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O MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA EM SÃO PAULO

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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” 
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS 
 
 
 
 
 
 
 
MARIANA SATO DOS REIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA EM SÃO 
PAULO: UM DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FRANCA 
2011 
 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
MARIANA SATO DOS REIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA EM SÃO 
PAULO: UM DIÁLOGO COM AS POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à 
Faculdade de Ciências Humanas e Socais, da 
Universidade Estadual Paulista “Júlio de 
Mesquita Filho”, para a obtenção do Título de 
Bacharel em Serviço Social. 
 
Orientadora: Profa. Dra. Raquel Santos 
Sant’Anna 
 
 
 
 
 
 
 
 
FRANCA 
2011 
 
 2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ao Movimento Nacional da População de 
Rua e a todos aqueles que fazem das ruas 
seu meio de vida. 
 
 3 
AGRADECIMENTOS 
 
 Agradeço a Deus pela proteção nos momentos de angústia e medo; pela luz que guiou 
meus caminhos; pela força que não me deixou desistir, pelo contrário, fez-me persistir ainda 
mais; pela paz no coração, quando a saudade apertava; por jamais deixar de ouvir minhas 
preces; pela sabedoria que guiou este trabalho; e pelas pessoas maravilhosas e inesquecíveis 
que colocou em minha vida. 
 Aos amigos espirituais de luz, agradeço materialmente por meio deste trabalho, pois 
sei que jamais me abandonaram, e jamais permitiram que coisas ruins encontrassem os rastros 
dos meus passos. 
 A minha mãe Ângela... A força que possuo, e a persistência para alcançar meus sonhos 
foram cultivadas dentro de mim, tendo você como meu maior exemplo de luta e coragem. Sei 
que minha partida não foi fácil, e me desculpe por esse buraco que deixei em seu coração, e 
pelas horas angustiadas que passou pensando se eu estaria bem, pois sei que tudo que você fez 
até hoje foi pensando em mim, na minha felicidade. Você é o lado oriental mais bonito que 
possuo. Mãe, mulher guerreira, muito obrigada. Eu te amo muito japonesa. 
Ao meu pai Ademar, exemplo de inteligência e sabedoria. Confidente de muitas 
angústias, amigo. A saudade que senti de você foi enorme em todos esses anos, você me fez 
muita falta. Muito obrigada por tudo. Perdoe-me a ausência por três anos seguidos do seu 
aniversário, e que a data da minha formatura seja então um grande presente para você. Meu 
respeito por você é uma imensidão desse amor que mal cabe no peito. Te amo para além do 
limite do amor de filha. 
 Pai e mãe, obrigada por todos os sacrifícios que fizeram para eu poder chegar até aqui, 
sei que algumas escolhas que fizeram não foram fáceis e os admiro muito por saber que elas 
foram tomadas por amor a mim e ao meu irmão. Saibam que a melhor parte de mim são 
vocês. 
Ao Matheus, meu companheiro, amigo, amante, cúmplice e... namorado. Se posso te 
definir de alguma forma, te defino como meu “porto-seguro”. É isso que você foi para mim 
durante esses quatros anos. Obrigada pelas incansáveis mudanças que me ajudou a fazer, e 
pelas visitas tão especiais e importantes; por ter compartilhado dos meus medos, das minhas 
tristezas, da minha raiva, da minha felicidade e das minhas conquistas. Obrigada por todas, 
todas as vezes que você apenas me ouvia e não me questionava, não me repreendia, apenas 
me deixava falar desesperadamente quando a saudade apertava ou quando algum problema 
surgia. Obrigada pela paciência, porque sei que esses quatro anos separados não foram fáceis. 
 
 4 
Obrigada ainda por ter ido comigo a campo, e me acompanhado em praticamente todo o 
desenvolvimento dessa pesquisa, passando horas me ouvindo falar sobre ela, e indo comigo 
até São Paulo. Quero que saiba que se hoje estou forte é porque muitas vezes foi pelos seus 
braços que eu fui amparada. Eu te amo muito meu amor, e se me permitir, enquanto essa 
liberdade encantadora que nos rodeia existir, quero permanecer ao seu lado. Porque apesar da 
distância sempre estivemos em baixo da mesma Lua. 
 Ao meu irmão Yuri, que além de irmão é parte do meu coração. Eu amo muito você. 
 Aos avós: Nice e Ademar, Jandira e José. Pelo carinho de avós que fez toda a 
diferença das minhas voltas para Rio Preto. E a minha Bisavó, por ter me benzido em japonês 
de forma tão doce naquela tarde. 
 Aos tios tão amados: Dedé e Zé, Silvia e Beto, Mara e Leandro, Jose e Beto. Tia Dedé 
e tia Silvia muito obrigada por cada coisa que me deram para me deixar o mais confortável 
possível em Franca, vocês foram e são minhas fadas madrinhas. 
 Aos meus primos-irmãos: Julia e Guilherme, Luiza e João Vitor, André, Yan e Giulia 
(o bebê da família). Pelo amor incondicional que cultivamos durante toda a nossa vida. Julia e 
Luiza vocês são as luzes da minha vida, são o meu maior tesouro. Perdoem-me pela ausência 
em muitos momentos importantes. Eu amo muito vocês minhas princesas. 
A família do Matheus, que é para mim uma segunda família. Em especial a minha 
cunhada Gabi, a Rosana, minha sogra-mãe que eu tanto admiro e que tanto me ensinou em 
todos esses anos; ao João, sogro-pai, pelo carinho e pelo acolhimento em São Paulo, muito 
obrigada mesmo por tudo. Aos avós Carlina, Geni e Luis (pelos almoços de domingo e pelas 
goiabas colhidas com tanto amor). 
As irmãs de coração que jamais imaginei ser capaz de encontrar... 
Talita, você me ensinou a singela inteligência que um ser humano pode ter. Muito 
obrigada pela companhia das inúmeras viagens que fizemos e pelas eternas histórias que 
jamais serão esquecidas. Eu te amo muito amiga. De nós quatro você foi para mim a 
segurança. 
Amanda, minha pequena francana, por você eu tenho uma admiração infinita, pelo seu 
esforço, sua magnífica inteligência. Nunca se esqueça que você é além de uma mulher, uma 
amêndoa, o que faz toda a diferença e te deixa ainda mais doce e especial do que você já é. 
Muito obrigada pelos almoços de domingo tão deliciosos (principalmente aquele que você e 
sua irmã me consolaram e fizeram minha unha, eu nunca vou esquecer disso), e por ter a mãe 
que faz o melhor feijão mundo. Eu te amo muito. De nós quatro você foi para mim a 
sabedoria. 
 
