). 
Como o devir só acontece em virtude de um outro ente em ato, a causa, se 
essa causa for causada por outra e essa outra por outra e assim sucessivamente, 
chega-se à conclusão, para evitar-se regredir ao infinito, da necessidade de existir 
uma causa primeira, um ente que é só ato, Ato Puro, Deus, isento de privações, imóvel 
e imutável em sentido absoluto (MOLINARO, 2002, p. 37). 
2.2.4 Al-Fārābī e Avicena: a distinção real entre essência e existência 
O filósofo árabe Avicena, seguindo al-Fārābī, concebeu a distinção real entre 
essência e existência, que é fundamental para compreender a noção tomista de ser. 
Segundo Gilson (1962, p. 23, grifos do autor): 
Tomás sempre teve sua própria noção de ser. [...] Ela foi preparada com 
certeza pela Metafísica de Avicena, e, através desta, pela de Alfarabi. 
Sustentavam êstes dois filósofos a tese de que a existência é um 
complemento da substância que, por não estar incluso na sua essência, lhe 
sobrevém, por assim dizer, como um acidente. Sòmente Deus não recebe a 
existência como complemento de sua essência. Deus não tem sua própria 
existência, êle é sua própria existência. 
É possível compreender, segundo essa citação, que, para al-Fārābī e Avicena, 
a existência seria então um acidente da essência. Iskandar (2011, p. 82, grifo nosso), 
contudo, vai discordar dessa afirmação: “Há que se destacar que [...] houve uma 
importante contribuição aviceniana para a época quando ele [Avicena] propôs a 
distinção real entre essência e existência, negando que a existência seja um simples 
acidente da essência”. Abbagnano (2012, p. 421) vai acrescentar que a redução de 
existência como um simples acidente da essência foi obra do filósofo judeu Moisés 
Maimônides, mas quem deu a melhor expressão a essa distinção foi Tomás de 
Aquino. 
Seguindo, portanto, a definição de Abbagnano, definir-se-á essência e 
existência quando se iniciar o estudo da metafísica realista de São Tomás de Aquino. 
17 
Basta saber por ora que a distinção real entre os termos já foi concebida pelos filósofos 
árabes. 
Como consideração final deste capítulo, afirma-se que a filosofia tomista foi 
original, como se verá mais tarde. Contudo, é útil perceber as influências que Tomás 
recebeu dos filósofos anteriores para poder compreender melhor sua filosofia. De 
Parmênides, Tomás definiu que o ser é o princípio de todas as coisas, mas deixou de 
lado a univocidade. De Platão, Tomás herdou o conceito de participação, adaptando-
o à metafísica do ato. De Aristóteles, Tomás continuou a metafísica do ato, contudo 
definiu como o ato de todas as coisas não a substância, mas o ser. De Avicena, Tomás 
retomou a distinção real entre essência e existência, desconsiderando a interpretação 
de Maimônides de existência como um acidente da essência. O fundamento da 
metafísica de Tomás derivou-se dessas influências, mas com uma originalidade 
própria ligada à sua concepção de ato de ser. 
 
 
18 
3 O ATO DE SER 
A metafísica realista de São Tomás de Aquino se destaca por ser a metafísica 
do ato de ser. O primeiro capítulo já mostrou que essa metafísica considera o ser 
como sendo real, ou melhor, a maior realidade existente. Aqui compreender-se-á no 
que consiste essa metafísica. Segundo Mondin (2010, p. 219): 
Causa universalíssima de tudo o que existe, tanto para santo Tomás como 
para Parmênides, é o ser, não a água, o ar, o fogo, o bem, ou a substância. 
O ser é a causa universal de todas as coisas, porqueé o receptáculo de toda 
perfeição e a fonte última de toda realidade. 
Não se pode falar em filosofia tomista, portanto, sem se referir ao ato de ser. A 
metafísica do ato de ser traspassa toda a filosofia tomista, de modo que tudo o que 
São Tomás definiu em sua filosofia está ligado ao ato de ser. 
3.1 O CAMINHO DE SÃO TOMÁS 
Não se sabe como Tomás chegou à apreensão de suas noções fundamentais 
em Filosofia. Parece que ele sempre teve sua própria noção de ser. Houve uma 
espécie de preparação por al-Fārābī, Avicena e Maimônides, como já foi visto no 
capítulo anterior, mas, segundo Gilson (1962, p. 24), “a noção pròpriamente tomista 
de ser aparece pela primeira vez nos trabalhos de São Tomás de Aquino”. Em vão se 
procuraria também a justificação de sua noção de ser por ser uma noção primeira, 
com princípios indemonstráveis. 
É possível, contudo, seguir passo a passo o modo pessoal de abordar a noção 
de ser de Tomás que está no âmago da sua concepção metafísica de realidade. Isso 
acontece na Suma Contra os Gentios e na Suma Teológica, quando Tomás pretende 
falar da essência de Deus. Na Suma Contra os Gentios, esse caminho aparece no 
primeiro livro, do capítulo XIV ao XXVII, enquanto na Suma Teológica todo o caminho 
está na prima pars, questão III6. Aqui se seguirá o texto da Suma Contra os Gentios, 
citando quando for necessário a Suma Teológica. 
Tomás seguiu o caminho de eliminar da natureza divina, sucessivamente, todos 
os tipos de composição. O caminho da eliminação se fez necessário porque não se 
poderia chegar à noção de Deus pela afirmação, como já havia percebido o Pseudo-
 
6
 Quanto às divisões das obras de São Tomás de Aquino, cf. apêndice. 
19 
Dionísio Areopagita e a sua chamada teologia “apofática”, que afirmava que a melhor 
maneira de falar de Deus era “negando-lhe todo atributo, à medida que ele é superior 
a todos” (REALE; ANTISERI, 2007a, p. 421). Aqui o Doutor Angélico vai afirmar: 
Como, porém, na consideração da substância divina, não podemos 
apreender sua qüididade, como se fosse um gênero; nem tampouco podemos 
apreender sua distinção de outras coisas por diferentes afirmativas, é 
necessário apreendê-la por diferenças negativas (C.G. I, XIV, 3).7 
De fato, o caminho trilhado por Tomás é o de negar a Deus toda determinação. 
No capítulo XV do primeiro livro da Suma Contra os Gentios, ele definirá que Deus é 
eterno, não está sujeito à temporalidade. O capítulo XVI dirá que em Deus não há 
potência, que Deus é puro ato. O capítulo XVII ensinará que em Deus não há matéria 
e o XVIII que não há composição. No capítulo XIX, Tomás conclui que não há nada 
de violento ou estranho à natureza divina. No longo capítulo XX ele diz que Deus não 
é corpo e no capítulo XXI ele vai dizer que Deus é sua essência ou quididade. 
