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SISTEMA PENAL DE PREVENÇÃO E COMBATE ÀS DROGAS Tráfico de Drogas Responsável pelo Conteúdo: Prof. Dr. Vander Ferreira de Andrade Revisão Textual: Prof. Ms. Luciano Vieira Francisco Nesta unidade, trabalharemos os seguintes tópicos: • Introdução ao Tema • Crimes equiparados ao tráfico • Material Complementar Fonte: Istock/Getty Im ages Objetivos • Indroduzir o aluno à problemática social das drogas • Introduzir o aluno às disposições gerais que incidem sobre a Lei Anti-Drogas • Apresentar as classificações dos crimes da Lei Anti-Drogas • Apresentar as questões dogmáticas mais relevantes da Lei Anti-Drogas Normalmente com a correria do dia a dia, não nos organizamos e deixamos para o último momento o acesso ao estudo, o que implicará o não aprofundamento no material trabalhado ou, ainda, a perda dos prazos para o lançamento das atividades solicitadas. Assim, organize seus estudos de maneira que entrem na sua rotina. Por exemplo, você poderá escolher um dia ao longo da semana ou um determinado horário todos ou alguns dias e determinar como o seu “momento do estudo”. No material de cada Unidade, há videoaulas e leituras indicadas, assim como sugestões de materiais complementares, elementos didáticos que ampliarão sua interpretação e auxiliarão o pleno entendimento dos temas abordados. Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discussão, pois estes ajudarão a verificar o quanto você absorveu do conteúdo, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e aprendizagem. Tráfico de Drogas UNIDADE Tráfi co de Drogas Contextualização A criação de uma nova lei de drogas estabelece que usuários e dependentes de drogas passem a receber tratamento diferenciado; os traficantes continuam sendo julgados pelas Varas de Entorpecentes, com o tempo mínimo de prisão aumentado de três para cinco anos. Dita também a lei o tempo máximo de reclusão permanece em 15 anos. Passa a existir um novo crime de tráfico, de menor amplitude, aquele praticado ocasionalmente e sem intuito de lucro. É de fundamental importância que o operador do Direito tenha conhecimento dessas relevantes inovações legislativas. 6 7 Introdução ao Tema A legislação penal brasileira houve contemplar o crime de tráfico ilícito de drogas no artigo 33 da Lei 11.343/06. Adotando a mesma sistemática empregada quando da redação do crime de posse de drogas para consumo pessoal, entendeu necessário o legislador prever um variado número de verbos que representa cada uma das possíveis condutas que podem ser incriminadas pelo crime de tráfico, conferindo ao mesmo a indispensável classificação de “crime de ação múltipla” ou de “conteúdo variado”. Essa característica que acompanha o delito se torna por demais importante, em especial pelo fato de, havendo o agente cometido diversas condutas dentre as previstas como aptas a ensejar o enquadramento penal em tal crime, não terá o mesmo cometido “várias infração penal”, mas tão somente crime único. No total, são 18 (dezoito) verbos que definem a conduta proibida. São eles: importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas”. O tipo penal, contudo, exige para a configuração do delito que tais comportamentos ocorram “ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”; trata-se do elemento normativo do tipo, indispensável, como já afirmado, para a ocorrência do crime em estudo. Diversamente da legislação anterior (Lei 6368 de 1976) que previa pena mínima ao traficante de 3 (três) anos de reclusão, a nova lei estabelece uma sanção penal de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos de reclusão, além da penalidade pecuniária cumulativa importando no pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Exemplo: Tício encontra-se vendendo comprimidos de “êxtase” (droga ilegal) na via pública, instante em que é preso em flagrante por policiais militares; os agentes da autoridade se dirigem à residência de Tício e lá encontram grande quantidade de cocaína acondicionada em malas de viagem. Nessa hipótese, Tício responde por um único crime de tráfico ilícito de drogas, eis que o delito em exame se caracteriza por ser “crime de ação única” ou de “conteúdo variado”. Assim, a conduta típica pode ser encontrada na própria descrição das condutas proi- bidas, vale dizer, em cada verbo, cada um deles constituído como “núcleo do tipo penal”. Eis assim o significado de cada conduta (verbo): · Importar – fazer ingressar no território nacional, droga ilícita. · Exportar – fazer sair do território nacional, droga ilícita. · Remeter – Enviar droga ilícita de um local para outro, sem estar com a mercadoria e no interior do território nacional. · Preparar - Aprontar droga ilícita para a venda ou para consumo. · Produzir – Ato de fabricar ou elaborar droga ilícita. 