 5 
Cris, você é um poço de emoções. Uma mulher desesperadamente incrível. Uma 
pessoa inteligente e muito especial. Obrigada pelas músicas sertanejas que você me ensinou a 
ouvir; pelas inúmeras sopas feitas juntas (rs); pelos momentos de “divã” que fiz no seu 
quarto; e obrigada por ouvir meus desabafos e bafos em todos esses momentos. Você deixou 
minha vida MARA! Saiba que esse ano que morei com você foi o ano mais especial, o ano 
que eu realmente me senti em casa. Eu te amo muito amiga-companheira do lar. De nós 
quatro, você foi para mim o zelo. 
 Amigas saibam que ter conhecido vocês fez toda a diferença. Vocês contagiaram 
minha vida de amor, de amizade, de companheirismo. Obrigada por cada tarde que passamos 
juntas, por cada almoço, por cada festa que curtimos juntas (isso inclui as terçanejas), por 
cada vez que me acolheram na casa de vocês, pelas palavras que me aconselharam, que me 
confortaram e que me ensinaram. Eu vou sentir uma saudade eterna de vocês. Cada uma é 
uma parte do meu coração. Que a nossa amizade seja eterna. 
 As Ana’s da minha vida: Ana Claudia, Ana Clara e Viviana. Muito obrigada por terem 
me ensinado um jeito mais simples e mais saudável de viver. Ana Claudia, você é uma mulher 
encantadora, nunca vou esqueceresse seu jeito milagroso de ser inteligente; muito obrigada 
pelas inúmeras conversas construtivas de tivemos. Sentirei falta da sua companhia nas lutas 
cotidianas e dos seus quitutes maravilhosos. Ana Clara, você bordou minha vida literalmente. 
Me ensinou que as aparências não condizem com o que nós realmente somos, saiba que você 
me ensinou a olhar para a vida com olhos mais puros. Muito obrigada pelos maravilhosos 
artesanatos que fez para mim e pela ópera que cantou para mim naquele dia, eu nunca vou 
esquecer daquele momento. Viviana, por trás do seu silêncio, existe uma grande mulher. 
Muito obrigada por ter me dado espaço para conhecer essa Viviana alegre, inteligente, com 
opinião forte, uma pessoa muito respeitosa que se tornou muito importante na minha vida. 
Meninas, muito obrigada pelo acolhimento na casa de vocês por diversas vezes. Eu vou sentir 
muita falta de cada uma...de cada Ana. 
 As meninas de Ribeirão Preto: Isabella, pena que demoramos tanto para construir essa 
amizade. Você é a pessoa mais doce que já conheci. Cris Fortaleza, você veio do Ceará 
diretamente para deixar minha vida totalmente arretada. Michelle (Xú), bom você já sabe que 
é única, a brasileira mais americana que já conheci. Obrigada por dividir muitas histórias 
comigo e ter deixado na minha memória lembranças tão alegres. Meninas vocês vão deixar 
muitas saudades. Muito obrigada por terem aberto as portas dos seus lares para mim. Foi 
muito especial. Eu amo muito vocês. 
 
 6 
 A todas as outras amigas que passaram pela minha vida nesses quatros anos: Débora 
(companheira de estágio) obrigada pelas caronas nas baladas; Fabiana, Raquel, Fernanda, 
Bianca, Priscila, Marina, Mariana’s, Yasmine, Tais Dib (Viçosa foi muito especial com você), 
Lívia (a pessoa mais fofa e forte que já conheci) e Amanda (Sino – a bixete mais querida de 
todas. Boa sorte na sua caminhada.) 
 As minhas eternas companheiras do lar: Camila, Lucila, Larissa e Cristiane. Aprendi e 
vivi momentos únicos com cada uma de vocês. Muito obrigada por tudo. 
“[...] as pessoas que amamos são eternas até certo ponto. Duram o infinito variável no 
limite de nosso poder de respirar a eternidade”. Carlos Drummond de Andrade. 
 Ao meu eterno grupo de extensão GEDE/ INCONESP: Zen, Carla, Jacob muito 
obrigada por tudo que me ensinaram. Ao professor Ivan e aos membros amados: Ana Claudia, 
Ana Clara, Viviana, Tais, Isabela (meninas obrigada por todas as viagens e experiências 
compartilhadas e construídas ao longo desses anos); Sylvia, Breno, Erick, Nelma, Bárbara, 
Jéssica, Thais, Matias, Pedro, Anna, Aline e Tayane. Obrigada a todos pelos desafios 
compartilhados e enfrentados juntos. Eu vou sentir uma falta eterna de vocês. Que a luta seja 
uma constante e que os sonhos jamais sejam esquecidos. 
Ao PET de Serviço Social, pelo pouco que vivi e pelo muito que aprendi. Agradeço a 
professora Cirlene pela oportunidade, e pelo carinho e dedicação ao grupo. Levo comigo as 
reuniões, os estudos, os debates, as viagens, os momentos de muita risada, as pessoas 
maravilhosas que por um minuto se tornaram parte de minha vida. Em especial, a Talita, 
melhor amiga, cúmplice de muitos momentos, exemplo de simplicidade e inteligência. 
A todos os outros professores do Serviço Social que contribuíram para minha 
formação profissional. 
Aos funcionários da UNESP, que me ajudaram em muitos momentos: Mariângela, 
Neide, Juliana, Tânia, Lívia, Guilherme e Laura. 
 Ao CREAS de Franca, pela oportunidade e pelos intensos momentos de troca. 
 Ao Movimento Nacional da População de Rua, exemplo de lutas, permeado pela 
certeza de que a chama dos movimentos sociais jamais será apagada. 
 Aos sujeitos da pesquisa que possibilitaram o enriquecimento da mesma e o diálogo 
com a realidade estudada. 
 A Associação Rede Rua e ao jornal “O Trecheiro”, pela caminhada e pelo trabalho 
desenvolvido ao longo desses anos, na luta pelos direitos das pessoas em situação de rua. 
Obrigada pelo acolhimento e pelas diversas contribuições à pesquisa. A vocês minha sincera 
admiração. 
 
 7 
 A professora orientadora Raquel Santos Sant’Ana, pelas incansáveis orientações, 
sempre feitas com muita seriedade, compromisso, um toque de carinho, e algumas lágrimas. 
A você professora, minha admiração e meu sincero respeito pelo trabalho que desenvolve na 
universidade e pelas lutas que assume no seu cotidiano profissional. 
 Agradeço, por fim à FAPESP pelo apoio e fomento à minha pesquisa nesse último 
semestre. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 8 
 
 
 
 
A rua 
A rua, concreta, discreta 
Nos mostra a frieza da sociedade 
E a tristeza de um povo esquecido. 
A rua, cinza, prateada, concreta, discreta, 
Esconde o brilho da lua 
Através da escuridão solitária 
Nos mostra o pouco caso dos governantes 
E a tristeza de um povo esquecido. 
A rua, vazia, fria, Cinza, prateada, Concreta, discreta, 
Sufoca os sentimentos, 
Entristece a felicidade do sorriso, 
Apaga o brilho do olhar, 
Nos mostra as drogas da vida 
E a tristeza de um povo esquecido. 
A rua, violenta, imponente, vazia, fria, Cinza, prateada, concreta, discreta, 
Acaba com a alma infantil, 
A brincadeira com a bola 
E a roupa colorida 
Que caracterizam as crianças. 
Assim, mais uma vez, a rua nos mostra 
A frieza da sociedade, 
O pouco caso dos governantes, 
As drogas da vida 
E a tristeza de um povo esquecido. 
 
 (Mariana Zayat Chammas) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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O Bicho 
Vi ontem um bicho 
Na imundície do pátio 
Catando comida entre os detritos. 
Quando achava alguma coisa, 
Não examinava nem cheirava: 
Engolia com voracidade. 
O bicho não era um cão, 
Não era um gato, 
Não era um rato. 
O bicho, meu Deus, era um homem. 
Manuel Bandeira 
 
 10 
REIS, Mariana S. dos O Movimento Nacional da População de Rua em São Paulo: um 
diálogo com as políticas sociais públicas. 2011. 97 f. Trabalho de Conclusão de Curso 
(Bacharel em Serviço Social) – Faculdade de Ciência Humanas e Sociais, Universidade 
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2011. 
 