E aqui se percebe onde se encontra a noção de ser de Tomás. O caminho 
trilhado na Suma Teológica é mais curto, porém também se detém na definição que 
Deus é sua essência, no artigo III. Gilson (1962, p. 25) explica que alguns filósofos 
cristãos como, por exemplo, Santo Agostinho, já haviam concluído isso, em especial 
da definição que o próprio Deus faz de si mesmo na Sagrada Escritura, ao se dirigir a 
Moisés: “Deus respondeu a Moisés: ‘EU SOU AQUELE QUE SOU’. E ajuntou: ‘Eis 
como responderás aos israelitas: (Aquele que se chama) EU SOU envia-me para junto 
de vós’” (Ex 3, 14).8 
Tomás defende que Deus é sua essência com este exemplo: ao se definir 
Sócrates, tomamos como sua essência a humanidade. Sócrates, porém, não é 
humanidade, mas humanidade mais alguma coisa que o faz ser Sócrates, a chamada 
matéria assinalada, ou individualizante. Nos termos tomistas, “As essências [...] são 
individualizadas pela matéria assinalada deste ou daquele indivíduo” (C.G. I, XXI, 3)9. 
O mesmo, contudo, não acontece com Deus: “A essência divina existe singularmente 
 
7
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 46. 
8
 BÍBLIA, 2006, p. 103. Vale a pena aqui uma rápida observação: alguns filósofos poderiam dizer que 
a filosofia cristã não é filosofia de fato por não conter “pureza racional”, mas estar baseada na revelação 
cristã. Apesar de não concordar com essa posição, não é objetivo deste trabalho defender uma posição 
contrária, mas é necessário observar que a filosofia em geral se baseia no uso da razão, não sendo, 
contudo, as premissas do pensamento filosófico necessariamente racionais. 
9
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 58. 
20 
por si mesma e em si mesma é individualizada” (C.G. I, XXI, 3)10. Explica-se, então, o 
que vários filósofos já haviam dito sobre Deus ser sua essência. 
O caminho de Tomás, contudo, foi novo ao passar para o capítulo XXII, ou o 
artigo IV da S. Th. I, III, seguindo não o caminho da essência, mas o do ser. O Aquinate 
afirma que em Deus são idênticos “ser atual” e “essência” ou, em outros termos, que, 
em Deus, essência e existência são a mesma coisa. Argumenta-se que, se a essência 
de Deus não fosse o seu “ser” (“esse”), que é “o nome de um ato”, Deus não seria por 
sua própria essência: seria por participação ao verdadeiro “esse” graças ao qual ele 
existe. Ele identifica Deus, portanto, com o ato sem o qual nenhuma essência existiria. 
Logo, ao nomear Deus, definimo-lo como o Puro Ato de Ser, o Ipsum Esse 
Subsistens11, ou seja, o Puro ato existencial, aquilo cuja essência toda é ser. Pode-se 
exprimir o caminho de Tomás pela seguinte sequência lógica: se a filosofia toma a 
existência atual como objeto de importância para a reflexão filosófica, indagar-se-á se 
há algo de misterioso no fato de que exista alguma coisa em vez de nada. Se alguma 
coisa é, ser é tão importante que se apresenta como a condição necessária para tudo 
o mais. O que é mais importante, torna-se aquilo que Deus é. Logo, Deus é puramente 
Ser12. Daí se conclui que, em Deus, a essência não é de modo algum distinta da 
existência, isto é, do Puro Ato de Ser. Afirmar que Deus é somente Ser é negar-lhe 
tudo o que, sendo uma determinação do ser, é uma negação do ser, de acordo com 
o caminho da eliminação escolhido por Tomás. Qualquer outra afirmação a respeito 
de Deus conduziria a uma ideia errada a respeito do que seja Deus (GILSON, 1962). 
Aqui se nota o primado do ser para São Tomás de Aquino: o ser é a perfeição 
de todas as coisas, então Deus é puramente Ser. Para Tomás, o ser é o princípio de 
todas as coisas. É a partir do ser que as coisas são ou, nas palavras do Aquinate, 
“toda coisa é porque tem ser.” (C.G. I, XXII, 6)13. Tomás adotou um novo conceito de 
ser, e daí concluiu a sua definição de Deus: Deus é o Puro Ato de Ser e, em Deus, 
aquilo que nos demais entes se denomina essência é idêntico ao Ato de Ser ou, em 
outras palavras, Ato de Ser e essência, em Deus, são a mesma coisa. 
 
10
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 58. 
11
 Ser por si subsistente, numa tradução literal do latim. 
12
 Obs.: Neste trabalho, a palavra “Ser” iniciada com maiúscula designa o Ser divino, subsistente em si 
(Ipsum Esse Subsistens), enquanto a palavra “ser” com letra minúscula designa o ser transcendental, 
determinado pela essência nos entes finitos. 
13
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 60. 
21 
3.2 O ATO COMO SER 
Quando se estudou a filosofia aristotélica no capítulo anterior, percebeu-se a 
cooperação de Aristóteles ao falar do processo do devir como passagem do substrato 
da potência ao ato pela ação da causa. Aristóteles havia concebido com isso a tese 
do primado do ato, onde disse que nada fica em ato senão em virtude de um ente que 
já está em ato (MOLINARO, 2002, p. 37). 
A metafísica de São Tomás, segundo Molinaro (2002, p. 38), herdou da 
metafísica aristotélica a tese do primado do ato: ambas são metafísicas do ato 
(ἐνέργεια – enérgeia, actus). O que as diferenciauma da outra é que, para Aristóteles, 
o ato é a forma, a determinação, a substância, enquanto que para Tomás, o ato é o 
ser, a pura e total atualidade do ser. Em outra obra, Molinaro (2000, p. 26) vai afirmar: 
Tanto sob o aspecto de enérgeia como sob o de entelécheia, ato é a palavra 
e o conceito-chave da metafísica de Aristóteles, o qual não ultrapassou, 
porém, a identificação do ato como forma. A ultrapassagem do ato como 
forma para o ato como ser é contribuição de santo Tomás, sob inspiração 
parmenideana [sic]. O sinal essencial e inegavelmente decisivo dessa 
ultrapassagem é que o Ato puro aristotélico se transforma e se eleva a Ipsum 
Esse Subsistens. 
Assim como para Parmênides, o ser para São Tomás é a causa universalíssima 
de tudo o que existe, porque é o receptáculo de toda perfeição e a fonte última de toda 
a realidade. Não é simples presença nem perfeição mínima nem uma barca que 
abrange todo o universo, o que o Aquinate chamou de ens commune, conceito donde 
parte a sua investigação metafísica e que é vago, indeterminado e que não preenche 
as coisas da perfeição que possuem. Adentrando no conceito superficial de ser, o 
esse commune, Tomás chegou a descobrir e explicar o conceito profundo de ser, de 
onde o conceito superficial recebe substância e valor (MONDIN, 2010, p. 219-220). 
