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Unidade 1: Hidrologia, ciclo hidrológico e bacia hidrográfica 1. Introdução à Hidrologia e ao Balanço Hídrico 1.1 Caracterização da água como recurso A água e o sol são indissociáveis e imprescindíveis à existência de vida na Terra. As plantas captam a energia sola, utilizando-a no processo de fotossíntese, o qual transforma a água, o dióxido de carbono e os sais minerais em compostos orgânicos indispensáveis aos seres vivos, tanto como fonte de energia, como para a constituição e renovação das células. Ainda, como consequência do processo de fotossíntese, a liberação de oxigênio livre para atmosfera permite a respiração aeróbia e, finalmente, a vida animal. A água é a substância que existe em maior quantidade nos seres vivos, representando cerca de 70% de massa do corpo humano, podendo chegar a 90% em alguns animais. Além de ser parte constituinte dos tecidos, a água é o solvente que transporta as substâncias intervenientes nos processos fisiológicos, sendo que sua falta provoca a debilidade e até a morte dos seres vivos. O volume de água na Terra tem-se mantido constante desde sua formação há 5 bilhões de anos, constituindo a chamada hidrosfera, dentro da qual a água circula continuamente, sob a ação da energia solar e da força gravitacional; a essa circulação contínua de água pelos reservatórios da hidrosfera dá-se o nome de ciclo hidrológico. De forma sintética, o ciclo hidrológico é a sequência de processos físicos pelos quais a água, após evaporar-se dos oceanos, lagos, rios e superfície terrestre, precipita-se como chuva, neve ou gelo, escoa por sobre o terreno, infiltra-se no subsolo, escoa pelos aquíferos, é absorvida pelas raízes das plantas, retornando à atmosfera, seja por transpiração ou evaporação direta. Nesse sentido, além de essencial à manutenção da vida, a água em circulação no ciclo hidrológico pode ser captada pelo homem e utilizada para diversas finalidades, as quais englobam desde formas primitivas de transporte até atividades econômicas, como por exemplo, a geração de energia elétrica. Devido às diferentes condições geomorfológicas e climatológicas, a água distribui-se de forma irregular, tanto no tempo como no espaço. Podem ser muito elevadas as variações sazonais e interanuais das vazões de um curso d’água. Portanto, quanto mais variável for o regime hidrológico, menor é a disponibilidade dos recursos naturais. As distribuições espacial e temporal da precipitação, a velocidade e a direção dominantes de deslocamento das tormentas sobre a bacia, as variações temporais e espaciais das perdas por evapotranspiração e infiltração, bem como as condições de armazenamento da umidade do solo, são exemplos do grande número de fatores interdependentes que podem influir na variabilidade das vazões de um curso d’água. Essa variabilidade, sendo bastante complexa, faz com que as vazões de um curso d’água, bem como outras variáveis hidrológicas, sejam consideradas variáveis aleatórias, passíveis de serem tratadas por métodos da teoria de probabilidades e estatística matemática e, em consequência, pode-se dizer que os recursos hídricos, embora renováveis, são móveis, pois escoam pelos rios e aquíferos, e são de natureza aleatória. A intervenção antrópica no ciclo hidrológico não ocorre apenas em termos de quantidade, como também em qualidade da água. Os cursos e corpos d’água têm a capacidade de assimilar efluentes (esgotos, resíduos, etc) e de se autodepurarem; essa capacidade, entretanto, é limitada. Sabe- se que a concentração de poluentes em um curso d’água é inversamente proporcional à vazão de diluição, fato que caracteriza a indissociabilidade dos atributos de quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Por outro lado, a erosão hídrica provoca a perda de solos férteis e a deposição de sedimentos em zonas de menor velocidade de escoamento, assoreando leitos fluviais, reservatórios e obstruindo sistemas de drenagem. A ocupação e o manejo adequado do solo, bem como o tratamento prévio de efluentes domésticos e industriais são fatores importantes para a conservação da água. Estima-se hoje, que 1/5 dos habitantes do planeta não tem acesso à água em quantidade suficiente e 1/3 a água de qualidade. Nesse sentido, talvez seja útil lembrar que a mensuração quantitativa e qualitativa dos elementos do ciclo hidrológico e de outras características intervenientes, constitui a base essencial para a gestão eficaz dos recursos hídricos, tal como exposto na Declaração de Dublin em 1992. 1.2 Histórico do desenvolvimento da hidrologia A história da hidrologia pode ser definida em 8 períodos, conforme Ven Te Chow (1964)1. Período da especulação (até 1400 DC) As antigas civilizações construíram diversas formas de aproveitamento de recursos hídricos, entre os quais se destacam os poços artesianos na Arábia, os canais e os complexos sistemas de abastecimento d’água de cidades da Pérsia (Iraque), as obras de irrigação e controle de cheias na China, Egito, Índia e Mesopotâmia, e os aquedutos romanos. Embora tenham sido capazes de construir essas obras, as civilizações antigas baseavam-se em concepções incorretas do ciclo hidrológico. De forma sucinta, os filósofos antigos não acreditavam que a água proveniente da chuva fosse suficiente para realimentar os cursos d’água e os aquíferos. Como 1 Chow VT. Handbook of Applied Hydrology. New York: McGraw-Hill, Section 8-1. 1964. exemplo, Platão imaginava a existência de uma grande massa de água subterrânea chamada Tartarus, que seria a origem de todas as nascentes e fontes de água. Aristóteles, por sua vez, propugnava a existência de cavernas subterrâneas nas quais o calor do interior da Terra provocava a ascensão dos volumes de água até a superfície, vindo alimentar as nascentes dos rios. O arquiteto romano Marcus Vitruvius Pollio (100 AC), em sua coleção De Architectura Libre Decem, foi o primeiro a advogar uma concepção do ciclo hidrológico que, embora ainda equivocada, aproximava-se da concepção atual. Período de observação (1400-1600) Embora sem nenhuma quantificação para as diversas variáveis envolvidas, Leonardo da Vinci (1425-1519) foi o primeiro a propor a concepção pluvial do ciclo hidrológico, conforme a atual, e a realizar estudos sobre a salinidade dos oceanos. Posteriormente, o francês Bernard de Palissy (1580) escreveu livros sobre a teoria pluvial do ciclo hidrológico e a origem da água subterrânea. Período de medições (1600-1700) Pierre Perrault (1674) usou instrumentos rudimentares para obter uma série de 3 anos de observações da chuva e vazão na bacia do rio Sena, na França, concluindo que a vazão desse rio, na localidade de Aigny-le-Duc, representava cerca de 1/6 da precipitação sobre a bacia. Edmé Mariotte (1620-1648) mediu a vazão do rio Sena, utilizando flutuadores. Edmund Halley (1687) estimou a evaporação do mar Mediterrâneo. Por estes feitos, credita-se a Perrault, Mariotte e Halley o estabelecimento das bases para o desenvolvimento da hidrologia moderna. Período de experimentação (1700-1800) Desenvolvimento da hidráulica dos escoamentos permanentes; equações de Bernoulli e Chézy; tubo de Pitot; medições de descarga pelo processo área-velocidade. Período de modernização (1800-1900): Equação de Darcy; criação de redes hidrométricas e hidrometeorológicas em diversos países. Período do empirismo (1900-1930): utilização de fórmulas empíricas para explicar a variabilidade de precipitações e vazões. Período de racionalização (1930-1950): desenvolvimento do hidrograma unitário e de metodologias para a hidráulica de poços em regime não permanente, análise sedimentológica e análise hidrometeorológica. Período de teorização (após 1950): desenvolvimento de modelos não-lineares para a transformação chuva-vazão. Modelos hidrológicos; uso de computadores para a simulação dos processos do ciclo hidrológico. 1.3 O ciclo hidrológico Por definição, o ciclo hidrológico corresponde à dinâmica da água no meio ambiente, compreendendo seus diferentes estados físicos (líquido, vapor e sólido) que se verifica nos diferentes ambientes do globo terrestre, tais como atmosfera, oceano, solo, leitos naturais de escoamento, montanhas e outros. A fonte básica de energia que aciona e torna o ciclo possível consiste na radiação solar (Mello e Silva, 20132). O ciclo hidrológico é o componente principal da hidrologia, uma vez que a água evapora dos oceanos e da superfície terrestre, sendo incorporada ao sistema através da circulação atmosféricas como vapor d’água, precipitando novamente como chuva ou neve e então, uma parcela é interceptada pelas árvores e vegetação, ocorre o escoamento superficial da água no solo, processos de infiltração, recarga de aquíferos e descargas nos cursos d’água, até sua saída para os oceanos, até nova evaporação. Essa dinâmica pode ser analisada em escala global, e/ou continental; ou bacias hidrográficas internacionais, as quais envolvem grandes rios, como a bacia amazônica, bacia do rio Nilo, bacia do rio Paraná, em bacias hidrográficas nacionais, com áreas de drenagem da ordem de milhares de km², como os dos rios Grande, São Francisco, Tietê, Iguaçu, em bacias hidrográficas de pequeno e médio portes, com áreas da ordem de centenas de hectares a alguns km², ou em bacias com algumas dezenas de hectares, enfim, o ciclo hidrológico pode ser analisado em diferentes escalas de áreas de drenagem, variando conforme os objetivos técnicos e científicos. A Figura 1 representa o ciclo hidrológico da água com seus principais componentes. 