RESUMO 
 
A pesquisa sobre o Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) teve por objetivo 
central dar visibilidade a este movimento social, na cidade de São Paulo, e sua luta pela 
garantia dos direitos da população em situação de rua, dialogando diretamente com as 
políticas sociais públicas. Baseando-se numa perspectiva histórico-dialética, materializada na 
realidade concreta, buscou-se através do método qualitativo de entrevistas abertas, a 
aproximação com esta realidade. Desta forma, no primeiro capítulo foram descritos os 
métodos utilizados, incluindo a pesquisa bibliográfica, documental e digital e a realização da 
pesquisa de campo. Foi feita ainda a caracterização da população de rua no Brasil, e destacou-
se a história do surgimento do MNPR, bem como seus princípios, objetivos e parcerias. Já a 
análise críticas das políticas sociais, foi feita no segundo capítulo, e foram abordadas as 
políticas de saúde, habitação, trabalho e educação. A questão do preconceito e da violência 
contra esta população finalizou o segundo capítulo. Por conseguinte, foi possível perceber no 
decorrer do trabalho, que a população em situação de rua é hoje um fenômeno que vem 
crescendo no Brasil, seja por conta do desemprego, seja por conta da quebra dos vínculos 
familiares, ou ainda pela dependência de álcool e outras drogas, dentre outrosmotivos, além 
do que os homens compõem a grande maioria desta população. É dessa forma, que a 
importância do MNPR se destaca, pois este objetiva a materialização de políticas públicas que 
possam garantir o acesso da população em situação de rua aos direitos sociais existentes. 
 
 
 
Palavras-chave: Movimento Nacional da População de Rua. População em situação de rua. 
Cidade de São Paulo. Políticas Públicas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 11 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13 
 
CAPÍTULO 1 O MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA (MNPR) NA 
LUTA PELO POVO DA RUA ...................................................................... 16 
1.1 A perspectiva teórico-metodológica ................................................................................ 16 
1.2 O percurso da pesquisa de campo................................................................................... 18 
1.3 Caracterização da população em situação de rua no Brasil......................................... 23 
1.4 O Surgimento do MNPR e sua atuação em São Paulo: seus princípios, objetivos e 
parcerias ............................................................................................................................ 33 
 
CAPÍTULO 2 POLÍTICAS SOCIAIS PÚBLICAS COMO INSTRUMENTO DE LUTA 
DO MNPR ....................................................................................................... 41 
2.1 As Políticas Sociais: uma análise crítica ......................................................................... 41 
2.2 A articulação entre a Política Nacional para a População de Rua (PNPR) e a Política 
Nacional de Assistência Social (PNAS)........................................................................... 45 
2.3 Saúde para a população em situação de rua .................................................................. 51 
2.4 O direito à habitação ........................................................................................................ 56 
2.5 “A população em situação de rua quer trabalhar!”...................................................... 59 
2.6 Expandindo os horizontes da educação.......................................................................... 64 
2.7 A violência contra a população em situação de rua ...................................................... 66 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................. 71 
 
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 76 
 
APÊNDICE 
APÊNDICE A – Questionário das Entrevistas .................................................................... 84 
 
ANEXOS 
ANEXO A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ................................ 87 
 
 12 
ANEXO B – TABELA 1 - Relação de Municípios onde foi realizada a Pesquisa Nacional 
sobre a População em Situação de Rua, 2007-8.............................................. 88 
ANEXO C – Regimento Interno do Movimento Nacional da População de Rua 
predispõe sobre a organização do movimento ................................................ 90 
ANEXO D – Ações Estratégicas (Contidas dentro da Política Nacional para a Inclusão 
da População de Rua)........................................................................................ 92 
ANEXO E – Jornal “O Trecheiro” Edição Especial ........................................................... 97 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 13 
INTRODUÇÃO 
 
“O real não está na saída nem na chegada, ele se 
dispõe para a gente é no meio da travessia”. 
 
Guimarães Rosa 
 
 A presente pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de 
São Paulo (FAPESP). O tema deste Trabalho de Conclusão de Curso foi escolhido devido a 
uma série de indagações que trouxeram inquietações e uma grande ânsia por possíveis 
respostas. Dentre estas indagações se destacam: Como o Movimento Nacional da População 
de Rua (MNPR) é formado, e por quem ele é constituído? Como esse Movimento se 
posiciona frente às demandas da população em situação de rua, especificamente na cidade de 
São Paulo? Qual é o impacto desse Movimento quando da formulação e implementação das 
políticas sociais públicas destinadas a essa população? Existe, em São Paulo, o vínculo entre o 
MNPR, e os assistentes sociais? Se existe, como ocorre esse diálogo? Qual é a articulação 
entre a população em situação de rua e MNPR? Essas e outras questões nortearam a busca por 
respostas, que foram clareadas no decorrer do trabalho, mas que continuarão abertas para 
outras possíveis contribuições relacionadas ao tema em questão. 
 Sendo assim, procurou-se com este trabalho dar visibilidade a este movimento social 
tão específico de uma determinada população, cuja característica principal é ser expressão 
radical da questão social. Mostrar a luta deste movimento (quem o compõe e que espaços ele 
ocupa), e as principais políticas sociais públicas reivindicadas por ele, numa perspectiva de 
acesso e garantia aos direitos sociais existentes, foi o principal foco deste Trabalho de 
Conclusão de Curso. 
 No primeiro capítulo, “O Movimento Nacional da População de Rua na luta pelo povo 
da rua”, foram descritos os procedimentos metodológicos incluindo a pesquisa bibliográfica, 
documental e digital e a realização da pesquisa de campo. A análise das entrevistas foi feita 
em grande parte no decorrer do capítulo que segue, sendo alguns pontos analisados neste 
primeiro capítulo. Esse método foi escolhido, pois dessa forma, as falas dos sujeitos adensam 
as discussões teóricas, enriquecendo o trabalho e dando concretude à pesquisa. É válido 
mencionar que a realização da pesquisa, foi norteada, dentre outras orientações, pelo o que 
está previsto no art. 43º (inciso VI) da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996: 
“A educação superior tem por finalidade [...]: VI – estimular o conhecimento dos problemas 
do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à 
comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade [...].” Foi feita ainda nesse 
 14 
primeiro capítulo, a caracterização da população de rua no Brasil, destacando as pesquisas 
realizadas por Silva (2009) nas cidade de São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre; 
por Schor e Vieira através da FIPE/ FEAC-USP na cidade de São Paulo, cujos os dados foram 
publicados em 2010; e pelo I Censo e Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de 
Rua, que abrangeu 71 municípios brasileiros, dentre eles, Franca. Por fim, destaca-se a 
história do surgimento do MNPR, com ênfase em São Paulo, bem como seus princípios, 
objetivos e parcerias. 
 No segundo capítulo, “Políticas sociais públicas como instrumento de luta do MNPR”, 
analisou-se de forma crítica as políticas sociais, e como elas se materializaram na realidade 
brasileira, por conseguinte, foi feita uma articulação entre a Política Nacional de Assistência 
Social e a Política Nacional para a População em Situação de Rua, apontando-se seus pontos 
negativos e positivos. Nesse capítulo foram abordadas ainda, as principais políticas 
relacionadas à população de rua: saúde, habitação, trabalho e educação. Com relação a estas 
políticas foram citadas as formas de acesso a elas, o papel do MNPR frente à materialização 
das mesmas, alguns dados estatísticos das pesquisas citadas anteriormente que deram 
embasamento e concretude aosfatos citados, além de terem sido usadas as falas dos sujeitos 
da pesquisa de campo, que contribuíram para a aproximação com a realidade concreta em 
análise neste trabalho. Por fim, o capítulo encerra-se com a questão da violência praticada 
contra essa população, seja em seu aspecto físico ou em seu aspecto psicológico, analisando 
também o preconceito existente na sociedade a que esta população está sujeita. 
 Nas considerações finais, procurou-se retomar alguns elementos para o entendimento 
do tema abordado neste trabalho e as principais conclusões obtidas no desenvolvimento do 
mesmo. Ao final, mesmo que pontualmente, discutiu-se a relação do Serviço Social com os 
Movimentos Sociais. 
A pesquisa teve ainda como pressuposto que é necessário para garantir que o Serviço 
Social esteja de acordo com as demandas da atualidade, nas palavras de Iamamoto (2007, p. 
20, itálico do autor) “romper com uma visão endógena, focalista, uma visão ‘de dentro’ do 
Serviço Social, prisioneira em seus muros internos”. 
 Portanto, a visão do Serviço Social, que norteou este trabalho foi baseada na procura 
por ir além das suas possibilidades internas, de forma a captar novas mediações, novas 
particularidades e refazer a ação profissional de forma contínua e inovadora. A necessidade de 
atenção para com a dinâmica da realidade que permeia as intervenções dos assistentes sociais 
para que haja a possibilidade de captar a essência da mesma, abre novos horizontes para a 
intervenção dos profissionais do Serviço Social. No entanto, durante esse percurso, como bem 
 15 
alerta Iamamoto (2007, p. 21-22) é necessário evitar a dualidade de visões presentes no 
Serviço Social: a visão fatalista, ligada à crença de uma realidade dada de forma definitiva, 
sem que nada se possa fazer para mudar as expressões que dela decorrem; e a visão 
messiânica da profissão que é descolada da realidade concreta e tida como heroísmo. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 16 
CAPÍTULO 1 O MOVIMENTO NACIONAL DA POPULAÇÃO DE RUA NA LUTA 
PELO POVO DA RUA 
 