Ao se falar de Deus ou dos entes finitos, emprega-se sempre a palavra ato. Ser 
é o “ato de todos os atos”. No senso comum, ato significa ação, operação, mas isso 
seria apenas um ato “segundo”. Antes desse tipo de ato há outros atos dos quais os 
segundos decorrem, os “atos primeiros”, que só podem ser conhecidos a partir de 
seus efeitos, ou seja, as operações, os “atos segundos”. Podemos dizer que a alma 
humana, por exemplo, além de ser uma forma, é também um ato primeiro. Chamando 
ser ou “esse” a um ato, diz-se que é um “ato primeiro”, ou seja, um princípio que se 
conhece sua existência com certeza pelo efeito que causa. Ao contrário das ciências 
empíricas e da filosofia da natureza, a metafísica, que tem como objeto próprio a 
22 
consideração do ser enquanto ser, leva sua investigação além das operações 
realizadas pelas substâncias (ciências empíricas) e dos atos primeiros, das formas, 
causas dessas operações (filosofia da natureza) para chegar, começando e 
terminando, na investigação do ser (GILSON, 1962). 
É esclarecedora a explicação de Lauand (1993, p. 31, grifo do autor) a respeito 
do ato de ser: 
E o que significa ser? Ser é, antes de mais nada, atividade, ato. Todas as 
coisas, todos os entes, são antes de mais nada, “aqueles que exercem o ato 
de ser” [...]. Mas justamente por constituir a primeira atividade, a mais 
fundamental – e “a mais maravilhosa”, dirá Gilson [...] –, o ser escapa a 
qualquer definição: “O ato de ser não pode ser definido”. 
Já foi citado no primeiro capítulo o que seria o ser para São Tomás: o ser 
“designa um ato” (C.G. I, XXII, 4)14 e é “a actualidade de tôda forma ou natureza” (S. 
Th. I, III, IV)15, “O ser em si é [o] mais perfeito de todos por actualizar a todos; pois, 
nenhum ser é actual senão enquanto existente. Por onde, o ser em si é o que actualiza 
todos os outros e, mesmo, as próprias formas”. (S. Th. I, IV, I, 3r)16. Considerado 
absolutamente, “é infinito, porque infinitas coisas podem participar dele de diversos 
modos” (C.G. I, XLIII, 6)17. Mondin (2010, p. 221-222) resume: 
O ser é, verdadeiramente, a atualidade de qualquer forma ou natureza, o ato 
primeiro e último de qualquer ente. [...] O ser está, pois, no fundo da realidade 
do ente e sustenta-a em todos os seus momentos, modalidades e formas. O 
ser é, verdadeiramente, a perfeição absoluta, a raiz de todas as perfeições. 
[...] enquanto nenhuma outra perfeição e nenhum outro valor são concebíveis 
como efetivos, isto é, como reais, sem que participem do ser, o ser, ao 
contrário, pode ser concebido mesmo que não participe de outras perfeições: 
é concebível em si mesmo, ut esse ipsum subsistens. Enfim, o ser, como 
afirma Tomás de Aquino, é o que há de mais íntimo e profundo nas coisas. 
[...] Na trama constitutiva do ente, no seu desenvolvimento, na sua conclusão, 
tudo procede do ser: o ente forma-se graças ao ser, parte do ser e retorna ao 
ser. [...] Trata-se de um conceito novo, totalmente desconhecido dos filósofos 
gregos e não levado em conta pelos filósofos modernos. 
Em síntese, nota-se que “essas características se condensam na afirmação da 
atualidade pura e absoluta do ser” (MOLINARO, 2002, p. 63). 
Falando-se agora da divisão do ser em potência e ato, Tomás segue Aristóteles 
ao dizer que essa divisão ocorre em qualquer tipo de composição. A mais geral de 
todas as composições é a composição de ato e potência. Ao dizer que Deus é Puro 
 
14
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 60. 
15
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 26. 
16
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 34. 
17
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 88. 
23 
Ato, tende-se a reduzir a noção de ser à noção de ato, que parece mais elevada. Este 
é um perigo que se deve evitar: imaginar que o ato é uma noção mais elevada que o 
ser. Deve-se, portanto, destacar que não há noção mais ampla e fundamental que a 
noção de ser. O primeiro princípio é ser, e não ato. Não se reduz a noção de ser à 
noção de ato, mas a noção de ato à noção de ser. Que é ato? Ato é ser. Ser Puro Ato 
é ser Puro Ser, é ser o próprio Deus. Ato é redutível a Deus e não Deus a ato (GILSON, 
1962). 
Em todos os entes finitos há sempre um grau de potência, já que, sempre 
finitos, algo lhes limita a atualidade. Potência é a aptidão a vir-a-ser e se mede pela 
distância que separa aquilo que o ente é daquilo que ele pode vir a ser: a composição 
de ato e potência é simplesmente a composição de um ente tomado em nível mais 
baixo de atualidade com uma perfeição que pode elevá-lo a mais alto nível de 
atualidade. Como quer que se considere a realidade, a inteligência nunca sai da noção 
de ser (GILSON, 1962, p. 47). 
Em poucas palavras, o ser é o que há de mais perfeito em todos os entes, o 
que coloca todos em ato. O ato de ser, portanto, não é uma operação ou faculdade 
operativa, mas algo de fixo e estável no ser finito, é o que de mais perfeito há no ente 
finito. A potência é uma aptidão a vir-a-ser, algo que pode elevar a perfeição do ente. 
3.3 ESSÊNCIA E EXISTÊNCIA 
Como já foi visto no capítulo anterior, a distinção real entre essência e 
existência iniciou-se com al-Fārābī e Avicena e, de acordo com Abbagnano (2012, p. 
421), “quem deu à doutrina sua melhor expressão foi Tomás de Aquino”. De fato, a 
distinção entre essência e existência presente na metafísica tomista é fundamental 
para entender a concepção tomista de Deus. 
Quando se falou do caminho de Tomás, percebeu-se que ele foi mais além no 
capítulo XXII do livro I da Suma Contra os Gentios, quando, ao definir a essência de 
Deus, ele concluiu que, em Deus, essência e existência são a mesma coisa: Deus é 
o Puro Ato de Ser. O ato de ser é a energia metafísica que faz um ente existir, ou seja, 
a própria existência do ente. Então, em Deus, a essência e a existência, ou ato de ser, 
são a mesma coisa. 
Na Suma Teológica, prima pars, questão III, ao fazer o mesmo caminho 
descrito acima, Tomás de Aquino tem um objetivo: provar que Deus é simples, isto é, 
24 
que em Deus não há nenhum tipo de composição. No artigo VII, ele faz a conclusão 
da simplicidade de Deus: não há nem composição de matéria e forma, de potência e 
ato e de essência e existência. 
