Buscar

12955 41961 1 PB

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 3, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 6, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você viu 9, do total de 23 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Prévia do material em texto

15 
 
Migração laboral no Brasil: problemáticas e perspectivas
1
 
 
Duval Fernandes
2
 
Juliana Carvalho Ribeiro
3
 
 
Introdução 
 
Diversos autores têm indicado que o Brasil se encontra em um novo patamar 
da migração internacional (BAENINGER, 2013; PATARRA, 1996; PATARRA e 
FERNANDES, 2011) no qual os processos migratórios não se dão em um único 
sentido e com temporalidade restrita. Na verdade a partir do final da primeira década 
do século XXI, o país se viu inserido no sistema de migração internacional como país 
de origem, destino e trânsito, onde a emigração, a imigração e o retorno acontecem de 
forma simultânea. 
Esta realidade, ainda não captada por todos os segmentos sociais, indica novos 
caminhos para as políticas públicas, principalmente as afeitas à governança 
migratória, que passam a ter novo paradigma e não podem ser desenhadas para 
atender a somente um dos movimentos, mas devem ser propostas considerando o 
cidadão independente da sua situação como imigrante, emigrante ou retornado. As 
políticas devem ter como ponto de partida a construção de mecanismos que 
contribuam para o processo de integração do cidadão migrante à sociedade brasileira. 
No entanto, a ausência de políticas que considerem situações ligadas à 
migração internacional levam os imigrantes estrangeiros e retornados a encontrarem 
dificuldades semelhantes na chegada ao Brasil no tocante ao trabalho, moradia e 
atendimentos de suas demandas na área social. No caso dos imigrantes, ainda há de se 
considerar os problemas relacionados ao processo de regularização do seu status 
migratório, sempre difícil por conta da arcaica legislação vigente. 
O que se pretende nesse texto é tratar, mesmo que de forma embrionária, de 
três situações migratórias que estão na agenda social e política da atualidade. 
 
1
 Texto produzido a partir de apresentação feita no Seminário do Observatório das Migrações realizado 
em Brasília (Brasil), em 14 de maio de 2014. 
2
 Professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Pontifícia Universidade Católica de Minas 
Gerais (PUC-Minas). 
3
 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Geografia da Pontifícia Universidade Católica de 
Minas Gerais (PUC-Minas), bolsista da Capes. 
 
16 
 
Primeiramente, a migração de retorno que, mesmo antes da crise econômica iniciada 
em 2008, já era perceptível, por conta das diversas ações empreendidas pelos 
governos dos países do Hemisfério Norte com vistas a restringir a entrada e 
permanência de estrangeiros em situação irregular, e, com o a crise, toma contornos 
mais amplos. A segunda situação seria, o aumento do número de estrangeiros que 
optam por viver no Brasil, que será tratada sob duas óticas, as experiências de 
espanhóis e portugueses que migram após o ano 2005 e, com maior intensidade, 
depois do início da crise de 2008 e, por fim, a situação dos haitianos que chegam ao 
país no início de 2010 e hoje se constituem em importante grupo de imigrantes. 
 
Retornados 
 
A situação do retorno se resume ao migrante que deixou o país e decide voltar, 
por uma infinidade de razões, como a não adaptação ao país que o recebeu, 
dificuldades financeiras ou mesmo questões legais, dentre outras inúmeras 
possibilidades. Este novo imigrante que volta ao ponto de partida, pode até ocupar o 
mesmo espaço físico que cabia a ele antes dele deixar o país, mas nada garante que 
ele alcance, pelo menos no curto prazo, a estrutura social anterior (SAYAD, 2000). 
Estima-se, o número de brasileiros vivendo no exterior tenha reduzido em 
mais de 35%. Em relação aos brasileiros que viviam no Japão, aproximadamente 45% 
fizeram a opção pelo retorno, alguns com apoio do governo japonês. No caso da 
Europa, mesmo que os números não sejam precisos, o maior impacto foi sentido nos 
países da península Ibérica ― Espanha e Portugal ― onde, nos últimos anos, os 
pedidos de auxilio ao repatriamento apresentados a instituições internacionais de 
apoio aos migrantes
4
, mais que dobraram. O quadro a seguir (ver tabela 1) mostra, 
com base nas informações do Itamaraty, a evolução recente do número de brasileiros 
residentes no exterior, nos principais destinos, evidenciando a mencionada redução. 
 
 
 
 
4
 Entre 2007 e 2012, o Programa de Retorno Voluntário, administrado pelo escritório da Organização 
Internacional para as Migrações (OIM), em Portugal, apoiou o retorno de 2.915 imigrantes, sendo 
2.383 brasileiros. O Programa conta com apoio do governo português. 
 
17 
 
Tabela 1 – Estimativas do número de brasileiros residentes no exterior, nos 
países selecionados – 2011 a 2012 
País 2011 2012 
Variação % 
2011/2012 
Total 
3.122.
813 
2.547.
079 -18,4 
USA 
1.388.
000 
1.066.
559 -13,9 
Japão 
230.55
2 
210.03
2 -8,7 
Paragua
i 
200.00
0 
201.52
7 0,5 
Espanha 
158.76
1 
128.00
0 -18,9 
Portugal 
136.22
0 
140.00
0 2,9 
 Fonte: Itamaraty 
 
Se o impacto desse retorno na região de origem (antigo destino, ou seja, país 
que recebeu o imigrante brasileiro) não é muito relevante ― salvo em comunidades 
muito específicas ―, por outro lado, na nova região de destino (que recebe o 
retornado), o retorno tem contribuído para transferir a essas localidades a crise 
observada nos países centrais. Há de se considerar também que o processo de retorno 
tende a reduzir as remessas e com isso impactar na economia local via a 
desarticulação de cadeias produtivas que atendiam aos investimentos dos emigrantes 
na sua terra natal, como a construção civil. 
A dificuldade de readaptação ao espaço e de reintegração à sociedade são os 
grandes entraves ao retornado, que acaba se traduzindo em um peso econômico para o 
seu país. Quanto mais longo o período de permanência no exterior, maiores são as 
dificuldades para conclusão desta última etapa com sucesso. No local que vivia antes 
da sua emigração, por mais isolado que ele possa ser, a vida continuou e as mudanças 
que ele irá encontrar quando do seu retorno, fazem desse local ― antes conhecido e 
 