“Como categoria histórica que é a identidade se constrói 
no movimento da história, ao longo da caminhada da 
própria classe, que ao produzir a sua existência, a sua 
vida material, produz a história humana”. 
 
Maria L. Martinelli 
 
“Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. 
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que 
fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta 
vive”. 
 
Fernando Pessoa 
 
1.1 A perspectiva teórico-metodológica 
 
 Nesta pesquisa, procurou-se dar uma abordagem materialista histórico dialética para o 
tema abordado. Esse método entende a realidade pela análise concreta/ material das relações 
sociais. Ele é histórico uma vez que o real carrega elementos do passado entrelaçados com a 
evolução do presente; é dialético, pois que a realidade está em constante movimento, em 
constante transformação. Com esse método foi possível compreender que os aspectos que 
permeiam a realidade das pessoas em situação de rua, estão ligados a fatos históricos presos 
no movimento da realidade concreta. O pauperismo, como consequência das desigualdades 
existentes na sociedade atual, aponta para uma realidade na qual a riqueza socialmente 
produzida é apropriada por uma pequena parcela da população. Estar na rua é uma condição 
social que só pode ser compreendida em sua essência, quando se apreende esse processo 
social que “empurra” milhares de pessoas a esta condição. A realidade dessas pessoas é 
complexa e está ligada a diversos fatores determinantes (como melhor será abordado no item 
1.3). Portanto, o método escolhido propiciou uma melhor apreensão dos fenômenos ligados a 
condição social desta população, sendo possível também captar a essência das lutas e 
reivindicações do Movimento Nacional da População de Rua 
No entanto, como afirma Guerra (2010, p. 29): 
 
 
 
 
 
 
 17 
A história, entendida como acumulação de forças produtivas, fornece o material 
para análise da razão. As categorias extraídas da história são remetidas a ela; a 
razão se historiciza e a história se racionaliza. Portanto, a teoria não se confunde 
com um método; ela ilumina as estruturas dos processos sociais, as determinações 
contraditórias dos processos que constituem os fenômenos, dissolvem a 
objetividade dos fatos pela sua negação, mas não oferece, nem se propõe a isto, os 
meios ou instrumentos profissionais de ação imediata sobre os fenômenos. Do 
mesmo modo, a concepção de método enquanto direção analítica difere em muito 
daquela que toma o método como um conjunto de procedimentos ou como meio de 
aplicação imediata do conhecimento. Entre o conhecimento e ação há mediações de 
diferentes naturezas, sobretudo, determinações objetivas da realidade e subjetivas 
dos sujeitos que, embora desveladas pelo método, não são por ele solucionadas. 
Exigir das formulações marxianas respostas a um nível de intervenção na realidade, 
referente a um ramo de especialização da divisão social e técnica do trabalho, é 
transformá-las numa técnica social ou, no limite, enquadrá-la na lógica formal. 
 
 
A pesquisa teve ainda como referência, uma abordagem qualitativa, envolvendo a 
realização de entrevistas abertas, pois dessa forma, o informante “é convidado a falar 
livremente sobre o tema” proposto de forma a garantir uma maior profundidade às reflexões 
(MINAYO, 2008, p. 64). 
 Esta autora cita ainda três maneiras de concretizar a pesquisa qualitativa: 
• Através da descrição: as opiniões dos informantes são apresentadas da maneira mais 
fiel possível, como se os dados falassem por si só; 
• Pela análise, objetiva-se ir além do descrito, fazendo uma decomposição dos dados e 
buscando as relações entre as partes que foram decompostas; 
• Por fim, é pela interpretação que se buscam os sentidos das falas e das ações para se 
chegar a uma compreensão ou explicação que vão além do descrito e do analisado. 
É importante ressaltar, que descrição, análise e interpretação não se anulam, pelo 
contrário, complementam-se. 
 A análise dos dados das entrevistas foi feita no decorrer do segundo capítulo, sendo 
que as falas dos sujeitos foram lidas e interpretadas a partir do referencial teórico dos dados 
estatísticos presentes nesses capítulos. Apenas alguns pontos foram citados neste primeiro 
capítulo, de forma a introduzir a análise dos dados. Esse método teve como norte a 
aproximação do conteúdo do trabalho com realidade concreta, para além de como esta se 
apresenta da imediaticidade do cotidiano. 
 
 
 18 
1.2 O percurso da pesquisa de campo 
 
Para o desenvolvimento do trabalho, a pesquisa bibliográfica esteve referenciada em 
autores relacionados ao tema abordado, como, por exemplo, Silva, 2009, que trás um amplo 
conhecimento sobre esta população e suas múltiplas determinações. Foram utilizados ainda 
artigos1 sobre a população em situação de rua, sobre o MNPR em São Paulo e sobre as 
políticas sociais públicas voltadas para este segmento, de forma a complementar o trabalho e 
dar também visibilidade a prática profissional no que tange as políticas e ao atendimento da 
assistência social destinado a esta população. 
A pesquisa documental e digital enriqueceu o trabalho com dados estatísticos que 
englobavam informações relacionadas à população em situação de rua, como por exemplo, 
dados de Schor e Vieira (FIPE/ FEAC-USP, 2010a), do I Censo e Pesquisa Nacional sobre a 
População de Rua (2010), site do MNPR, entre outros. Por fim, foram utilizadas as leis que se 
referem à população em questão, bem como os decretos e os programas e políticas sociais 
públicas. 
Com relaçãoà pesquisa, a necessidade da observação e contato direto com os sujeitos 
foi fundamental, como parte do estudo de campo. Como afirma Thiollent (1985, p. 19): ”[...] a 
inadequada crítica ao empiricismo contribui para que o estudo dos problemas sociais gritantes 
seja desprezado e a elaboração de novos modos de relacionamento entre mundo acadêmico e 
mundo real desapareça enquanto preocupação crítica.” Este autor ainda fala que: 
 
 
O uso de questionários e entrevistas não é sinônimo de empiricismo quando estas 
técnicas, consideradas como meios de captação da informação, a ser criticada, e não 
como fins em si, são submetidas ao controle metodológico e subordinadas a uma 
verdadeira preocupação de teoria sociológica. [...] Tal controle consiste, em 
particular, na evidenciação dos pressupostos de teoria em atos específicos a cada 
técnica e também na revelação de todas as fontes de distorção inerente à distância 
cultural existente entre o universo acadêmico e o mundo das pessoas investigadas e 
que interfere na obtenção de dados. (THIOLLENT, 1985, p. 21). 
 