2 Mello CR, Silva AM. Hidrologia: princípios e aplicações em sistemas agrícolas. Lavras: Ed. UFLA, 2013. 455p. Figura 1. O ciclo hidrológico com volumes anuais de vazão dados em unidades relativas da precipitação anual na superfície do planeta (119.000 km³/ano)3 (Fonte: Maidment, 1992). Sob o efeito da radiação solar, a evaporação ocorre a partir das superfícies de água formando uma massa de ar úmido. O resfriamento deste ar úmido provoca a condensação do vapor e a formação de minúsculas gotas de água, as quais, prendem-se a sais e partículas higroscópicas, presentes na atmosfera, dando origem a nuvens e outras formas de nebulosidade. O choque entre as gotículas em suspensão provoca o seu crescimento, tornando-as suficientemente pesadas para se precipitarem em forma de chuva (ou neve, ou granizo, ou orvalho). Essas gotas de chuva iniciam então a segunda fase do ciclo hidrológico, que é a precipitação, a qual pode variar em intensidade de uma estação para outra, ou de uma região para outra, a depender das diferenças climáticas no tempo e espaço. Quando as quantidades anuais do volume de água global são expressas em unidades de altura (lâmina) ao invés de volume (Figura 2), a precipitação média anual na superfície é de 800 mm, correspondendo a 2/3 do seu valor nos oceanos; a evaporação anual da superfície terrestre de 480 mm, totalizando 1/3 dos oceanos e os 320 mm remanescentes é o escoamento da superfície para os oceanos, demonstrando o domínio dos oceanos em suprir a umidade atmosférica e a circulação de água, seja por seu papel no ciclo, seja pela grande parte que ocupa em termos de cobertura da superfície da Terra. Na Tabela 1, pode-se verificar a quantidade de água dentro do balanço hídrico. 3 Chow VT, Maidment DR, Mays LW. Applied Hydrology. New York: McGraw-Hill, 1988. 4Figura 2. Quantidades anuais do balanço hídrico global (Fonte: Maidment, 1992). 5Tabela 1. Quantidades anuais de água nas fases do ciclo hidrológico (Maidment, 1992). Item Área (106 km²) Volume (km³) Porcentagem do total (%) Porcentagem de água doce (%) Oceanos 361,3 1.338.000.000 96,5 Água Subterrânea Doce 134,8 10.530.000 0,76 30,1 Salina 134,8 12.870.000 0,93 Umidade do Solo 82 16.500 0,0012 0,05 Gelo Polar 16 24.023.500 1,7 68,6 Outros gelo e neve 0,3 346.600 0,025 1,0 Lagos Doce 1,2 91.000 0,007 0,26 Salina 0,8 85.400 0,006 Pântanos 2,7 11.470 0,0008 0,03 Rios 148,8 2.120 0,0002 0,006 4 Bras, RL. Hydrology. Addison-Wesley, Reading, Mass., 1990. 5 Maidment DR. Handbook of Hydrology. New York: McGraw-Hill, 1992. Água biosférica 510 1.120 0,0001 0,003 Água atmosférica 510 12.900 0,001 0,04 Total Água 510 1.385.984.610 100 Água Doce 148,8 35.029.210 2.5 100 Essa quantidade de água disponível retorna ao ciclo pelos processos de evaporação, bem como da precipitação (que posteriormente irá evaporar ou preencher os reservatórios do solo). É importante salientar, que uma parcela da precipitação será recolhida (retida) pela folhagem e pelos troncos das árvores, não atingindo o solo e consequentemente, evaporando-se. A esse armazenamento da água pela vegetação dá-se o nome de intercepção ou interceptação, grande parte na qual, retorna à atmosfera sob a forma de vapor, através da energia fornecida pela radiação solar. A parte da precipitação que atinge o solo pode infiltrar para o subsolo, escoar por sobre a superfície ou ser recolhida diretamente por cursos e corpos d’água. As fases de infiltração e escoamento superficial são inter-relacionadas e muito influenciadas pela intensidade da chuva, cobertura e uso do solo e pela permeabilidade do solo. A parte da água que chega efetivamente ao solo e infiltra, pode ficar retida poros na camada superior do solo pela ação da tensão capilar. Essa umidade retida no solo pode ser absorvida pelas raízes da vegetação ou pode sofrer evaporação. Outra parte do volume infiltrado pode formar o escoamento sub-superficial através das vertentes e camadas mais superficiais do solo. O restante da água de infiltração irá percolar para as camadas mais profundas até encontrar uma região na qual todos os interstícios do solo estarão preenchidos com água. Essas camadas de solo saturado com água são chamadas aquíferos e repousam sobre substratos impermeáveis ou de baixa permeabilidade. O escoamento subterrâneo em um aquífero pode dar-se lateralmente e, eventualmente, emergir em um lago ou mesmo sustentar a vazão de um rio perene em períodos de estiagem. Por outro lado, se a chuva exceder a capacidade máxima de infiltração do solo, esse excesso irá inicialmente se acumular em depressões e, em seguida, formar o escoamento superficial. Esse ocorre através de trajetórias preferenciais (rede de drenagem), sulcos, ravinas, vales e cursos d’água, os quais finalmente irão desaguar nos mares e oceanos. Salienta-se novamente, que durante esse trajeto superficial, pode ocorrer mais uma vez perdas por infiltração e evaporação, conforme as características de relevo e umidade atual do solo. O ciclo hidrológico completa-se pelo retorno à atmosfera da água armazenada pelas plantas, pelo solo e pelas superfícies líquidas sob a forma de vapor d’água. Quando essa mudança de fase tem origem em superfícies líquidas dá-se o nome de evaporação. A planta, por sua vez, absorve a água retida nas camadas superiores do solo através de seu sistema radicular, utilizando-a em seus processos fisiológicos. A transpiração é a fase pela qual as plantas devolvem para a atmosfera a água que absorvem do solo, expondo-a a evaporação através de pequenas aberturas existentes nas folhas(estômatos). O conjunto dos processos de evaporação e evapotranspiração é então denominado evapotranspiração. Obviamente, o processo como um todo foi simplificado de uma forma geral, contudo, cada aspecto desse processo será discutido e apresentado nas unidades seguintes. 1.4 O balanço hídrico Considerando os principais processos do ciclo da água, pode-se fazer uma estimativa das quantidades de água que passam por cada uma destas etapas. Esta quantificação provém da aplicação do princípio da conservação da massa, cuja formulação representa a lei fundamental da hidrologia ou equação do balanço hídrico. Esta é uma mera expressão da equação da continuidade aplicada ao ciclo hidrológico em uma bacia hidrográfica (ou em uma determinada região) e define a relação entre os fluxos de água que entram (Qe) e que saem (Qs) de um sistema definido no espaço e o volume armazenado (∆V), durante um intervalo de tempo (∆t): ∆V ∆t = Qe̅̅̅̅ − Qs̅̅ ̅ (1) Supondo os instantes de tempo inicial e final t1 e t2 respectivamente, a equação acima pode ser escrita como: V2 − V1 ∆t = Qe1̅̅ ̅̅ ̅ + Qe2̅̅ ̅̅ ̅ 2 − Qs1̅̅ ̅̅ ̅ + Qs2̅̅ ̅̅ ̅ 2 (2) Para uma bacia hidrográfica, os componentes do armazenamento (V2 e V1) serão os correspondentes ao volume de superfície VS (incluindo os volumes armazenados em rios, canais, lagos, reservatórios e depressões), ao volume de subsolo VB (incluindo a umidade do solo e o volume armazenado em aquíferos) e ao volume interceptação VIT. Geralmente, a variação do volume de água interceptada pela vegetação é muito baixa, não sendo considerado significativo relativamente à variação dos volumes superficial e subterrâneo. Uma vez fixado um certo intervalo de tempo, a vazão de entrada (Qe) poderá ser representada pelo volume de precipitação P. Da mesma forma, a vazão de saída (Qs) poderá ser a soma dos volumes correspondentes ao escoamento superficial S, aos escoamentos sub-superficial e subterrâneo B, à evaporação E, à transpiração T e à infiltração I, no intervalo de tempo em questão. Logo, em unidades volumétricas a equação (2) pode ser expressa como: ∆VS + ∆VB = VS(t2) − VS(t1) + VB(ts) − VB(t1) (3) ∆VS + ∆VB = P − S − B − E − T − I Os termos da evaporação e da transpiração podem ser substituídos pelo termo da evapotranspiração ETP. A equação (3) também pode ser desmembrada para representar o balanço hídrico acima e abaixo da superfície. Indicando a parcela acima da superfície pelo subscrito “S”, a equação resume-se em: ∆VS = P − S − ETPS − I (4) Analogamente, indicando a parcela abaixo da superfície pelo subscrito “B”, tem-se: ∆VB = I − B − ETPB (5) Da mesma forma que essas equações podem ser aplicadas a bacias hidrográficas, elas podem ser modificadas para representar o balanço hídrico de um reservatório, ou de um trecho de rio, ou mesmo de uma superfície impermeável, desde que os termos pertinentes sejam considerados. Como exemplo, considere o problema de determinação do volume de escoamento superficial resultante de um evento chuvoso isolado. Nesse caso, suponha que não houve alteração significativa do armazenamento subterrâneo e que Vs(t1) = 0. O escoamento sub-superficial B deve-se à infiltração I e, portanto, a equação (3) torna-se: S = P − I − E − T − VS(t2) (6) Para eventos isolados, as quantidades E e T são muito menores do que P, I, Vs e S, podendo ser desprezadas. Nesse caso, S = P − I − VS(t2) (7) Essa equação indica que, o volume de escoamento superficial causado por um evento isolado de precipitação sobre uma bacia hidrográfica, pode ser obtido subtraindo-se do total de chuva, a soma do volume infiltrado e do volume superficial eventualmente utilizado ou desviado da bacia durante a duração de ocorrência. As