Para chegar à simplicidade de Deus, a última composição eliminada foi a de 
essência e existência. Por conseguinte, a primeira composição encontrada nas 
criaturas é a composição de essência e existência. Com exceção de Deus, todo ser 
se compõe pelo menos “daquilo que” ele é, isto é, sua essência, e do ato existencial 
em virtude do que ele é, ouseja, do seu ato de ser. À questão “qual é, no tomismo, o 
sentido da célebre composição de essência e existência?” a resposta direta é: isso 
significa que, como Deus é o seu próprio Ato de Ser, nenhum outro ente pode ser o 
seu próprio ato de ser (GILSON, 1962). 
A existência ou ato de ser, como se viu, é a energia metafísica que faz um ente 
finito existir. A distinção real entre essência e existência é defendida por Tomás da 
seguinte forma: 
Ora, toda essência ou quididade pode ser inteligida sem que algo seja 
inteligido do seu ser. Posso, de fato, inteligir o que é o homem ou a fênix e, 
no entanto, ignorar se tem ser na natureza das coisas. Portanto, é claro que 
o ser é outro em relação à essência ou quididade (E.E. IV, 52)18. 
Compreende-se, então, que a essência difere da existência porque é possível 
conceber algo sem necessariamente comprovar sua existência. 
Daí se conclui o que é essência: a definição da coisa. Tomás usa dois termos 
iniciais para definir: quididade, ou seja, “aquilo pelo qual algo tem o ser algo” e 
natureza, segundo Boécio, “aquilo que pode ser captado pelo intelecto” (E.E. I, 5)19. 
Ele prefere usar, no entanto, um terceiro termo, essência, que abrange os dois 
anteriores, e quer significar “que, por ela e nela, o ente tem o ser” (E.E. I, 6)20. 
Aqui compreende-se o que é o ente: aquilo cujo ato é ser. A definição pode ficar 
mais clara ao comparar com a definição de vivente: aquilo cujo ato é viver. Ato seria 
aqui a atualidade pura, a perfeição máxima: o ser é o ato de tudo o que é em tudo o 
que é, assim como o viver é o ato de tudo o que vive em tudo o que vive (MOLINARO, 
2002, p. 56). “O ente não é o ser, mas uma determinação do ser, um isso ou um aquilo 
do ser, o ser deste ou daquele modo” (MOLINARO, 2000, p. 8). A determinação, 
 
18
 TOMÁS DE AQUINO, 2013, p. 38-39. 
19
 TOMÁS DE AQUINO, 2013, p. 19-20. 
20
 TOMÁS DE AQUINO, 2013, p. 20. 
25 
então, seria a essência. O ato de ser, a atualidade pura e a perfeição máxima do ente, 
seria a existência. 
A causa da finitude nos entes é a essência ou, em outras palavras, o que faz 
um ente ser finito é aquilo que se acrescenta ao seu ato de ser. Em todos os entes, 
com exceção de Deus, o ato de ser é limitado, determinado e restringido pela sua 
essência. Portanto, o ente finito pode ser concebido como um ente cujo ato existencial 
é limitado pela própria essência que ele possui. O efeito primordial da essência é 
restringir o ato de ser às dimensões determinadas pela definição daquilo que a 
essência é. Isso quer dizer que a essência de um ente finito, fazendo-o ser aquilo que 
ele é, impede-o de ser o próprio Deus ou, em outras palavras, a essência de um ente 
finito restringe o ato de ser, impedindo-o de ser o Puro Ato de Ser. Como 
consequência, com exceção de Deus, todos os entes têm a essência distinta da 
existência e nada há de mais perfeito que o próprio ato pelo qual eles são. O ato de 
ser é o ato de todos os atos, a perfeição de todas as perfeições (GILSON, 1962). 
Há muita resistência neste pensamento, mas ele é inseparável da metafísica 
realista. Como Deus é o Puro Ato de Ser, toda participação na perfeição da natureza 
divina é, antes de mais nada, uma participação daquele ato supremo. Nota-se aqui 
que a essência não aperfeiçoa o ato de ser, antes o “desaperfeiçoa”. Esta é uma 
filosofia difícil de entender por se apoiar em uma noção extremamente simples, mas 
principalmente porque entende que a quididade, a essência, objeto próprio da 
inteligência humana, é algo negativo. Mas é possível compreender que essa 
negatividade acontece em relação ao Puro Ato de Ser, Deus. Como são as essências 
participações do ser cada uma, há nelas uma perfeição também, apesar de haver a 
imperfeição de ser apenas uma parte do ser. Há graus de perfeição nos entes, como 
se verá adiante: é melhor ser pedra que ser nada, melhor ser planta que pedra, ser 
animal que planta, ser homem que animal irracional, ser anjo que homem e 
infinitamente melhor ser o Puro Ato de Ser. É sempre bom para um ente finito ser o 
que ele é, se bem que em comparação com o Puro Ser, é uma imperfeição para 
qualquer essência ser somente isto ou aquilo (GILSON, 1962). 
26 
3.4 DEUS E OS ENTES FINITOS 
Antes de explanar sobre o ser, precisa-se compreender o que são os entes 
finitos em sua relação com o Puro Ato de Ser, Deus. Essa necessidade se mostra 
para compreender o processo de explicitação do ser, que será estudado em seguida. 
Primeiramente, segundo Gilson (1962), deve-se entender que, para Tomás, 
“ser” e “ser infinito” são a mesma coisa, já que “infinito” é um termo negativo que quer 
eliminar toda noção de finitude, o que se aplica a Deus. Como já se afirmou, em Deus, 
o Ato de Ser é aquilo que, nos outros entes, chama-se essência e, nos entes finitos, 
a essência é o que limita seu ato de ser, impedindo-os de ser o Puro Ato de Ser. 
Como também já se afirmou, diferentemente de Deus, os entes finitos possuem 
composição, pelo menos, de essência e existência, isto é, uma estrutura metafísica. 
Segundo Gilson (1962), todo ato de ser põe o ente na condição de existência atual, 
fora do nada, mas ao mesmo tempo, o ser não é o mesmo no Ato de Ser Subsistente 
em Si, Deus, e nas substâncias que o têm distinto de sua essência. Pode-se definir o 
ente finito com precisão como sendo uma essência dotada de um ato de ser, 
lembrando sempre que a existência é mais perfeita que a essência. 
Avicena talvez tenha chegado mais longe que Tomás ao afirmar que Deus não 
tem essência. É provável que o Aquinate tenha se sentido tentado a seguir esse 
raciocínio, mas nunca fez essa afirmação em suas obras, apesar também de não 
condená-la. A essência de algo é a resposta à pergunta “Que é isso?”. Dizer que Deus 
não tem essência é responder “Nada” à pergunta “O que é Deus?”, o que é impossível. 
