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13 Bioenergética e tipos de reações bioquímicas 505 14 Glicólise, gliconeogênese e a via das pentoses-fosfato 543 15 Princípios da regulação metabólica 587 16 Ciclo do ácido cítrico 633 17 Catabolismo de ácidos graxos 667 18 Oxidação de aminoácidos e produção de ureia 695 19 Fosforilação oxidativa e fotofosforilação 731 20 Biossíntese de carboidratos em plantas e bactérias 799 21 Biossíntese de lipídeos 833 22 Biossíntese de aminoácidos, nucleotídeos e moléculas relacionadas 881 23 Regulação hormonal e integração do metabolismo em mamíferos 929 O metabolismo é uma atividade celular altamente coor-denada, em que muitos sistemas multienzimáticos (vias metabólicas) cooperam para (1) obter energia química capturando energia solar ou degradando nutrien- tes energeticamente ricos obtidos do meio ambiente; (2) converter as moléculas dos nutrientes em moléculas com características próprias de cada célula, incluindo precur- sores de macromoléculas; (3) polimerizar precursores monoméricos em macromoléculas (proteínas, ácidos nu- cleicos e polissacarídeos); e (4) sintetizar e degradar as biomoléculas necessárias para as funções celulares espe- cializadas, como lipídeos de membrana, mensageiros intra- celulares e pigmentos. Embora o metabolismo englobe centenas de diferentes reações catalisadas por enzimas, o grande objetivo da Par- te II é o estudo das principais vias metabólicas, poucas em número e notavelmente semelhantes em todas as formas de vida. Os organismos vivos podem ser divididos em dois grandes grupos de acordo com a forma química pela qual obtêm carbono do meio ambiente. Os autotróficos (como bactérias fotossintéticas, algas verdes e plantas vasculares) podem usar o dióxido de carbono da atmosfera como sua única fonte de carbono, a partir do qual formam todas as suas biomoléculas constituídas de carbono (ver Figura 1-5). Alguns organismos autotróficos, como as cianobactérias, também podem utilizar nitrogênio atmosférico para gerar todos os seus componentes nitrogenados. Os heterotrófi- cos não conseguem utilizar o dióxido de carbono atmosfé- rico e devem obter carbono a partir do ambiente na forma de moléculas orgânicas relativamente complexas, como a glicose. Os animais multicelulares e a maioria dos micror- ganismos são heterotróficos. As células e os organismos au- totróficos são relativamente autossuficientes, enquanto as células e os organismos heterotróficos, por necessitarem de carbono em formas mais complexas, dependem de produ- tos de outros organismos. Muitos organismos autotróficos são fotossintéticos e obtêm sua energia da luz solar, enquanto organismos hete- rotróficos obtêm sua energia a partir da degradação de nu- trientes orgânicos produzidos por autotróficos. Em nossa biosfera, os autotróficos e heterotróficos vivem juntos em um ciclo vasto e interdependente em que os organismos autotróficos usam o dióxido de carbono atmosférico para construir suas biomoléculas orgânicas, alguns deles geran- PARTE II Bioenergética e Metabolismo Nelson_6ed_13.indd 501Nelson_6ed_13.indd 501 02/05/14 17:2302/05/14 17:23 502 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX do oxigênio a partir da água durante o processo. Os orga- nismos heterotróficos, por sua vez, utilizam os produtos orgânicos dos autotróficos como nutrientes e devolvem dióxido de carbono para a atmosfera. Algumas das reações de oxidação que produzem dióxido de carbono também consomem oxigênio, convertendo-o em água. Assim, car- bono, oxigênio e água são constantemente reciclados en- tre os mundos heterotrófico e autotrófico, com a energia solar como a força que impulsiona esse processo global (Figura 1). Todos os organismos vivos também exigem uma fonte de nitrogênio, necessária para a síntese de aminoácidos, nucleotídeos e outros componentes. As bactérias e as plan- tas, geralmente, podem usar amônia ou nitrato como única fonte de nitrogênio, mas os vertebrados devem obter nitro- gênio na forma de aminoácidos ou de outros compostos or- gânicos. Somente alguns organismos – as cianobactérias e muitas espécies de bactérias do solo, que vivem simbiotica- mente sobre as raízes de algumas plantas – são capazes de converter (“fixar”) nitrogênio atmosférico (N2) em amônia. Outras bactérias (as bactérias nitrificantes) oxidam amônia em nitritos e nitratos; e outras, ainda, convertem nitrato a N2. As bactérias anamox convertem amônia e nitrito em N2. Portanto, além dos ciclos globais de carbono e oxigênio, um ciclo de nitrogênio opera na biosfera, movimentando enor- mes quantidades de nitrogênio (Figura 2). A reciclagem de carbono, oxigênio e nitrogênio que, em última análise, envolve todas as espécies, depende do equilíbrio adequado entre as atividades dos produtores (autotróficos) e consu- midores (heterotróficos) em nossa biosfera. Esses ciclos de matéria são impulsionados por um enor- me fluxo de energia na biosfera, iniciando com a captura da energia solar pelos organismos fotossintéticos e a utilização dessa energia para gerar carboidratos ricos em energia e outros nutrientes orgânicos; esses nutrientes são, então, usados como fontes de energia por organismos heterotrófi- cos. Nos processos metabólicos, e em todas as transforma- ções energéticas, existe uma perda de energia útil (energia livre) e um aumento inevitável na quantidade de energia não utilizável (calor e entropia). Ao contrário da reciclagem de matéria, portanto, a energia flui em uma direção através da biosfera; os organismos não conseguem reciclar energia útil a partir da energia dissipada na forma de calor e en- tropia. Carbono, oxigênio e nitrogênio são reciclados conti- nuamente, mas energia é constantemente transformada em formas não utilizáveis, como o calor. O metabolismo, a soma de todas as transformações químicas que ocorrem em uma célula ou em um organismo, ocorre por meio de uma série de reações catalisadas por enzimas que constituem as vias metabólicas. Cada uma das etapas consecutivas em uma via metabólica produz uma pequena alteração química específica, em geral a remoção, a transferência ou a adição de um átomo particular ou um grupo funcional. O precursor é convertido em um produ- to por meio de uma série de intermediários metabólicos chamados de metabólitos. O termo metabolismo inter- mediário frequentemente é aplicado às atividades combi- nadas de todas as vias metabólicas que interconvertem pre- cursores, metabólitos e produtos de baixo peso molecular (em geral, Mr , 1.000). O catabolismo é a fase de degradação do metabolis- mo, na qual moléculas nutrientes orgânicas (carboidratos, gorduras e proteínas) são convertidas em produtos finais menores e mais simples (como ácido láctico, CO2 e NH3). As vias catabólicas liberam energia, e parte dessa energia é conservada na forma de ATP e de transportadores de elétrons reduzidos (NADH, NADPH e FADH2); o restante é perdido como calor. No anabolismo, também chamado de biossíntese, precursores pequenos e simples formam moléculas maiores e mais complexas, incluindo lipídeos, polissacarídeos, proteínas e ácidos nucleicos. As reações anabólicas necessitam de fornecimento de energia, geral- mente na forma de potencial de transferência do grupo fosforil do ATP e do poder redutor de NADH, NADPH e FADH2 (Figura 3). Heterotróficos Autotróficos fotossintetizantes Pr od uto s orgânicos O2 CO2 H2O FIGURA 1 Ciclo do dióxido de carbono e do oxigênio entre o domí- nio autotrófico (fotossintético) e o heterotrófico na biosfera. O fluxo de massa por esse ciclo é enorme; 4 3 1011 toneladas de carbono são recicla- das anualmente na biosfera. Bactérias e arqueias fixadoras de nitrogênio Bactérias Anamox Bactérias, arqueias e fungos desnitrificantes Bactérias nitrificantes Bactérias e arqueiasnitrificantes Plantas Plantas Animais NH14 Amônia NO22 Nitrito NO23 Nitrato N2 na atmosfera Aminoácidos FIGURA 2 Ciclo do nitrogênio na biosfera. O nitrogênio (N2) gasoso compreende mais de 80% da atmosfera da Terra. Nelson_6ed_book.indb 502 Nelson_6ed_book.indb 502 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 503 Algumas vias metabólicas são lineares e algumas são ra- mificadas, gerando múltiplos produtos finais úteis a partir de um único precursor ou convertendo vários precursores em um único produto. Em geral, as vias catabólicas são convergentes e as vias anabólicas são divergentes (Figura 4). Algumas vias são cíclicas: um composto inicial da via é regenerado em uma série de reações que converte outro componente inicial em um produto. Serão analisados exem- plos de cada tipo de via nos capítulos a seguir. A maioria das células tem as enzimas para realizar tanto a degradação quanto a síntese das categorias importantes de biomoléculas – ácidos graxos, por exemplo. No entanto, a síntese e a degradação simultâneas de ácidos graxos se- riam inúteis, e isso é evitado pela regulação recíproca das sequências de reações anabólicas e catabólicas: quando uma sequência está ativa, a outra está suprimida. Tal regu- lação não poderia ocorrer se as vias anabólicas e catabóli- cas fossem catalisadas por exatamente o mesmo grupo de enzimas, operando em um sentido para o anabolismo, e no sentido oposto para o catabolismo: a inibição de uma enzi- ma envolvida no catabolismo também inibiria a sequência de reações no sentido do anabolismo. As vias catabólicas e anabólicas que conectam os mesmos produtos finais (p. ex., glicose S S piruvato, e piruvato S S glicose) podem empregar muitas das mesmas enzimas, mas invariavelmen- te pelo