unidades nesse caso são alturas equivalentes, ou milímetros de água uniformemente distribuídos sobre a área da bacia hidrográfica. No caso do escoamento superficial S, essa altura equivalente (mm ou cm) sobre a área de drenagem é denominada deflúvio superficial ou, simplesmente, deflúvio. Exercício resolvido 1 – Cálculo do deflúvio Considere uma vazão média anual de 1,5 m³ s-1 em uma bacia hidrográfica com área de 100 km². Qual é o deflúvio correspondente à essa bacia? Solução: conforme descrito acima, o deflúvio é a altura equivalente a uma vazão distribuída uniformemente sobre uma área. Logo: 𝑆 = 𝑄( 𝑚³ 𝑠 ) 𝐴(𝑚²) × 86400 ( 𝑠 𝑑𝑖𝑎 ) × 365 (dias) 𝑆 = 1,5 106 × 86400 × 365 = 0,473 𝑚 = 473 𝑚𝑚 Exercício resolvido 2 – Balanço Hídrico Durante o mês de julho de 1981, a afluência média ao reservatório de Três Marias foi de 430 m³ s-1. No mesmo período, a CEMIG operou o reservatório liberando para jusante uma vazão de 250 m³ s-1 para atendimento à navegação, sendo que a geração de energia elétrica consumiu uma vazão adicional de 500 m³ s-1. A precipitação mensal na região foi de apenas 5 mm, enquanto a média histórica de evaporação da superfície do lago vale 110 mm. Sabendo que no início do mês o NA do reservatório era 567,03 m, calcular o NA no fim do mês, dada a relação cota-área-volume a seguir. Despreze as perdas por infiltração e calcule a precipitação efetiva (precipitação – evaporação) sobre o lago com base no NA de 567,03 m. Fazer interpolação linear na relação cota-área-volume. Reservatório de Três Marias – Relação Cota-Área-Volume NA (m) Volume (109 m³) Área do reservatório (km²) 565,00 12,729 912 565,50 13,126 933 566,00 13,527 953 566,50 13,929 974 567,00 14,331 995 567,50 14,733 1018 568,00 15,135 1040 Solução: De acordo com o enunciado do problema, tem-se os seguintes dados: Qe 430 m³ s-1 P 5 mm NAi 567,03 m Qs 250 m³ s-1 + 500 m³ s-1 = 750 m³ s-1 E 110 mm t 31 dias Logo, substituindo estes valores na equação 3, obtêm-se uma equação cuja incógnitas são o volume no início do mês e a área. 𝑉𝑁𝐴 𝐹 − 𝑉𝑁𝐴 𝐼 = (𝑃 − 𝐸) × 𝐴 + [(𝑄𝑒 − 𝑄𝑠) × 86400 × 31] ↔ 𝑚3 = 𝑚𝑚 × 𝑚2 + 𝑚³ 𝑠 × 𝑠 𝑉𝑁𝐴 𝐹 − 567,03 = (0,005 − 0,110) × 𝐴 + [(430 − 750) × 86400 × 31] Com o auxílio da relação Cota-Área-Volume, dada na tabela acima, utiliza-se o recurso da interpolação linear para obter a área e o volume no início do mês: (567,50 − 567,00) × (1018 − 𝐴) = (567,50 − 567,03) × (1018 − 995) → 𝐴 = 996,38 𝑘𝑚² (567,50 − 567,00) × (14,733 − 𝑉𝑁𝐴 𝐼 ) = (567,50 − 567,03) × (14,733 − 14,331) → 𝑉𝑁𝐴 𝐼 = 14,35512 × 106 𝑚³ Substituindo estes valores calculados, obtêm-se: 𝑉𝑁𝐴 𝐹 − 14,35512 × 106 = (𝑃0,005 − 0,110) × 996,38 + [(430 − 750) × 86400 × 31] 𝑉𝑁𝐴 𝐹 = 13,4980 × 106𝑚³ Contudo, o problema pede o NA no fim do mês e não o volume final. Logo, fazendo outra interpolação linear, obtêm-se: (13,527 − 13,126) × (566,00 − 𝑁𝐴𝑓) = (13,527 − 13,393) × (566,00 − 565,50) NAf = 565,83 m 1.5 Bacias Hidrográficas 1.5.1 Definições básicas Uma bacia hidrográfica, também chamada de bacia de captação ou de drenagem, é uma unidade fisiográfica, limitada por divisores topográficos, que recolhe a precipitação, age como um reservatório de água e sedimentos, defluindo-os em uma seção fluvial única, denominada seção exutória ou exutório. Os divisores topográficos, ou divisores de água, são as cristas de elevações do terreno que separam a drenagem da precipitação entre duas bacias adjacentes. De modo geral, segundo Mello e Silva (2013), a bacia hidrográfica consiste de uma área na qual ocorre a captação da água proveniente da atmosfera e a drenagem de uma parte que é convertida em escoamento superficial, a partir dos limites geográficos, direcionando o fluxo para a seção de controle. Uma bacia hidrográfica é constituída por bacias menores, chamadas de tributárias ousub- bacias. Como exemplo, a bacia do rio Arrudas é uma sub-bacia do rio das Velhas, que por sua vez é uma sub-bacia do rio São Francisco, bem como a bacia do Alto rio Grande integra a cabeceira da bacia do rio Grande, a qual possui seção de controle junto à sua afluência ao rio Paranaíba, formando o rio Paraná. Esses dois exemplos demonstra uma estruturação das bacias conforme uma hierarquia que, em geral, tem o relevo como fator determinante e de forma cumulativa a área de drenagem. Para um melhor entendimento da bacia hidrográfica, torna-se importante conhecer os elementos fisiográficos quem a compõem e apresentados na Figura 3: a. Divisores de água: linha que representa os limites geográficos da bacia (pontos mais elevados), determinando a área de captação e o sentido do fluxo da rede de drenagem; b. Seção de controle: local por onde parte da água captada na bacia é drenada; c. Rede de drenagem: constitui-se de todos os drenos da bacia, desde os perenes aos não perenes. Denomina-se como dreno perene aqueles que sempre apresentam escoamento, mesmo nas épocas mais secas do ano, uma vez que são alimentados pelo fluxo de base. São considerados drenos intermitentes, os drenos que escoam água somente em épocas de chuva, ou seja, quando os aquíferos livres estão abastecidos e com o início da estação seca, esses drenos secam. Por fim, os drenos ditos efêmeros são aqueles que há o escoamento somente durante ou após a ocorrência da precipitação, ou seja, somente apresenta a parcela referente ao escoamento superficial direto. Quando a precipitação termina, o fluxo de água cessa em pouco tempo. Figura 3. Esquema representativo de uma bacia hidrográfica com seu exutório (a), divisores de água (b) e rede de drenagem e cotas de nível (c). Uma vez apresentados os elementos fisiográficos, torna-se importante discutir a importância desses no aspecto de manejo, seja para fins de produção de água (conservação) ou da produção agrícola. A cobertura vegetal e as classes de solo são fundamentais para a caracterização do ambiente e controlam a dinâmica da água dentro da bacia. Obviamente, cada tipo de cobertura vegetal exercerá uma influência diferente na questão de evapotranspiração e de retenção da precipitação e, consequentemente, na umidade do solo. A cobertura vegetal exerce papel importante nos processos de recarga de aquíferos, especialmente em áreas de cabeceira, conforme sugerem Durães e Mello (2013)6. A presença de uma cobertura vegetal afeta não somente a proporção com que a precipitação se transforma em escoamento superficial, como também a velocidade com que esse é transportado à rede de drenagem. As influências mais notáveis são sobre as parcelas de interceptação e evapotranspiração, ou seja, sobre o volume de água retida na folhagem e troncos. Além disso, o sistema 6 Durães MF., Mello CR. Groundwater recharge behavior based on surface runoff hydrographs in two basin of the Minas Gerais State. Ambi-Água, 8(2):57-66, 2013. radicular de uma planta causa pequenas fissurações no solo, tornando-o mais poroso, porém menos sujeito a desagregações estruturais, facilitando dessa forma a infiltração. Contudo, quando uma bacia sofre desmatamento ou é parcialmente urbanizada, tem-se menores perdas por interceptação, evapotranspiração e infiltração e, portanto, uma maior disponibilidade de água para o escoamento superficial. Esse, por sua vez, processa-se em lâminas d’água de maior profundidade, escoando sobre o terreno menos permeável e hidraulicamente menos rugoso, tendo como consequência um maior volume de escoamento superficial, um menor tempo de resposta da bacia e uma maior vazão de pico. Como resultado desse processo, a erosão se intensifica, carreando uma maior quantidade de volumes de sólidos às calhas fluviais, lagos e reservatórios. Durães et al. (2016)7 apresentaram um estudo sobre a taxa de aporte de sedimentos na bacia do Alto rio Iguaçu e encontraram valores elevados de sedimentos à jusante da região metropolitana de Curitiba, realçando, portanto, o papel da urbanização sobre a dinâmica hidrossedimentológica. A Figura 4 apresenta um exemplo com a variação de cobertura vegetal em bacias hidrográficas. Figura 4. Mapas de uso e cobertura do solo 7 Durães MF, Coelho Filho JAP, Oliveira VA. Water erosion vulnerability and sediment delivery rate in upper Iguaçu river basin – Paraná. Revista Brasileira de Recursos Hídricos, 21(4): 728-741, 2016. A rede de drenagem determina a potencialidade para a geração do escoamento superficial e para a produção e transporte de sedimentos, fatores esses preponderantes no contexto ambiental, características imprescindíveis para o manejo da bacia, principalmente quando se analisa o território urbano, onde tem-se áreas impermeáveis, diminuição do tempo de concentração da chuva e aumento considerável da vazão de pico, gerando assim, enchentes e inundações, como por exemplo, a marginal do rio Tietê que passa na cidade de São Paulo - SP. A rede de drenagem de uma bacia é formada pelo rio principal e pelos seus tributários. Os seus constituintes podem ser delineados a partir de mapas topográficos, porém, seus detalhes são altamente dependentes da escala utilizada e sua arquitetura pode ser melhor entendida através das diversas propostas de classificação ou ordenação dos cursos d’água. A pioneira entre elas é a classificação de Horton, segundo a qual, todo afluente que não possui tributários é considerado um rio de primeira ordem. Quando dois afluentes de primeira ordem se juntam, eles formam um rio de segunda ordem. A confluência desses forma um rio de terceira ordem e assim por diante. Depois que todos os rios são ordenados, ao rio de maior comprimento, atribui-se a maior ordem. Horton demonstrou haver uma correlação importante entre a ordem de um rio e seu comprimento. Outro a propor um sistema de classificação dos cursos d’água foi Strahler, que modificou ligeiramente a classificação de Horton, omitindo a etapa final de identificação do rio de maior comprimento e a respectiva atribuição da ordem mais alta. A classificação de Strahler é uma das mais usadas e um exemplo de sua aplicação encontra-se na Figura 5. Figura 5. Classificação da rede de drenagem segundo Strahler. Em relação aos solos da bacia, deve-se atentar às etapas de infiltração e percolação, principalmente nas camadas superficiais. As características de permeabilidade e porosidade do solo determinam o volume de água que se infiltra e o volume de água que fica armazenado. Em termos gerais, uma bacia que apresente solos predominantemente arenosos permitirá maior infiltração e percolação, e menor disponibilidade para o escoamento superficial, relativamente a uma bacia com solos silte-argilosos. Porém, o primeiro solo terá um volume menor de água retido por capilaridade e consequentemente, com efeitos nos processos de evapotranspiração. As características dos solos e demais discussões serão abordadas na Unidade 3. 