 
Sobre a entrevista e a questão da intersubjetividade, Zaluar (1997, p. 103), fala que: “É 
neste encontro entre pessoas que se estranham e que fazem um movimento de aproximação 
que se pode desvendar sentidos ocultos e explicitar relações desconhecidas”. A questão da 
subjetividade é algo que está entrelaçado na realização da pesquisa. Zaluar (1997, p. 104), 
 
1
 Um jornal que contribuiu imensamente para a pesquisa com informações importantes sobre o Movimento, suas 
ações e implicações para a população em situação de rua é “O Trecheiro”. 
 19 
sobre essa questão pontua: “Arrisco a afirmar que a subjetividade que não fomos treinados 
para controlar teima em se fazer presente e isto porque ninguém mais defende a noção de 
‘neutralidade’ que os manuais positivistas propunham como condição da ciência.” 
 Ainda sobre as entrevistas utilizadas pelo pesquisador, de forma que este possa ter 
uma maior aproximação dos sujeitos que compõem seu universo de estudo, Minayo (2008, 
p. 65) explica que: 
 
 
Uma entrevista, como forma privilegiada de intervenção social, está sujeita a 
mesma dinâmica das relações existentes na própria sociedade. Quando se trata de 
uma sociedade ou de um grupo marcado por muitos conflitos, cada entrevista 
expressa de forma diferenciada a luz e a sombra da realidade, tanto no ato de 
realizá-la, como nos dados que aí são produzidos. 
 
 
Partindo desses pressupostos, a pesquisa de campo foi realizada na cidade de São 
Paulo, sendo que os sujeitos foram escolhidos de forma aleatória, sem nenhum vínculo direto 
com instituições. Como forma de abordagem das pessoas em situação de rua entrevistadas, foi 
solicitada ajuda de profissionais que trabalham com esta população, sendo que estes 
indicaram os lugares certos que haveria possibilidade da realização das entrevistas. Devido a 
necessidade de assegurar o sigilo, não serão mencionados nem os nomes das localidades nas 
quais os sujeitos foram entrevistados e nem os nomes dos mesmos. Serão utilizados nomes 
fictícios que representarão os sujeitos em questão. As entrevistas abertas2 decorrentes da 
pesquisa qualitativa foram realizadas com o consentimento3 dos sujeitos, sendo gravadas, a 
posteriori transcritas e em seguida analisadas através dos procedimentos: descrição, análise e 
interpretação, sempre dialogando na perspectiva materialista histórico-dialética e na 
compreensão da realidade concreta. Como afirma Karel Kosík (1976) é possível chegar à 
essência do fenômeno (sua dinâmica e estruturas), saindo do caos da imediaticidade ou 
pseudoconcreticidade e através do processo de abstração, chegar a dados mais simples, que 
compõem, por sua vez, uma dada complexidade. 
 Foram entrevistados sete sujeitos: três pessoas em situação de rua: Francisco – 43 anos 
de idade, nascido em ITU, interior de São Paulo, e há 18 anos em situação de rua e vive 
atualmente na cidade de São Paulo; Beatriz – uma adolescente de apenas 17 anos, grávida de 
sete meses, em situação de rua há aproximadamente um ano, e sempre morou em São Paulo; e 
João – senhor, há oito anos em situação de rua, originário de Curitiba (PR) e desde então mora 
 
2
 Apêndice A: questionário das entrevistas. 
3
 Anexo A: Termo de Livre Consentimento Esclarecido (TLE). 
 20 
em São Paulo; duas assistentes sociais – Rosa, formada há 9 anos, e trabalhando com a 
população de rua quase que o mesmo período; e Luana, formada há aproximadamente 2 anos, 
e atualmente trabalha em um albergue em São Paulo; Luiz representante do MNPR, e por fim, 
Carlos, parceiro do Movimento e jornalista, um dos responsável pela Organização do jornal 
“O Trecheiro”. 
 As entrevistas com as três pessoas em situação de rua foram muito significativas, pois 
mostraram um pouco da realidade encontrada nas ruas: quando questionados sobre qual o 
serviço oferecido pela Assistência Social que eles mais utilizavam, Francisco disse ser o 
abrigo, que freqüentava quase que diariamente (a questão da habitação e dos equipamentos 
públicos para pernoite das pessoas em situação de rua será abordada no segundo capítulo, que 
discute as políticas sociais para esta população); Beatriz disse nunca ter utilizado nenhum 
serviço ou equipamento da assistência social, apenas a Tenda de Rua4, espaço utilizado com 
grande freqüência, além do Bom Prato para poder fazer suas refeições e o postinho de saúde, 
no qual estava fazendo o acompanhamento pré-natal de sua gravidez (a questão da saúde 
também será discutida no segundo capítulo deste trabalho); já João disse não utilizar 
atualmente nenhum equipamento para pernoite, dormindo na rua mesmo, pois afirma que na 
rua possui mais liberdade do que no abrigo, onde há regras e normas a serem seguidas. 
Estas falas revelam que os equipamentos que existem para o atendimento desta 
população, sejam os abrigos, os refeitórios, os postos de saúde, as Tendas de Rua, entre 
outros, com raras exceções, não trazem uma abordagem diferenciada que proporcione a esta 
população qualquer expectativa de transformação da realidade na qual vivem atualmente. 
Apesar da realidade complexa e bastante heterogênia, as pessoas em situação de rua possuem 
em comum (na maioria das vezes) a perda da perspectiva de futuro, seja pelo rompimento dos 
laços com pessoas as amadas, seja pela perda brusca do emprego, ou ainda pela dependência 
de álcool e outras substâncias psicoativas que também contribuem para essa falta de 
perspectiva. O que se procurou evidenciar neste trabalho foi que, apesar da existência de 
políticas públicas que garantam alguns direitos às pessoas em situação de rua, muitas vezes 
tais políticas não, conseguem abordar os muitos aspectos presentes na realidade concreta desta 
população. Muitas destas políticas citam a questão dos vínculos familiares, da matricialidade 
sociofamiliar, e os equipamentos seguem essa linha de atendimento, quando na verdade, a 
maioria das pessoas que estão em situação de rua, já não possui mais vínculos com ninguém. 
E ai o papel do MNPR é fundamental, pois que ele vem no sentido de exigir que essas 
 
4
 Espaços públicos de convivência da cidade de São Paulo, no qual as pessoas em situação de rua passam o dia. 
 21 
políticas se adequem a realidade destas pessoas, e que outras políticas sejam formuladas, sem 
que, no entanto, permaneça essa fragmentação, que fraciona também o ser humano. 
 Ainda como forma de iniciar o diálogo com os sujeitos pesquisados, um outro 
questionamento foi feito para as pessoas em situação de rua: quais eram as suas principais 
demandas? Beatriz, afirma ser o frio, a fome, além do “rapa” levar seus pertences e desmontar 
as barracas, utilizadas por ela.Beatriz, ainda fala que as Tendas de Rua também deveriam 
servir para eles poderem dormir e sair, sem as regras e exigências que existem no albergues. 
Para Francisco: 
 
 
Principais coisas: existir uma supervisão que dá atendimento de rua, uma delegacia, 
um lugar que a gente possa ter mais atenção nessa situação. Por exemplo, nós 
estamos aqui em S.A., aqui tem mais de 800 mil habitantes, e não tem onde ficar a 
pessoa, quando ela sai do albergue pela manhã, às 8:00 da manhã né! Deveria ter 
um lugar, para que ela possa se adequar a ficar ali né! Para que ela possa “se 
levantar”. E hoje ainda é preciso mudar muito. 
 
 
 A resposta mais peculiar, mas não menos importante, foi a de João: 
 
 
Olha aqui de coração, sabe do que essa população de rua precisa mesmo? É ter 
força de vontade! É ter força de vontade, porque ajuda tem de vários lugares que 
vem ajuda, favorece, tendeu?! Então assim, muitos não se esforçam para mudar. 
Olha meu caso, eu cheguei numa situação assim que eu já entrei num comodismo, 
num comodismo de rua! Chego lá jogo papelão, jogo minha manta, me deito, 
durmo... alimento vem. 
 