Essa definição até pode ser válida já que se considera essência como algo distinto do 
Puro Ato de existência atual de Deus, como aquilo que limita o ato de ser. A filosofia, 
contudo, precisa da linguagem para se manifestar e, por isso, parece que Tomás não 
quer que se perca o contato com a realidade finita, mesmo ao se falar de Deus. 
(GILSON, 1962). 
Falando-se da essência, não é possível, afirma Gilson (1962, p. 52), do ponto 
de vista tomista, conceber a noção de ser separadamente da noção de existência 
atual, como faz a metafísica essencialista, “cuja tese decisiva é a da redutibilidade do 
real à essência” (BRANDÃO, 1994, p. 45, grifo do autor). O ente finito tem causas, 
que são seus elementos constitutivos: a essência e o ato de ser. Não são dois seres, 
mas juntos são a composição de um mesmo ser. Não se deve resumir a metafísica a 
uma consideração da essência, mas é notável a importância da essência na 
27 
composição do ente finito: ela é o próprio sujeito que recebe o ato em virtude do qual 
determinado ser existe. Sem a essência, não haveria o ente finito. 
O ato de ser, por sua vez, não é uma operação ou faculdade operativa, mas 
algo de fixo e estável no ser finito. O ato de ser de um indivíduo não é o mesmo de 
outro. Ele não se identifica com o ser que ele atualiza, devendo haver a essência para 
recebê-lo, porque, se não houver sujeito, ele mesmo não poderá existir. O ato de ser 
dos entes finitos não é subsistente em si, como o Puro Ato de Ser. O que torna as 
coisas diferentes não é o fato de serem, mas de serem o que são. Em outras palavras, 
ainda que cada coisa tenha o seu ato de ser individual, este não a faz diferente das 
outras coisas, mas sim as essências ou naturezas que a fazem adquirir o ser por 
modos diferentes. Isso não quer dizer que a essência tem primazia sobre o ato de ser, 
mas apenas que a determinação é importante na constituição do ente finito (GILSON, 
1962). 
Na filosofia tomista, o ato de ser é oque há de mais íntimo em todas as coisas 
e, para que algo tenha ser, é necessário que Deus esteja sempre atuando sobre o 
ente. Vale a pena fixar aqui este ponto: para Tomás, o que há de mais íntimo e 
profundo em qualquer coisa é seu ato de ser, ou seja, o ato pelo qual a coisa é. Esse 
é o tomismo, no sentido filosófico da palavra. 
Partindo-se das criaturas para chegar a Deus, Gilson (1962, p. 69) levanta 
algumas perguntas. Por que existe o mundo criado? Por que, se existe o Primeiro 
Motor, a Causa não causada ou o Ser necessário, existiriam os movidos, as causas 
causadas ou os seres contingentes? Usando os termos da filosofia tomista, pode-se 
perguntar: se existe o Ato Puro de Ser, por que existiriam os entes finitos? 
A resposta é que convém por natureza a qualquer ato comunicar-se tanto 
quanto possível, e a natureza divina é puramente ato. Deus, porque é o Puro Ato de 
Ser, tende naturalmente a agir, a operar e a comunicar-se por meio da criação. Se 
tudo age desde que está em ato, a natureza criadora divina é facilmente compreendida 
através da noção de Puro Ato de Ser. É conveniente que um Deus que é Puro Ato 
deva agir (GILSON, 1962, p. 75). 
Como ser criado é receber o ser, apenas as substâncias são propriamente 
criadas, já que somente elas possuem por si mesmas um ato de ser. A substância 
toda é criada de uma só vez. O primeiro ponto, contudo, é o ser: o ato pelo qual o ente 
é. A primeira das criaturas é o ser. Ser é o princípio formal com respeito a tudo aquilo 
que há em alguma coisa (GILSON, 1962). 
28 
Dado que o ato de ser é o efeito próprio de Deus e a mais íntima e profunda 
realidade das criaturas, conclui-se que Deus opera intimamente em todas as coisas. 
Gilson (1962, p. 81) afirma: 
Esta doutrina está exposta na Summa theologiae, I, 8, I, na resposta à 
pergunta: “Está Deus em tôdas as coisas?” E a resposta é “sim”, porque “uma 
coisa é, enquanto opera. Ora, Deus opera em tôdas as coisas. Portanto, Deus 
está em tôdas as coisas”. Ao justificar sua conclusão, – Tomás invoca o 
princípio de que “Deus está presente em tôdas as coisas, não, naturalmente, 
como parte da essência delas, nem como um acidente, e sim como um agente 
está presente naquilo em que age.” Acabamos de ver agora que “uma vez 
que Deus é o seu próprio ser por essência, o ser criado deve ser Seu efeito 
próprio.” E Deus não causa sêres finitos sòmente no momento de sua criação, 
“mas, enquanto a criatura continua a existir tem que ser mantida no ser; assim 
como a luz é produzida no ar pelo sol por quanto tempo o ar permanece 
iluminado. Destarte, enquanto uma coisa tem ser, Deus está presente nela, 
de acôrdo com seu modo de ser. Mas ser (esse) é o que há de mais interior 
em cada coisa e o que há de mais fundamentalmente presente em tôdas as 
coisas, como acima ficou demonstrado. Assim, é necessário que Deus esteja 
em tôdas as coisas e da maneira mais íntima. 
Deus está presente em todas as coisas não como parte de sua essência nem 
como acidente, mas como um agente está presente naquilo que age. Deus não causa 
seres finitos somente no momento da criação, mas enquanto a criatura existe, deve 
ser mantida no ser. Enquanto uma coisa tem ser, Deus está presente nela. Essa é 
uma presença de Deus por sua essência, como causa eficiente. É a doutrina tomista 
da cooperação imediata de Deus com as criaturas. Para negar isso, só negando o 
tomismo, ou seja, negando que o ato de ser é mais íntimo à criatura que sua essência. 
Esse é o lugar central da noção de esse na concepção tomista da relação das criaturas 
com Deus. 
A relação de Deus e das criaturas é uma relação de participação, derivado do 
latim partem capere21, conceito fundamental para entender a analogia do ser, que será 
estudada mais adiante. Já se falou no primeiro capítulo de participação na concepção 
platônica de metessi, mimesi, koinonia e parusía. Esse conceito se desenvolveu no 
neoplatonismo e, através de Santo Agostinho, atingiu sua formulação clássica em São 
Tomás de Aquino, que o sintetizou na doutrina aristotélica do ato e da potência e, 
englobando nele a noção de causalidade eficiente e exemplar, elevou-o à expressão 
essencial da relação criacional (MOLINARO, 2000, p. 104). 