1.5.2 Forma da bacia hidrográfica O formato superficial da bacia é importante pela influência que exerce no tempo de transformação da chuva em escoamento superficial direto (Mello e Silva, 2013). Nesse sentido, existem alguns coeficientes que são empregados para quantificar a influência da forma da bacia na sai resposta à ocorrência de uma precipitação. i. Coeficiente de compacidade (Kc) – é a relação entre o perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de área igual à bacia, sendo, portanto, adimensional. É importante observar que quanto mais próximo de um circular uma bacia se apresentar (Figura6), maior será a sua capacidade de proporcionar grandes cheias, devido a concentração do escoamento superficial direto para um pequeno trecho do dreno principal, havendo acúmulo de fluxo e, consequentemente, maiores vazões máximas (Mello e Silva, 2013). Ac = π ∙ D2 4 (8) Pc = π ∙ D (9) Kc = PBH Pc (10) Kc = PBH 2 ∙ π √π ∙ √ABH (11) Kc = 0,28 ∙ PBH √ABH (12) Em que Ac é a área do círculo cujo valor é igual à área da bacia (ABH), PC é o perímetro do círculo, PBH é o perímetro da bacia e D é o diâmetro da circunferência de área igual à área da bacia. Figura 6. Representação da distribuição do escoamento superficial direto em uma bacia circular e em outra elipsoidal. (Adaptado de Mello e Silva, 2013). A interpretação do Kc é a seguinte: 1,00 – 1,25: bacia com alta propensão a grandes enchentes 1,25 – 1,50: bacia com tendência mediana a grandes enchentes >1,50: bacia com menor propensão a grandes enchentes ii. Fator de forma ou índice de Gravelius (Kf) – expressa a relação entre a largura média da bacia e o seu comprimento axial, expresso da seguinte forma: Kf = L̅ Lax (13) Onde �̅� é a largura média da bacia e Lax é o comprimento axial da bacia. Assim como o Kc, esse índice pode assumir valores que auxiliam na interpretação do hidrólogo quanto à tendência a enchentes. 1,00 – 0,75: sujeito a enchentes 0,75 – 0,50: tendência mediana a enchentes <0,50: menor tendência a enchentes iii. Índice de conformação (Ic) – representa a relação entre a área da bacia e a de um quadrado de lado igual ao comprimento axial da bacia. Esse índice expressa a capacidade da bacia em gerar enchentes. Quanto mais próximo de 1, maior a propensão a enchentes, pois a bacia fica cada vez mais próxima de um quadrado e com maior concentração do fluxo. Contudo, pode assumir valores acima ou abaixo de 1. Caso a bacia possua forma de um retângulo, por exemplo, e o comprimento axial for correspondente ao menor lado desse retângulo, o índice poderá ser menor que 1. Por outro lado, se a bacia apresentar comprimento axial no sentido do maior lado, o índice poderá ser maior que 1. Ic = ABH (Lax)2 (14) Um coeficiente de forma próximo ou maior que 1 indica também que a bacia é arredondada, enquanto que para valores menores que 1, a bacia tem forma mais alongada. 2. Lista de Exercícios 1) Se a vazão média anual de uma bacia hidrográfica de 200 km² é de 1,67 m³ s-1, qual é o deflúvio correspondente em mm? 2) Se ocorrer uma chuva de 30 mm durante 90 minutos sobre uma superfície impermeável de 3 km², qual será a respectiva vazão média no período, em m³ s-1? 3) Considere o balanço hídrico simplificado de uma superfície de uma superfície retangular impermeável de 3 km de largura e 10 km de comprimento, sobre a qual ocorreu uma Exercício resolvido 3 – Forma da bacia Calcular o coeficiente de compacidade, fator de forma e o índice de conformação para uma bacia cujo perímetro é 11,3 km, área de 800 ha e comprimento axial de 4,5 km. Foram determinados 7 valores de largura ao longo da bacia, iguais a 1,5 km; 2,6 km; 3,5 km; 4,5 km; 4,3 km; 2,8 km e 1,1 km. Solução: Primeiramente, calcula-se o coeficiente de compacidade através da equação 12. 𝐾𝑐 = 0,28 ∙ 𝑃𝐵𝐻 √𝐴𝐵𝐻 𝐾𝑐 = 0,28 ∙ 11,3 √8 Kc = 1,12 A partir do valor encontrado, a bacia em questão apresenta alta propensão a grandes enchentes. Calcula-se agora, o fator de forma pela equação 13 e o índice de conformação pela equação 14. �̅� = 𝐿1 + 𝐿2 + ⋯ + 𝐿3 𝑛 �̅� = 1,5 + 2,6 + ⋯ + 1,1 7 �̅� = 2,9 𝑘𝑚 𝐾𝑓 = �̅� 𝐿𝑎𝑥 𝐾𝑓 = 2,9 4,5 𝐾𝑓 = 0,64 𝐼𝑐 = 𝐴𝐵𝐻 (𝐿𝑎𝑥)2 𝐼𝑐 = 8 (4,5)2 𝐼𝑐 = 0,40 Interpretação: Com base no fator de forma, a bacia terá tendência mediana a enchentes. Tomando-se por base o coeficiente de compacidade, a bacia apresentará alta propensão a grandes enchentes. Como o primeiro (Kf) expressa uma tendência, não dizendo respeito à grandeza dessa enchente, e o segundo (Kc) expressa a dimensão da cheia, os índices são, portanto, complementares. Assim, essa bacia apresentará tendência mediana a enchentes e se estas ocorrerem, poderão ser de grande importância. precipitação de 50 mm durante 2 horas. Sabendo-se que a vazão média no ponto de saída da superfície foi de 10 m³ s-1, calcule a variação de volume entre os instantes final e inicial. O volume do reservatório de escoamento superficial aumentou ou diminuiu? Por quê? 4) Em um determinado ano, uma bacia hidrográfica de 25.900 km² de área de drenagem, recebeu 500 mm de precipitação. A vazão média anual na seção fluvial que drena essa área foi de 170 m³ s-1. Estime a quantidade de água correspondente à evapotranspiração da bacia durante o período. 5) Em um determinado ano, os seguintes dados hidrológicos foram observados em uma bacia de 350 km² de área de drenagem: precipitação total de 850 mm, evapotranspiração de 420 mm, deflúvio superficial de 225 mm. Calcule o volume de água infiltrada em m³, desprezando as variações de armazenamento dos reservatórios superficial e subterrâneo. 6) Demonstre matematicamente que, para uma bacia perfeitamente circular, o coeficiente de compacidade é igual a 1. Unidade 2: Precipitação 1. Introdução A precipitação pode ser definida como qualquer forma de umidade presente na atmosfera que, dadas condições termodinâmicas, precipita-se sobre a superfície terrestre. Segundo Singh (1992)8, a quantidade, distribuição e intensidade da precipitação varia espacialmente e temporalmente, sendo essa variação dependente do movimento de circulação geral da atmosfera e suas características, comumente chamado de clima. A precipitação pode ocorrer sob as formas de chuvisco, chuva, granizo, orvalho, geada, neve ou neblina, constituindo o principal mecanismo de entrada para o balanço hídrico. O chuvisco (ou garoa) consiste em gotículas muito finas de água, com diâmetros entre 0,1 e 0,5 mm, que se precipitam sobre a superfície com intensidades muito baixas que às vezes causam a impressão de flutuar no ar atmosférico. A chuva por sua vez é formada por gotas maiores, com diâmetros entre 0,5 e 5 mm, que se precipitam com intensidades muito variáveis e dependentes do mecanismo de ascensão das massas de ar úmido. Algumas nuvens convectivas de desenvolvimento vertical podem produzir granizo (o granizo é formado pelo congelamento instantâneo de gotículas, produzido por forte e rápida ascensão atmosférica.), ou seja, precipitação sob a forma de pedras de gelo de dimensões variadas, com tamanho mínimo de 5 mm. O orvalho é uma forma de precipitação na qual a água contida na forma de vapor na atmosfera sofre condensação e precipita nas diferentes superfícies (folhagens de plantas, objetos expostos ao ar). Isso se dá em função dos corpos sólidos perderem calor mais rápido para a atmosfera, sofrendo resfriamento em relação ao ar atmosférico. Quando a temperatura é inferior a 0°C, o orvalho pode dar origem à geada (nesse caso, o ponto de orvalho na curva de saturação é abaixo de zero, havendo um processo de sublimação, na qual a água precipita diretamente na forma sólida). A neve resulta da precipitação de cristais de gelo, os quais formam flocos de dimensões e formas variadas, geralmente em formatos hexagonais, em nuvens muito frias (abaixo de 0°C). Por fim, a neblina é resultado da condensação do vapor d’água em pequenas gotículas, em decorrência do resfriamento da atmosfera e normalmente são formadas à noite e no início da manhã em áreas de serra ou relevo montanhoso, pelo acúmulo do ar frio em áreas de vale, conforme salientam Mello e Silva (2013). Assim, antes de se iniciaro estudo da precipitação, tem-se que analisar o vapor d’água presente na atmosfera e consequentemente e a sua condensação. 