18 
 
sempre presente no imaginário do retornado ―, quase outro país no qual o processo 
de adaptação será, muitas vezes, mais penoso do que o vivenciado no exterior. 
Apesar de todos os benefícios que a experiência no exterior garante ao 
retornado, ele tem grande dificuldade de se readaptar. Acredita-se que o tempo 
passado fora de seu país, em contato com outra cultura, outros hábitos, outros 
costumes, garante ao retornado uma rica vivência, a partir da qual são desenvolvidas 
novas habilidades. Além disso, os bens adquiridos no exterior e o estilo de vida 
experimentado naquele país podem ser considerados capitais financeiro e humano a 
ser realizado no seu país, quando do retorno. Porém, esta bagagem adquirida no 
exterior, muitas vezes, acaba se traduzindo em entraves para a sua readaptação e, até 
mesmo, pode estimular uma nova migração, quando este capital humano não se 
realiza ou não é “investido” na nova região de destino. 
O exemplo mais claro dessa dificuldade está no reconhecimento de 
certificados e diplomas adquiridos no exterior, fato que atinge também os imigrantes 
no Brasil. A não existência de protocolos para avaliação dos cursos e a insistência de 
tratar cada processo individual como um caso autônomo, retarda ou impede que o 
retornado possa efetivamente utilizar seu capital humano adquirido no exterior. 
Outra importante perspectiva que envolve retornados e implica em crise para a 
localidade que o recebe quando do seu retorno é a influência que eles exercemsobre 
as pessoas que vivem neste local. A simples presença física na cidade de origem 
daquele que em momento passado teria partido, pode contribuir para estipular novas 
migrações ou mesmo servir como fator relevante na mudança de planos. 
Assim, os retornados ocupam posições estruturais fundamentais para a 
organização e a sustentação dos sistemas de migração. As redes pessoais contribuem 
para o recrutamento, para o agenciamento e para o suporte aos novos migrantes. 
Justifica esta realidade o fato das experiências serem apresentadas e filtradas com a 
intenção de mostrar sucessos, mesmo em situações que foram adversas. 
Para a maioria dos organismos internacionais, o retornado é visto como um 
potencial empreendedor e motivador do desenvolvimento local. Os recursos 
acumulados no exterior e a vivencia em outro país são considerados instrumentos para 
novos investimentos na terra natal. Porém, a realidade, muitas vezes, é diversa à 
apresentada. O pouco ou nenhum conhecimento sobre o gerenciamento de 
empreendimentos, aliado a perfis pessoais que só vivenciaram funções subalternas no 
mercado de trabalho, contribuem para o elevado nível de fracasso e de frustrações. 
 
19 
 
Tal situação indica que para um retornado sem muita perspectiva e pouco 
conhecimento da realidade que o aguarda na sua chegada o empreendedorismo não é 
uma opção (OIM, 2013). Contribuindo ou não para o seu país, no seu retorno, o 
sujeito não pode contar com políticas públicas eficazes. Este retorno, inclusive, gera 
como desafio o desenvolvimento de políticas sociais, já que inexistem políticas 
explícitas e eficientes para atender aos migrantes retornados. O que se encontra são 
ações pontuais e voltadas para determinados seguimentos, o que não atende este 
universo crescente. 
A invisibilidade do retornado, porém, dificulta o equacionamento de políticas 
públicas. Não há informações para o retornado que viabilizem sua mais rápida 
adaptação, bem como o Estado não tem acesso a informações concretas e substanciais 
sobre o retornado. A falta de informações do Estado para o retornado e sobre o 
retornado fazem as políticas públicas inexistentes ou inexequíveis, tornando a 
situação desses sujeitos ainda mais vulnerável. 
 
Imigrantes estrangeiros: destaque para portugueses e espanhóis 
 
Em relação à chegada de estrangeiros no Brasil, devem-se considerar não só os 
problemas dos países de origem afetados pela crise econômica, mas também a 
situação da economia brasileira em época recente. Ao se considerar o período dos 
últimos 20 anos, a economia brasileira passou por profundas transformações, no qual 
o combate à inflação, prioridade maior da segunda metade do século XX, cede lugar 
às políticas voltadas para o crescimento econômico e para a inclusão social. 
Em meados dos anos 1990, a implantação do Plano Real
5
 abriu espaço para o 
crescimento econômico sustentado do Brasil. A este período seguiu-se o de um 
Governo com tendência neoliberal
6
 que aplicou um vasto plano de privatização de 
empresas públicas, principalmente na área de telecomunicações, que passaram a ser 
geridas por capital estrangeiro. Nesse período, as taxas de crescimento da economia 
não foram elevadas e, durante certo tempo, até nulas. No entanto, essas ações foram 
decisivas para a entrada do país no mercado globalizado. 
 
5
 Plano de estabilização econômica implantado em 1994, que obteve sucesso no combate à inflação, 
situação que se tornava endêmica no Brasil. 
6
 Governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, cujos mandatos foram de 1995 a 1998 e de 1999 
a 2002. 
 
20 
 
Ao se iniciar o século XXI, foi eleito um presidente
7
 que propunha um 
programa de governo calcado na inclusão social, com abertura ao diálogo com a 
sociedade e que deu especial atenção à questão migratória. Quando acontece a crise 
mundial em 2008, o país estava em plena efervescência econômica, via investimentos 
privados e governamentais na área da construção civil pesada
8
 e da prospecção de 
petróleo
9
. Ao mesmo tempo, a política de transferência de renda e inserção laboral de 
uma parcela da população que se encontrava marginalizada, contribuiu para a criação 
de considerável mercado interno que ampliou o poder de compra da população. Essa 
situação permitiu que o impacto da crise econômica mundial, iniciada em 2008, fosse 
pouco sentido e que, nos anos seguintes, as taxas de crescimento do PIB levassem o 
país a ocupar um lugar de destaque no cenário da economia mundial. 
É nesse contexto que deve ser entendida a imigração que tem como destino o 
Brasil e principalmente a atração pela mão de obra qualificada, que conduz ao país 
um contingente expressivo de estrangeiros. 
Os registros da Coordenação Nacional de Migração do Ministério do Trabalho 
e Emprego permitem avaliar alguns aspectos da migração laboral mais recente. A 
partir de 2009, o número de estrangeiros que solicitam autorização de trabalho ao 
governo brasileiro tem aumentado, em média, 25% ao ano, passando de 42914, em 
2009, para 70524 em 2011, chegando a 73022 em 2012 e reduzindo para 65693 em 
2013. A participação das mulheres é ainda muito acanhada, apesar do ligeiro aumento 
de 8,8% do total de autorizações de trabalho concedidas em 2009, para 10,3% em 
2012. 
Nem toda migração, no entanto, é registrada pelos órgãos de governo e a 
situação de irregularidade acontece com certa frequência. O procedimento é sempre o 
mesmo: chega-se com visto de turista, com prazo de 90 dias, e parte-se para a busca 
de trabalho. 
 