7 UNIDADE Tráfi co de Drogas · Fabricar – Ato de produção de droga ilícita em maior escala. · Adquirir – Ato de aquisição de droga ilícita no formato gratuito ou oneroso. · Vender – Ato de alienar droga ilícita por um valor. · Expor à venda – Ato de exibição de droga ilícita. · Oferecer – Ato de oferta de droga ilícita, ou de mostrar a título oneroso ou gratuito. · Ter em depósito – Possuir droga ilícita armazenada ou conservada em al- gum lugar. · Transportar – Ato de transporte de droga ilícita de um lugar para outro; nessa hipótese verifica-se o “acompanhamento”, diverso do ato relativo ao verbo “remeter”. · Trazer consigo – Ato de condução da droga ilícita nas próprias vestes, no corpo, ou em algum acessório. · Guardar – Ato de vigilância da droga ilícita de outra pessoa. · Prescrever – Ato de receitar droga ilícita. · Ministrar – Ato de injetar, aplicar ou servir droga ilícita droga ilícita. · Entregar a consumo – Ato de passar droga ilícita para o consumo de ter- ceira pessoa. · Fornecer – Ato de abastecimento de droga ilícita, ainda que de forma gratuita. Em todos os casos, a prática de tais condutas deve vir associada ao elemento normativo do tipo consistente na expressão “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. Necessita de raciocínio valorativo e leva em conta normas jurídicas ou ético-sociais. Estão descritos em palavras como “indevidamente”, “indevida”, “sem as formalidades legais”, “sem justa causa”, “sem prévia autorização”, “imperícia”, “imprudência”, etc. Existem outros termos jurídicos que necessitam de valoração normativa como “cheque”, “saúde”, “moléstia”, “dignidade”, “documento”, etc. Nesse caso o elemento normativo é o trecho “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. 8 9 Crimes equiparados ao tráfico Nos crimes equiparados ao tráfico, previstos no Art.33, § 1º, inciso I (produtos químicos, insumos e matéria prima) não se exige que a substância contenha o efeito farmacológico (toxidade=princípio ativo) da droga que originará, bastando que se faça prova de que se destina ao seu preparo. O MP terá que provar que os produtos se destinam ao preparo da droga. No inciso II, as condutas semear, cultivar ou colher podem referir-se a pequena, média ou grande quantidade, com finalidade de distribuição da droga. As plantações ilegais serão destruídas pela autoridade policial conforme previsão do Art. 32 da Lei de Drogas. As glebas utilizadas para o cultivo ilícito serão expropriadas pela união e se destinarão ao assentamento de colonos em função da reforma agrária Art. 243 da Constituição Federal. Utilização de local ou bem de qualquer natureza parao tráfico O inciso III trata da utilização de local ou bem de qualquer natureza utilizado para o tráfico ilícito de drogas. O tipo penal pune o agente que não pratica o tráfico diretamente, mas o admite em local (casas noturnas, bares, hotéis, motéis, etc.) ou em bem de qualquer natureza (veículos, aeronaves e embarcações) de que tenha a posse, propriedade ou administração. O sujeito ativo é o proprietário, posseiro, administrador, etc. O sujeito passivo é a Sociedade. Não se admite a forma culposa, deverá ser feita a prova de que havia dolo (elemento subjetivo). Se o local ou o bem se destinarem ao uso indevido de drogas, há duas orientações: 1. A conduta é atípica. A lei é clara no sentido de que o crime consiste em utilização de local ou bem de consumo para o tráfico e não para o uso. Este é o posicionamento da defesa e da defensoria. 