8 Singh VP. Elementary hydrology. Englewwod Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1992. 973p. 2. Vapor d’água na Atmosfera A água ocorre na atmosfera em seus três estados físicos. O vapor d’água é invisível e não deve ser confundido com nuvens ou neblina, as quais contêm gotículas de água em suspensão. O vapor d’água tem a capacidade de absorver tanto a radiação solar de ondas curtas quanto a radiação terrestre de ondas longas e dessa forma, interpreta um importante papel de regulação da temperatura do ar e de manutenção do equilíbrio energético global. A lei de Dalton afirma que numa mistura de gases, cada gás exerce uma pressão parcial, a qual independe das pressões parciais dos outros gases constituintes. Na atmosfera terrestre, a pressão parcial exercida pelo vapor d’água recebe o nome de pressão ou tensão de vapor, geralmente denotada por “е” e expressa em unidades como milibares (mb) ou cm ou mm de mercúrio, constituindo-se em uma medida do conteúdo de vapor d’água do ar atmosférico. Sob pressão constante, a quantidade máxima de vapor d’água que um dado volume de ar atmosférico pode conter depende apenas da temperatura. Nessas condições, a pressão parcial exercida pelo vapor d’água é chamada de pressão de vapor de saturação (ou saturante) e seu valor varia com a temperatura do ar. A pressão exercida pelo teor saturante de vapor d’água e sua dependência da temperatura por ser descrita pela equação de Tetens, apresentada abaixo. es = 0,6108 ∙ 10 7,5T 237,3+T para T ≥0°C (15) es = 0,6108 ∙ 10 9,5T 265,5+T para T <0°C (16) em que T é a temperatura do ar, em °C, e es expressa em kPa Através da análise da curva da pressão de vapor de saturação em relação à temperatura (Figura 7), pode-se observar que uma parcela de ar, inicialmente à temperatura “T” e pressão de vapor “е”, sofre um resfriamento sob pressão constante até a temperatura T0, estando essa parcela então saturada de vapor d’água. Qualquer resfriamento adicional provocará a condensação do vapor d’água ali presente. Com isso, essa temperatura T0 é chamada de temperatura do ponto de orvalho. Contudo, ainda analisando a Figura 7, verifica-se que, mantida a temperatura inicial T, a parcela de ar apresenta um déficit de saturação do ar (∆e), sendo obtido pela diferença entre es e ea, que na figura 7 está representada pela barra vertical. Assim, define-se a umidade relativa do ar, denotada por U, como sendo a proporção expressa em porcentagem, entre a quantidade de vapor d’água efetivamente presente no ar e aquela em condições de saturação. ∆e = es − ea (17) U = ea es ∙ 100 ou U = e E ∙ 100 (18) Figura 7. Gráfico Psicométrico A máxima quantidade de vapor d’água que o ar consegue reter a uma dada temperatura, ou seja, a umidade de saturação (Us), pode ser quantificada utilizando-se os mesmos princípios para a obtenção da umidade atual (Ua). Ua = 2,169 ∙ ea T (19) Us = 2,169 ∙ es T (20) Em que a T é a temperatura do ar, em K; e ea e es em kPa; Ua e Us são, respectivamente, a umidade atual e a umidade de saturação, ambas em kg m-3. É importante lembrar que a quantidade de vapor d’água na atmosfera varia desde valores quase nulos, como por exemplo, nas regiões desérticas e polares, até valores de 4% (em volume de ar úmido) nas regiões quentes e úmidas. O símbolo “ea” foi convencionado para representar a pressão exercida pela massa atual de vapor d’água existente na atmosfera, sendo que ela varia desde 0 (para o ar totalmente seco) até um valor máximo denominado de pressão de saturação de vapor d’água (es). 3. Condensação do Vapor d’água Atmosférico O processo de condensação corresponde à passagem do vapor d’água à fase líquida, com liberação de calor latente de vaporização (583,2 cal g-1 a 25°C). Quando essa mudança ocorre diretamente para a fase sólida, tem-se o processo de sublimação, com liberação dos calores latentes de fusão (80 cal g-1) e vaporização. Esses dois processos são importantes, porque é a partir deles que se tem a formação de nuvens, névoas, orvalho e geada. Para que esses processos físicos ocorram é necessário fluxo de energia, sendo a radiação a principal fonte de energia para os processos climáticos. A radiação pode se apresentar nas seguintes formas: Solar: de ondas curtas e alta intensidade energética. Terrestre: ondas longas e baixa intensidade energética. Outra forma de transmissão de calor é através da condução e convecção, uma vez que o ar próximo da superfície terrestre se aquece, transmitindo fluxo de energia A condensação do vapor d’água presente em uma parcela de ar inicia-se quando essa se torna saturada, ocorrendo sobre os chamados núcleos de condensação, os quais compostos de partículas microscópicas em suspensão no ar, tais como sais higroscópicos e óxidos higroscópicos de enxofre e fósforo de origem urbana e industrial, partículas de sal oriundas dos oceanos, pólen, argila, cristais de gelo. O ar úmido das camadas inferiores, aquecidos por condução, sofre ascensão adiabática até atingir a condição de saturação em função da expansão com redução da pressão atmosférica e resfriamento. A partir desse nível, em condições atmosféricas favoráveis e a partir do momento em que os núcleos higroscópicos se tornam ativos, esses últimos aglutinam as moléculas de vapor d’água, permitindo a formação de gotículas de água, as quais são mantidas em suspensão na atmosfera dando origem a várias formas de nebulosidade. No interior dessas nuvens, ocorre um eventual aumento da massa e do diâmetro dessas gotículas em suspensão podendo iniciar o processo de precipitação. O processo de precipitação se inicia quando por um processo de crescimento (os principais mecanismos de crescimento das gotas são a coalescência e a difusão), as gotículas de água adquirem tamanho suficiente para vencer as forças de ascensão que exercem resistência às gotas e, então se precipitam. O resfriamento adiabático é a principal causa da condensação e responsável pela maioria das precipitações, sendo que, a ascensão de massas de ar na atmosfera pode se dar em função do relevo (ou orografia), por convecção térmica ou pelo seu encontro com outra massa de ar de diferente densidade. No primeiro caso, a precipitação é resultante da ascensão mecânica de massas de ar úmidas sobre barreiras naturais, como por exemplo uma encosta de serra ou montanhas, fazendo com que sofra um deslocamento vertical e expansão do volume. Com isso, a ascensão e resfriamento da massa de ar provocam um aumento da umidade relativa, podendo atingir a saturação, formar nuvens e consequentemente, as chamadas precipitações orográficas, sendo o nível onde o processo de condensação se inicia denominado nível de condensação. Normalmente, esse tipo de precipitação apresenta alta intensidade, ocorrendo principalmente em regiões litorâneas. Figura 8. Esquema geral da ocorrência de uma chuva orográfica (adaptada de Tubelis e Nascimento, 1980)9 As precipitações do tipo convecção térmica (chuvas convectivas) são típicas das regiões tropicais e equatoriais, podendo ser comuns em regiões de clima temperado durante o verão (Figura 9). Esse tipo de precipitação inicia-se com o aquecimento diferenciado da superfície terrestre, provocando aquecimento desigual das camadas atmosféricas, produzindo estratificação térmica da atmosfera, a qual fica instável. O ar em contato com o solo mais aquecido também se aquece pelo processo de condução térmica e, em consequência, expande-se, eleva-se e é substituídopor ar mais denso. Então, a coluna de ar vai se aquecendo como um todo, criando células de circulação ascensional. Esse processo pode se desenvolver tanto na vertical quanto na horizontal, com intensidade variável (dependente do gradiente de decréscimo da temperatura com a altitude e da diferença de pressão de vapor entre as massas vizinhas). Em relação a essa ascensão brusca e violenta do ar quente (pode atingir grandes altitudes), ocorre inicialmente a formação de nuvens do tipo Cumulus e num segundo momento, Cumulunimbus. As chuvas convectivas se caracterizam pela forte intensidade, mas curta duração, podendo ocorrer descargas elétricas, trovoadas, ventos fortes e granizo. Nesse sentido, esse tipo de precipitação apresentam um elevado potencial de danos, sobretudo no aspecto de conservação do solo, uma vez que sua intensidade de precipitação supera a velocidade de infiltração da água no solo, provocando 9 Tubelis A, Nascimento FJL. Meteorologia descritiva: fundamentos e aplicações brasileiras. São Paulo: Nobel, 1980. 