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VOLICH, R. M. Psicossomática: de Hipócrates à Psicanálise. 7. Ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010. P. 110-123. Georg Groddeck (1866-1934) construiu suas hipóteses a partir de sua experiência como médico. Tornou-se membro da Associação psicanalítica de Berlim em 1920, argumentando que as doenças físicas poderiam ser compreendidas e tratadas através da psicanálise. De acordo com Groddeck, não existem doenças orgânicas ou psíquicas, pois o corpo e a alma adoecem ao mesmo tempo. A expressão de psicossomática remete a uma essência, a do ser humano. Não foi através do estudo da neurose que ele chegou à suas conclusões, mas através da observação de doenças “físicas”. Groddeck se recusou a aceitar a separação entre doenças somáticas e psíquicas, pois acreditava que o espírito e o corpo são uma mesma entidade, que abriga o Isso (ID). Groddeck lançou O Livro d’Isso, marcando sua paternidade da psicossomática moderna e definindo suas posições com relação ao movimento psicanalítico. No livro. Groddeck insiste no aspecto criativo do Isso, absolutamente arraigado no funcionamento orgânico. “O Isso vive o homem; é a força que o faz agir, pensar, crescer, sentir- se bem ou doente, uma palavra, o que o vive”. Nele, discute-se várias questões fortemente marcadas pela psicanálise, como a relação do humano com o infantil, a função das relações primitivas com a mãe, a função do ato sexual e do parto na vida da mulher, entre outros. Groddeck denuncia o conflito do pensamento causalista, na divisão entre os que defende a primazia das causas internas ou a das externas. Para ele, ao dividirmos as causas em duas, a interna que o ser humano extrai de si mesmo, e a externa que vem do meio ambiente, nos jogamos sobre as causas externas. Pois, é muito desagradável olhar para dentro de si mesmo. O homem esquece a causa interna pelo medo de reconhecer a causa interna. A doença é uma criação do Isso, carregada de sentido, de finalidade e de função expressiva, e para Groddeck, essas forças que participam do adoecer, devem ser mobilizadas no processo terapêutico associadas aos procedimentos indicados pelo médico. Além disso, ele considerava também as resistências do paciente diante de tal tratamento. “Não é o médico que derrota a doença, mas o doente. O doente cura a si mesmo, com suas próprias forças, assim como é através de suas próprias forças que ele caminha, come, pensa, respira, dorme.” (Groddeck, 1923, p. 226,227). Groddeck acreditava que a psicanálise e suas técnicas deveriam ser ampliadas para além do campo das neuroses. Apesar das diferenças em relação ao conceito de Isso e Id entre Freud e Groddeck, e do lugar ‘marginal’ que ele acabou por ocupar no movimento psicanalítico, é certo que suas formulações deixaram marcas profundas na psicanálise, que, além de ter incorporado o termo criado por ele (ID), não poderia mais ignorar as relações entre o funcionamento psíquico e o orgânico, tampouco suas repercussões. Wilhelm Reich orientou suas concepções na tentativa de evidenciar as relações entre a economia sexual, o psiquismo e o funcionamento vegetativo. Ele criticava a tendência da psicanálise de afirmar que todas as enfermidades resultavam de desejos inconscientes. Para ele, “o psíquico e o somático são dois processos paralelos que exercem efeito recíproco um sobre o outro” (Reich, 1949, p. 70). A intensidade de uma ideia psíquica depende da excitação somática momentânea à qual é associada, e do mesmo jeito, a emoção tem origem nas pulsões, e portanto no campo somático, permitindo a compreensão da relação entre a neurose da angústia fisiogênica e a psiconeurose psicogênica. Para Reich, a perturbação genital cosntitui a fonte de energia da neurose pelo lado somático. A estase sexual (impossibilidade de descarga da libido acumulada) é um fator presente em qualquer patologia. O conflito psíquico e a estase sexual se realimentam mutuamente. O sintoma é uma tentativa de descarga parcial e de ligação da libido estásica. A couraça do caráter é o mecanismo que retém toda a energia libidinal do indivíduo. (ibid, p. 104-124). O caráter é uma alteração crônica do Eu, que instaura uma rigidez, determinando o modo característico de reação do indivíduo. O caráter é incorporado à natureza do indivíduo, e sua função é proteger o Eu contra perigos internos e externos, razão pela qual é denominado de couraça. “A couraça determina uma diminuição da mobilidade psíquica total e das relações com o mundo exterior. Ela opera segundo o princípio do prazer-desprazer, intensificando-se diante de experiências desprazeirosas e diminuindo diante de experiências prazeirosas. [...] O objetivo da terapia analítica deveria não apenas tornar o paciente consciente de sua sexualidade reprimida, mas torna-lo capaz de potência orgástica, ou seja, capaz de descarregar completamente a energia sexual acumulada.” (p.121). Para Reich, o corpo influencia a mente ao mesmo tempo em que a mente influencia o corpo. A mente (psique) é determinada pela qualidade e o corpo (soma) pela quantidade. “A qualidade de uma atitude psíquica depende da quantidade de excitação somática da qual provém”. (ibid, p.226).
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