Vim para o Brasil em finais de 2005, estou aqui de 7 para 8 
anos. Entrei como turista, posteriormente eu fiquei 3 meses, nesses 
3 meses consegui trabalho. Obviamente não era um trabalho 
 
7
 Luís Inácio Lula da Silva, cujos mandatos foram de 2003 a 2007 e de 2008 a 2011. 
8
 A construção de obras para atender a Copa do Mundo de 2014, as Olimpíadas de 2016 e a expansão 
da produção de energia elétrica. 
9
 Nos investimentos para a prospecção de petróleo, destaca-se a exploração dos campos do pré-sal. 
 
21 
 
regularizado, findos estes 3 meses eu pedi uma prorrogação para os 
6 meses, permitido. (Imigrante português/RJ).( ICMPD-2013) 
 
Outra forma de garantir a permanência no país, sem cair na irregularidade 
migratória é pleitear um visto de estudante e, uma vez estando em solo brasileiros 
inicia a busca por um posto de trabalho. 
Mesmo que encontre trabalho o imigrante não pode exercer a atividade de 
forma regular por duas razões, a primeira pelo fato de não ter a autorização de 
trabalho e, mesmo que a tenha, deverá ter o seu diploma validado no Brasil. Tal 
situação atinge tanto aos estrangeiros como os brasileiros retornados que tem de 
passar pelo processo de homologação de diplomas obtidos no exterior. Esse processo 
é demorado e, dependendo da profissão, tem elevado custo. Tal situação contribui 
para a vulnerabilidade laboral dos imigrantes. 
 
Tive uns 7 empregos, houve certos trabalhos que eu entrava 
e fazia parcerias com as pessoas para fazer trabalhos específicos. 
E findos esses trabalhos normalmente seriam escritórios pequenos 
que tem trabalhos temporários, eu ficava sem trabalho. Mais a 
maioria do tempo trabalhava com empresas grandes. Nas empresas 
grandes também possuía trabalho informal. Na arquitetura, a 
maioria dos trabalhos são informais. Isso é uma característica da 
profissão, em Portugal isso é uma coisa corriqueira também 
(Imigrante português/RJ).(ICMPD – 2013) 
 
A não regularização tem fortes reflexos na vida e no cotidiano dos imigrantes, 
pois impede o acesso à contabancária, uma vez que não é possível conseguir o CPF, e 
dificulta o acesso à moradia onde o imigrante irá depender de algum amigo ou parente 
para afiançar o aluguel de um imóvel. 
Apesar da legislação brasileira permitir a regularização de um imigrante que 
esteja no país, as possibilidades de se obter sucesso não são muito grandes. Mesmo 
que consiga o seu intento o estrangeiro deverá deixar o país para retirar o visto em 
uma representação consular brasileira no exterior. 
 
 
22 
 
A principal dificuldade é conseguir um dos quatro requisitos 
para o visto: ter um filho brasileiro, casar com brasileiro(a), 
conseguir um trabalho ou fazer um investimento. Estes são os 
caminhos na legislação brasileira. Se não conseguir as primeiras 
três, terei que pensar no quarto requisito, fazer investimento. 
(Imigrante espanhol/SP).(ICMPD – 2013) 
 
Os relatos levantados pela pesquisa do ICMPD (2013) contribuem para traçar 
o perfil desse novo imigrante internacional. Geralmente são jovens que estavam em 
situação de desemprego ou subemprego no país de origem. Na maioria dos casos tem 
grau de ensino superior, mas pouca possibilidade de regularizar a sua situação laboral. 
Assim, utilizam de subterfúgios como o visto de turista ou mesmo de estudante para 
permanecer no país de forma regular. Apesar das dificuldades causadas pela situação 
de transitoriedade, como o acesso a bancos ou mesmo a outros serviços, a maioria 
avalia que a opção de emigrar para o Brasil foi acertada e, alguns, relatam que são 
foco de discriminação positiva por serem estrangeiros que observam tanto em relação 
ao pagamento recebido como no reconhecimento da atividade que exercem. 
 
A imigração haitiana 
 
Ao mesmo tempo em que acontece a imigração internacional em direção aos 
grandes centros urbanos do país, em busca de postos de trabalho com melhor 
remuneração, outro processo tem inicio nas fronteiras do Brasil com os países da 
América do Sul. Nesse grupo de imigrantes estão sul-americanos que 
tradicionalmente optam por residir no país e, em período mais recente, fazem o trajeto 
respaldados nos acordos de livre transito no âmbito do MERCOSUL. No entanto, a 
partir de 2010, a presença de nacionais de país outros que os da América do Sul se faz 
notar, como senegaleses, bengalis e outras nacionalidades, principalmente haitianos, 
cujo fluxo iniciado após o terremoto de 2010 tomou contornos de um processo 
migratório com características que indicam a sua continuidade por um longo período. 
Considerando a história migratória do Haiti, a incorporação do Brasil no 
roteiro migratório não é uma surpresa muito grande, mas chama a atenção por se 
tratar de um novo destino que não era incluído nas escolhas anteriores dos imigrantes. 
Pode-se dizer que após o terremoto estavam presentes no país com maior vigor os 
 