menos uma das etapas é catalisada por enzimas di- ferentes nos sentidos catabólico e anabólico, e essas enzi- mas constituem pontos de regulação independentes. Além disso, a fim de que as vias anabólicas e catabólicas sejam essencialmente irreversíveis, pelo menos uma das reações específicas de cada sentido deve ser termodinamicamente muito favorável – em outras palavras, uma reação cuja rea- ção inversa é muito desfavorável. Como contribuição adi- cional à regulação independente das sequências de reações anabólicas e catabólicas, elas geralmente ocorrem em com- partimentos celulares distintos: por exemplo, o catabolismo de ácidos graxos na mitocôndria, e a síntese dos ácidos gra- xos no citosol. As concentrações de intermediários, enzi- mas e reguladores podem ser mantidas em diferentes níveis nesses compartimentos distintos. Como as vias metabólicas são cineticamente controladas pela concentração do subs- trato, conjuntos separados de intermediários anabólicos e catabólicos também contribuem para o controle das taxas metabólicas. Esses recursos que separam os processos ana- bólicos e catabólicos serão de interesse particular em nossa discussão sobre o metabolismo. As vias metabólicas são reguladas em vários níveis, den- tro e fora das células. A regulação mais imediata é a dispo- nibilidade de substrato; quando a concentração intracelu- lar do substrato de uma enzima está próxima ou abaixo do Km (como é o caso, comumente), a velocidade de reação depende muito da concentração do substrato (ver Figura 6-11). Um segundo tipo de controle rápido dentro da célula é a regulação alostérica (p. 226) por um intermediário me- tabólico ou por uma coenzima – um aminoácido ou ATP, por exemplo – que sinaliza o estado metabólico no interior da célula. Quando a célula contém uma quantidade de asparta- to, por exemplo, suficiente para suas necessidades imedia- tas, ou quando os níveis celulares de ATP indicam não ser necessário o consumo adicional de combustível no momen- to, esse sinais inibem alostericamente a atividade de uma ou mais enzimas nas vias pertinentes. Em organismos mul- ticelulares, as atividades metabólicas de tecidos diferentes são reguladas e integradas por fatores de crescimento e hormônios que atuam de fora da célula. Em alguns casos, essa regulação ocorre quase que instantaneamente (algu- mas vezes em menos de um milissegundo) por alterações nos níveis dos mensageiros intracelulares que, por sua vez, modificam a atividade de enzimas intracelulares por meca- nismos alostéricos ou por modificações covalentes, como a fosforilação. Em outros casos, o sinal extracelular modifica a concentração celular de uma enzima alterando a velocida- de de sua síntese ou degradação, de tal forma que o efeito é visto apenas em minutos ou horas. A Parte II inicia com uma discussão sobre os princípios energéticos básicos que governam todo o metabolismo (Ca- pítulo 13). Em seguida, aborda as principais vias metabóli- cas pelas quais as células obtêm energia a partir da oxida- ção de vários combustíveis (Capítulos 14 a 19). O Capítulo 19 é o ponto principal da discussão sobre o metabolismo; ele trata do acoplamento de energia quimiosmótica, meca- nismo universal em que um potencial eletroquímico trans- Moléculas precursoras Aminoácidos Açúcares Ácidos graxos Bases nitrogenadas Nutrientes energéticos Carboidratos Gorduras Proteínas Anabolismo ATP NADH NADPH FADH2 Catabolismo Energia química ADP 1 HPO2 NAD1 NADP1 FAD Macromoléculas celulares Proteínas Polissacarídeos Lipídeos Ácidos nucleicos Produtos finais sem energia CO2 H2O NH3 FIGURA 3 A relação energética entre as vias catabólicas e anabóli- cas. As vias catabólicas liberam energia química na forma de ATP, NADH, NADPH e FADH2. Esses transportadores de energia são usados em vias ana- bólicas para converter precursores pequenos em macromoléculas celulares. Nelson_6ed_book.indb 503 Nelson_6ed_book.indb 503 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 504 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX membrana, produzido tanto por oxidação de substratos como por absorção de luz, promove a síntese de ATP. Os Capítulos 20 a 22 descrevem as principais vias ana- bólicas pelas quais as células utilizam a energia do ATP para produzir carboidratos, lipídeos, aminoácidos e nucleotídeos a partir de precursores mais simples. O Capítulo 23 volta a abordar o estudo das vias metabólicas – como elas ocorrem em todos os organismos, de Escherichia coli a humanos – e considera como elas são reguladas e integradas por me- canismos hormonais nos mamíferos. No momento em que o foco de estudo será o metabo- lismo intermediário, uma observação final. Não esqueça de que uma grande quantidade das reações descritas nestas páginas ocorre e tem funções fundamentais em organis- mos vivos. A cada reação e a cada via que você encontrar, questione: o que essa transformação química faz pelo or- ganismo? Como essa via se conecta com as outras vias que operam simultaneamente na mesma célula para produzir a energia e os produtos necessários para a manutenção e o crescimento da célula? Como os diferentes níveis dos me- canismos de regulação cooperam para o balanço metabólico e o fornecimento e consumo de energia, alcançando o es- tado de equilíbrio dinâmico da vida? Estudando com essa perspectiva, o metabolismo proporciona dados fascinantes e reveladores sobre a vida, com aplicações incontáveis na medicina, agricultura e biotecnologia. Borracha Ácidos biliares Hormônios esteroides (a) Catabolismo convergente (b) Anabolismo divergenteOxaloacetato CO2 CO2 (c) Via cíclica Acetato (acetil-CoA) Citrato PiruvatoGlicoseGlicogênio Fosfolipídeos Alanina Ácidos graxos Leucina Fenilalanina Isoleucina Amido SerinaSacarose Eicosanoides Fosfolipídeos Pigmentos carotenoides Vitamina K Triacilgliceróis Ésteres de colesteril TriacilgliceróisMevalonato Isopentenil- -pirofosfato Ácidos graxos Acetoacetil-CoA Diacilglicerol-CDP Colesterol FIGURA 4 Três tipos de vias metabólicas não linea- res. (a) Convergente, catabólica, (b) divergente, anabólica, e (c) cíclica. Em (c), um dos compostos de partida (no caso, o oxaloacetato) é regenerado e reingressa na via. O acetato, um intermediário metabólico chave, é o produto da degradação de uma variedade de combustíveis (a), serve de precursor de um grande número de produtos (b) e é consumido na via ca- tabólica conhecida como o ciclo do ácido cítrico (c). Nelson_6ed_book.indb 504 Nelson_6ed_book.indb 504 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 13.1 Bioenergética e termodinâmica 506 13.2 Lógica química e reações bioquímicas comuns 511 13.3 Transferência de grupos fosforil e ATP 517 13.4 Reações biológicas de oxidação-redução 528 As células e os organismos vivos devem realizar traba-lho para permanecer vivos, crescer e se reproduzir. A capacidade de controlar a energia e direcioná-la para o trabalho biológico é uma propriedade fundamental de todos os organismos vivos; essa capacidade deve ter sido adquiri- da muito cedo no curso da evolução celular. Os organismos modernos realizam uma notável variedade de transduções da energia, conversões de uma forma de energia em outra. Usam a energia química dos combustíveis para sintetizar macromoléculas complexas, altamente organizadas, a par- tir de precursores simples. Também convertem a energia química dos combustíveis em gradientes de concentração e em gradientes elétricos, em movimento e calor e, em alguns organismos como o vaga-lume e peixes do fundo do mar, em luz. Os organismos fotossintéticos transformam a energia luminosa em todas essas outras formas de energia. Os mecanismos químicos envolvidos nas transduções biológicas de energia têm fascinado e desafiado biólogos por séculos a fio. O químico francês Antoine Lavoisier reconheceu que de alguma forma os animais transformam os combustíveis químicos (alimentos) em calor e que esse processo de respiração é essencial para a vida. Ele ob- servou que ...em geral, a respiração é nada mais que a combustão lenta de carbono e hidrogênio, seme- lhante à que ocorre em uma lâmpada ou vela acesa e, desse ponto de vista, animais que respiram são corpos com- bustíveis que queimam e consomem a si próprios... Al- guém poderia dizer que essa analogia entre combustão e respiração não passou despercebida pelos poetas, ou ainda pelos filósofos da antiguidade, já tendo sido re- latada e interpretada por eles. Esse fogo roubado dos céus, essa tocha de Prometeu, não representa apenas uma ideia engenhosa e poética, ela é um retrato fiel das operações da natureza, pelo menos para os animais que respiram; portanto, alguns podem dizer, com os antigos, que a tocha da vida ilumina a si mesma no momento em que a criança respira pela primeira vez, e ela só se extin- gue na morte.1 A partir do século XX, aumentou a compreensão sobre a química relacionada à “tocha da vida”. As transduções biológicas de energia obedecem às mesmas leis químicas e físicas que governam todos os outros processos naturais. Portanto, é fundamental para um estudante de bioquímica entender essas leis e como elas se aplicam no fluxo de ener- gia na biosfera. Este capítulo começa revisando as leis da termodinâmi- ca e a relação quantitativa entre energia livre, entalpia e entropia. Em seguida, revisa os tipos comuns de reações bioquímicas que ocorrem em células vivas, reações que controlam, armazenam, transferem e liberam a energia ad- quirida pelos organismos do seu meio ambiente. Focaliza, então, as reações com funções especiais nas trocas bioló- gicas de energia, particularmente aquelas envolvendo ATP. Finalmente, considera a importância das reações de oxida- ção-redução em células vivas, as variações energéticas nas transferências biológicas de elétrons, e os transportadores de elétrons comumente utilizados como cofatores nestes processos. 