Há dois aspectos de que se deve falar da participação: o primeiro se refere à 
relação de criação, de derivação e de dependência do ente relativamente ao Puro Ato 
 
21
 Tomar parte, numa tradução literal. 
29 
de Ser; o segundo estabelece o significado do ente por participação, pondo em ato a 
referência ao Puro Ato de Ser. Deus, o Puro Ato de Ser, seria o Ser por essência, 
aquilo cuja essência é Ser e o ente por participação, o ente finito, significa o ser cuja 
essência ou determinação é a participação no Ser. Molinaro (2000, p. 105), depois 
dessas definições, acrescenta: 
Nesse segundo significado, torna-se clara a identidade entre participação e 
essência ou determinação. Essa clareza exige que se elimine do conceito de 
participação a representação de um ente ou de uma essência pressupostos 
ao ato de participar e, portanto, tais que recebam o ato de ser do Ser por 
essência. O ente enquanto ser determinado é participante no mesmo sentido 
no qual é determinado: a sua participação no ser é a sua determinação ou 
essência. Da mesma clareza segue-se ainda que o verbo “participar” deve 
ser entendido em sentido intransitivo, equivalente a “determinar-se” do ser no 
ente no tocante tanto à sua essência quanto à sua atualidade. 
Então, em poucas palavras, a participação do ente finito no Ser é a sua própria 
essência. Mondin (1982, p. 175) faz uma simples comparação: a participação do ente 
finito no Ser não se dá como a participação das fatias num bolo. Se fosse dessa 
maneira, os entes finitos e Deus teriam a mesma natureza e substância. Os entes 
finitos participam do Ser como a cópia participa do modelo. É uma participação por 
semelhança, não por essência. Com essa doutrina, Tomás evita o perigo do 
panteísmo, sem diminuir as criaturas. O ser delas ainda permanece divino; de uma 
divindade não essencial, mas imitativa. 
Aqui se pode compreender a originalidade da teoria tomista de ser. Gardeil 
(1967, p. 123-124) vai explicar: 
Quando se observa de perto esta análise do ser, pela distinção real do par 
essência-existência, assinala-se uma transformação profunda da ontologia 
de Aristóteles por S. Tomás. E como o mostrou Gilson na sua obra sôbre 
L’être et l’essence, isso dá à metafísica do Doutor angélico uma significação 
bastante original que nem sempre foi bem percebida, mesmo em sua Escola. 
A tendência mais constante dos filósofos, a história o prova, foi sempre a de 
considerar o ser mais como uma natureza, como uma essência. [...] Ora, se 
retornarmos a S. Tomás, veremos [...] que a existência é ato, ou como a 
perfeição última do ser e que o próprio Deus é o Ipsum esse subsistens. O 
ser é, pois, para êle, e tanto em Deus como nas criaturas, existência por 
excelência. [...] Em sentido bastante diferente, e é preciso sublinhá-lo, do que 
toma a palavra em certas filosofias contemporâneas, a metafísica de S. 
Tomás pode ser considerada existencialista. E, a êste título, em face dos 
antigos racionalismos, escolásticos ou modernos, apresenta-se como um 
pensamento notàvelmente original. 
Em outras palavras, a originalidade de Tomás consiste em afirmar a distinção 
real entre essência e existência e não considerar o ser como uma essência, mas como 
30 
a existência determinada pela essência e como algo mais perfeito que ela, o que não 
foi considerado pelos filósofos posteriores, tanto escolásticos como modernos. 
3.5 A EXPLICITAÇÃO ONTOLÓGICA DO SER 
3.5.1 Processo de explicitação do ser 
Como a metafísica realista é o processo de explicitação do ser e sua 
manifestação, é necessário explanar brevemente sobre esse processo. Paraisso far-
se-á uso da explicação de Molinaro (2002, p. 69-70). 
Esse processo advém segundo os elementos que o ser manifesta de si mesmo. 
Estes elementos são, como já se estudou: o ser enquanto tal, no seu absoluto e 
transcendentalidade e a determinação ou essência ou participação. Uma vez que a 
determinação é interior ao ser, ela se apresenta necessariamente em síntese com o 
ser: esta síntese de ser e determinação é o ente. Impõe-se, pois, a necessidade de 
ter bem distintas a consideração do ser enquanto tal e a consideração do ente, 
distinção essa que no fundo é a mesma distinção real entre essência e existência da 
qual já se tratou. 
Dessa distinção resulta o duplo plano, no qual advém – deve advir – a 
explicitação do ser e da sua manifestação: 
a) O plano da explicitação transcendental ou ontológica, que ilumina as 
propriedades transcendentais do ser; estas são: o uno, o verdadeiro, 
o bom e o belo; 
b) O plano da explicitação categorial ou determinada ou ôntica, que 
ilumina as propriedades categoriais do ente, ou seja, do ser 
determinado ou participado, do ser segundo a essência, com o qual 
se apresenta em síntese; estas são: a analogia, a substância e o 
acidente, o ato e a potência, os graus de perfeição. 
A explicitação seria então a exposição das propriedades do ser no plano 
ontológico e no ôntico, obtendo-se respectivamente em cada um as propriedades 
transcendentais e categoriais do ser. 
31 
3.5.2 Propriedades transcendentais do ser 
Para falar das propriedades transcendentais do ser, é necessário primeiro 
precisar o significado de transcendental no contexto tomista, principalmente para 
evitar confusões com outras definições feitas por outros filósofos, como Kant e 
Heidegger. 
O transcendental é uma propriedade na qual se exprime a transcendentalidade 
do ser. Isso significa que os transcendentais se estendem quanto e como se estende 
o ser: a realidade do ser é a sua realidade. Por isso, vale para eles o caráter da 
inseparabilidade e da identidade com o ser: é quanto está contido em seu caráter 
transcendental. Mas, enquanto os transcendentais expressam o ser, explicitando-o, 
vale para eles ao mesmo tempo o caráter da distinção do ser, justamente porque 
enriquecem-no, expõem-no e assim expandem-no. Eles não designam realidades 
diversas, mas a mesma realidade – o ser – na qual a luz do pensamento, acesa pelo 
próprio manifestar-se do ser, distingue os momentos de tal manifestação. Nesse 
sentido deve-se dizer que eles têm um fundamento real (MOLINARO, 2002, p. 73-74). 
“[...] nenhum dêsses transcendentais acrescenta nada de novo ao ser, pois são 
apenas aspectos do ser considerado a luzes diversas” (HIRSCHBERGER, 1959, p. 
132). 
Os transcendentais são: unidade, verdade e bondade (unum, verum e bonum). 