23 
 
fatores de expulsão que contribuem a criação e ampliação de uma diáspora 
(JACKSON, 2011). 
Para a escolha dos destinos havia de se considerar a legislação migratória dos 
países desenvolvidos que, após setembro de 2001, impõem severas restrições à 
imigração de uma maneira geral e, em especial, à migração irregular. As razões para a 
incorporação do Brasil na rota do processo migratório dos haitianos, não são muito 
claras, alguns autores (FERNANDES, 2010; SILVA, 2013) indicam que a presença 
das tropas brasileiras no Haiti poderia ter contribuído para disseminar a ideia do 
Brasil como país de oportunidades, principalmente no momento em que grandes obras 
estavam em execução e a taxa de desemprego em descenso. 
Independente da razão inicial, o fato é que após o terremoto teve inicio o fluxo 
migratório de haitianos para o Brasil. Os trajetos são diversos (PATARRA, 
FERNANDES, 2011; SILVA, 2013) e vão se alterando no tempo conforme as 
facilidades ou dificuldades oferecidas no caminho. Importante notar que dos países da 
América do Sul, somente quatro
10
, em 2010, não exigiam visto para a entrada de 
haitianos no seu território no caso de viagem de turismo. A partir de 2012, sob forte 
pressão do governo brasileiro, o Peru passou a exigir visto dos haitianos e no Equador 
houve, em 2013, uma tentativa de restringir a entrada dos haitianos, mas a medida não 
foi implementada. Mesmo com estas facilidades, nenhum destes países tornou-se um 
importante ponto de destino final da imigração haitiana, como foi o caso do Brasil. 
Tal fato pode indicar que esta migração não é gestada unicamente pelas facilidades de 
entrada no país, como preconizam os que criticam as medidas tomadas pelo governo 
brasileiro, mas é determinada também pela intenção de chegar e de se estabelecer na 
região de destino. 
Durante o ano de 2010 pequenos grupos de haitianos, que não somavam duas 
centenas de imigrantes, chegaram à fronteira brasileira com o Peru. Ao final de 2011 
havia indicações da presença de mais de 4.000 haitianos no Brasil (COSTA, 2012; 
SILVA, 2013), número este que não cessou de aumentar, sendo que ao final de 2013 
estimava-se que o montante já teria ultrapassado a casa dos 20.000 imigrantes, com 
indicações de que o número total poderia chegar a 50.000 ao final de 2014. 
Tal fluxo fez com que a percepção da presença dos haitianos fosse vista com 
certa desconfiança por parcela da sociedade, neste grupo se inclui alguns órgãos da 
 
10
 Argentina, Chile, Equador e Peru. 
 
24 
 
impressa nacional que comparam à chegada dos imigrantes a uma invasão
11
. Por outro 
lado, este movimento migratório teve também efeito positivo de levar o governo e a 
sociedade civil a iniciar um processo de discussão da legislação migratória, 
introduzindo nos debates a visão do respeito aos direitos humanos dos imigrantes. Ao 
mesmo tempo, foi possível avançar no estabelecimento de laços de solidariedade 
entre diversos setores da sociedade no acolhimento e atendimento aos haitianos. 
No âmbito dos governos federal, estadual e municipal, nas cidades mais 
afetadas pela chegada destes imigrantes, as respostas institucionais foram diversas. 
Enquanto o governo do estado do Acre se engajava em apoiar a montagem da 
estrutura de atendimento aos haitianos que chegavam à cidade de Brasiléia, o governo 
do estado do Amazonas, especificamente no caso das cidades de Tabatinga e Manaus, 
a princípio ignorou o problema e posteriormente deu pequenas contribuições para 
manter as ações da sociedade civil (SILVA, 2013). Estas diferenças nas respostas dos 
governos estaduais refletem um pouco a percepção das autoridades sobre o problema 
e seus compromissos com os direitos humanos dos imigrantes. 
No plano federal, as respostas foram mais efetivas, mas mesmo assim, pouco 
ordenadas, com medidas tomadas para solucionar situações pontuais extremas que 
não contribuíam em um planejamento, mesmo de curto prazo, para atender às 
demandas surgidas com o volume crescente de imigrantes haitianos. 
Após o trajeto até a fronteira brasileira, os haitianos ainda têm de enfrentar um 
longo processo para a regularização da sua situação migratória. O ponto de partida é a 
solicitação de refugio apresentada à autoridade migratória nas cidades fronteiriças. A 
abertura deste processo leva a emissão de um protocolo que permite ao imigrante a 
obtenção de carteira de trabalho e de CPF provisórios, enquanto a solicitação de 
refugio é analisada pelo CONARE
12
. Tais documentos são essenciais para o ingresso 
do imigrante no mercado formal de trabalho e o envio de remessas. Por tal solicitação 
de refúgio não se enquadrar nos requisitos definidos em lei e convenções 
internacionais, ela é recusada. Ante esta situação que levaria à permanência irregular 
dos haitianos no Brasil,o CONARE repassa ao Conselho Nacional de Imigração os 
processos que analisa a situação de cada requerente. Em 2011, com base na Resolução 
 
11
 Jornal O Globo do dia 17/01/14 País “Tião Viana, do PT, critica governo federal após invasão de 
haitianos”. Jornal O Globo 11/01/12 Capa “Brasil fecha fronteira para conter „invasão‟ de haitianos” 
12
 CONARE – Comitê Nacional para os Refugiados 
 
25 
 
Normativa nº 27
13
, o CNIg cria procedimentos para autorizar a permanência de 
haitianos no Brasil. No entanto, este processo não teve o resultado esperado e frente a 
chegada de contingentes cada vez mais expressivos de haitianos na fronteira da 
Região Norte foi necessário criar medidas que permitissem a migração de forma 
regular, sem a necessidade de se fazer esse trajeto. Assim em janeiro de 2012, o CNIg 
edita a Resolução Normativa – RN nº 97, que permite a concessão de visto 
humanitário permanente, pelo prazo de cinco anos, aos imigrantes haitianos. Este 
visto seria expedido pelo Consulado Brasileiro na cidade de Porto Príncipe, no Haiti, 
sendo, no entanto, o número de vistos restrito a 1.200 por ano. Não incluído neste 
total os vistos para reunificação familiar. Está Resolução tinha prazo de vigência de 
dois anos. 
Ao se avaliar a aplicação desta RN (FERNANDES ET ALLIS, 2013), observa-
se que apesar da louvável tentativa de solucionar um problema que tomava 
proporções de calamidade pública, quer nas cidades fronteiriças quer nas que atuavam 
como polo de atração desta migração, como a cidade de Manaus, o efeito esperado 
não foi alcançado. Não houve redução da chegada de imigrantes haitianos ao Brasil 
via a fronteira norte e o número de vistos emitidos pelo Consulado, 100 por mês, não 
conseguia atender à crescente demanda. Em novembro de 2012, todos os 
agendamentos para a concessão de vistos em 2013 estavam completos e o Consulado 
abriu uma lista de espera. Assim, ao final de 2012, voltava-se a repetir na fronteira a 
situação observada antes da promulgação da RN nº 97, com a superlotação do abrigo 
construído para acolher os imigrantes na cidade de Brasiléia e, em Porto Príncipe, 
formavam-se gigantescas filas na porta do Consulado Brasileiro composta por pessoas 
que esperavam obter o visto de entrada no Brasil. 
Tentando contornar a situação no Consulado, o Governo, por meio da RN nº 
102, em abril de 2013, retira a limitação do número de vistos aos haitianos que não 
mais ficariam restritos a 1.200, permitindo também a sua concessão em Consulados 
Brasileiros em outros países, além do Haiti. A última alteração a RN nº 97 acontece 
em outubro de 2013, quanto a o seu prazo de vigência, que encerraria em janeiro de 
2014, foi prorrogado por mais um ano. 
 