1Memorial redigido por Armand Seguir e Antoine Lavoisier, 1789, citado em Lavoisier, A. (1862) Oeuvres de Lavoisier. Imprimerie Impériale, Paris. 13 Bioenergética e Tipos de Reações Bioquímicas Antoine Lavoisier, 1743-1794 Nelson_6ed_13.indd 505Nelson_6ed_13.indd 505 02/05/14 17:2302/05/14 17:23 506 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX 13.1 Bioenergética e termodinâmica Bioenergética é o estudo quantitativo das transduções energéticas que ocorrem em células vivas – mudança de uma forma de energia a outra – bem como da natureza e da função dos processos químicos envolvidos nessas transdu- ções. Embora muitos dos princípios da termodinâmica te- nham sido introduzidos em capítulos anteriores, podendo, assim, já serem familiares a você, uma revisão dos aspectos quantitativos desses princípios será útil. As transformações biológicas de energia obedecem às leis da termodinâmica Muitas observações quantitativas feitas por físicos e quími- cos sobre a interconversão de diferentes formas de energia levaram, no século XIX, à formulação das duas leis funda- mentais da termodinâmica. A primeira lei é o princípio da conservação da energia: para qualquer mudança física ou química, a quantidade total de energia no universo permanece constante; a energia pode mudar de forma ou pode ser transportada de uma região para outra, mas não pode ser criada ou destruída. A segunda lei da termodinâmica, que pode ser enunciada de diferentes for- mas, diz que o universo sempre tende para o aumento da desordem: em todos os processos naturais, a entropia do universo aumenta. “Agora, na segunda lei da termodinâmica...” Organismos vivos são formados por uma coleção de moléculas, cujo grau de organização é muito maior que o dos componentes do seu meio ambiente a partir dos quais eles são formados, e os organismos produzem e mantêm a organização, aparentemente imunes a segunda lei da termodinâmica. No entanto, os organismos não violam a segunda lei; eles operam em rigorosa concordância com ela. Para discutir as aplicações da segunda lei aos sistemas biológicos, deve-se primeiro definir esses sistemas e o seu meio ambiente. O sistema reagente é a coleção de componentes que es- tão sendo submetidos a um determinado processo químico ou físico; pode ser um organismo, uma célula, ou dois com- postos reagentes. Juntos, o sistema reagente e o seu meio ambiente constituem o universo. No laboratório, alguns processos físicos e químicos podem ser realizados isolados ou em sistemas fechados, nos quais não existe troca de ma- terial ou energia com o meio. No entanto, células vivas e organismos são sistemas abertos, trocando tanto matéria quanto energia com o seu meio ambiente; os sistemas bioló- gicos jamais atingem o equilíbrio com o seu meio ambiente, e a constante interação entre o sistema e o meio explica como os organismos podem se auto-organizar enquanto operam de acordo com a segunda lei da termodinâmica. No Capítulo 1 (p. 23) foram definidos três parâmetros termodinâmicos que descrevem as trocas de energia que ocorrem em reações químicas: Energia livre de Gibbs, G, expressa a quantidade de energia capaz de realizar trabalho durante uma reação à temperatura e pressão constantes. Quando uma reação ocorre com a liberação de energia livre (ou seja, quan- do o sistema se transforma de modo a possuir menos energia livre), a variação da energia livre, DG, possui um valor negativo e a reação é chamada de exergônica. Nas reações endergônicas, o sistema adquire energia livre e o DG é positivo. Entalpia, H, é o conteúdo de calor do sistema rea- gente. Ela reflete o número e o tipo de ligações químicas nos reagentes e produtos. Quando uma reação química libera calor, ela é denominada exotérmica; o conteúdo de calor dos produtosé menor do que o dos reagentes, e DH possui, por convenção, um valor negativo. Os siste- mas reagentes que captam calor do meio são endotérmi- cos e possuem valores positivos de DH. Entropia, S, é uma expressão quantitativa da alea- toriedade ou desordem de um sistema (ver Quadro 1-3). Quando os produtos de uma reação são menos comple- xos e mais desordenados do que os reagentes, a reação ocorre com ganho de entropia. As unidades de DG e DH são joules/mol ou calorias/mol (lembre que 1 cal 5 4,184 J); a unidade de entropia é jou- les/mol · Kelvin (J/mol · K) (Tabela 13-1). Sob as condições existentes nos sistemas biológicos (in- cluindo temperatura e pressão constantes), as variações de energia livre, entalpia e entropia estão quantitativamente relacionadas pela equação DG 5 DH 2 TDS (13-1) em que DG é a variação da energia livre de Gibbs do siste- ma reagente, DH é a variação da entalpia do sistema, T é a temperatura absoluta, e DS é a variação na entropia do sistema. Por convenção, DS possui sinal positivo quando a entropia aumenta e DH, como mencionado anteriormente, possui sinal negativo quando o sistema libera calor para o meio. Qualquer uma dessas condições, típicas de processos Nelson_6ed_book.indb 506 Nelson_6ed_book.indb 506 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 507 energeticamente favoráveis, tendem a tornar negativo o va- lor de DG. De fato, o valor de DG de um sistema reagente espontâneo é sempre negativo. A segunda lei da termodinâmica afirma que a entropia do universo aumenta durante todos os processos químicos e físicos, embora o aumento da entropia não ocorra necessa- riamente no próprio sistema reagente. A organização pro- duzida dentro das células, à medida que elas crescem e se dividem, é mais do que compensada pela desordem gerada no meio no curso do crescimento e da divisão (ver Quadro 1-3, caso 2). Em resumo, os organismos vivos preservam sua organização interna por captarem a energia livre do meio na forma de nutrientes ou luz solar, e devolverem a ele uma quantidade de energia igual, na forma de calor e entropia. As células necessitam de fontes de energia livre As células são sistemas isotérmicos – elas funcionam es- sencialmente em temperaturas constantes (e também em pressão constante). O fluxo de calor não é uma fonte de energia para as células, já que o calor é capaz de realizar trabalho somente quando passa por uma região ou por um objeto com temperatura inferior. A energia que as células podem e devem utilizar é a energia livre, descrita como uma função da energia livre de Gibbs, G, que permite predizer o sentido das reações químicas, sua posição de equilíbrio exa- ta, e a quantidade de trabalho que elas podem (em teoria) realizar em temperatura e pressão constantes. As células heterotróficas adquirem energia livre a partir das moléculas de nutrientes, e as células fotossintetizantes adquirem ener- gia livre da radiação solar absorvida. Os dois tipos de células tranformam essa energia livre em ATP e em outros com- postos ricos em energia, capazes de fornecer energia para a realização de trabalho biológico em temperatura constante. A variação da energia livre padrão está diretamente relacionada à constante de equilíbrio A composição de um sistema reagente (uma mistura de reagentes e produtos químicos) tende à variação contínua até que o equilíbrio seja atingido. Nas concentrações de equilíbrio dos reagentes e dos produtos, as velocidades das reações direta e inversa são exatamente as mesmas, e não ocorre variação líquida adicional do sistema. As concentra- ções dos reagentes e dos produtos no equilíbrio definem a constante de equilíbrio, Keq (p. 25). Na reação geral aA 1 bB ∆ cC 1 dD, onde a, b, c e d são o número de molécu- las de A, B, C e D que participam da reação, a constante de equilíbrio é dada por (13-2) onde [A], [B], [C] e [D] são as concentrações molares dos componentes da reação no ponto de equilíbrio. Quando o sistema reagente não está em equilíbrio, a tendência em direção ao equilíbrio representa uma força motriz cuja intensidade pode ser expressa como a variação de energia livre para a reação, DG. Em condições-padrão (298 K 5 25°C), quando os reagentes e os produtos estão presentes em concentração igual a 1 M ou, para os gases, em pressão parcial de 101,3 quilopascais (kPa), ou 1 atm, a força que move o sistema na direção do equilíbrio é definida como a variação de energia livre padrão, DG°. Por esta de- finição, o estado-padrão para as reações que envolvem íons hidrogênio é [H1] 5 1 M, ou pH 0. A maior parte das reações bioquímicas, no entanto, ocorre em soluções aquosas devi- damente tamponadas em valores de pH próximos a 7; tanto o pH como a concentração da água (55,5 M) são essencial- mente constantes. CONVENÇÃOCHAVE: Para conveniência dos cálculos, os bio- químicos definem o estado-padrão como diferente daquele utilizado por químicos e físicos: no estado-padrão bioquími- co, [H1] é 1027 M (pH 7) e [H2O] é 55,5 M. Para as reações que envolvem Mg21 (que inclui a maioria daquelas nas quais o ATP é um reagente), a [Mg21] em solução é comumente considerada constante em 1 mM. ■ As constantes físicas com base nesse estado-padrão bio- químico são chamadas de constantes-padrão aparentes e são escritas com uma apóstrofe (como DG9° e K9eq) para distingui-las das constantes não aparentes utilizadas pelos químicos e físicos. (Note que a maioria dos outros livros- -texto usa o símbolo DG°9 em vez de