2. A conduta configura o crime do art. 33, § 2º, induzimento (Induzir significa criar uma ideia que até então não existia), instigação (Instigar significa reforçar uma ideia pré-existente) ou auxílio (Auxiliar significa prestar ajuda) ao uso indevido da droga. O que tem a posse, propriedade ou administração estaria auxiliando no uso indevido de drogas, está seria a posição da acusação. Trata-se de crime de tráfico, pois o agente através de sua conduta se equipara ao traficante ou, no mínimo, seria partícipe do tráfico alheio. A apologia ao uso ou ao tráfico A apologia ao uso ou ao tráfico, que anteriormente era crime, deixou de ser considerada como tal. É livre a manifestação do pensamento conforme prevê o art. 5º da Constituição Federal. Segundo a doutrina a conduta “apologia ao uso, ao consumo e tráfico de drogas” deixou de ser incriminada pela Lei de Drogas, deste modo, manifestações, distribuição de panfletos ou passeatas, que falem sobre drogas, em primeira análise, não são crime. 9 UNIDADE Tráfi co de Drogas No entanto, convém não olvidar que o Código Penal prevê os crime autônomos e independentes de “apologia ao crime” e de “incitação ao crime”, que podem ter, por ausência de previsão de delito específico na Lei de Drogas, aplicabilidade concreta caso ocorra a conduta vedada pela lei penal. Vejamos as respectivas previsões típicas: Incitação ao crime (art. 286 do Código Penal): Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa. Apologia de crime ou criminoso (art. 287 do Código Penal): Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa. Fazer apologia significa elogiar, louvar, fazer discurso de defesa, assim sendo, quem incorre no delito de apologia ao crime está elogiando, publicamente, autores de crimes ou a ocorrência do crime em si. Incitar significa estimular, impelir, instigar. Neste caso, a incitação ao crime estará caracterizada quando o agente estimula publicamente a prática de um crime. Embora o tema seja bastante controverso na doutrina e na jurisprudência, as denominadas “marchas pela legalização da maconha” ou de outras drogas, não tem sido consideradas como condutas aptas a configurar a infração penal de apologia ao crime. Tais comportamentos tem sido compreendidos como legítima forma de se manifestar, comportamento que encontra amparo nos princípios e diretrizes que emanam do Estado Democrático de Direito onde é conferido a setores sociais, de forma ordeira e pacífica, exercer o direito constitucional de livre expressão e de postular modificações legislativas que sejam analisadas como úteis, necessárias ou válidas. Uso Compartilhado Para que tenhamos a configuração de uso compartilhado, previsto no art. 33, § 3º, faz-se necessária a concomitância de alguns elementos, o oferecimento da droga de forma eventual, a ausência do objetivo de lucro (o sujeito que oferece não pode cobrar), consumo em conjunto (se entregar só para o outro fumar restará em crime de tráfico) e para pessoa do seu relacionamento. A pena do uso compartilhado será de detenção de 6 meses a 1 ano e multa de 700 a 1500 dias multa. A doutrina vê a multa estabelecida como desproporcional em função de que, a multa para o tráfico, prevista no caput é de 500 a 1500. O agente deste crime é o usuário que por educação oferece a droga, logo deveria ter pena de multa menor que a do traficante. Todos os elementos descritos deverão estar presentes, na falta de um dos elementos irá responder por crime de tráfico. Trata-se de crime bi próprio, pois exige vinculo (relacionamento) entre os agentes. Enquanto o “consumo em conjunto” é o elemento positivo do injusto penal, a “ausência de objetivo de lucro” é o elemento negativo. É infração de menor ofensivo, devendo portanto, ser processado no Juizado Especial Criminal (JECRIM). 10 11 Para efeito de reconhecimento do “tráfico privilegiado”, a causa de diminuição de pena, prevista no art. 33, § 4º, exige que o agente seja primário , tenha bons antecedentes (sujeito que, anteriormente, não possuía condenações definitivas), não integre organizações criminosas e nem se dedique a atividades criminosas. Atendendo a todos estes requisitos, o agente terá uma redução de pena que poderá variar de 1/6 a 2/3. Há vedação legal quanto à substituição desta pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos. Em recente decisão, em cede de controle difuso o STF declarou que esta vedação é inconstitucional por ferir o princípio da individualização da pena. Quem deve dizer se pode haver substituição ou não, analisando o caso concreto, é o Juiz. Os artigos 33, caput, § 4º, e 42 da Lei nº 11.343/06 estabelecem o seguinte: Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. (...) Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Devido ao aumento da pena-base imposta aos incursos no art. 33 da Lei 11.343/06, o legislador tratou de implementar, como medida de política criminal, causas de diminuição de pena. Trata-se de assegurar conformidade ao princípio da individualização da pena, tratando-se desigualmente situações distintas. O § 4º prevê que os delitos definidos no caput e no § 1º do artigo 33 poderão ter suas penas reduzidas de um sexto a dois terços, para agentes primários, de bons antecedentes e que não se dediquem a atividades criminosas nem integrem organizações criminosas, sendo-lhes, todavia, vedada a conversão em pena restritiva de direitos. O delito base – no caso, sobre o tipo de art. 33, “caput”, da Lei 11.343/06, que é o único que define o tráfico na Lei de Drogas -, pode incidir circunstâncias que, às vezes, aumentam a pena, às vezes diminuem. Algumas vezes essas circunstâncias estão no mesmo tipo do delito base; outras vezes estão em tipos diferentes. O art. 33 já citado e alguns de seus parágrafos são exemplos do primeiro caso. Os arts. 121 e 123, ambos do Código Penal, são exemplos do segundo caso. 11 UNIDADE Tráfi co de Drogas Assim, poder-se-á aplicar as causas de diminuição de pena do § 4º àqueles que preencheremos seguintes requisitos: · Primariedade: significa não ser reincidente. É não ter cometido novo crime após o trânsito em julgado de sentença que tenha condenado o agente por crime anterior, observando-se a regra do art. 64 do Código Penal; · Bons antecedentes: não haver reconhecimento de fatos tidos como maus praticados pelo réu anteriormente, que vão desde inquéritos e procedimentos criminais em andamento até condenações anteriores irrecorríveis; · Não se dedicar a atividades criminosas: não praticar o réu, com frequência, habitualidade, atividades ilícitas, demonstrando tratar-se de agente com propensão a transgredir normas. · Não integrar organização criminosa: não havendo definição legal para “organização criminosa”, faz-se alusão à mera incursão do agente em quadrilha ou bando para que se torne desmerecedor das causas de diminuição de pena. Em síntese, se aplicarmos o índice de redução de pena em seu grau máximo sobre a pena mínima cominada no caput do art. 33, chegar-se-á à pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, que deverá ser cumprida em regime inicialmente fechado. O artigo 42 da Lei Antidrogas informa requisito de ordem geral a ser observado na fixação das penas, criando critério objetivo de preponderância sobre o que consta no artigo 59 do Código Penal. Exemplo: supondo que certa pessoa trouxesse consigo, para fins de tráfico, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar, 200 (duzentos) papelotes contendo substância droga (cocaína), capaz de causar dependência física e psíquica. É, portanto, denunciado e processado como incurso nas penas do art. 33, caput, da Lei 11.343/06. O processo tem seu curso regular sem qualquer nulidade ou irregularidade a ser sanada. Proferida a sentença, o réu é condenado como incurso no art. 33, §4º da Lei 11.343/06, sendo-lhe aplicada a pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, fixado o regime semi-aberto para cumprimento da reprimenda (mais os dias-multa fixados). Ocorre que, na fixação da pena base, deve o juiz considerar os termos do art. 42 da Lei 11.343/2006: Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. (grifo nosso) Portanto, evidenciada a prática de tráfico em razão da grande quantidade e natureza da substância apreendida, deve a pena base ser exasperada, conforme previsão do art. 42. Neste contexto, no exemplo dado, incorreta a condenação do acusado nas penas do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. 12 13 Em crimes de drogas, na fixação da pena-base, o juiz deve conferir prevalência à natureza e quantidade da substância ou produto (circunstâncias objetivas); em seguida, à personalidade e conduta social do agente (circunstâncias subjetivas). Elas se sobrepõem às demais circunstâncias preconizadas no art. 59 do Código Penal. É que aquelas são mais nocivas e concentram maior danosidade à saúde pública e periculosidade do agente. Assim, o que se tem entendido é que o artigo 42 da Lei 11.343/2006 trouxe circunstância judicial objetiva nova a ser necessariamente analisada por ocasião da fixação da pena base;vale dizer que a lei nova determina ao juiz que, na primeira