Idênticos e distintos, eles são conversíveis com o próprio ser. Deve-se, de fato, afirmar 
que o ser é a unidade, a verdade e a bondade; que a unidade, a verdade e a bondade 
são o ser; que a unidade é a verdade e a bondade; que a bondade é a unidade e a 
verdade; que a verdade é a unidade e a bondade. Em geral, nos transcendentais se 
verifica a auto expressão e a autodistinção do ser mesmo: o ser se desenvolve em si 
mesmo e o resultado imediato deste autodesenvolvimento é a distinção da unidade, 
da verdade e da bondade na sua própria identidade. O ser, nas suas propriedades 
transcendentais, mostra a sua identidade na distinção ou, o que é o mesmo, a sua 
distinção na identidade (MOLINARO, 2002, p. 74). 
Dizer que o ser é unum (uno) expressa sua indivisibilidade: 
A unidade não acrescenta nada ao ser, mas, só a negação da divisão; pois, 
ser uno não é senão ser indiviso; e daqui resulta claramente, que a unidade 
é conversível no ser. Pois, todo ser ou é simples ou é composto. Aquêle é 
indiviso, actual e potencialmente. Êste não recebe o ser enquanto as suas 
partes estiverem divididas. Mas, só depois que elas o constituem e compõem. 
Por onde, é manifesto que o ser de qualquer coisa consiste na sua indivisão; 
32 
e daí vem que todo ente conserva o seu ser na medida em que conserva a 
unidade. (S. Th. I, XI, I)22 
Isso quer dizer que a indivisão é necessária a um ente para ele se manter no 
ser. Molinaro (2002, p. 76) explica que a unidade, como indivisão, significa negação 
da negação do ser e da oposição do ser. A oposição máxima e absoluta do ser é a 
negação do ser, o não-ser, que se opõe contraditoriamente à afirmação do ser. A 
unidade, portanto, exprime a oposição contraditória do ser à própria negação; em 
outras palavras, o ser exclui, torna impossível o não-ser como sua negação. O ser é 
o puro afirmativo, é impossível que haja oposição ao ser e o ser é também identidade, 
isto é, não é outra coisa que o ser. Vale a pena relembrar que essa propriedade, assim 
como toda propriedade transcendental do ser, está no plano do ser e não da 
determinação, ou seja, da essência, relembrando da distinção real entre essência e 
existência e que a determinação do ser não é todo o ser. No plano do ser (ontológico) 
encontramos a unidade, no plano da determinação do ser (ôntico), a multiplicidade. 
Quando se fala da unidade do ser, fala-se que não há realidade que não seja 
tal para o ser, que não seja ser. Ao se falar no ser como verdade e bondade, faz-se 
uma separação entre ser e espírito (alma, intelecção). O espírito também se separa 
em inteligência e vontade e ambas são os modos com os quais o espírito supera a 
separação e estabelece a sua identificação com o ser. A verdade seria, então, a 
presença do ser na inteligência enquanto a bondade seria a presença da vontade no 
ser. O ser se conforma à inteligência no processo da verdade, formando como um 
semicírculo, e a vontade se conforma ao ser no processo da bondade, formando outro 
semicírculo e fechando o ciclo. Onde termina a interiorização do ser por parte da 
inteligência começa a realização da vontade no ser (MOLINARO, 2002, p. 80). 
Ao se afirmar que o ser é verum (verdadeiro), afirma-se, portanto, que ele é 
inteligível, racional. É conhecível na medida em que “é”, na medida em que está em 
ato. É verdadeiro porque participa do ser, segundo Tomás: “A verdade está nas 
cousas e no intelecto [...]. Mas, a verdade existente nas cousas converte-se 
substancialmente com o ser; a que, porém, existe no intelecto converte-se com o ser” 
(S. Th. I, XVI, III, 1r)23. 
Isso quer dizer, como a verdade é propriedade transcendental do ser, que toda 
a verdade é ser e que todo o ser é verdade. Pode-se falar da verdade lógica, ou seja, 
 
22
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 80. 
23
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 168. 
33 
da própria inteligência como manifestação do ente, e se realiza o ente como 
adequação24 e conformidade com ela: é a verdade na ordem do conhecimento. Mas 
também aqui surge a verdade ôntica, ou seja, a inteligibilidade do ente, que exprime 
a afinidade e a intimidade do ente à inteligência. Neste sentido, o ente é medida da 
verdade da inteligência: é a verdade do ente, no qual se funda a verdade lógica da 
inteligência, o seu conteúdo (MOLINARO, 2002, p. 83-84). 
Dizer que o ser é bonum (bom) é o mesmo que dizer que ele é desejável, 
amável. “O dito – o bem é o que todos os sêres desejam – não significa que cada bem 
seja desejado por todos, mas, que tudo o que é desejado tem o caráter de bem” (S. 
Th. I, VI, II, 2r)25, ou seja, o bem é aquilo que pode ser desejado. Tem-se aqui uma 
noção de valor. Bem e ser são noções convertíveis. Assim como com a verdade, todo 
o ser é bondade e toda bondade é ser. 
Nesse sentido transcendental, a vontade é vontade de ser enquanto é vontade 
que é o ser mesmo: o ser quer ser, o ser tem-se e se mantém inteiramente em si 
mesmo. A vontade é o ser que se possui perfeitamente e permanece nessa posse. Se 
a verdade exprime a necessidade do ser de ser junto desi, a bondade exprime a 
permanência perfeita do ser em posse de si, a posse de si completa. De fato, o ser é 
desde sempre e absolutamente o volível que é atualmente querido, o amável que é 
atualmente amado, o desejável que é atualmente desejado, e assim por diante. Da 
mesma forma que a verdade, existe a bondade intencional ou em exercício, que 
corresponde à verdade lógica, e a bondade ôntica, que corresponde à verdade ôntica. 
Enquanto a primeira designa o ente cuja determinação é a vontade, a inclinação, o 
amor; a segunda designa o ente, cuja determinação é a volibilidade, a inclinabilidade, 
a amabilidade. A primeira é intenção, ato da vontade, a segunda é o cumprimento da 
intenção: a vontade inclina e tende para o ente, que por sua parte satisfaz e completa 
tal inclinação e tal tendência (MOLINARO, 2002). 
Por fim, pode-se perceber o ser como beleza ou, no plano ôntico, o belo 
(pulchrum). Não é uma explicitação particular do ser ou do ente, mas a harmonia das 
explicitações anteriores, da unidade, da verdade e da bondade. Molinaro (2002, p. 90-
92) conclui essa afirmação a partir da Suma Teológica I, XXXIX, VIII26, onde Tomás 
 
24
 Não é objetivo deste trabalho discorrer da definição de verdade como adequação ou 
correspondência, mas apenas demonstrar o princípio ontológico da definição gnosiológica tomista da 
verdade. 
25
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 48. 
26
 TOMÁS DE AQUINO, 1980, p. 359. 