DG9°. O uso de DG9°, recomendado por um comitê internacional de químicos e bioquímicos, visa enfatizar que a energia livre aparente, DG9, é o critério para o equilíbrio.) Por simplicidade, daqui por diante essas constantes aparentes serão chamadas de variações de energia livre padrão. CONVENÇÃOCHAVE: Em uma outra convenção para simpli- ficação utilizada pelos bioquímicos, quando H2O, H 1 e/ou Mg21 são reagentes ou produtos, as suas concentrações não são incluídas nas equações, como na Equação 13-2, mas es- tão incorporadas nas constantes K9eq e DG9°. ■ Assim como a K9eq é uma constante física característica para cada reação, DG9° também é uma constante. Conforme TABELA 131 Algumas constantes físicas e unidades utilizadas na termodinâmica Constante de Boltzmann, k 5 1,381 3 10223 J/K Número de Avogadro, N 5 6,022 3 1023 mol21 Constante de Faraday, 5 96.480 J/V · mol Constante dos gases, R 5 8,315 J/mol · K (5 1,987 cal/mol · K) A unidade de DG e DH é J/mol (ou cal/mol) A unidade de DS é J/mol · K (ou cal/mol · K) 1 cal 5 4,184 J A unidade de temperatura absoluta, T, é o grau Kelvin, K 25°C 5 298 K A 25°C, RT 5 2,478 kJ/mol (5 0,592 kcal/mol) Nelson_6ed_book.indb 507 Nelson_6ed_book.indb 507 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 508 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX foi mencionado no Capítulo 6, existe uma relação simples entre K9eq e DG9°: DG9° 5 2RT ln K9eq (13-3) A variação de energia livre padrão de uma reação quí- mica é simplesmente uma forma matemática alternati- va para expressar sua constante de equilíbrio. A Tabela 13-2 mostra a relação entre DG9° e K9eq. Se a constante de equilíbrio para uma determinada reação for igual a 1,0, a variação de energia livre padrão dessa reação é igual a zero (o logaritmo natural de 1,0 é zero). Se a K9eq de uma reação for maior que 1,0, seu DG9° é negativo. Se K9eq for menor que 1,0, seu DG9° é positivo. Como a relação entre DG9° e K9eq é exponencial, variações relativamente pequenas em DG9° correspondem a uma grande mudança em K9eq. Pode ser útil pensar na variação de energia livre de ou- tra forma. DG9° é a diferença entre o conteúdo de energia livre dos produtos e o conteúdo de energia livre dos rea- gentes, em condições-padrão.Quando DG9° é negativo, os produtos contêm menos energia livre do que os reagen- tes e a reação ocorrerá espontaneamente em condições- -padrão; todas as reações químicas tendem a seguir no sentido que resulta em um decréscimo na energia livre do sistema. Um valor positivo de DG9° significa que os produ- tos da reação contêm mais energia livre do que os reagen- tes, e essa reação tenderá a seguir no sentido inverso, se iniciarmos com concentrações iguais a 1,0 M para todos os componentes (condições-padrão). A Tabela 13-3 resume esses pontos. PROBLEMA RESOLVIDO 131 Cálculo de DG9° Calcule a variação de energia livre padrão da reação catali- sada pela enzima fosfoglicomutase: Glicose-1-fosfato ∆ glicose-6-fosfato sendo que, iniciando a reação com 20 mM de glicose-1- -fosfato e ausência de glicose-6-fosfato, o equilíbrio final da mistura a 25°C e pH 7,0 contém 1,0 mM de glicose-1-fosfato e 19 mM de glicose-6-fosfato. A reação no sentido da for- mação de glicose-6-fosfato ocorre com perda ou ganho de energia livre? Solução: Primeiro calcula-se a constante de equilíbrio: [glicose-6-fosfato] [glicose-1-fosfato] Agora, é possível calcular a variação de energia livre padrão: Como a variação de energia livre padrão é negativa, a con- versão de glicose-1-fosfato em glicose-6-fosfato ocorre com perda (liberação) de energia livre. (Para a reação inversa, o DG9° contém a mesma magnitude, mas o sinal oposto.) A Tabela 13-4 fornece a variação de energia livre padrão para algumas reações químicas representativas. Note que a hidrólise de ésteres simples, amidas, peptídeos e glicosíde- os, assim como os rearranjos e as eliminações, ocorre com variações relativamente pequenas de energia livre padrão, enquanto a hidrólise de anidridos ácidos é acompanhada pelo decréscimo relativamente grande da energia livre pa- drão. A oxidação completa de compostos orgânicos como a glicose ou o palmitato em CO2 e H2O, reações que requerem muitas etapas nas células, resulta em um decréscimo muito grande da energia livre padrão. No entanto, as variações de energia livre padrão, como aquelas da Tabela 13-4, indicam o quanto de energia livre está disponível a partir de uma reação em condições-padrão. Para descrever a energia li- berada sob as condições existentes nas células, é essencial uma expressão para a variação de energia livre real. TABELA 132 Relação entre as constantes de equilíbrio e as variações de energia livre das reações químicas K9eq DG9° (kJ/mol) (kcal/mol)* 103 217,1 24,1 102 211,4 22,7 101 25,7 21,4 1 0,0 0,0 1021 5,7 1,4 1022 11,4 2,7 1023 17,1 4,1 1024 22,8 5,5 1025 28,5 6,8 1026 34,2 8,2 * Embora joules e quilojoules sejam as unidades padrão de energia e as utilizadas neste texto, algumas vezes os bioquímicos e nutricionistas expressam os valores de DG9° em quilocalorias por mol. Consequentemente, foram incluídos valores tanto em quilojoules como em quilocalorias nesta tabela e nas Tabelas 13-4 e 13-6. Para converter quilojoules em quilocalorias, divida o número de quilojoules por 4,184. TABELA 133 Relação entre os valores de K9eq e DG9° e o sentido das reações químicas Quando K9eq é... DG9° é... Iniciando com 1 M de todos os componentes, a reação... . 1,0 negativo ocorre no sentido direto 1,0 zero está no equilíbrio , 1,0 positivo ocorre no sentido inverso Nelson_6ed_book.indb 508 Nelson_6ed_book.indb 508 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 509 A variação de energia livre real depende das concentrações dos reagentes e dos produtos É preciso ter cuidado ao distinguir entre duas grandezas diferentes: a variação de energia livre real, DG, e a varia- ção de energia livre padrão, DG9°. Cada reação química possui uma variação de energia livre padrão característi- ca, que pode ser positiva, negativa ou nula, dependendo da constante de equilíbrio da reação. A variação de ener- gia livre padrão nos diz em que sentido e até onde uma dada reação deve seguir para atingir o equilíbrio quando a concentração inicial de cada componente é 1,0 M, em pH 7,0, temperatura de 25°C e pressão de 101,3 kPa (1 atm). Assim, DG9° é constante, tendo um valor carac- terístico e imutável para uma dada reação. No entanto, a variação da energia livre real, DG, é uma função das concentrações dos reagentes e produtos e da tempera- tura que prevalece durante a reação, e nenhum desses parâmetros será necessariamente igual às condições-pa- drão, como definidas anteriormente. Além disso, o DG de qualquer reação que ocorra espontaneamente em direção ao seu equilíbrio é sempre negativo, torna-se menos ne- gativo ao longo da reação, e é zero no ponto de equilíbrio, indicando que não pode mais ser realizado trabalho pela reação. DG e DG9° para uma determinada reação aA 1 bB ∆ cC 1 dD estão relacionados pela equação (13-4) na qual os termos em vermelho são aqueles que realmente prevalecem no sistema em observação. A concentração dos termos nessa equação expressa o efeito comumente cha- mado de ação das massas, e o termo [C]c[D]d/[A]a[B]b é cha- mado de razão da ação das massas, Q. Assim, a Equação 13-4 pode ser expressa como DG 5 DG9° 1 RT ln Q. Como exemplo, supõe-se que a reação A 1 B ∆ C 1 D esteja TABELA 134 Variações de energia livre padrão de algumas reações químicas Tipo de reação DG9° (kJ/mol) (kcal/mol) Reações de hidrólise Anidridos de ácidos Anidrido acético 1 H2O ¡ 2 acetato ATP 1 H2O ¡ ADP 1 Pi ATP 1 H2O ¡ AMP 1 PPi PPi 1 H2O ¡ 2Pi UDP-glicose 1 H2O ¡ UMP 1 glicose-1-fosfato 291,1 230,5 245,6 219,2 243,0 221,8 27,3 210,9 24,6 210,3 Ésteres Acetato de etila 1 H2O ¡ etanol 1 acetato Glicose-6-fosfato 1 H2O ¡ glicose 1 Pi 219,6 213,8 24,7 23,3 Amidas e peptídeos Glutamina 1 H2O ¡ glutamato 1 NH 1 4 Glicilgliena 1 H2O ¡ 2 glicina 214,2 29,2 23,4 22,2 Glicosídeos Maltose 1 H2O ¡ 2 glicose Lactose 1 H2O ¡ glicose 1 galactose 215,5 215,9 23,7 23,8 Rearranjos Glicose-1-fosfato ¡ glicose-6-fosfato Frutose-6-fosfato ¡ glicose-6-fosfato 27,3 21,7 21,7 20,4 Eliminação de água Malato ¡ fumarato 1 H2O 3,1 0,8 Oxidação com oxigênio molecular Glicose 1 6O2 ¡ 6CO2 1 6H2O Palmitato 1 23O2 ¡ 16CO2 1 16H2O 22.840 29.770 2686 22.338 Nelson_6ed_book.indb 509 Nelson_6ed_book.indb 509 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 510 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX ocorrendo em condições-padrão de temperatura (25°C) e pressão (101,3 kPa), mas que as concentrações de A, B, C e D não sejam iguais e nenhum dos componentes esteja presente na concentração-padrão de 1,0 M. Para determi- nar a variação de energia livre real, DG, nessa condição não padrão de concentração à medida que a reação ocorre da esquerda para a direita, simplesmente aplicam-se as con- centrações reais de A, B, C e D na Equação 13-4; os valo- res de R, T e DG9° são os valores-padrão. DG é negativo e se aproxima do zero à medida que a reação evolui, já que as concentrações reais de A e B diminuem e as concentra- ções de C e D aumentam. Note que quando a reação está no equilíbrio – quando não há mais força que estimule a reação em nenhum dos sentidos e DG é zero – a Equação 13-4 reduz-se a ou DG9° 5 2RT ln K9eq que é a equação que relaciona a variação de energia livre padrão e a constante de equilíbrio (Equação 13-3). O critério para avaliar a espontaneidade de uma reação é o valor de DG, e não de