etapa (fixação da pena-base) deve utilizar o Código Penal (art. 59) subsidiariamente, considerando, com preponderância (maior peso), a natureza (espécie) e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade (caráter do sentenciado) e a conduta social do agente (comportamento do réu no seu ambiente familiar, de trabalho e social). Nesse sentido, deve ser firmado o entendimento de que a grande quantidade de droga deve ser analisada para efeito de se impedir a aplicação da causa de diminuição de pena; vale dizer que, ao lado de situações inequívocas, impõe-se aferir o modus vivendi do agente, sua fonte de receita, sua profissão, etc. Em suma, se a quantidade de droga apreendida foi suficiente para convencer o magistrado a condenar o agente, será considerada para majorar a pena-base (Lei 11.343/06, art. 42), e, consequentemente, para afastar a causa de diminuição. No mesmo sentido é a jurisprudência: STJ-066414 HABEAS CORPUS. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. NATUREZA (COCAÍNA) E QUANTIDADE (676 G) DO ENTORPECENTE. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ACÓRDÃO QUE AFASTOU A MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06, SOB O FUNDAMENTO DE SER PACIENTE INTEGRANTE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. IMPOSSIBILIDADE DE REFORMA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VEDAÇÃO NA ESTREITA VIA DO HABEAS CORPUS. ORDEM DENEGADA. 1. O art. 42 da Lei nº 11.343/2006 impõe ao Juiz considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, tanto na fixação da pena-base quanto na aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da nova Lei de Drogas. 2. Na hipótese, o acórdão impugnado, atento aos elementos coligidos aos autos, afirmou que a natureza da droga (cocaína) e a sua quantidade (676 g) trouxeram maior grau de censurabilidade à conduta da Paciente, razão pela qual fixou a pena-base pouco acima do mínimo legal. 3. A simples valoração das provas descritas no voto condutor do acórdão ora objurgado não permite concluir pela existência de ilegalidade patente na conclusão da Corte Federal a quo. A impetração defende o equívoco do entendimento do Tribunal de origem, o qual considerou, com base nos elementos coligidos aos autos, ser a Paciente integrante de organização criminosa. Conclusão em sentido contrário, exige o alargamento da análise probatória, incompatível com a estreita via do writ. 4. Ordem denegada. (Habeas Corpus nº 136129/SP (2009/0090868-8), 5ª Turma do STJ, Rel. Laurita Vaz. j. 21.10.2010, unânime, DJe 06.12.2010). O artigo 42 da Lei 11.343/2006 foi inserido pelo legislador no ordenamento pátrio em homenagem ao princípio da individualização da pena (fase legislativa). Outrossim, não pode ser desconsiderado pelo juiz na aplicação da pena base. 13 UNIDADE Tráfi co de Drogas Caso contrário, estar-se-ia perpetrando inominável injustiça, pois igualaríamos aquele traficante que foi pego com pouca quantidade de droga de menor periculosidade (10 gramas de maconha, por exemplo) àquele preso com 200 (duzentos) papelotes de cocaína (como no exemplo citado), droga muito mais lesiva. Ora, se a conduta deste último é deveras mais agressiva à sociedade, sua reprimenda deve ser maior. Seguem outros julgados acerca do tema: TRÁFICO DE ENTORPECENTES - RÉ QUE, APÓS DENÚNCIA ANÔNIMA É PRESA EM FLAGRANTE, TRANSPORTANDO 522,0 GRAMAS DE ‘CRACK’ - ABSOLVIÇÃO - PROVAS CONTUNDENTES - IMPOSSIBILIDADE. Impossível se falar em absolvição por tráfico quando, após denúncia anônima, que descrevia as características individuais da ré, ressaltando até que a mesma estaria acompanhada de uma criança, a denunciada é presa em flagrante, trazendo consigo quinhentos e vinte e dois gramas de ‘crack’, tornando impossível o afastamento da distribuição. DEPOIMENTO POLICIAL - VALIDADE. É torrencial a corrente jurisprudencial no sentido de que os policiais, civis ou militares, mormente os que se encontravam no momento e no lugar do crime, não estão impedidos de depor, pois não podem ser considerados inidôneos ou suspeitos, pela simples condição funcional. Se não demonstrados seus interesses diretos na condenação do réu, têm eles o direito de sustentar a legitimidade do trabalho que realizaram.PENA-BASE - PREPONDERÂNCIA DO ART. 42 DA LEI 11.343/06 - QUANTIDADE E DIVERSIDADE DA DROGA - PENA MÍNIMA - IMPOSSIBILIDADE. Além das circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, o art. 42 da Lei Federal 11.343/06, suscita três circunstâncias preponderantes para a fixaçãoda pena-base, de modo que ficando patente a existência de drogas de três naturezas e em quantidade expressiva, circunstância que não foi considerada na sentença, impõe-se a modificação da reprimenda fixada no mínimo legal, sob pena de se negar vigência à própria norma de contenção. TRÁFICO - CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA - ART. 33, § 4º DA LEI FEDERAL 11.343/06 - AFERIÇÃO DE DEDICAÇÃO ÀS ATIVIDADES CRIMINOSAS - INADEQUAÇÃO DA CONDIÇÃO - APLICAÇÃO MANTIDA. Presentes que estejam as condições de primariedade, bons antecedentes, ausência de prova de que o agente integre organização criminosa, impossível afastar a causa de diminuição pelo fato do agente dedicar-se à atividade, dedicação que não foi qualificada na lei, porque a condição é colidente com a própria causa estabelecida, assim, a aplicação da benesse se mostra imperiosa no caso em tela. CAUSA DE DIMINUIÇÃO - RAZÃO MATEMÁTICA - CRITÉRIO - PROPORCIONALIDADE. A ausência de critério a justificar uma razão matemática específica para as hipóteses de aumento ou diminuição, não havendo outros elementos preponderantes a justificarem maior ou menor diminuição ou aumento impõe a adoção do mesmo declinado com justificador da pena-base, por adoção do princípio da proporcionalidade. Recurso ministerial parcialmente provido, negado provimento ao defensivo. (TJMG - 2186296- 94.2007.8.13.0105 – Rel. JUDIMAR BIBER – DJ 22/01/2008) HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DEPENA PREVISTA NO ART. 33, § 4.º, DA NOVA LEI DE TÓXICOS. FIXAÇÃO DOQUANTUM DE REDUÇÃO. APLICAÇÃO, PELO JUÍZO SENTENCIANTE, NO PATAMARDE 1/2. CONFIRMAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTOILEGAL. ORDEM DENEGADA.LEI DE TÓXICOS1. O art. 42 da Lei n.º 11.343/2006 impõe ao Juiz considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga, tanto na fixação da pena-base, quanto na determinação do grau de redução da causa de diminuição depena prevista no § 4.º do art. 33 da nova Lei de Tóxicos. Código Penal§ 4.º 33 Lei de Tóxicos2. Na hipótese, à luz do art. 42 da Lei n.º 11.343/2006, a natureza da substância apreendida - 17 papelotes de cocaína - justifica a não aplicação 14 15 do redutor em seu grau máximo, qual seja: 2/3.3. Não havendo ilegalidade na fixação do quantum a ser reduzido pela minorante do art. 33, § 4.º, da Lei de Drogas, é vedado, na estreita via do habeas corpus, proceder ao amplo reexame dos critérios considerados para a sua fixação, por demandar análise de matéria fático-probatória.4. Ordem denegada. (STJ: 171605 SP 2010/0082237-2, Relator: MIN. LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 06/03/2012, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/03/2012) Finalmente, a pena deve ser cumprida em regime inicialmente fechado, haja vista a hediondez do delito, tanto no que se refere à figura do caput do art. 33 da Lei 11.343/06 quanto àquela conhecida popularmente (e erroneamente) como tráfico privilegiado. Afinal, a causa de diminuição de pena do §4º da Lei 11.343/06, justamente em razão de sua natureza de causa de diminuição, não criou tipo penal diverso daquele previsto na cabeça do artigo. Não se está diante, portanto, de crimes diversos, com implicações outras que não as expressamente previstas em lei. Assim, não pode o aplicador da lei criar distinções onde o legislador não as previu. Com efeito, os tribunais tem diuturnamente confirmado a hediondez do “tráfico privilegiado”, fixando, por consequência, o regime fechado para cumprimento de pena. Vejamos: STJ: REsp 1329088 / RS RECURSO ESPECIAL 2012/0124208-0 Relator(a) Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR (1148) Órgão Julgador S3 - TERCEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 13/03/2013 Data da Publicação/Fonte DJe 26/04/2013 Ementa RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA (ART. 543-C DO CPP). PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. APLICAÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. CAUSA DE DIMINUIÇÃO. CARÁTER HEDIONDO. MANUTENÇÃO. DELITO PRIVILEGIADO. INEXISTÊNCIA. EXECUÇÃO DA PENA. PROGRESSÃO. REQUISITO OBJETIVO. OBSERVÂNCIA. ART. 2º, § 2º, DA LEI N. 8.072/1990. OBRIGATORIEDADE. 