13
 Resolução Normativa nº 27, de 25 de novembro de 1998, que disciplina a avaliação de situações 
especiais e casos omissos pelo Conselho Nacional de Imigração. Essa Resolução considera como 
“situações especiais” aquelas que, embora não estejam expressamente definidas nas Resoluções do 
Conselho Nacional de Imigração, possuam elementos que permitam considerá-las satisfatórias para a 
obtenção do visto ou permanência; e como “casos omissos” as hipóteses não previstas em Resoluções 
do Conselho Nacional de Imigração 
 
26 
 
Ao se analisar os resultados das medidas tomadas pelo governo federal fica 
claro que elas não conseguiram alcançar os objetivos propostos, inicialmente, quando 
da analise da questão pelo CNIg, no momento da aprovação da RN nº 97. 
 
“[...] o controle da atuação dos coiotes na fronteira norte 
brasileira; a abertura de um canal para a concessão de vistos de 
forma mais simples; a regularização da situação migratória dos 
cerca de quatro mil haitianos que já se encontram em território 
brasileiro; e o envio de auxílio material para alojamento, 
alimentação e cuidados de saúde para esses imigrantes nos estados 
do Acre e do Amazonas” (CNIg, 2012). 
 
 Pelo contrário as medidas tiveram o efeito de estimulo à migração. A atuação 
dos coiotes tem se ampliado com o estabelecimento de rede de tráfico de imigrantes 
por todo o trajeto que inclui a passagem pelo Equador e Peru. Tal fato contribui para 
que o número de imigrantes chegados às cidades fronteiriças venha se ampliando não 
só em volume, mas também pela incorporação de novas rotas via Venezuela, Bolívia 
e Argentina. Uma vez mais, no inicio de 2014, a situação na cidade de Brasiléia 
mostrou-se caótica com a presença de mais de 1.200 haitianos aguardando o 
atendimento para a regularização da sua situação migratória ou uma oportunidade de 
trabalho, via a contratação por alguma empresa que chegue à cidade em busca de 
trabalhadores. 
Considerando informações disponíveis nos registros administrativos dos 
Ministérios do Trabalho e das Relações Exteriores é possível traçar, mesmo de forma 
preliminar, o perfil desses imigrantes. No entanto, por serem dados de órgãos públicos 
e levantados junto a registros administrativos, mais voltados para atender à 
procedimentos internos de cada setor, o que aqui é apresentado deve ser considerado 
com cautela. 
Segundo os registros do Conselho Nacional de Imigração – CNIg do 
Ministério do Trabalho, as mulheres representam, aproximadamente 20% do total dos 
imigrantes haitianos que receberam permissão de residência no Brasil. Mas a 
participação das mulheres vem aumentando, principalmente pelo aumento dos vistos 
para reunião familiar. Em relação à idade, mais de 30% destes imigrantes estão 
concentrados na faixa etária de 25 a 29 anos, seguida daqueles no grupo etário 30 a 34 
 
27 
 
anos, que representam, aproximadamente, 25% da população em estudo, conforme 
demonstra a figura 1 a seguir. 
 
Figura 1 - Pirâmide Etária dos haitianos demandantes de visto nas 
representações consulares do Brasil - 2013 
 
 
Fonte: MRE. Dados coletados até 29/08/13 
 
Os registros do Ministério das Relações Exteriores indicam que, 
aproximadamente, 80% dos imigrantes haitianos que solicitaram visto nas 
representações consulares brasileiras se declararam solteiros. Em relação à ocupação 
que tinham no Haiti, mais de 50 % dos homens indicou estar exercendo alguma 
atividade no setor da construção civil. No caso das mulheres a área de serviços é que 
mais absorvia mão de obra, seguida pelo comércio. 
Em relação ao local de residência dos imigrantes haitianos no Brasil, os dados 
da Polícia Federal indicam 267 municípios. No entanto, 18 deles receberam mais de 
75% desses imigrantes, como indica a figura 2 a seguir. Os maiores destaques são por 
conta de São Paulo com 24% do total e Manaus com 13%. 
 
Figura 2 - Proporção de imigrantes haitianos por cidade de residência Brasil 
Janeiro de 2010 a Março de 2014 
 
28 
 
 
Fonte: SINCRE - Sistema Nacional de Cadastramento e Registro de 
Estrangeiros/DPF 
 
Considerando informações disponibilizadas pela OIM (2014) observa-se que 
em relação à instrução não há uma diferença muito grande entre homens e mulheres 
em termos do grau de instrução nos níveis mais elevados. 42,1% dos homens 
indicaram um grau de ensino no mínimo secundário completo, enquanto, 43,2% das 
mulheres indicaram a mesma situação. 
No entanto, ao se somar os que declaram ter segundo grau completo e 
incompleto, 50,8% das mulheres estariam nessa situação contra 41,8% dos homens. 
Como observado em outros países (GÓIS, 2009) a migração dos haitianos para 
o Brasil seguiu o padrão onde aqueles com maior qualificação predominavam no 
primeiro grupo que chegou em 2010 e 2011. As informações disponibilizadas pela 
OIM (2014) indicam que nos anos seguintes,houve o crescimento da participação 
daqueles que, apesar de um menor nível de instrução, estavam, antes de emigrar, em 
ocupações técnicas, em sua maioria na área da construção civil. No entanto, em 
momento recente, observou-se a ampliação do número de pessoas com mais baixo 
nível de instrução dentre aqueles que chegam ao país. A pouca instrução, as 
dificuldades com o aprendizado da língua portuguesa e a impossibilidade de 
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30%
outros
Pato Branco
Chapecó
Balneário Camboriu
Sorocaba
Cuiabá
Navegantes
Itajaí
Bento Gonçalves
Pinhais
Esmeraldas
Contagem
Macapá
Cascavel
Caxias do Sul
Curitiba
Porto Velho
Manaus
São Paulo
 
 
 