374p. escoamento superficial direto e consequentemente, erosão do solo (desde que fatores como cobertura do solo, umidade antecedente e declividade do terreno contribuam para isso). Figura 9. Esquema geral da ocorrência de uma chuva convectiva. O terceiro tipo de precipitação, ocasionado pelo encontro de massas de ar de diferentes densidades, é denominado de precipitação ciclônica, podendo ser frontal e não frontal. A precipitação frontal por estar associado ao deslocamento de frentes frias ou quentes. Uma massa de ar de maior densidade é geralmente caracterizada por baixa temperatura e baixa umidade relativa, podendo-se deslocar das latitudes polares em direção ao Equador, encontrando em sua trajetória outra massa de ar mais úmida, quente e menos densa, sendo que a convergência dessas duas massas de ar forma uma superfície divisória em forma de cunha, chamada superfície frontal ao longo da qual surgem as frentes frias e quentes, dando, portanto, o nome característico para essa chuva. Se o ar frio se movimenta em relação ao ar quente, a frente é dita fria, caso contrário, a frente é quente (Figura 10). Esse tipo de precipitação é comum nas zonas de convergência extratropical, com o encontro do ar frio polar com o ar mais quente, sendo sua ocorrência em regiões de altas altitudes, apresentando longa duração e intensidade baixa a moderada, recobrindo grandes áreas. Figura 10. Precipita do tipo ciclônica frontal de frente fria (a) e frente quente (b) (adaptado de Naghettini, 201210). As chuvas ciclônicas não frontais se caracterizam pela convergência horizontal de massas de ar quentes e úmidas para regiões com baixa pressão, com sua elevação e resfriamento. 4. Quantificação da Precipitação 4.1 Monitoramento da precipitação O monitoramento da precipitação, em sua grande maioria, é feito com base em pluviômetros, que se caracterizam pela simplicidade e baixo custo. O pluviômetro é um recipiente metálico com volume capaz de conter as maiores precipitações possíveis em um intervalo de 24 horas, sendo o pluviômetro Ville de Paris o mais utilizado no Brasil (Figura 11). Figura 11. Pluviômetro Ville de Paris Esse tipo de pluviômetro possui uma área de captação de 400 cm², instalado à 1,5 m da superfície do solo, fazendo com que 1mm de chuva corresponda a 40 ml de volume captado (calibrado 10 Naghettini M. Introdução à hidrologia aplicada. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2012. por provetas). Em relação a identificação da chuva diária, segue-se o padrão meteorológico mundial, o qual consiste na realização das leituras às 9 horas de cada dia. Se a coleta ocorrer antes das 12 horas, considera-se que a precipitação se refere ao dia anterior, assim, a maior dificuldade em se trabalhar com esse tipo de equipamento está na baixa capacidade em se detalhar a precipitação (distribuição temporal e espacial). Uma alternativa seria realizar leituras espaçadas em 6 horas, o que melhoraria a análise do comportamento temporal da chuva, contudo, aumentar-se-ia gastos com pessoal para executar tal detalhamento. Essa limitação, por outro lado, pode ser contornada pela utilização de outro aparelho, denominado pluviógrafo (Figura 12), que tal como o pluviômetro, capta os volumes precipitados por uma superfície e os acumula em um recipiente, permitindo o registro contínuo das variações ao longo do dia, sendo fundamental para estudos vinculados ao manejo do solo e da água, projetos de obras hidráulicas, potencial erosivo das chuvas e chuvas intensas. Embora existam vários tipos de pluviógrafos, um dos mais utilizados no Brasil é o pluviógrafo de massa, porém, o pluviógrafo é um equipamento com uso restrito, encontrado na maioria das vezes em postos oficiais de meteorologia, órgãos ambientais e empresas específicas. Figura 12. Pluviógrafo de massa. O acumulo da precipitação é feita em um recipiente solidário ao braço da balança. A medida que aumenta os volumes precipitados, aumenta-se o peso do recipiente, fazendo com que o braço da balança se movimente para baixo. No outro braço da balança encontra-se uma pena que descreve o movimento oposto ao recipiente, permitindo registrar a variação da precipitação ao longo do gráfico sobreposto a um tambor, o qual executa um movimento de rotação completa em torno do seu próprio eixo em 24 horas. O recipiente possui volume máximo correspondente a 10 mm de precipitação (alguns aparelhos esse volume máximo corresponde a 9 mm), correspondendo à posição mais elevada da pena sobre o gráfico. Nesse ponto, um sifão permite a drenagem da água acumulada, fazendo com que a pena volte a posição de origem e reinicie o processo de registro da chuva. A esse gráfico de variação da chuva ao longo do dia, dá-se o nome de pluviograma (Figura 13). Figura 13. Pluviograma extraído do Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade - POIT. Como os pluviômetros e pluviógrafos são utilizados para a quantificação da precipitação em um determinado ponto, é recomendado que esses aparelhos sejam instalados a uma certa distância de obstáculos que possam exercer influência sobre as observações, tais como casas, árvores, podendo inferir em erros de leitura. Dentre desses erros em função da instalação, outros são listados, como defeitos de fabricação (área de captação diferente da especificada), evaporação do volume coletado, falhas mecânicas, falha do operador e ação de ventos. Na Figura 14, tem-se um exemplo de recomendação para instalação de pluviômetros e pluviógrafos. Figura 14. Exemplo de instalação para pluviômetro e pluviógrafo (Adaptado de Naghettini, 2012). Além do pluviômetro e do pluviógrafo, existem estações meteorológicas automáticas que fornecem o total precipitado em um determinado intervalo de tempo, o qual pode varia desde 1 segundo a horas, conforme interesse do usuário. Esse tipo de equipamento automatizado permite obter um maior detalhamento do evento de chuva, com maior precisão que o pluviograma. Como estes aparelhos totalizam a precipitação em um determinado ponto, são utilizados radares meteorológicos, o qual é capaz de medir a intensidade variável da chuva ao longo de uma determinada área, sendo que em seu caso, a refletividade do eco é uma medida da intensidade da precipitação, permitindo quantificar, através da emissão e a reflexão, a variação espacial da intensidade da chuva, dentro de um raio de até 180 km. Fatores como tipo e distância da precipitação, presença de partículas na atmosfera, interferência de construções e árvores, podemafetar as medidas pluviométricas com esse equipamento. Em relação ao evento de chuva, algumas grandezas são características, a saber: altura pluviométrica, duração da chuva, intensidade e frequência. A altura da chuva ou altura pluviométrica (P) representa a espessura média da lâmina d’água distribuída por sobre a área, caso a mesma fosse recolhida numa superfície horizontal, sendo expressa em mm, cm ou polegadas (para países de língua inglesa). A duração ou tempo de duração (t) representa o intervalo de tempo (em min ou horas), decorridos entre o início e o fim da precipitação. A intensidade de precipitação ou, simplesmente intensidade, é a altura de chuva por unidade de tempo, geralmente expressa em mm h-1, representando a variabilidade temporal ao longo da duração da precipitação. Por fim, a frequência é o número de ocorrências de uma determinada precipitação no decorrer de um período de tempo especificado. 4.2 Análise de dados pluviométricos Os dados de chuva são geralmente obtidos pelos registros de uma estação pluviométrica, os quais são publicados sob a forma de uma folha resumo contendo os totais diários para cada ano de observação, além das informações dos totais mensais e anuais, constituindo séries pluviométricas as quais são de extrema importância para estudos hidrológicos. Contudo, essas séries podem conter períodos sem informações ou com observações incorretas, devido aos mais variados problemas, desde os operacionais até com os aparelhos totalizadores. Porém, algumas técnicas e procedimentos podem ser utilizados para minimizar esses erros, ressaltando-se que são aplicáveis para séries quinzenais, mensais e anuais, uma vez que as séries diárias, sobretudo as máximas diárias apresentam elevada variabilidade espacial e temporal devido a influência das condições locais, principalmente os orográficos. Nesse sentido, as técnicas que serão apresentadas a seguir devem ser evitadas para essas situações. (a) Ponderação regional Essa técnica de preenchimento de falhas é muito aplicada para dados mensais e anuais. Nesse caso, suponha que uma determinada estação (estação A) possua falhas mensais e que esteja próxima a outras três estações (B, C e D), essas com período ininterrupto de observações. Assim, a falha em um determinado momento (mês ou ano) para a estação A, denotada por PA, pode ser obtida da seguinte forma: PA = 1 n ∙ ( NA NB ∙ PB + NA NC ∙ PC + NA ND ∙ PD) (21) Onde N representa a média pluviométrica anual de longo período ou média normal, calculada para cada estação e P denota a altura pluviométrica, observada em cada local, naquele mês (ou ano) específico e n representa o número de estações circunvizinhas. A recomendação é que as médias normais sejam calculadas sobre um período mínimo de 10 anos e que essa técnica de ponderação regional não seja aplicada para o preenchimento de dados diários. (b) Precipitação média espacial A altura média da precipitação sobre uma localidade (área ou bacia hidrográfica), oriunda de uma chuva isolada ou em intervalos mensais ou anuais é um requisito importante para diversos problemas vinculados à engenharia de recursos hídricos, balanços hídricos e modelos de simulação hidrológica, muitas vezes em razão da variabilidade espacial das precipitações. Assim, alguns métodos mais usuais para a estimativa da precipitação podem ser descritos, variando desde o cálculo da média aritmética das precipitações observadas nas estações existentes na área, a qual produz resultados satisfatórios em bacias de declividade muito pequena, uma vez que as estações pluviométricas se encontram uniformemente espaçadas, contudo, não sendo suficiente para representar