DG9°. Uma reação com DG9° po- sitivo pode ocorrer no sentido direto se o DG for negativo. Isto é possível se o termo RT ln ([produtos]/[reagentes]) na Equação 13-4 for negativo e possuir valor absoluto maior que DG9°. Por exemplo, a remoção imediata dos produtosde uma reação pode manter a relação [produtos]/[reagen- tes] muito abaixo de 1, de forma que o termo RT ln ([produ- tos]/[reagentes]) apresenta um grande valor negativo. DG9° e DG são expressões da quantidade máxima de energia li- vre que uma dada reação pode teoricamente liberar – uma quantidade de energia que poderia ser utilizável apenas me- diante a presença de um dispositivo muito eficiente para captá-la ou dirigi-la. Já que tal dispositivo não é factível (parte da energia sempre é perdida para a entropia durante qualquer processo), a quantidade de trabalho realizada pela reação a temperatura e pressão constantes é sempre menor que a quantidade teoricamente disponível. Outro ponto importante é que algumas reações termo- dinamicamente favoráveis (ou seja, reações em que o DG9° é grande e negativo) não ocorrem em velocidades mensu- ráveis. Por exemplo, a combustão da lenha em CO2 e H2O é muito favorável termodinamicamente, mas a lenha perma- nece estável por anos já que a energia de ativação (ver Fi- guras 6-2 e 6-3) para a reação de combustão é maior do que a energia disponível à temperatura ambiente. Se a energia de ativação necessária é fornecida (p. ex., por um fósforo aceso), a combustão terá início, convertendo a madeira nos produtos mais estáveis CO2 e H2O, e liberando energia nas formas de calor e luz. O calor liberado por essa reação exo- térmica fornece a energia de ativação para a combustão das regiões vizinhas à lenha; o processo é autopropagável. Em células vivas, as reações que seriam extremamente lentas, caso não fossem catalisadas, prosseguem não pelo fornecimento de calor adicional, mas sim pela redução da energia de ativação pelo uso de enzimas. Uma enzima for- nece uma via de reação alternativa com energia de ativação menor do que a reação não catalisada, de tal forma que, à temperatura ambiente, uma grande fração das moléculas de substrato possui energia térmica suficiente para supe- rar a barreira de ativação, aumentando drasticamente a velocidade da reação. A variação de energia livre para uma reação é independente da via pela qual a reação ocorre; ela depende apenas da natureza e das concentra- ções dos reagentes iniciais e produtos finais. Portanto, as enzimas não podem alterar as constantes de equilíbrio; mas o que elas fazem é aumentar a velocidade pela qual a reação ocorre no sentido determinado pela termodinâmica (ver Seção 6.2). As variações de energia livre padrão são aditivas No caso de duas reações químicas sequenciais, A ∆ B e B ∆ C, cada reação possui sua própria constante de equilíbrio e cada uma possui sua variação de energia livre padrão característica, DG91° e DG92°. Como as duas reações são sequenciais, B é cancelado, resultando na reação geral A ∆ C, que possui sua própria constante de equilíbrio e, consequentemente, sua própria variação de energia livre padrão, DG9°total. Os valores de DG9° de reações químicas sequenciais são aditivos. Para a reação geral A ∆ C, o DG9°total é a soma das variações de energia livre padrão indi- viduais, DG91° e DG92°, das duas reações separadas: DG9°total 5 DG91° 1 DG92°. Este princípio da bioenergética explica como uma reação termodinamicamente desfavorável (endergônica) pode ocorrer no sentido direto, acoplando-a a uma reação alta- mente exergônica, por meio de um intermediário comum. Por exemplo, a síntese de glicose-6-fosfato é o primeiro passo na utilização de glicose em muitos organismos: Glicose 1 Pi ¡ glicose-6-fosfato 1 H2O DG9º 5 13,8 kJ/mol O valor positivo de DG9° indica que, em condições-padrão, a reação não tenderá a ocorrer espontaneamente no sentido representado. Outra reação celular, a hidrólise de ATP em ADP e Pi, é muito exergônica: ATP 1 H2O S ADP 1 Pi DG9º 5 230,5 kJ/mol Essas duas reações compartilham os intermediários co- muns, Pi e H2O, e podem ser expressas como reações se- quenciais: Nelson_6ed_book.indb 510 Nelson_6ed_book.indb 510 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 511 A variação de energia livre padrão global é obtida pelo so- matório dos valores de DG9° para as reações individuais: DG9º 5 13,8 kJ/mol 1 (230,5 kJ/mol) 5 2 16,7 kJ/mol A reação global é exergônica. Neste caso, a energia arma- zenada no ATP é utilizada para promover a síntese de gli- cose-6-fosfato, ainda que sua formação a partir de glicose e fosfato inorgânico (Pi) seja endergônica. A via de formação de glicose-6-fosfato a partir de glicose pela transferência de grupo fosforil do ATP é diferente das reações (1) e (2) des- critas anteriormente, embora o resultado final seja equiva- lente ao somatório das duas reações. Nos cálculos termodi- nâmicos, tudo o que importa é o estado do sistema no início e no final do processo; o caminho entre os estados inicial e final é irrelevante. Foi mencionado que DG9° é uma forma de expressar a constante de equilíbrio para uma reação. Para a reação (1) anterior, Note que a H2O não está incluída nessa expressão, e assu- me-se que a sua concentração (55,5 M) mantém-se inalte- rada durante a reação. A constante de equilíbrio para a hi- drólise de ATP é Portanto, a constante de equilíbrio para as duas reações acopladas é Este cálculo ilustra um ponto importante sobre as cons- tantes de equilíbrio: embora os valores de DG9° para duas reações cujo somatório resulte em uma terceira sejam adi- tivos, o K9eq para a reação global é o produto dos valores dos K9eq individuais das duas reações. As constantes de equilíbrio são multiplicativas. Devido ao acoplamento da hidrólise de ATP à síntese de glicose-6-fosfato, o K9eq para a formação de glicose-6-fosfato a partir de glicose aumenta na ordem de 2 3 105. Esta estratégia envolvendo intermediários comuns é utilizada por todas as células vivas na síntese de interme- diários metabólicos e de componentes celulares. Obviamen- te, a estratégia funciona apenas se compostos como o ATP estiverem continuamente disponíveis. Nos capítulos se- guintes, serão consideradas algumas das mais importantes vias celulares para a produção de ATP. RESUMO 13.1 Bioenergética e termodinâmica c As células vivas realizam trabalho constantemente. Elas necessitam de energia para manter suas estru- turas altamente organizadas, sintetizar componentes celulares, gerar correntes elétricas e muitos outros processos. c A bioenergética é o estudo quantitativo das relações de energia e conversões energéticas em sistemas biológi- cos. As transformações biológicas de energia obedecem às leis da termodinâmica. c Todas as reações químicas são influenciadas por duas forças: a tendência de atingir o estado de ligação mais estável (para o qual a entalpia, H, é uma expressão útil) e a tendência de atingir o mais alto grau de desordem, expresso pela entropia, S. A força motriz líquida de uma reação é o DG, a variação de energia livre, que represen- ta o efeito líquido desses dois fatores: DG 5 DH 2 TDS. c A variação de energia livre padrão aparente, DG9°, é uma constante física característica para uma dada rea- ção e pode ser calculada a partir da constante de equilí- brio da reação: DG9° 5 2RT ln K9eq. c A variação de energia livre real, DG, é uma variável que depende de DG9° e das concentrações dos reagen- tes e dos produtos: DG 5 DG9° 1 RT ln([produtos]/ [reagentes]). c Quando DG é elevado e negativo, a reação tende a se- guir no sentido direto; quando DG é elevado e positivo, a reação tende a seguir no sentido inverso; quando DG 5 zero, o sistema está em equílibrio. c A variação de energia livre de uma reação é independen- te da via pela qual a reação ocorre. As variações de ener- gia livre são aditivas; a reação química final resultante de sucessivas reações que compartilham intermediários comuns possui uma variação de energia livre globalque é a soma dos valores de DG para as reações individuais. 13.2 Lógica química e reações bioquímicas comuns As transduções biológicas de energia abordadas neste livro são reações químicas. A química celular não abran- ge todo tipo de reação estudada em um curso típico de química orgânica. Quais reações ocorrem em sistemas biológicos e quais não é algo determinado por (1) sua re- levância para um sistema metabólico em particular e (2) sua velocidade. As duas considerações são importantes no formato das vias metabólicas que serão estudadas ao longo deste livro. Uma reação relevante é aquela que faz uso de um substrato disponível e o converte em um produto útil. No entanto, mesmo uma reação potencialmente relevante pode não ocorrer. Algumas transformações químicas são muito lentas (possuem energias de ativação muito altas) para contribuir com os sistemas vivos, mesmo com a ajuda de poderosos catalisadores enzimáticos. As reações que ocorrem nas células representam uma “caixa de ferra- mentas” que a evolução teria utilizado para construir as vias metabólicas que contornam as reações “impossíveis”. Aprender a reconhecer as reações plausíveis pode ser uma ótima ajuda para desenvolver um conhecimento profundo em bioquímica. Nelson_6ed_book.indb 511 Nelson_6ed_book.indb 511 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 512 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX Mesmo assim, o número de reações metabólicas que ocor- rem em uma célula típica pode parecer exagerado. A maior parte das células tem a capacidade de