 
 A autopunição, o sentimento de culpa, dentre as pessoas em situação de rua é algo 
muito frequente. Como não ter um sentimento de autopunição, em meio à realidade atual, 
inserida na lógica do sistema vigente, no qual vale mais quem melhor se posiciona, 
principalmente frente ao mercado? O “comodismo” citado por João é uma característica 
muitas vezes guiada pela autocobrança, pode ter sido uma justificativa usada para sinalizar 
uma profunda desistência diante de uma situação social em que muitos já perderam a 
perspectiva de futuro, perderam a perspectiva de viver com certa dignidade que, na maioria 
das vezes, nunca se quer nem conheceram, seja por falta de amparo público adequado no 
momento da dependência, (principalmente de bebidas alcoólicas e outras drogas – a falta de 
instituições públicas vem sendo um dos principais obstáculos ao combate a dependências de 
substâncias psicoativas atualmente), seja porque a desigualdade social é grande e a riqueza 
socialmente produzida é apropriada por uma pequena parcela da sociedade, aumentando ainda 
mais o pauperismo existente, ou ainda, seja pelos altos índices de desemprego, que 
 22 
precarizam cada vez mais a situação do trabalho, ficando este a mercê das condicionalidades 
do capital. 
O mesmo questionamento também foi feito aos dois representantes do MNPR: Luiz 
(pertencente ao MNPR) fala que a principal demanda é por políticas públicas, e Carlos 
(jornalista e parceiro do MNPR), fala que além da diversificação de políticas, a principal 
demanda é pela qualidade dos serviços prestados a essa população. 
 A conversa estabelecida com as assistentes sociais, mostrando o lado profissional da 
relação entre elas e as pessoas em situação de rua também foi rica e poderá ser constatada no 
próximo capítulo. Já a fala do representante do MNPR, trouxe à tona a “voz” do Movimento, 
suas expectativas, suas lutas, as dificuldades encontradas no caminho, e também suas 
conquistas. O parceiro do MNPR apresentou uma visão de fora, mas ao mesmo tempo uma 
visão muito presente e participante dos atos e do percurso que esse Movimento vem traçando 
do decorrer dos anos. Ele acompanhou a construção da Política Nacional para a População em 
Situação de Rua, além de ter sido participante direto na construção I Censo e Pesquisa 
Nacional sobre a População em Situação de Rua, fotografando os municípios que esta 
pesquisa abordou, e enquanto jornalista, cobrindo todos os passos da mesma. 
Nesse sentido, a pretensão da pesquisa foi mostrar, através dos dados das entrevistas e 
do conteúdo teórico apresentado, que o MNPR é além de um Movimento social, um 
instrumento de luta pela garantia dos direitos em todas as suas amplitudes: social, política e 
econômica, de uma população historicamente excluída e marginalizada socialmente; bem 
como alertar para as políticas sociais públicas que são formas de garantir tais direitos, não 
deixando de lado o constante questionamento crítico em relação a tais políticas para que elas 
sejam de fato efetivadas e para que novas sejam criadas, implementadas e com orçamento 
adequado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 23 
1.3 Caracterização da população em situação de rua no Brasil 
 
Temos o direito de sermos iguais sempre que as 
diferenças nos inferiorizem; temos o direito de sermos 
diferentes sempre que a igualdade nos descaracterize. 
 
Boaventura de S. Santos 
 
Silva5 (2009) em seus estudos mostra que o fenômeno “população em situação de 
rua”, constitui uma síntese de múltiplas determinações, possuindo uma conexão entre as 
relações de trabalho dentro do sistema capitalista. As mudanças acarretadas para a classe 
trabalhadora com o advento deste sistema, geraram, como umas das principais consequências, 
um exército industrial de reserva, que nada mais é do que a população sobrante frente às 
necessidades do capital. As consequências, das mudanças ocasionadas no mundo do trabalho 
no final do século XX e início do século XXI repercutiram no agravamento do desemprego, 
na precarização das relações de trabalho e na queda da renda média real dos trabalhadores. Na 
seqüência deste movimento histórico, houve um aumento das desigualdades sociais e dos 
níveis de pobreza da classe trabalhadora. 
Fazendo a relação destes fatos com o fenômeno população em situação de rua, ocorre 
que, segundo os estudos de Silva (2009, p. 21), no período entre 1995 e 2005 no Brasil: 
 
 
[...] as mudanças no mundo do trabalho contribuíram para a ampliação de uma 
superpopulação relativa ou exército industrial de reserva e aprofundaram as 
desigualdades sociais e a pobreza, deslocando as relações com o trabalho para o 
centro das determinações do fenômeno. 
 
 
 A autora designa a população em situação de rua como parte da superpopulação 
relativa, que na visão marxiana, esta pode aparecer, “[...] conforme as fases do ciclo 
industrial, de forma aguda nos períodos de crises, ou de forma crônica, nos períodos de 
relativa estabilidade.” (MARX, 1988b, p. 743 apud SILVA, 2009, p. 98). 
 Esta superpopulação relativa, segundo a autora, pode ser denominada de “flutuante, 
latente e estagnada”. Entende-se por flutuante aqueles trabalhadores que ora são atraídos, ora 
são repelidos pelo mercado de trabalho (nos grandes centros industriais). É uma população 
caracterizada por ter idade mediana e por ser “liberada” pelo mercado de trabalho. Os estudos 
de Silva (2009), relacionados ao perfil da população de rua no período citado, e que serão 
 
5
 Em seu livro “Trabalho e População em Situação de Rua no Brasil”, Maria Lucia Lopes da Silva faz um estudo 
desta população no Brasil (mais precisamente nas cidades de São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Porto 
Alegre), no período de 1995 até 2005. 
 24 
vistos mais adiante, mostram que a população em situação de rua pode ser considerada 
“flutuante”, principalmente pelos pólos industriais como São Paulo e Porto Alegre. A 
população será “latente” quando há fluxos migratórios do campo para as cidades, evidenciada 
pela expulsão do meio rural sem que haja, no entanto, a atração desta população. 
 
 
Destaca-se que no período entre 1930 e 1970, no processo de destruição de um 
padrão de acumulação fundado em atividades econômicas de bases 
agroexportadoras para um padrão de acumulação sustentado em uma estrutura 
produtiva de base urbano-industrial, a área rural contribuiu com um grande 
contingente populacional na constituição de um exército industrial de reserva nas 
cidades brasileiras, especialmente naquelas localizadas no eixo sul-sudeste no País, 
nas quais o processo de industrialização foi mais acelerado. (SILVA, 2009, p. 99). 
 