34 
vai dizer que a beleza exige três condições: a integridade, a proporção e o esplendor 
ou claridade. A integridade corresponde à unidade, já que ambas são indivisão, 
perfeição, plenitude. A proporção corresponde à bondade, que é proporção do ser 
consigo mesmo, o ser em posse de si mesmo. O esplendor ou claridade corresponde 
à verdade, já que é a manifestação do ser, a luminosidade do ser manifesto, o 
esplendor da aparição do ser. Portanto, da harmonia entre unidade, verdade e 
bondade, conclui-se que o ser possui também a propriedade transcendental da 
beleza. 
3.6 A EXPLICITAÇÃO ÔNTICA DO SER 
3.6.1 Analogia 
Diferentemente de Deus, os entes finitos possuem composição, pelo menos, 
de essência e existência, isto é, uma estrutura metafísica. Esse ser é análogo: todo 
ato de ser põe o ente na condição de existência atual, fora do nada, mas ao mesmo 
tempo, o ser não é o mesmo no ato de ser subsistente em si, Deus, e nas substâncias 
que o têm distinto de sua essência (GILSON, 1962, p. 51). 
Na Suma Contra os Gentios (II, XLV, 1)27, Tomás faz sua própria definição de 
analogia, justificando nela a necessidade de multiplicidade e variedade: 
Com efeito, como todo agente pretende introduzir no efeito a sua 
semelhança, na medida que o efeito a possa receber, tanto mais perfeita é a 
ação, quanto mais perfeito é o agente. [...] Ora, Deus é o agente perfeitíssimo. 
Por isso, cabia-lhe introduzir nas coisas criadas de modo perfeitíssimo a sua 
semelhança, conforme a conveniência da coisa criada. Mas a perfeita 
semelhança as coisas criadas não a podem conseguir em uma só espécie de 
criatura, porque, a causa excedendo o efeito, o que na causa está simples e 
unificado, está em composição e multiplicado no efeito, a não ser que este se 
equipare à espécie da causa. Mas isso não pode ser atribuído ao nosso caso, 
porque a criatura não se pode igualar a Deus. Foi, pois, necessário ter havido 
multiplicidade e variedade nas coisas criadas, para que nelas houvesse, a 
seu modo, perfeita semelhança de Deus. 
Como Deus é um, único, e as criaturas são múltiplas, é necessário que haja um 
meio termo entre a unidade e a multiplicidade e que acabe com a ambiguidade entre 
elas: a analogia. 
O atributo de analogia do ser vem determinar a metafísica de Tomás de forma 
a corrigir eventuais erros na interpretação da filosofia tomista. Gardeil (1967, p. 35) 
 
27
 TOMÁS DE AQUINO, 1990, p. 241-242, grifo do autor. 
35 
explica que Tomás apresenta a analogia como um modo de atribuição lógica, 
intermediário entre a atribuição unívoca e a atribuição equívoca. O termo unívoco se 
reporta aos seus inferiores segundo uma mesma significação; o termo equívoco 
convém às coisas às quais é atribuído segundo significações inteiramente diversas; o 
termo análogo diz-se dos seus inferiores segundo uma significação parcialmente 
diferente e parcialmente semelhante. 
A situação se esclarece ao se perceber que univocismo metafísico é o mesmo 
que monismo e que equivocismo metafísico é o mesmo que pluralismo. 
Consequentemente, a analogia é a posição na qual a diferença ou a multiplicidade 
supõe e implica a identidade ou a unidade (MOLINARO, 2000, p. 16). Os termos 
univocidade, equivocidade e analogia se desdobram em três níveis: o linguístico, da 
palavra e do termo; o lógico, do pensamento e do significado; o ontológico ou 
metafísico, da coisa ou do ente. Molinaro (2002, p. 117) descreve esta disposição da 
seguinte maneira: 
a) Univocidade: um termo, um significado, uma coisa. 
b) Equivocidade: um termo, muitos significados discrepantes e 
desconexos, muitas coisas discrepantes e desconexas. 
c) Analogia: um termo, muitos significados unificados, muitas coisas 
unificadas. 
O que diferencia a analogia da univocidade é a multiplicidade de significados e 
de coisas e o que a diferencia da equivocidade é a unidade, ou melhor, a unificação 
dos muitos significados e das muitas coisas. 
Mondin define a analogia como uma espécie de semelhança que não é nem 
específica, ou seja, entre seres que pertencem à mesma espécie, e nem genérica, 
entre seres que pertencem ao mesmo gênero. “Se não pertencem nem ao mesmo 
gênero, nem à mesma espécie, a semelhança é designada por Tomás com o termo 
analogia, o qual originariamente significava simplesmente ‘semelhança’.” (MONDIN, 
1982, p. 176, grifo do autor). 
O conceito analógico está numa situação bastante especial, como explica 
Gardeil (1967, p. 39). Num conceito unívoco, como, por exemplo, ser vivo e animal, 
onde acontece semelhança de gênero, há uma unidade de significação, com conteúdo 
preciso e determinado, onde a passagem aos termos inferiores, as espécies, ocorre 
pela diferença específica exterior ao gênero. O conceito unívoco é uno e divisível em 
potência. O mesmo não ocorre no conceito analógico: a unidade e a diversidade 
36 
acontecem de forma diferente. Os termos sujeitos, chamados analogados, não podem 
ser excluídos do conceito, encontram-se, pois, aí representados, mas de modo 
implícito e dentro de uma certa confusão. A unidade de um conceito analógico não 
será abstrata como do unívoco, mas proporcional, fundada sobre a conveniência real 
dos analogados entre si. O conceito analógico é um conceito uno, de uma unidade 
proporcional, envolvendo implicitamente ou de modo confuso a diversidade dos 
analogados. Deste conceito único e confuso, passa-se ao conhecimento distinto de 
cada analogado, tornando explícito o modo que lhe corresponde, conseguindo, então 
um conhecimento preciso. 
3.6.2 Substância e acidente 
Aristóteles determinou as categorias do ser que são a substância (ousía – 
oὐσία) e os nove acidentes (symbebekós – συµβεβηκός), que vêm junto na 
substância. 
Pois os nossos conceitos são designações de uma essência (substância) ou 
são aspectos da quantidade, qualidade, relação, lugar, tempo, situação, 
estado, ação e paixão. As categorias por sua vez se repartem em dois 
grandes grupos. De um lado está a substância: o ser existente por si mesmo 
e tendo por isso uma certa independência. De outro lado estão os restantes 
nove esquemas, chamados acidentes: o que pode acrescentar-se à 
substância como determinação própria (HIRSCHBERGER, 1957, p. 146-
147). 
Na filosofia aristotélica, substância é o que se define e se entende em 
contraposição a “acidente”. A substância é uma unidade

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