a precipitação média em uma grande bacia hidrográfica. Para áreas maiores, tem-se os polígonos de Thiessen e o método das Isoietas. Polígonos de Thiessen Esse método é recomendado para regiões relativamente planas, trabalhando com a distribuição espacial dos postos pluviométricos, sendo a média obtida pela ponderação do valor de precipitação em um posto (Pi) pela sua suposta área de influência (A). As etapas do método são: localizar as estações na bacia e conectá- las mediante segmentos de reta; traçar a mediatriz (corresponde a uma reta que corta outra no seu ponto central formando um ângulo reto) de cada segmento de reta definindo os polígonos em torno de cada estação, cujos os lados definem sua área de influência; calcular o fator de ponderação de cada estação, dividindo a área formada pelo polígono correspondente pela área total; calcular a precipitação média espacial através da média ponderada das estações. Embora esse método seja mais preciso que o anterior, ele apresenta limitações, uma vez que não considera a influência do relevo (efeitos orográficos). Com o advento de programas computacionais e dos sistemas de informações geográficas (SIGs), o cálculo do polígono de Thiessen se tornou mais rápido e preciso, permitindo através de um modelo digital de elevação do terreno, avaliar os efeitos orográficos na distribuição das estações. A Figura 15 apresenta um exemplo ilustrativo desse polígono. Figura 15. Polígono de Thiessen para uma área hipotética. A precipitação média é calculada então por: P̅ = ∑ Pi ∙ Ai n i=1 ∑ Ai n i=1 (22) Em que Pi é a precipitação média posto i e Ai é a área de influência do posto i Método das Isoietas Esse método se consiste no traçado das curvas de mesma precipitação – isoietas (Figura 16), permitindo considerar indiretamente os efeitos do relevo e outras influências subjetivas sobre o regime meteorológico da região. A partir do traçado das linhas, as áreas entre isoietas adjacentes são obtidas por planimetria e expressas em porcentagem de área total. Os incrementos percentuais são então multiplicados pela lâmina média de chuva estimada para a região entre as isoietas sucessivas correspondentes, sendo que a soma desses produtos fornece a precipitação média da bacia. Figura 16. Exemplo do método das Isoietas. A precipitação média por este método é dada por: P̅ = ∑ ( Pi + Pi+1 2 ) ∙ Ai n i=1 ∑ Ai n i (23) 4.3 Chuvas Intensas A chuva intensa pode ser definida segundo Mello e Silva (2013) como aquela em que sua lâmina ou sua intensidade supere um valor mínimo que seja função do tempo da duração da chuva, conforme a eq. 24 e a Tabela 2, ou seja, apresentam grandes lâminas precipitadas em pequenos intervalos de tempo. O seu conhecimento é de fundamental importância na elaboração de projetos hidráulicos, controle da erosão, manejo de bacias hidrográficas (urbanas ou rurais) e atividades relacionadas à conservação do solo (Cardoso et al., 199811). Nesse sentido, a sua quantificação, bem como o conhecimento da forma como se distribui na bacia hidrográfica temporalmente e espacialmente são de grande importância, principalmente para atividades de manejo e uso do solo. I = P td (24) 11 Cardoso CO, Ullmann MN, Bertol I Análise de chuvas intensas a partir da desagregação das chuvas diárias de Lages e de Campos Novos (SC). Revista Brasileira de Ciência do Solo, 22:131-140, 1998. Tabela 2. Valores mínimos de intensidade de chuva conforme seu tempo de duração (td) (Mello e Silva, 2013). Tempo de duração (min) 5 10 20 30 60 90 120 180 240 Intensidade média (mm h-1) 120 72 51 40 25 19 15 11 8,7 A partir da análise da Tabela 2, nota-se que a intensidade média da chuva decresce com o aumento da duração da chuva, contudo, tanto a intensidade quanto a altura precipitada dependem da frequência com que esses valores ocorrem, sendo essa frequência de ocorrênciarepresentada pelo tempo de retorno de determinado evento. Assim, a quantificação da chuva intensa pode ser realizada por meio de equações de chuvas intensas, também conhecidas como curvas intensidade-duração-frequência (IDF), que relacionam a duração do evento, sua intensidade e a frequência na qual ocorre em um determinado período de retorno, sendo o ajuste dos parâmetros realizado de modo empírico, a partir de dados pluviométricos para cada estação e local, ou, por meio do emprego de regressão linear e da não linear, com base em valores extraídos de séries de dados pluviométricos. A equação 25 apresenta a forma típica de uma equação IDF. i = K ∙ TRa (t + td)c (25) Onde i é a intensidade média máxima de precipitação (mm h-1); TR é o tempo de retorno (anos); td é o tempo de duração da precipitação (min) e K, a, t e c são os parâmetros a serem estimados com base nos dados pluviométricos da localidade. Mello e Silva (2013) citam que uma alternativa mais simples para estimar os parâmetros da equação IDF está no uso da ferramenta SOLVER do software Excel, uma vez que trabalha de forma iterativa partindo de um valor inicial para os parâmetros da equação. Outros métodos para determinação da equação de chuva intensa consistem no método da desagregação de chuvas e no método de Bell, bem como alguns softwares já desenvolvidos como, por exemplo, o software Pluvio® desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa em Recursos Hídricos (GPRH) da Universidade Federal de Viçosa feito para todo o Brasil. 4.4 Erosividade da Chuva A erosividade da chuva pode ser definida como a sua capacidade em provocar erosão através do impacto direto da gota sobre a superfície do solo, devido à energia cinética das gotas e à intensidade da chuva. Essa energia cinética pode ser estimada com base em equações empíricas que a relacionam à precipitação ou à intensidade, sendo a pioneira aquela apresentada por Wischmeier e Smith (197812). A estimativa da erosividade de chuva foi determinada a partir de parcelas experimentais de perda de solo, analisando sua produção de sedimentos oriunda da correlação entre a intensidade média máxima da precipitação em diferentes tempos de duração, os quais variaram de 10 a 60 minutos, sendo a melhor correlação obtida com a intensidade máxima de 30 minutos (Wischmeier e Smith, 1978). Alguns modelos são utilizados para estimar a energia cinética da chuva, possibilitando o cálculo da energia cinética total, o que permite determinar a erosividade, denotada por EI30 ou R. Os modelos comumente utilizados são dos de Wischmeier e Smith (eq. 26), Wagner e Massambini (eq. 2713) e Brown e Foster (eq. 2814). Ec = 0,119 + 0,0873 ∙ log10I (26) Ec = 0,153 + 0,0645 ∙ log10I (27) Ec = 0,29 ∙ [1 − 0,72 ∙ exp(−0,05 ∙ I)] (28) Em que Ec representa a energia cinética por mm de precipitação em MJ ha-1 mm-1 e I é a intensidade média da chuva em mm h-1. Uma vez calculado a energia cinética, obtém-se a energia cinética total produzido pelo evento de chuva pela equação 29: Ect = ∑(Eci ∙ hi) n i=1 (29) Onde Ect representa a energia cinética total da chuva (MJ ha-1); hi é a lâmina de precipitação (mm) e n é o número de intervalos de tempo considerado na análise do evento de precipitação. Recomenda- 12 Wischmeier WH, Smith DD 1978. Predicting rainfall erosion losses: a guide to conservation planning. Washington: United States Department of Agriculture, 1978. 58p. 13 Wagner CS, Massambini O Análise da relação intensidade de chuva: energia de Wischmeier e Smith e sua aplicabilidade à região de São Paulo. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 12:197-203, 1988. 14 Brown LC, Foster GR Storm erosivity using idealized intensity distributions. Transactions of the ASABE, St. Joseph, 30:379-386, 1987. se realizar esse cálculo discretizando a precipitação ao longo de tempo de sua duração, de 10 em 10 minutos ou de 30 em 30 minutos. A determinação da erosividade (EI30) é feita então extraindo-se o maior valor precipitado em 30 minutos consecutivos de um pluviograma e, com base nesse valor extraído e do cálculo da energia cinética, obtém-se a erosividade daquela chuva (eq. 30) e consequentemente, ao somar todos os valores estimados num dado mês ou ano, tem-se a erosividade total do período em questão. EI30 = I30 ∙ Ect (30) Sendo EI30 a erosividade da chuva expressa em MJ mm ha -1 h-1 e I30 a intensidade média máxima em 30 minutos consecutivos, em mm h-1. Alguns autores utilizam critérios para estabelecer se uma determinada chuva é erosiva ou não e dentre esses, cita-se aquele adotado por De Maria (199415), onde chuvas com altura de 10 mm como não erosivas, desde que tenham intensidade máxima em 10 minutos menor que 24 mm h-1, ou energia cinética total inferior a 3,6 MJ ha-1. Outra classificação é adotada por Carvalho (200816) e Foster et al. (198117) e apresentada na Tabela 3. Tabela 3. Classes de interpretação do índice de erosividade médio anual Erosividade (MJ mm ha-1 h-1 ano-1) Classes de erosividade EI30 ≤ 2452 Baixa 2452 < EI30 ≤ 4905 Média 4905 < EI30 ≤ 7357 Moderada 7357 < EI30 ≤ 9810 Alta EI30 > 9810 Muito alta 15 De Maria, IC Cálculo da erosividade da chuva. In: Instituto Agronômico de Campinas. Manual de programas de processamento de dados de campo e de laboratório para fins de experimentação em conservação do solo. Campinas: IAC-SCS, 1994. 16 Carvalho, NO 2008. Hidrossedimentologia Prática. 2a ed. Rio de Janeiro: Interciência. 