1. A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas, uma vez que a sua incidência não decorre do reconhecimento de uma menor gravidade da conduta praticada e tampouco da existência de uma figura privilegiada do crime. 2. A criação da minorante tem suas raízes em questões de política criminal, surgindo como um favor legislativo ao pequeno traficante, ainda não envolvido em maior profundidade com o mundo criminoso, de forma a propiciar-lhe uma oportunidade mais rápida de ressocialização. 3. Recurso especial provido para reconhecer o caráter hediondo do delito de tráfico de drogas, mesmo tendo sido aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, e para determinar que, na aferição do requisito objetivo para a progressão de regime, seja observado o disposto no art. 2º, § 2º, da Lei n. 8.072/1990, com a redação atribuída pela Lei n. 11.464/2007, ficando restabelecida a decisão do Juízo da Execução. TJMG: Processo: Apelação Criminal 1.0024.12.184008-6/001 1840086- 34.2012.8.13.0024 (1) Relator(a): Des.(a) Alexandre Victor de Carvalho Data de Julgamento: 04/06/2013 Data da publicação da súmula: 10/06/2013 Ementa: EMENTA: PENAL - TRÁFICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO - RECONHECIMENTO DO PRIVILÉGIO DO ARTIGO 33 PARÁGRAFO 4º DA LEI 11.343/06 - POSSIBILIDADE - APELANTE QUE PREENCHE O REQUISITO PARA O BENEFÍCIO - SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL - ADMISSIBILIDADE - RESOLUÇÃO Nº 05/2012 DO SENADO FEDERAL - 15 UNIDADE Tráfi co de Drogas REGIME FECHADO - MANUTENÇÃO - DELITO EQUIPARADO A HEDIONDO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1- Impõe-se a condenação porquanto a autoria e a materialidade se encontram devidamente comprovadas. 2- Necessário é o reconhecimento da causa de diminuição de pena do § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas vez que preenchidos estão os requisitos necessários. 3- Substitui-se a pena corporal por restritivas de direitos nos termos da resolução nº 5/2012 do Senado Federal. 4- Mantém-se o regime fechado por ser o delito de tráfico privilegiado hediondo. 5- Recurso par cialmente provido. v.v. APELAÇÃO CRIMINAL - TRÁFICO DE DROGAS - FRAGILIDADE PROBATÓRIA - DÚVIDAS - ABSOLVIÇÃO - MEDIDA QUE SE IMPÕE.I - A sentença condenatória não pode ser mantida diante de um frágil acervo probatório. Segundo o § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06, nos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, as penas poderão ser reduzidas de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), desde que o agente seja primário, de bons antecedentes e não se dedique à atividades criminosas nem integre organização criminosa. Interpretando-se o artigo 42 em conjunto com o artigo 33, § 4º da Lei 11.343/2006, outro raciocínio não se extrai que não seja aquele que ordena seja a quantidade de drogas apreendidas analisada para efeito de se aplicar ou não a citada causa de diminuição de pena. O artigo 42 da Lei 11.343/2006 trouxe circunstância judicial objetiva nova a ser necessariamente analisada por ocasião da fixação da pena base. 16 17 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Legislação penal especial ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação penal especial. 9ª ed. atual. E ampl. São Paulo: Saraiva, 2013. Comentários penais e processuais penais à Lei de drogas (Lei 11.343/2006) BACILA, Carlos Roberto; RANGEL, Paulo. Comentários penais e processuais penais à Lei de drogas (Lei 11.343/2006); Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. Curso de Direito Penal CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – PARTE ESPECIAL, volume 4, 15ª edição, São Paulo: Saraiva,2015. Lei de Drogas Anotada GRECO FILHO, Vicente. Lei de Drogas Anotada. 3ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010. 17 UNIDADE Tráfi co de Drogas Referências BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal; São Paulo: Saraiva, 2015. DAMÁSIO, Evangelista de Jesus. Código de Processo Penal Anotado, 24ª edição, São Paulo: Saraiva, 2014. FISCHER, Douglas; OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Comentários ao Código de Processo Penal e Sua Jurisprudência - 7ª edição, São Paulo: Saraiva, 2015. GONÇALVES, Vinicius Rios. Coordenação: LENZA, Pedro. Direito Penal Sistematizado. São Paulo:Saraiva, 2015. 18
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