 
 Coma reestruturação produtiva iniciada nas décadas de 1980 e 1990, este processo se 
intensificou ainda mais, contribuindo também para a ida de muitos desses trabalhadores para 
as ruas. 
 A forma “estagnada” é representada pela classe trabalhadora em atividade, mas em 
ocupações irregulares (extensa jornada de trabalho, pequenos salários, sem garantias de 
proteção social), podendo ser considerada como “reserva” do mercado capitalista. Muitas 
pessoas em situação de rua já vivenciaram ou vivenciam esta condição (SILVA, 2009, p. 100). 
Vale ressaltar que uma das condições caracterizadoras da população em situação de 
rua é a pobreza extrema definida pela não propriedade dos meios de produção e reduzido ou 
inexistente acesso à riqueza socialmente produzida. 
Silva (2009) utiliza-se do termo população “em situação de rua”, pois designa uma 
condição social produzida pela sociedade capitalista, no processo de acumulação do capital. 
O fenômeno população em situação de rua é desta forma, expressão radical da questão 
social, na contemporaneidade. 
A questão social é expressão das desigualdades resultantes das relações capitalistas 
desenvolvidas a partir da relação entre o capital e o trabalho; ela expressa também rebeldia, 
não sendo um resultado natural da sociedade humana, mas uma reação às desigualdades 
impostas pela ordem social capitalista. É, pois inerente ao capitalismo (IAMAMOTO, 2005, 
p. 28 apud SILVA, 2009, p. 112). 
Ainda segundo Silva (2009) são muitas as determinações que levam tais populações a 
se tornarem de rua: “fatores estruturais” relacionados à ausência de moradia, inexistência de 
trabalho e renda, mudanças econômicas e institucionais de forte impacto social; “fatores 
biográficos” relacionados à ruptura dos vínculos familiares, doenças mentais, consumo 
 25 
freqüente de álcool e outras drogas, infortúnios pessoais – morte de todos os membros da 
família/ roubo de todos os bens, fuga do país de origem; “desastres de massas” na ocorrência 
de terremotos, inundações, entre outros. 
Para a autora, existem seis aspectos característicos da população em situação de rua: as 
múltiplas determinações (citadas anteriormente) que levam tal população a encontrar nas ruas 
espaços de moradias; ser o fenômeno expressão radical da questão social; estar localizada em 
grande parte nos grandes centros urbanos; ter como marca o preconceito da sociedade para 
com esta população; as particularidades dos territórios em que tal fenômeno se manifesta; e a 
tendência à naturalização do mesmo. 
Cabe ainda citar as características gerais desta população: heterogeneidade; pobreza 
extrema; vínculos familiares interrompidos ou fragilizados; inexistência de moradia 
convencional regular e a utilização da rua como espaço de moradia e sustento, por 
contingência temporária ou permanente. Fatores estes que segundo Silva (2009, p.136): “[...] 
obrigam seus integrantes a procurar logradouros públicos (ruas, praças, jardins, canteiros, 
marquises, em baixo de viadutos), e as áreas degradadas (dos prédios abandonados, ruínas, 
cemitérios e carcaças de veículos)”. 
Silva (2009) ainda menciona um estudo quantitativo do perfil da população de rua 
realizado nas cidades de Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife e São Paulo6 no período de 
1995 a 2005. Em Porto Alegre nas pesquisas realizadas em 1995 e 1999, o número total da 
população de rua foi de 222 e 207 respectivamente; em Belo Horizonte as pesquisas 
realizadas em 1998 e 2005 calcularam 916 e 1.157 pessoas em situação de rua 
respectivamente; São Paulo nas pesquisas de 2000 e 2003 o número foi de 8.088 e 10.399; por 
fim Recife nas pesquisas realizadas em 2004 e 2005 somou-se 653 e 1.390 pessoas moradoras 
de rua. Com relação as formas de superpopulação relativa, os dados mostram que em Porto 
Alegre, em 1995, das 222 pessoas encontradas nas ruas, 25,21% eram originários de outros 
estados do Pais. Em Belo Horizonte, no ano de 1998, das 916 pessoas em situação de rua 
33,62%% vieram de outros estados. Já em Recife, no ano de 2005, das 1.390 pessoas, 24,90% 
vieram de outros estados brasileiros. O destaque maior é para São Paulo, que no ano de 2000, 
das 8.706 pessoas recenseadas, 65,71% eram provenientes de outros estados. Este dado se 
justifica pelo fato de São Paulo ser a maior metrópole e pólo de atração em relação aos demais 
estados do Brasil. Porém, vale destacar que atualmente houve uma redução do chamado 
 
6O número absoluto desta população nas referidas cidades foi calculado com base em pessoas com 18 anos 
completos ou mais e de ambos os sexos. 
 26 
êxodo rural, contribuindo para queda do número de pessoas em situação de rua, provenientes 
deste fenômeno. 
A partir destes dados Silva (2009) pode concluir que: a maioria dos indivíduos nesta 
condição é do sexo masculino (cerca de 78%); encontram-se em idade economicamente ativa 
(sendo crescente a concentração em faixas etárias mais elevadas entre 25 e 55 anos); a 
escolaridade desta população varia entre a 1ª e a 8ª série (embora seja crescente o índice de 
indivíduos pertencentes a esta população com grau de escolaridade mais elevado), sendo que 
70% sabem ler e escrever. Com relação à origem desta população, os dados pesquisados pela 
autora mostram que é crescente o número de pessoas do próprio Estado, quando não, da 
própria capital. 
 
 
[...] evidenciando que os problemas inerentes às grandes metrópoles no capitalismo 
contemporâneo, como a elevação dos índices de pobreza, o crescimento da 
informalidade, do desemprego e do trabalho precário, assumem importância 
fundamental nas determinações do fenômeno população em situação de rua (SILVA, 
2009, p. 172). 
 
 
Os dados mostram também que é crescente o tempo de permanência nas ruas: entre 
1995 e 2000, por exemplo, o tempo de permanência era inferior a um ano. Depois deste 
período, o índice sobe para mais de cinco anos, o que comprova que as pessoas estão 
envelhecendo nas ruas, sem que haja políticas públicas para o enfrentamento desta realidade. 
Com relação à família, apenas 10% desta população estão nas ruas acompanhadas de algum 
parente, a grande maioria sabe da existência de algum familiar, mas não possui vínculo algum 
com ele, o que comprova que os laços estão interrompidos e fragilizados. Em se tratando de 
trabalho 72% disseram ter uma profissão ou ter alguma experiência de trabalho anterior à 
situação de rua (estas experiências estão concentradas nas áreas da indústria, serviços, 
construção civil e ocupação doméstica). Quando da situação de rua as ocupações estão 
relacionadas aos cuidados com carros (lavar, vigiar, etc.), catação de materiais recicláveis, e 
também a mendicância contínua que ainda é algo freqüente. Por fim, a grande maioria desta 
população faz uso freqüente de álcool e outras drogas, sem que políticas públicas específicas 
para a população de rua no enfrentamento desses problemas sejam pensadas, o que mostra o 
descaso no atendimento público a estes problemas como veremos no próximo capítulo. 
A partir dos dados apresentados, fica evidente a importância das políticas públicas e 
sociais para esta população. 
 27 
Boschetti (2004, p.113 apud SILVA, 2009, p. 174) ao tratar de políticas públicas 
afirma: 
 
 
Ainda que incapazes de instituir a plena igualdade de condições no capitalismo, as 
políticas sociais podem constituir uma via para a redução das desigualdades sociais, 
desde que assumidas pública e institucionalmente como sistemas legais e legítimos 
de garantia de direitos e não apenas como programas focalizados de combate à 
pobreza extrema. 
 
 
Nesta perspectiva, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome 
(MDS), comprometeu-se em formular políticas públicas destinadas a este segmento social. 
Para tanto, em 2005 a Secretaria Nacional de Assistência Social(SNAS) realizou o I Encontro 
Nacional sobre População em Situação de Rua, onde foram discutidos, em conjunto com os 
movimentos sociais que representam esta população, os desafios, as estratégias e as 
recomendações para a formulação de políticas públicas nacionalmente articuladas para este 
segmento populacional. Em vista disso, de 2007 para 2008 foi realizado o I Censo e Pesquisa 
Nacional sobre População em situação de Rua, um trabalho feito através da parceria entre 
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e o 
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, por meio da Secretaria Nacional 
de Assistência Social (SNAS) e Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI). 
O censo foi muito importante para a população em situação de rua, haja vista que esta 
população não é incluída nos censos demográficos brasileiros, fundamentalmente porque a 
coleta dos dados dos censos é de base domiciliar. 
Como simboliza Sposati (2010, p. 193) “[...] saber quantos e quem são aqueles em 
situação de rua significa transitar das esferas das individualidades para a esfera coletiva da 
população. É o início do reconhecimento que poderá levar à restauração da identidade social.” 
 Esta pesquisa foi também de fundamental importância para a Política Nacional de 
Assistência Social (PNAS) que dirige à população em situação de rua os serviços relacionados 
à Proteção Especial de Alta Complexidade de forma a nortear a construção de futuras 
políticas públicas para esta população. Os serviços de Proteção Social Especial de Alta 
Complexidade visam à proteção integral – moradia, alimentação, higienização e trabalho 
protegido para famílias e indivíduos que se encontram sem referência e/ ou, situação de 
ameaça (BRASIL, 2004, p.32)7. 
 