realizar milhares de reações específicas, catalisadas por enzimas: por exemplo, a transformação de um nutriente simples como a glicose em aminoácidos, nucleotídeos ou lipídeos; a extração de energia a partir da oxidação de combustíveis; ou a polimerização de subunidades monoméricas em macromoléculas. Para estudar essas reações, é essencial alguma organi- zação. Existem padrões na química da vida; você não preci- sa estudar todas as reações individuais para compreender a lógica molecular da bioquímica. A maior parte das reações nas células vivas pertence a uma das cinco categorias ge- rais: (1) reações que criam ou quebram ligações carbono- -carbono; (2) rearranjos internos, isomerizações e elimina- ções; (3) reações com radicais livres; (4) transferência de grupos; e (5) oxidação-redução. A seguir, cada uma dessas categorias será discutida em maior detalhe. Nos capítulos posteriores, serão citados alguns exemplos de cada tipo de reação. Note que os cinco tipos de reações não são mutua- mente excludentes; por exemplo, uma reação de isomeri- zação pode envolver um intermediário do tipo radical livre. No entanto, antes de dar continuidade, é preciso revi- sar dois princípios químicos básicos. Primeiro, uma ligação covalente consiste em um par de elétrons compartilhados, e a ligação pode ser rompida, em geral, de duas formas (Fi- gura 13-1). Na clivagem homolítica, cada átomo deixa a ligação na forma de um radical, carregando um elétron desemparelhado. Na clivagem heterolítica, que é a mais comum, um átomo retém os dois elétrons da ligação. As espécies mais frequentemente geradas quando as ligações C¬C e C¬H são clivadas estão ilustradas na Figura 13-1. Carbânions, carbocátions e íons hidreto são altamente ins- táveis; como será visto, essa instabilidade caracteriza a quí- mica desses íons. O segundo princípio básico é que muitas reações bio- químicas envolvem interações entre nucleófilos (grupos funcionais ricos em elétrons e capazes de doá-los) e ele- trófilos (grupos funcionais deficientes em elétrons e que os procuram). Os nucleófilos doam elétrons e combinam- -se com os eletrófilos. Nucleófilos e eletrófilos comuns em biologia estão representados na Figura 13-2. Note que um átomo de carbono pode agir tanto como um nucleófilo quanto um eletrófilo, dependendo das ligações e dos grupos funcionais que o rodeiam. Reações que criam ou quebram ligações carbono-carbono. A cliva- gem heterolítica de uma ligação C¬C gera um carbânion e um carbocátion (Figura 13-1). Inversamente, a formação de uma ligação C¬C envolve a combinação de um carbâ- C C Radicais de carbono C 1 C C H PrótonCarbânion C 1 HClivagem heterolítica C H Radical de carbono C 1 HClivagem homolítica C H HidretoCarbocátion C 1 C C CarbocátionCarbânion C 1 C Átomo de H H – – – + + + : : : . . . . FIGURA 131 Dois mecanismos para a clivagem de uma ligação C¬C ou C¬H. Em uma clivagem homolítica, cada átomo mantém um dos elé- trons da ligação, resultando na formação de radicais de carbono (carbonos contendo elétrons não pareados) ou átomos de hidrogênio não carregados. Em uma clivagem heterolítica, um dos átomos retém os dois elétrons da li- gação. Isso pode resultar na formação de carbânions, carbocátions, prótons ou íons hidreto. Nucleófilos Eletrófilos NHN :: S–: C–: O–H : O–: C O R: N + C H R: H+ R: P R: Fósforo de um grupo fosfato Próton Sulfidril carregada negativamente Carbânion Grupo amino descarregado Imidazol Íon hidróxido O– O– –O O Oxigênio negativamente carregado (como em um grupo hidroxil desprotonado ou um ácido carboxílico ionizado) Átomo de carbono de um grupo carbonil (o oxigênio mais eletronegativo do grupo carbonil retira elétrons do carbono) Grupo imino protonado (ativado devido ao ataque nucleofílico ao carbono pela protonação da imina) N : FIGURA 132 Nucleófilos e eletrófilos comuns em reações bioquími- cas. Os mecanismos de reações químicas, que descrevem a formação e a quebra de ligações covalentes, estão representados por pontos e setas cur- vas, uma convenção informalmente conhecida como “trajetória do elétron”. Uma ligação covalente consiste em um par de elétrons compartilhado. Os elétrons importantes para o mecanismo da reação, que não participam da li- gação, estão representados por pontos (:). As setas curvas ( ) representam o movimento do par de elétrons. Para o movimento de um único elétron (como em uma reação com radical livre), é usada uma seta de ponta única (tipo anzol) ( ). A maioria dos passos da reação envolve um par de elé- trons não compartilhado. Nelson_6ed_book.indb 512 Nelson_6ed_book.indb 512 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 513 nion nucleofílico e um carbocátion eletrofílico. Carbânions e carbocátions geralmente são tão instáveis que a sua for- mação como intermediários de reação pode ser energetica- mente inacessível, mesmo com catálise enzimática. Para a finalidade da bioquímica celular, essas reações impossíveis – a não ser que seja fornecido um auxílio químico na forma de grupos funcionais contendo átomos eletronegativos (O e N) que podem alterar a estrutura eletrônica dos átomos de carbonos adjacentes, de modo a estabilizar e facilitar a formação dos intermediários carbânion e carbocátion. Os grupos carbonil são particularmente importantes nas transformações químicas das vias metabólicas. O áto- mo de carbono de um grupo carbonil possui uma carga positiva parcial devido à propriedade de retirar elétrons do oxigênio carbonílico, sendo portanto um carbono ele- trofílico (Figura 13-3a). Um grupo carbonil pode então facilitar a formação de um carbânion em um carbono adja- cente por deslocar as cargas negativas do carbânion (Figu- ra 13-3b). Um grupo imino (ver Figura 1-16) pode ter uma função similar (Figura 13-3c). A capacidade de deslocar elétrons dos grupos carbonil e imino pode ainda ser poten- cializada por catálise ácida ou por um íon metálico, como o Mg21 (Figura 13-3d). A importância do grupo carbonil é evidente nas três principais classes de reações em que ligações C¬C são for- madasou quebradas (Figura 13-4): condensações aldóli- cas, condensação de Claisen e descarboxilações. Em cada tipo de reação, um intermediário carbânion é estabilizado por um grupo carbonil, e em muitos casos outro grupo car- bonil fornece o eletrófilo com o qual o carbânion nucleofí- lico reage. A condensação aldólica é uma rota comum para a formação de ligações C¬C; a reação da aldolase na glicó- lise, que converte um composto de seis átomos de carbono em dois compostos de três átomos de carbono, é o inverso de uma condensação aldólica (ver Figura 14-6). Em uma condensação de Claisen, o carbânion é estabilizado pelo carbonil de um tioéster adjacente; um exemplo é a sínte- se de citrato no ciclo do ácido cítrico (ver Figura 16-9). A descarboxilação também envolve, geralmente, a geração de um carbânion estabilizado por um grupo carbonil; um exemplo é a reação da acetoacetato-descarboxilase, que leva à formação de corpos cetônicos durante o catabolismo dos ácidos graxos (ver Figura 17-19). Todas as vias meta- bólicas estão organizadas em torno da introdução de um grupo carbonil em uma localização particular, de modo que uma ligação carbono-carbono adjacente possa ser formada ou clivada. Em algumas reações, uma imina ou um cofator especializado, como piridoxal-fosfato, exerce a função de retirar elétrons do grupo carbonil. O intermediário carbocátion que ocorre em algumas reações que formam ou clivam ligações C¬C é gerado pela eliminação de um grupo de saída muito bom, como o pi- rofosfato (ver as reações de transferência de grupos, a se- guir). Um exemplo é a reação da preniltransferase (Figura 13-5), uma etapa inicial na via de biossíntese do colesterol. Rearranjos internos, isomerizações e eliminações. Outro tipo co- mum de reação celular é um rearranjo intramolecular em que a redistribuição de elétrons resulta em alterações de muitos tipos diferentes, sem alterar o estado de oxidação global da molécula. Por exemplo, grupos diferentes em uma molécula podem sofrer oxidação-redução, sem variar o estado líquido de oxidação da molécula; grupos conten- do ligação dupla podem sofrer um rearranjo cis-trans; ou as posições das ligações duplas podem ser mudadas. Um exemplo de uma isomerização envolvendo oxidação-redu- ção é a formação de frutose-6-fosfato a partir de glicose-6- C(a) O C C C· C(b) O O (c) C CC NH2 C C C NH2 · Me2 (d) C O HA C O FIGURA 133 Propriedades químicas do grupo carbonil. (a) O átomo de carbono de um grupo carbonil é um eletrófilo devido à capacidade de retirar elétrons do átomo de oxigênio eletronegativo, resultando em uma estrutura em que o carbono tem carga positiva parcial. (b) No interior de uma molécula, o deslocamento dos elétrons para um grupo carbonil facilita e estabiliza a formação de um carbânion em um carbono adjacente. (c) As iminas atuam como os grupos carbonil, facilitando a retirada dos elétrons. (d) Os grupos carbonil não atuam sempre sozinhos; sua capacidade como escoadouro de elétrons frequentemente é potencializada pela interação com um íon metálico (Me21, como Mg21) ou com um ácido (HA). 