29 
 
conseguir a equivalência de diplomas, tem contribuído para que parcela importante do 
contingente de imigrantes haitianos se engaje em ocupações que exigem pouca 
qualificação, como na construção civil, em atividades auxiliares ou em linhas de 
montagem industrial. Em se tratando das mulheres, a situação é mais delicada, pois ao 
lado das dificuldades com o idioma, soma-se a pouca oferta de postos de trabalho para 
as mesmas. As ofertas de emprego são, em sua maioria, no setor de serviços 
domésticos, onde há necessidade de maior interação patrão e empregado, dificultada 
pela barreira linguística (OIM, 2014). 
Por outro lado, a avaliação dos empresários sobre o trabalho dos haitianos tem 
mostrado aspectos contraditórios, enquanto a maioria tem um discurso positivo – “os 
trabalhadores haitianos faltam pouco ao trabalho, não se envolvem em situações de 
conflito com colegas e superiores hierárquicos” – outro conjunto de empresários 
indica que eles não se adaptam ao ritmo de trabalho exigido – “os haitianos são mais 
„moles‟ para realizar tarefas e apresentam um ritmo muito diferente dos brasileiros” 
(OIM, 2014). 
Ainda segundo o levantamento da OIM (2014), os postos de trabalho 
ocupados pelos haitianos são, na maioria dos casos, de baixa remuneração, com 
salários que variam entre um a um e meio salário mínimo. Ao considerar os gastos 
para se manter no Brasil, a maioria dos imigrantes, não consegue poupar o suficiente 
para enviar remessas às famílias e pagar as dívidas contraídas com os coiotes para 
fazer a viagem. Tal situação leva alguns a dividir moradias insalubres e a reduzir os 
gastos ao mínimo necessário para sobreviver, fazendo a estadia no país de destino ser 
pior do que a situação vivenciada no Haiti. 
Em uma ampla visão desse processo observa-se que, apesar de todas as 
medidas tomadas pelo governo, algumas louváveis como a RN nº 97, a questão da 
migração dos haitianos para o Brasil ainda é um problema que necessita de uma ação 
coordenada e não de ações pontuais. Não se pode colocar ênfase em uma só direção, 
como a regularização do status migratório, mas tem de se pensar em políticas que 
possam permitir a integração dos haitianos na sociedade brasileira, como assim, 
fizeram vários outros imigrantes que aqui chegaram no passado. 
Trata-se, sem a menor sombra de dúvida, de um processo longo e que deverá 
contar com a participação da sociedade civil e do governo, que agora tem pela frente a 
responsabilidade de dar respostas às demandas da comunidade dos haitianos e levar o 
país a se tornar um exemplo no respeito aos direitos humanos dos imigrantes. 
 
30 
 
 
Considerações finais 
 
Se, de meados do século XIX até o início da 2ª Guerra mundial, o Brasil 
poderia ser rotulado como país de imigração, e como país de emigração nas décadas 
de 1980 e 1990, na atualidade, nenhum destes rótulos se aplicaria. Na realidade, o 
país está hoje inserido no sistema da migração internacional, sendo, ao mesmo tempo, 
ponto de origem, de destino e de trânsito de migrantes. 
Neste cenário, a chegada de migrantes ao Brasil não pode ser analisada como 
algo corriqueiro, sem qualquer problema para os sujeitos envolvidos, bem como para 
as nações envolvidas ― a de origem dos migrantes e a de destino dos mesmos. 
A grande dificuldade encontrada pelos imigrantes no Brasil é a sua inserção na 
sociedade brasileira. Hábitos diversos e, principalmente, o idioma, são, em alguns 
casos, barreiras intransponíveis. O que se percebe é que a convivência entre os 
imigrantes de mesma origem acaba sendo, na maior parte das vezes, circunscrita ao 
próprio grupo onde estão inseridos. São, em regra, majoritariamente deslocados do 
convívio com a população brasileira. 
Com isso, os imigrantes mostram dificuldades de se apropriarem do espaço e 
de reproduzi-lo a seu favor. A apropriação do espaço potencializa o movimento de 
interligação entre a história individual do sujeito e a história coletiva. Diógenes (2003, 
p. 189) defende que no “[...] corpo [...] se coloca a possibilidade de transbordamento, 
de desfiguração das fronteiras entre o individual e o social”, o que grifa a distância 
entre os imigrantes e a sociedade brasileira. 
Ao mesmo tempo em que se grifa a dificuldade de apropriação do espaço, 
compreende-se a não concepção das cidades brasileiras enquanto lugar
14
 para os 
imigrantes, se os lugares são “[...] uma porção do espaço em que os homens se 
reconhecem. Reconhecem a sua história, o seu ambiente, o seu universo de relações, 
experiências, lembranças, desejos, conflitos, vivências.” (MELO, 2006, p. 65). 
O convívio socioespacial, que ajudaria na construção de uma identidade entre 
esses sujeitos e a sociedade brasileira, é ainda dificultado pela limitação financeira 
dos imigrantes. Com a indústria do lazer consolidada, tornam-se cada vez mais 
 
14
 Concebe-se aqui o termo lugar enquanto categoria socioespacial, muito empregada pela geografia 
para remeter a um local com o qual se estabelece laços afetivos, sentimentos de pertencimento, vínculo, 
identidade. 
 
31 
 
dispendiosos os momentos de lazer. “Concomitante, observa-se também a redução 
dos espaços de sociabilidade aos espaços de consumo. O que acaba por condicionar a 
acessibilidade à cultura e ao lazer ao poder econômico, forjando nichos de reunião 
entre iguais.” (SENRA, 2009, p. 6). Muitas vezes, a renda dos imigrantes é, em sua 
maior parte, destinada aos seus familiares que ficaram no país de origem. Dessa 
forma, eles se veem impossibilitados de investir em práticas sociais, sendo privados 
de lazer. 
A dificuldade da inserção e do convívio dos sujeitos estrangeiros com a 
sociedade brasileira pode se refletir, ainda, nas condições de trabalho desses 
imigrantes. A condição migratória, muitas vezes, acarreta um problemático vínculo 
com a atividade de trabalho. Há limitações para a comunicação entre eles e os colegas 
de trabalho brasileiros, bem como entre eles e os gestores da empresa que os emprega. 
Diferenças culturais também podem se impor enquanto entraves, uma vez que podem 
interferir na rotina, no cotidiano desses sujeitos e, dessa forma, pode vir a 
comprometer a dinâmica da empresa. Esse vínculo laboral torna-se ainda mais 
precário quando se toma por base imigrantes com baixa escolaridade. Por esses 
motivos, eles podem vir a desenvolver estresse pela dificuldade de adaptação. 
A própria condição de vida desses sujeitos, enquanto imigrantes, estrangeiros, 
sujeitos de outra cultura, que falam e entendem outra língua, mais uma vez podem 
interferir no seu cotidiano, pois os submete, salvo raras exceções, a piores alternativas 
no mercado de trabalho, inferiorizando-os. 
Por outro lado, como, muitas vezes, imigrantes desqualificados se concentram 
onde o índice educacional também não é alto entre os brasileiros da região, eles 
tornam-se mais competentes para desempenhar certas funções quando comparados a 
esses brasileiros.Esse fato acaba acarretando dificuldades para os nativos e 
estranhamento entre os brasileiros e os imigrantes. A economia local, inclusive, pode 
sentir reflexos dessa situação, o que não é interessante para o país que recebe esses 
sujeitos. 
Todo o exposto se mostrou como uma preocupação do Sr. Odilon dos Santos 
Braga, Conselheiro do CNIg representando a Central dos Trabalhadores e 
Trabalhadoras do Brasil (CTB), quando defendeu que “o debate não deve perder de 
vista a necessidade de que sejam preservados os interesses do trabalhador brasileiro e 
o impacto dessa necessidade nas medidas que porventura venham a ser adotadas.” 
(Ata da Reunião Extraordinária do CNIg 12/01/2012, p. 3). Assim, ele expõe a 
 