599p. 17 Foster GR, Mc Cool DK, Renard KG, Moldenhauer WC Conversion of the universal soil loss equation to SI metric units. Journal of Soil Water Conservation, 36:355-359, 1981. Muitos outros trabalhos avaliam a erosividade da chuva para atividades de manejo em diversos estados brasileiros1819, influência da erosividade na erosão hídrica em biomas20, como por exemplo o pantaneiro, além de estudos relacionados a erosividade e aos padrões hidrológicos no agreste central pernambucano21 e associada aos padrões de chuva22. 18 Waltrick PC, Machado MAM, Dieckow J, Oliveira D Estimativa da erosividade de chuvas no estado do Paraná pelo método da pluviometria: atualização com dados de 1986 a 2008. Revista Brasileira de Ciência do Solo, 39:256-267, 2015 19 Salton JC, Comunello JCS, Fietz CR Documentos 116: Estimativa de índices de erosividade da chuva para o Estado de Mato Grosso. Dourados: Embrapa Agropecuária Oeste, 2013. 20 Machado DO, Alves Sobrinho T, Ribeiro AS, Ide CN, Oliveira PTS Erosividade da chuva para o bioma Pantanal. Engenharia Sanitária e Ambiental, 19(2):195-202, 2014. 21 Santos TEM, Montenegro AAA Erosividade e padrões hidrológicos de precipitação no agreste central pernambucano. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, 16(8):871-880, 2012. 22 Machado RL, Carvalho DF, Costa JR, Oliveira Neto DH, Pinto MF Análise da erosividade das chuvas associada aos padrões de precipitação pluvial na região de Ribeirão das Lajes (RJ). Revista Brasileira de Ciência do Solo, 32(5):2113- 2123, 2008. Exercício resolvido 4 – Erosividade da chuva Estime a erosividade da chuva da Figura 13, aplicando as equações 26, 27 e 28. Solução: Como cada pico no pluviograma corresponde a 10 mm, inclusive no primeiro, cujo valor é mais elevado que os demais (isso ocorre devido a intensidade muito elevada no começo, sendo uma resposta da inércia do registrador), calcula-se o total precipitado, que foi de 89 mm. A partir desse ponto, discretiza-se o pluviograma em intervalos de 10 em 10 minutos (pode-se optar pela discretização de 30 em30 minutos) para estimativa da energia cinética. O primeiro passo, portanto, consiste no cálculo da intensidade média em 10 minutos de cada lâmina (3ª coluna), dividindo h por 10 min e multiplicando o resultado por 60 min para obter em mm h - 1. Ec1, Ec2 e Ec3 corresponde a energia cinética pelas respectivas equações 26, 27 e 28, as quais foram aplicadas com base na intensidade média de cada lâmina monitorada (coluna 3). As colunas 5, 7 e 9 correspondem a aplicação da equação 29. A soma de cada trecho de energia cinética nessas colunas corresponde à energia cinética total estimadas nas equações acima. Depois, as lâminas acumuladas em 30 minutos consecutivos, coluna 10 são calculadas, sendo possível calcular a intensidade máxima em 30 min, como sendo igual a 60 mm h-1. Assim, o valor máximo de intensidade é identificado e multiplicando-se pela energia cinética total (colunas 5, 7 e 9) por esse valor, tem-se a erosividade da dessa chuva. col1 col2 col3 col4 col5 col6 col 7 col 8 col 9 col 10 col 11 Hora h (mm) I (mm/h) Ec1 EC1*h Ec2 Ec2h Ec3 Ec3*h h30 i30 9:10 0 0 9:20 2.6 15.6 0.22316 0.580215421 0.22995654 0.597886995 0.194285 0.505141 2.8 5.6 9:30 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 1.4 2.8 9:40 0 0 1.4 2.8 9:50 1.2 7.2 0.19385 0.232614152 0.20829795 0.249957535 0.144325 0.17319 3.6 7.2 10:00 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 6 12 10:10 2.2 13.2 0.21683 0.477017429 0.22527702 0.495609441 0.182081 0.400579 8.4 16.8 10:20 3.6 21.6 0.2355 0.847792125 0.23907227 0.860660161 0.219092 0.788733 6.4 12.8 10:30 2.6 15.6 0.22316 0.580215421 0.22995654 0.597886995 0.194285 0.505141 9.6 19.2 10:40 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 14 28 10:50 6.8 40.8 0.25961 1.765352299 0.25688758 1.746835548 0.26285 1.78738 14 28 11:00 7 42 0.26071 1.824967641 0.25769958 1.803897055 0.264431 1.851018 7.4 14.8 11:10 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 2.6 5.2 11:20 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 12.4 24.8 11:30 2.2 13.2 0.21683 0.477017429 0.22527702 0.495609441 0.182081 0.400579 22.2 44.4 11:40 10 60 0.27423 2.742326042 0.26769076 2.676907556 0.279604 2.796045 30 60 11:50 10 60 0.27423 2.742326042 0.26769076 2.676907556 0.279604 2.796045 30 60 12:00 10 60 0.27423 2.742326042 0.26769076 2.676907556 0.279604 2.796045 30 60 12:10 10 60 0.27423 2.742326042 0.26769076 2.676907556 0.279604 2.796045 23 46 12:20 10 60 0.27423 2.742326042 0.26769076 2.676907556 0.279604 2.796045 16.4 32.8 12:30 3 18 0.22859 0.685755869 0.23396508 0.70189523 0.205108 0.615325 7 14 12:40 3.4 20.4 0.23333 0.793324426 0.23747115 0.807401896 0.214708 0.730006 4.2 8.4 12:50 0.6 3.6 0.16757 0.100539125 0.18888151 0.113328907 0.115596 0.069357 1 2 13:00 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 0.8 1.6 13:10 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 0.8 1.6 13:20 0.4 2.4 0.15219 0.060876977 0.17752363 0.07100945 0.104811 0.041924 2 4 13:30 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 1.8 3.6 13:40 1.4 8.4 0.19969 0.279565414 0.21261601 0.29766242 0.152809 0.213932 1.8 3.6 13:50 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 14:00 0.2 1.2 0.12591 0.025182505 0.15810719 0.031621438 0.09336 0.018672 Total 89 22.66870898 22.54039324 22.24925 EI30 1360.122539 1352.423594 1334.955 4.5 Concepção da rede pluviométrica Como existe uma grande variação da precipitação dentro de uma determinada tempestade, com observações de 51 a 226 mm em uma única chuva convectiva sobre uma bacia hidrográfica, é importante ressaltar que a chuva não se precipitada uniformemente, sendo necessário, portanto, conceber uma rede pluviométrica que amostre adequadamente a variabilidade do evento, observando que muitas vezes essa variabilidade é decorrente da topografia, velocidade do vento, movimento de massas de ar e do tipo da chuva. Portanto, a localização e o espaçamentos entre as estações (pluviométricas ou pluviográficas) dependem do tipo de precipitação a ser medida, bem como o uso das medições de precipitação. Um critério a ser utilizado é o critério médio de chuvas, cujo objetivo está em determinar a precipitação média mapeando a variabilidade espacial da chuva (Singh, 1992), uma vez que muitos fatores podem afetar a acurácia do critério sendo quanto maior for a densidade da rede de monitoramento, mais acurada será a representação. Em geral, os erros de amostragens tendem a aumentar com o aumento da precipitação média e, por outro lado, tendem a diminuir com o aumento da densidade da rede, duração da precipitação e extensão da área. Nesse sentido, os maiores erros serão produzidos para uma chuva isolada, do que para chuvas em uma escala mensal, sazonal ou anual, uma vez que erros médios são geralmente variáveis. Na verdade, para o mesmo nível de precisão, a densidade da rede pode ser de duas a três vezes maior para chuvas de verão do que as de inverno. Assim, a adequabilidade de uma rede pluviométrica em uma bacia pode ser determinada estatisticamente, sendo o número dito ótimo de pluviômetros correspondente a uma porcentagem do erro atribuído na estimativa da precipitação média, sendo obtido por: N = ( Cv ε ) 2 (31) Cv = 100 ∙ S P̅ (32) S = 1 m − 1 ∙ [∑ Pi 2 − m i=1 (∑ Pi m i=1 ) 2 m ] 0,5 (33) Onde N é o número ótimo de estações pluviométricas, Cv é o coeficiente de variação dos valores de chuva das estações, ε é a porcentagem do erro atribuída na estimativa da precipitação média, S é o desvio padrão da chuva e �̅� é a precipitação média. Segundo a Organização Meteorológica Mundial (196923), a densidade mínima da rede pluviométrica para propósitos hidrometeorológicos deve ser: Uma estação por 600 a 900 km² de área em regiões planas de zonas temperadas, mediterrâneas e tropicais; Uma estação por 100 a 250 km² de área em regiões montanhosas de zonas temperadas, mediterrâneas e tropicais; Uma estação por 25 km² de área em pequenas áreas montanhosas com precipitação irregular e, Uma estação por 1500 a 10.000 km² de área em zonas árida ou polar. 4.6 Precipitação Provável Os fenômenos hidrológicos podem ser caracterizados como aleatórios, o que confere a eles, um caráter probabilístico e estocástico. Nesse sentido, as variáveis hidrológicas são consideradas contínuas, ou seja, variáveis que existem continuamente no tempo possibilitando, portanto, aplicar 23 World Meteorological Organization. 1969. Guide to hydrometeorological practices. 2ed, Technical Report No. 82, WMO NO. 168. Geneva: World Meteorological Association. Exercício resolvido 5 – Densidade de rede pluviométrica Uma bacia hidrográfica tem uma rede pluviométrica composta de 5 estações. A precipitação anual registrada por essas estações é apresentada abaixo: Estação 1 2 3 4 5 Precipitação Anual (cm) 50 82 73 64 105 Calcule o número ótimo de estações de chuva para essa bacia para um erro de 10% na estimativa da precipitação média Solução: Para solucionar esse exercício, aplica-se as equações 33, 32 e 31 respectivamente, considerando m = 5; e a Pmédio = 74,8 cm. Com isso, o desvio padrão calculado será de 20,61. Aplicando a equação 32, encontra-se um coeficiente de variação igual a 27,55% e consequentemente, estima- se o número ótimo pela equação 31: 𝑁 = ( 𝐶𝑣 𝜀 ) 2 𝑁 = ( 27,55 10 ) 2 𝑁 = 7,59 ≅ 8 𝑒𝑠𝑡𝑎çõ𝑒𝑠 modelos estatísticos que permitam caracterizar a magnitude do fenômeno, bem como sua probabilidade de ocorrência. Aos fazermos
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