1 2R1 C Condensação aldólica C O R2 H C R3 R4 O H1 R1 C C O R2 H C R3 R4 OH CoA-S C Condensação de Claisen C O H H C R1 S — R2 S — R2H O H1 CoA-S C C O H H C R1 O R C Descarboxilação de um b-ceto ácido C O H H C O O2 H1 R C C O H H H CO2 2 FIGURA 134 Algumas reações comuns de formação e quebra de li- gações C¬C em sistemas biológicos. Tanto para a condensação aldólica como para a condensação de Claisen, um carbânion atua como nucleófilo e o carbono de um grupo carbonil atua como eletrófilo. O carbânion é es- tabilizado em cada caso por outro grupo carbonil no carbono adjacente ao carbânion. Na reação de descarboxilação, um carbânion é formado no car- bono sombreado em azul quando o CO2 é liberado. A reação não ocorreria em velocidade adequada sem o efeito estabilizador do carbonil adjacente ao carbânion. Em qualquer lugar em que um carbânion é mostrado, assume- -se também a presença de uma ressonância estabilizadora com o carbonil adjacente, como representado na Figura 13-3b. Uma imina (Figura 13-3c) ou outro grupo removedor de elétrons (incluindo certos cofatores enzimáticos como o piridoxal) pode substituir o grupo carbonil na estabilização dos car- bânions. Nelson_6ed_book.indb 513 Nelson_6ed_book.indb 513 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 514 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX -fosfato na glicólise (Figura 13-6; esta reação é discutida em detalhes no Capítulo 14): C-1 é reduzido (aldeído para álcool) e C-2 é oxidado (álcool para cetona). A Figura 13- 6b mostra os detalhes dos movimentos dos elétrons neste tipo de isomerização. Um rearranjo cis-trans está ilustrado na reação da prolil-cis-trans-isomerase no enovelamento de certas proteínas (ver Figura 4-8). Uma simples mudan- ça de uma ligação C“C ocorre durante o metabolismo do ácido oleico, um ácido graxo comum (ver Figura 17-10). Alguns exemplos espetaculares de reposicionamento de duplas ligações ocorrem na biossíntese do colesterol (ver Figura 21-33). Um exemplo de uma reação de eliminação que não afeta o estado de oxidação global é a perda de água por um ál- cool, resultando na introdução de uma ligação C“C: R C C H H OH R1 H2O H H C H2O H R C R1 Reações similares podem resultar de eliminações em aminas. Reações envolvendo radicais livres. Antigamente considerada rara, a clivagem homolítica de ligações covalentes com ge- ração de radicais livres é, atualmente, encontrada em uma ampla gama de processos bioquímicos. Alguns exemplos são: isomerizações que fazem uso de adenosilcobalamina (vitamina B12) ou S-adenosilmetionina, que são iniciadas com um radical 59-desoxiadenosil (ver a reação da metil- malonil-CoA-mutase no Quadro 17-2); certas reações de descarboxilação iniciadas por radicais (Figura 13-7); al- gumas reações da redutase, como a catalisada pela ribonu- PPiIsopentenil- -pirofosfato P2O O O2 PO O C O O2 Dimetilalil-pirofosfato C CH3 CH3 ”≈ ≈ C ≈ H2 H H1 ” C C CH3 CH3 ” ≈ HP2O 1C O O2 PO O C O O2 Isopentenil-pirofosfato Carbocátion dimetil-alílico C CH3 H2 CH2 ≈ ≈ ≈ C ≈H2 HH C ≈≈ Geranil-pirofosfato P2O O O2 PO O O O2 FIGURA 135 Os carbocátions na formação da ligação carbono-car- bono. Em uma das primeiras etapas da biossíntese do colesterol, a enzima preniltransferase catalisa a condensação de isopentenil-pirofosfato e dimetil- -pirofosfato, formando geranil-pirofosfato (ver Figura 21-36). A reação é ini- ciada pela eliminação do pirofosfato do dimetil-pirofosfato para gerar um carbocátion, estabilizado por ressonância com a ligação C“C adjacente. H 1C 2C B1 H O OH Glicose-6-fosfato B2 H C C H O OH C OH H C H OH C H OH C H H O P O2 O O2 H 1C 2C OH O Frutose-6-fosfato Intermediário enediol H C OH H C H OH C H OH C H H O P O2 O O2 (a) (b) Fosfoexose- -isomerase ➊ B1 retira um próton. ➍ B2 retira um próton, possibilitando a formação de uma ligação C“O. ➋ Isso possibilita a formação de uma ligação dupla C“C. ➌ Elétrons do grupo carbonil formam uma ligação O¬H com o íon hidrogênio doado por B2. ➎ Um par de elétrons é deslocado da ligação C“C para formar uma ligação C¬H com o próton doado por B1. C B1 H H C H OO H C OH H C O B1 B2 B2 : : : FIGURA 136 As reações de isomerização e eliminação. (a) Conversão de glicose-6-fosfato a frutose-6-fosfato,reação do metabolismo de açúcares catalisada pela fosfoexose-isomerase. (b) Esta reação ocorre por meio de um intermediário enediol. Os quadros em cor salmão indicam a via de oxidação da esquerda para a direita. B1 e B2 são grupos ionizáveis da enzima; eles são capazes de doar e receber prótons (atuando como ácidos ou bases) à medi- da que a reação ocorre. Nelson_6ed_book.indb 514 Nelson_6ed_book.indb 514 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 515 cleotídeo-redutase (ver Figura 22-41); e algumas reações de rearranjo, como as catalisadas pela DNA-fotoliase (ver Figura 25-26). Reações de transferência de grupos. A transferência de grupos acil, glicosil e fosforil de um nucleófilo para outro é comum em células vivas. A transferência de grupo acil geralmente envolve a adição de um nucleófilo ao carbono do carbonil de um grupo acil para formar um intermediário tetraédrico: R C Intermediário tetraédrico O Y X R C O2 Y X R C O Y X2: : A reação da quimotripsina é um exemplo de transfe- rência de grupo acil (ver Figura 6-22). A transferência de grupos glicosil envolve a substituição nucleofílica no C-1 do anel de um açúcar, que é o átomo central de um ace- tal. Em princípio, a substituição poderia prosseguir por via SN1 ou SN2, como descrito na Figura 6-28 para a enzima lisozima. A transferência de grupos fosforil exerce função espe- cial em vias metabólicas, e essas reações de transferência são discutidas em detalhes na Seção 13.3. Um tema geral no metabolismo é a ligação de um bom grupo de saída a um intermediário metabólico a fim de “ativá-lo” para as reações subsequentes. Entre os melhores grupos de saída em reações de substituição nucleofílica estão o ortofosfato inorgânico (a forma ionizada de H3PO4 em pH neutro, uma mistura de H2PO4 2 e HPO4 22, geralmente abreviado como Pi) e o pirofosfato inorgânico (P2O7 42, abreviado como PPi); os ésteres e os anidridos do ácido fosfórico são efetiva- mente ativados para reação. A substituição nucleofílica torna-se mais favorável pela ligação de um grupo fosforil a um grupo de saída pobre, como o hidroxil ¬OH. As subs- tituições nucleofílicas, nas quais o grupo fosforil (¬PO3 22) atua como um grupo de saída, ocorrem em centenas de reações metabólicas. O fósforo pode formar cinco ligações covalentes. A re- presentação convencional de Pi (Figura 13-8a), com três e2 CO2 Coproporfirinogênio III H R R NH 1 H3C X • 2OOC • Radical coproporfirinogenil III 12XH H3C R R NH 2OOC Protoporfirinogênio IX H3C R R NH FIGURA 137 Uma reação de descarboxilação iniciada por radicais livres. A biossíntese do heme (ver Figura 22-26) em Escherichia coli inclui uma etapa de descarboxilação em que a cadeia lateral propionil do inter- mediário coproporfirinogênio III é convertida na cadeia lateral vinil do pro- toporfirinogênio IX. Quando a bactéria está crescendo anaerobiamente, a enzima independente de oxigênio coproporfirinogênio III-oxidase, também chamada de proteína HemN, promove a descarboxilação pelo mecanismo de radical livre mostrado aqui. O receptor do elétron liberado não é conheci- do. Para simplificar, são mostradas apenas as porções relevantes das grandes moléculas de coproporfirinogênio III e protoporfirinogênio; as estruturas completas são mostradas na Figura 22-26. Quando E. coli está crescendo na presença de oxigênio, esta reação é uma descarboxilação oxidativa, sendo catalisada por uma enzima diferente. O O O 32 PO (b) O P O O O O2 OP O2 O2 2O O O2P2O O2 O2P O O2 O2 2O O2PO (a) (c) Adenina Ribose O O P O P O2 HO R O2 P O O2 O2 O O Glicose ATP Adenina Ribose O O P O 2O P OO2 1 O2 P R O2 2O OO ADP Glicose-6-fosfato, um éster-fosfato O O O P WZ (d) OHZ 5 R W 5 ADP FIGURA 138 Transferência de grupos fosforil: alguns dos participan- tes. (a) Em uma representação (inadequada) de Pi, três oxigênios estão liga- dos ao fósforo por ligações simples, e o quarto está ligado por ligação dupla, possibilitando as quatro estruturas de ressonância diferentes mostradas aqui. (b) As estruturas de ressonância de Pi podem ser representadas mais acurada- mente mostrando todas as quatro ligações fósforo-oxigênio com caráter de ligação dupla parcial; os orbitais híbridos assim representados estão arranja- dos em um tetraedro com o P na posição central. (c) Quando um nucleófilo Z (neste caso, a ¬OH do C-6 da glicose) ataca o ATP, ele desloca ADP (W). Nesta reação SN2, um intermediário pentacovalente (d) é formado transitoriamente. Nelson_6ed_book.indb 515 Nelson_6ed_book.indb 515 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 516 DAV I D L . N E L S O N & M I C H A E L M . COX ligações P¬O e uma ligação P“O, é conveniente, mas não é acurada. No Pi, quatro ligações fósforo-oxigênio equiva- lentes compartilham parcialmente o caráter de ligação du- pla, e o ânion tem uma estrutura tetraédrica (Figura 13- 8b). Como o oxigênio é mais eletronegativo que o fósforo, o compartilhamento dos elétrons é desigual: o fósforo central fica com uma carga positiva parcial e, portanto, atua como um eletrófilo. Em um número muito grande de reações me- tabólicas, um grupo fosforil (¬PO3 22) é transferido do ATP para um álcool, formando um éster fosfato (Figura 13-8c), ou para um ácido carboxílico, formando um anidrido misto. Quando um nucleófilo ataca o átomo de fósforo eletrofíli- co do ATP, forma-se um intermediário de reação com uma estrutura pentacovalente relativamente estável (Figura 13- 8d). Com a partida do grupo de saída (ADP), a transferên- cia de um grupo fosforil está completa. A grande família de enzimas que catalisam a transferência de grupos fosforil, com o ATP como doador, é chamada de cinase (do grego, kinein, “mover”). A hexocinase, por exemplo, “move” um grupo fosforil do ATP para a