32 
 
importância do Estado se ater às duas partes, favorecendo a inserção do imigrante, 
sem trazer qualquer dano social e profissional aos brasileiros. 
Este novo paradigma migratório brasileiro não foi totalmente assimilado pela 
sociedade e seus representantes. Imposto esse cenário, as intervenções do Governo 
brasileiro nesse processo migratório tornam-se ainda mais urgentes e imprescindíveis, 
considerando o constante e grande fluxo de imigrantes que entram dia após dia no 
país. Esse movimento migratório configura uma situação delicada para o Governo ― 
e para a sociedade brasileira ―, consistindo em desafios para a sua governança, em 
termos da migração internacional em direção ao país, que, se bem gerido, pode se 
traduzir em amplos benefícios para o país receptor. 
Porém, propostas de reformulação de instrumentos jurídicos que tratam da 
migração ― como a Lei nº 6815, também conhecida como Estatuto do Estrangeiro, 
um dos últimos resquícios do período ditatorial ― não encontram respaldo entre a 
classe política. O Projeto de Lei nº 5655
15
, apresentado em 2009, serve de exemplo, 
pois em quase cinco anos de tramitação no Congresso Nacional ainda não conseguiu 
vencer as fases iniciais do processo para a sua aprovação.. 
Na área do Executivo, por sua vez, a questão migratória é tratada de forma 
excepcional. Medidas são tomadas para atender demandas emergenciais, sem a devida 
avaliação dos desdobramentos das ações. Uma proposta de política migratória 
preparada pelo Conselho Nacional de Imigração (CNIg) e encaminhada, em 2010, à 
Casa Civil da Presidência da República, ainda não mereceu qualquer atenção. 
O conjunto de medidas tomadas pelo Governo, em lugar de permitir traçar 
uma política migratória que respeite os direitos humanos dos imigrantes, tem levado a 
situações de criação de privilégios para algumas nacionalidades, como os haitianos, 
enquanto os nacionais de outros países devem seguir procedimentos morosos, como 
os relacionados à obtenção de documentação para sua inserção no mercado de 
trabalho. 
Neste escopo, perde o Brasil, já que, ao mesmo tempo em que é possível 
listarmos uma série de limitações das migrações para o país de destino desses sujeitos, 
uma infindável lista de vantagens acompanha a chegada dos mesmos. Uma primeira 
 
15
 O PL 5655/2009 “dispõe sobre o ingresso, permanência e saída de estrangeiros no território nacional, 
o instituto da naturalização, as medidas compulsórias, transforma o Conselho Nacional de Imigração 
em Conselho Nacional de Migração, define infrações e dá outras providências.”. Informação extraída 
do sítio da Câmara dos Deputados, cujo acesso foi feito em 11 de agosto de 2014: 
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=443102. 
 
33 
 
vantagem garantida, entre as diversas que se descortinam nesses fluxos, são de cunho 
econômico, mais propriamente vantagens ao capital. A possibilidade de suprir lacunas 
no mercado de trabalho brasileiro, nos postos de difícil incorporação da mão de obra 
local. 
Ainda tomando os aspectos positivos, o discurso para justificar a atratividade 
se volta para o público como prática de uma função social. Ao empregar imigrantes , 
o Brasil, via as empresas privadas, pode se projetar, perante o mundo, enquanto 
sensível às dificuldades desses países de origem . A solidariedade é, sem dúvida, 
concebida de forma extremamente positiva pelas grandes nações, o que pode se 
traduzir em ganhos para o Brasil. 
Porém, para isso, há demandas que devem ser atendidas pelo governo 
brasileiro. Uma delas seria maior eficiência para conclusão do processo de 
regularização, ajudando os imigrantes estrangeiros a conseguirem os documentos 
mais rapidamente. Outra intervenção que poderia ter o Estado seria no que tange o 
mercado de trabalho. Os imigrantes estrangeiros precisam de ajuda para conquistar 
uma vaga profissional, para encontrar uma moradia digna e para reduzir os custos das 
remessas que empreendem. 
Uma alternativa para consolidar tais propostas é a manutenção de diálogos 
regulares entre os governos dos países envolvidos, buscando as soluções para os 
problemas e visando benefícios para suas populações. Desta forma, o fluxo migratório 
se vê cada vez mais distante de lacunas e limitações traumáticas. 
Com a vinda desses sujeitos, o Brasil se torna o palco para o desenho de uma 
nova história. Os migrantes, que muitas vezes se deslocam, deixando seus países por 
questões socioeconômicas, configuram, com a iniciativa da migração, um cenário de 
busca de um ideário, de vida nova, com perspectivas de melhoria da qualidade de vida 
de cada um deles, bem como de seus familiares. 
Nessa dinâmica, a cada dia, são construídas novas ideias, novos percursos, 
novas perspectivas. “O processo social está sempre deixando heranças que acabam 
constituindo uma condição para as novas etapas.” (SANTOS, 2002, p. 140). A partir 
da decisão de deixarem seu país rumo ao Brasil, desenham novas etapas das suas 
vidas, e, muitas vezes, conseguem, mesmo que de forma limitada, trilhar caminhos 
que os garantem maior retorno financeiro que tinham no seu país. 
O país de destino, ao mesmo tempo, também garante ganhos com a chegada 
dos migrantes, uma vez que esses sujeitos geram riquezas nos locais que os acolhem: 
 
34 
 
eles trabalham, estudam, consomem e não representam peso financeiro para o Estado, 
Independentemente dos benefícios que o país pode alcançar com a chegada dos 
imigrantes, o século XXI expõe como desafio a necessidade de sensibilizar as 
populações acerca do respeito às diferenças, da convivência entre os povos e da 
aceitação do pluralismo cultural, tendo em vista o intenso e constante fluxo migratório 
internacional da contemporaneidade. O mundo globalizado potencializa a necessidade 
de trocas ― culturais, principalmente ― entre os diferentes povos, uma vez que 
amplia o contato entre as pessoas de nações distintas. Nesse interim, valores como o 
respeito e a fraternidade são urgentes no mundo hoje. 
 