glicose. Os grupos fosforil não são os únicos grupos que ativam moléculas para reação. Os tioálcoois (tióis), em que o áto- mo de oxigênio de um álcool é substituído por um átomo de enxofre, também são bons grupos de saída. Os tióis ativam os ácidos carboxílicos pela formação de tioésteres (ou tiol ésteres). Em capítulos posteriores serão discutidas diversas reações, inclusive aquelas catalisadas pela acil graxo-sinte- tase na síntese de lipídeos (ver Figura 21-2), em que a subs- tituição nucleofílica no carbono do carbonil de um tioéster resulta na transferência do grupo acil para outra região. Reações de oxidação-redução. Os átomos de carbono podem existir em cinco estados de oxidação, dependendo dos ele- mentos com que eles compartilham os elétrons (Figura 13-9), e as transições entre esses estados de oxidação são de importância crucial no metabolismo (as reações de oxi- dação-redução são o tópico da Seção 13.4). Em muitas oxi- dações biológicas, um composto perde dois elétrons e dois íons hidrogênio (ou seja, dois átomos de hidrogênio); essas reações são comumente chamadas de desidrogenações, e as enzimas que as catalisam são chamadas de desidrogena- ses (Figura 13-10). Em algumas oxidações biológicas, mas não em todas, um átomo de carbono é covalentemente liga- do a um átomo de oxigênio. As enzimas que catalisam essas oxidações geralmente são chamadas de oxidases ou, se o átomo de oxigênio é derivado diretamente de um oxigênio molecular (O2), oxigenases. Cada oxidação deve ser acompanhada por uma re- dução, em que um receptor de elétrons recebe os elé- trons removidos na oxidação. As reações de oxidação geralmente liberam energia (pense em uma fogueira: os compostos na madeira são oxidados por moléculas de oxigênio do ar). A maioria das células vivas obtémener- gia necessária para o trabalho celular pela oxidação de combustíveis metabólicos como carboidratos ou gorduras (os organismos fotossintéticos também podem captar e usar a energia da luz solar). As vias catabólicas (que libe- ram energia) descritas nos Capítulos 14 a 19 são sequên- cias de reações oxidativas que resultam na transferência de elétrons das moléculas combustíveis para o oxigênio por meio de uma série de transportadores de elétrons. A alta afinidade do O2 por elétrons torna o processo global de transferência de elétrons altamente exergônico, for- necendo energia que leva à síntese de ATP – o objetivo central do catabolismo. Muitas das reações dessas cinco classes são facilitadas por cofatores, na forma de coenzimas e metais (vitamina B12, S-adenosilmetionina, folato, nicotinamida e ferro são alguns exemplos). Os cofatores ligam-se às enzimas – em alguns casos reversivelmente, em outros casos quase irre- versivelmente – e conferem a elas a capacidade de promo- ver um tipo particular de reação química (p. 190). A maior parte dos cofatores participa em uma estreita faixa de reações diretamente relacionadas. Os capítulos seguintes apresentam e discutem cada cofator biologicamente im- portante. Os cofatores fornecem outra forma de organizar o estudo dos processos bioquímicos, já que as reações fa- cilitadas por um determinado cofator costumam ser meca- nisticamente relacionadas. CH2 AlcanoCH3 CH2 CH2 Álcool Aldeído (cetona) Ácido carboxílico Dióxido de carbono CH2OH O H(R) C CH2 O OO OH C C FIGURA 139 Os níveis de oxidação do carbono em biomolécu- las. Cada composto é formado por oxidação do carbono em vermelho no composto mostrado imediatamente acima. O dióxido de carbono é a forma de carbono mais altamente oxidado encontrada em sistemas vivos. CH3 Lactato PiruvatoLactato- -desidrogenase CH3CH OH C C C O O O2 2H1 2e21 2H1 2e21 O O2 FIGURA 1310 Uma reação de oxidação-redução. Está representada aqui a oxidação do lactato a piruvato. Nesta desidrogenação, dois elétrons e dois íons hidrogênio (o equivalente a dois átomos de hidrogênio) são re- movidos do C-2 do lactato, um álcool, formando piruvato, uma cetona. Nas células, a reação é catalisada pela lactato-desidrogenase, e os elétrons são transferidos para o cofator dinucleotídeo de nicotinamida-adenina (NAD). Esta reação é totalmente reversível; o piruvato pode ser reduzido pela trans- ferência dos elétrons do cofator. Nelson_6ed_book.indb 516 Nelson_6ed_book.indb 516 03/04/14 07:4303/04/14 07:43 P R I N C Í P I O S D E B I O Q U Í M I C A D E L E H N I N G E R 517 As equações bioquímicas e químicas não são idênticas Os bioquímicos representam as equações metabólicas de forma simplificada, e isso é particularmente evidente para as reações envolvendo ATP. Os compostos fosforilados po- dem existir em vários estados de ionização e, conforme já mencionado, as diferentes espécies podem ligar Mg21. Por exemplo, em pH 7,0 e 2 mM de Mg21, o ATP existe na forma de ATP42, HATP32, H2ATP 22, MgHATP2 e Mg2ATP. Conside- rando a função biológica do ATP, no entanto, nem sempre há interesse em todos esses detalhes e, assim, considera- -se o ATP como uma entidade constituída pela soma des- sas espécies e representa-se sua hidrólise como a equação bioquímica ATP 1 H2O ¡ ADP 1 Pi na qual ATP, ADP e Pi correspondem ao somatório das es- pécies. A constante de equilíbrio padrão aparente corres- pondente, K9eq 5 [ADP][Pi]/[ATP], depende do pH e da con- centração de Mg21 livre. Note que H1 e Mg21 não aparecem na equação bioquímica, pois são mantidos constantes. Por- tanto, uma equação bioquímica não inclui necessariamente o equilíbrio de H, Mg ou de cargas, embora ela inclua o equi- líbrio entre todos os outros elementos envolvidos na reação (C, N, O e P na equação acima). É possível escrever uma equação química que inclui o equilíbrio de todos os elementos e cargas. Por exemplo, quando o ATP é hidrolisado em valores de pH acima de 8,5 na ausência de Mg21, a reação química é representada por ATP42 1 H2O S ADP 32 1 HPO4 22 1 H1 A constante de equilíbrio correspondente, K9eq 5 [ADP 32] [HPO4 22][H1]/[ATP42], depende apenas da temperatura, da pressão e da força iônica. As duas formas de representar uma reação metabólica são relevantes em bioquímica. As equações químicas são utilizadas quando se quer levar em consideração todos os átomos e cargas em uma reação, como quando se estuda o mecanismo de uma reação química. As equações bioquí- micas são utilizadas para determinar em qual sentido uma reação ocorrerá espontaneamente, dado um valor de pH e [Mg21] específicos, ou para calcular a constante de equilí- brio da reação. Ao longo deste livro serão utilizadas equações bioquí- micas, a não ser quando o foco for o mecanismo químico envolvido, sendo utilizados os valores de DG9° e K9eq deter- minados em pH 7 e 1 mM de Mg21. RESUMO 13.2 Lógica química e reações bioquímicas comuns c Os sistemas vivos fazem uso de um grande número de reações químicas que podem ser classificadas em cinco tipos gerais. c Os grupos carbonil exercem função especial nas reações que formam ou clivam ligações C¬C. Os intermediários carbânions são comuns e estabilizados por grupos car- bonil adjacentes ou, menos frequentemente, por grupos imino e certos cofatores. c A redistribuição dos elétrons pode produzir rearranjos internos, isomerizações e eliminações. Essas reações incluem oxidação-redução intramolecular, alteração do arranjo cis-trans de ligações duplas e transposições de ligações duplas. c A clivagem homolítica de ligações covalentes com a ge- ração de radicais livres ocorre em algumas vias, como em certas reações de isomerização, descarboxilação, re- dutase e rearranjos. c As reações de transferência de grupos fosforil são um tipo especialmente importante de transferência de gru- pos nas células, necessário para a ativação de moléculas para as reações que de outra forma seriam altamente desfavoráveis. c As reações de oxidação-redução envolvem a perda ou o ganho de elétrons: um reagente ganha elétrons e é re- duzido, enquanto outro perde elétrons e é oxidado. As reações de oxidação geralmente liberam energia e são importantes no catabolismo. 13.3 Transferência de grupos fosforil e ATP Uma vez tendo sido apresentados alguns princípios fun- damentais da variação de energia em sistemas químicos, sendo revisadas as classes comuns de reações, agora é possível examinar o ciclo de energia nas células e a fun- ção especial do ATP como a moeda energética que re- laciona catabolismo e anabolismo (ver Figura 1-29). As células heterotróficas obtêm energia livre de forma quí- mica pelo catabolismo de moléculas de nutrientes, e elas usam essa energia para fazer ATP a partir de ADP e Pi. O ATP, então, doa parte da sua energia química para pro- cessos endergônicos como a síntese de intermediários metabólicos e de macromoléculas a partir de precursores menores, para o transporte de substâncias por meio de membranas contra gradientes de concentração, e para o movimento mecânico. Essa doação de energia do ATP ge- ralmente envolve a sua participação covalente na reação, com a eventual conversão de ATP em ADP e Pi, ou, em algumas reações, em AMP e 2 Pi. Serão discutidas aqui as bases químicas para a grande variação de energia livre que acompanha a hidrólise de ATP e de outros compos- tos de fosfato altamente energéticos, e será mostrado que a maior parte dos casos de doação de energia por ATP envolve a transferência de grupo, e não simplesmente a hidrólise de ATP. Para ilustrar a gama de transduções de energia em que o ATP fornece a energia, será abordada a síntese de macromoléculas ricas em informação, o trans- porte de solutos através
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