 
35 
 
Referências bibliográficas 
 
ACNUR - Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados. Convenção 
Relativa ao Estatuto dos Refugiados, cujo acesso ocorreu em 09 de março de 2014, pelo 
portal:http://www.acnur.org/t3/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relat
iva_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf?view=1. 
 
BAENINGER, Rosana. Notas acerca das migrações internacionais no século 21. 
In: Rosana Baeninger (Org.). Migrações Internacionais. Coleção: Por Dentro do Estado 
de São Paulo. Volume 9. 1ª ed. Campinas, SP: NEPO-UNICAMP, 2013, v. 9, p. 9-22. 
 
BAENINGER, Rosana. Modalidades Migratórias Internacionais: da diversidade 
dos fluxos às novas exigências conceituais. In: Rosana Baeninger (Org.). Migrações 
Internacionais. Coleção: Por Dentro do Estado de São Paulo. Volume 9. 1ª ed. 
Campinas, SP: NEPO-UNICAMP, 2013, v. 9, p. 23-34. 
 
Conselho Nacional de Imigração(CNIg). Ata da Reunião Extraordinária 
12/01/2012, cujo acesso ocorreu em 05 de março de 2014, pelo portal 
http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A36A27C140137E0DAB22838B5/Ata%20
Reuni%C3%A3o%20Extraordin%C3%A1ria%20janeiro-2012%20v2.pdf. 
 
Conselho Nacional de Imigração (CNIg). Resolução Normativa nº 97, de 12 de 
janeiro de 2012, cujo acesso ocorreu em 10 de março de 2014, pelo portal 
http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A350AC8820135687F345B412D/RESOLU
%C3%87%C3%83O%20NORMATIVA%20N%C2%BA%2097.pdf. 
 
COSTA, Pe. Gelmino A. Haitianos em Manaus: dois anos de imigração – e 
agora?. Travessia: Revista do Migrante, nº 70, São Paulo, 2012. 
 
DIÓGENES, Glória. Itinerários de corpos juvenis: o baile, o jogo e o tatame. 
São Paulo: Annablume, 2003. 
 
FARIA, Andressa Virgínia de. A diáspora haitiana para o Brasil: o novo fluxo 
migratório (2010-2012). Dissertação (Mestrado em Geografia – Tratamento da 
 
36 
 
Informação Espacial) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo 
Horizonte, 2012. 
 
FERNANDES, Duval Magalhães. Migração Brasil - Europa: a situação dos 
migrantes brasileiros retornados da Europa no início do Século XXI. ICMPD, 2013. 
 
FERNANDES, Duval Magalhães; MILESE, Rosita; PIMENTA, Bruna Beatriz; 
CARMO, Vanessa do. Migração dos Haitianos para o Brasil: a RN nº 97/2012, uma 
avaliação preliminar. In: Caderno de Debates Refúgio, Migrações e Cidadania, 2013, v. 
8, p. 55. 
 
FERNANDES, Jéssica. Operação Haiti: ação humanitária ou interesse político 
para o Brasil?.Conjuntura internacional. nº 22. PUC Minas. 2010. 
 
Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH). Estatísticas sobre Refugiados. 
Dados emitidos pelo CONARE, em www.migrante.org.br, cujo acesso ocorreu em 05 
de março de 2014. 
 
International Centre for Migration Policy Development (ICMPD). Publicações 
disponíveis em www.icmpd.org. 
 
JACKSON, Regine Les espaces haitiens. Remapping the geography of the 
Haitian diáspora. In: Geographies of the Haitian diaspora Routledge. New York. 2011. 
 
GÓIS, Pedro et al. Segunda ou terceira vaga? As características da imigração 
brasileira recente em Portugal. In: PADILLA, Beatriz; XAVIER, Maria (orgs.). Revista 
Hatian Diaspora. Disponível em http://haitiandiaspora.com/. Acesso em 03/03/13. 
 
MELO, Adriana Ferreira. O lugar-sertão: grafias e rasuras. Dissertação 
(Mestrado em Organização do Espaço) – Instituto de Geociências, Universidade Federal 
de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006. 
 
Organização Internacional para as Migrações (OIM). Publicações cujo acesso foi 
feito a partir do portal http://www.brasil.iom.int/. 
 
37 
 
 
PATARRA, Neide Lopes. Migrações Internacionais: Herança XX, Agenda 
XXI. São Paulo-SP: FNUAP, 1996. v. 2. 268p. 
 
PATARRA, Neide Lopes. Emigração e Imigração Internacionais no Brasil 
Contemporâneo. 2ª ed. São Paulo: UNPFA, 1996. v. I. 207p. 
 
PATARRA, Neide Lopes; FERNANDES, Duval Magalhães. Desenvolvimento e 
Migração. In: Leonir Mario Chiarello (Org.). Las políticas públicas sobre migraciones 
y la sociedad civil en América Latina: los casos de Argentina, Brasil, Colombia y 
Mexico. New York: Scalabrini International Migration Network, Inc., 2011, v. , p. 160-
194. 
 
PATARRA, Neide Lopes; FERNANDES, Duval Magalhães. Marco das 
políticas migratórias. In: Leonir Mario Chiarello (Org.). Las políticas públicas sobre 
migraciones y sociedad civil en America Latina. New York: Scalabrini International 
Migration Network, Inc., 2011, p. 194-220. 
 
ROUSSEAU, Jacques H. Haiti: quince años no son nada, pero se avanza em 
población y desarrollo. Anais IV Congreso da Asociación Latinoamericana de 
Población-ALAP. Havana, 2010. 
 
SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. 4. ed. 
São Paulo: EDUSP, 2002. 
 
SAYAD, Abdlmalek. O Retorno. Travessia: revista do imigrante. Número 
especial. Centro de Estudos Migratórios-CEM: São Paulo, 01/2000. 
 
SENRA, Estevão B. Cinema, cidade e metrópole: do espaço vivido ao 
espetáculo. In: Encontro de Geógrafos da América Latina, 2009, Montevidéu. Anais do 
XII EGAL: Universidade de la Republica, 2009. v. 01. p. 01-10. 
 
SILVA, Sidney Antônio da. Brazil, a new Eldorado for immigrants?: The case 
of Hatians and the Brazilian Immigration Policy. Urbanities, 2013. v. 3. p. 03-18.

Outros materiais