7
 No segundo capítulo serão abordados mais alguns pontos sobre a PNAS e sua relação com a população em 
situação de rua. 
 28 
O I Censo e Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua foi realizado 
pelo Instituto Meta e abrangeu 71 cidades brasileiras8, sendo que 48 eram municípios com 
mais de 300 mil habitantes e 23 capitais, independente do seu porte populacional. Vale 
ressaltar que São Paulo, Recife, Belo Horizonte e Porto Alegre não entraram na pesquisa, pois 
já haviam feito ou já estavam fazendo pesquisas semelhantes. 
Nessa pesquisa foram identificados 32.922 adultos9 em situação de rua nas 71 cidades 
brasileiras. Para tanto, foram visitados na pesquisa, albergues, abrigos e casas de passagem ou 
de apoio, além de outras instituições que recebem a população em situação de rua, como 
hospitais, clínicas e casas de convivência. Também foram consideradas na pesquisa aquelas 
pessoas que têm casa própria, alugada ou de parentes no interior ou em local afastado do 
centro da cidade e que por motivos de trabalho dormem nas ruas uma ou mais vezes na 
semana. Por outro lado, não foram consideradas na pesquisa, pessoas que ocupam prédios 
abandonados há mais de cinco anos, com características de razoável estrutura (divisórias de 
alvenaria, uso de luz elétrica, equipamentos domésticos, etc.). Foram também desconsideradas 
as pessoas moradoras de favelas; os chamados “programas de aluguel social” e os 
beneficiários do “programa de pensão social” (VEIGA; QUIROGA; PEREIRA, 2010, p. 19-
20). 
O “programa de aluguel social” é regulamentado pela Lei n. 10.365 de 2 de setembro 
de 1999, que autoriza o Estado de São Paulo a implantar o Programa de Locação Social, 
destinado a promover moradias para a população de baixa renda. 
O perfil encontrado na população, que deu base para a Pesquisa, entre outras 
características, foi: 82% do total dos entrevistados são do sexo masculino; 53% possuem entre 
25 e 44 anos; 39,1% se declararam pardas, 29,5% brancas e 27,9% pretas; a maioria (52,6%) 
recebe entre R$ 20,00 e R$ 80,00 semanais, mostrando que os níveis de renda são muito 
baixos. 
Com relação à formação escolar 74% dos entrevistados sabem ler e escrever, 17,1% 
não sabem escrever e 8,3% apenas assina o próprio nome; a imensa maioria não estuda 
atualmente (95%). Dentre os principais motivos que levam estas pessoas a passarem a viver e 
morar nas ruas 35,5% se refere aos problemas de álcool e/ ou drogas; 29,8% devido ao 
desemprego; 29,1% por causa de desavenças com familiares e 71% dos entrevistados citaram 
 
8
 Anexo B: Tabela dos 71 municípios englobados no I Censo e Pesquisa Nacional sobre a População em 
Situação de Rua. 
9
 O número absoluto desta população nas referidas cidades foi calculado com base em pessoas com 18 anos 
completos ou mais e de ambos os sexos. As crianças em situação de rua somente foram contadas quando o 
adulto entrevistado declarou ser responsável por alguma criança ou adolescente na rua ou em alguma 
instituição. 
 29 
pelo menos um destes motivos (que também podem estar correlacionados entre si). Dos 
entrevistados 45,8% sempre viveram no município em que moram atualmente; 56% vieram de 
municípios do mesmo Estado em que estão; 72% vieram de áreas urbanas. Tal fato mostra 
que a grande maioria da população em situação de rua é originária do mesmo local de onde se 
encontra, ou de locais próximos, não sendo somente do deslocamento ou da migração campo/ 
cidade (fenômeno predominante no início do século XX). Estão a mais de dois anos dormindo 
nas ruas ou em albergues 48,4% dos entrevistados. Em se tratando dos vínculos familiares 
51,9% dos entrevistados possuem algum parente morando na cidade em que se encontram; 
38,9% não mantêm contato com esses parentes; 14,5% mantêm um contato de forma 
esporádica. Dos entrevistados 70,9% exercem alguma atividade remunerada, sendo que 
27,5% trabalham na coleta e venda de matérias recicláveis. A pesquisa também aponta que 
54% desta população já foi vítima de discriminação e impedimento de entrada em locais 
públicos, comércio, shopping centers, bem como de utilização da rede de saúde e de 
transporte coletivos, entro outros. 
 Dentre os entrevistados 28,4% não possuem quaisquer documentos de identificação, o 
que mostra que é difícil o acesso da população em situação de rua a muitas políticas públicas 
e sociais, pois existe uma série de exigências formais que impedem este acesso, como, por 
exemplo, a apresentação de documentos de identificação pessoal e endereço domiciliar 
(mesmo que ainda haja casos em que essas pessoas consigam benefícios do governo dando o 
endereço de albergues ou pensões). São poucas as pessoas na condição de rua que possuem 
tais documentos, e mesmo quando os possuem não têm como comprovar residência, pois que 
fazem das ruas suas casas. A grande maioria desta população não é atingida pela cobertura 
dos programas governamentais: 85% afirmam não receber qualquer benefício dos órgãos 
governamentais. Entre os benefícios recebidos, destacam-se: 3,2% aposentadoria; 2,3% Bolsa 
Família e 1,3% o Benefício de Prestação Continuada (BPC). 
Vale ainda ressaltar, entre muitos outros resultados do I Censo e Pesquisa Nacional 
sobre a População de rua (2010), que 95,5% da população em situação de rua entrevistada não 
participam de qualquer movimento social ou atividade de associativismo. Apenas 2,9% 
confirmam sua participação em algum movimento social ou alguma forma de associativismo. 
61,6% não exercem o direito de cidadania elementar que é o voto para a escolha dos 
representantes parlamentares e dos executivos governamentais, uma vez que não possuem 
título de eleitor. 
Um ponto que também deve ser destacado, é que a pesquisa indicou que os albergues, 
que tradicionalmente ocupam posição destacada nas políticas públicas para essa população, 
 30 
apresentam significativo déficit de vagas, o que potencializa a procura das ruas, calçadas, 
viadutos como espaço de pernoite. Outros aspectosrelacionados aos albergues, apontados 
pela população em situação de rua destes 71 municípios brasileiros: 43,3% alegam falta de 
liberdade nos albergues, e 27,1% o seu horário de funcionamento (SANTOS, 2010, p. 140). 
Estes dados revelam a necessidade de repensar a gestão administrativa destes equipamentos. 
Comparando os dados citados anteriormente com aqueles utilizados por Silva (2009) 
constata-se que o sexo masculino é predominante neste segmento populacional; a atual 
população em situação de rua se encontra em idade economicamente ativa; grande parte desta 
população sabe ler e escrever e é crescente o número de pessoas do próprio Estado, quando 
não, da própria capital. 
Percebe-se também que é crescente o tempo de permanência nas ruas, além do alto 
índice de fragilidade dos laços familiares; grande parte desta população possui alguma 
atividade de remuneração, ganhando destaque a catação e reciclagem de materiais. 
É válido ainda mencionar que no início de 2009 até abril de 2010 (SCHOR; VIEIRA, 
2010a) houve um recenseamento10 da População em Situação de Rua na cidade de São Paulo, 
pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), em parceria com a Faculdade de 
Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEAC-USP), 
obtendo um resultado de 6.587 moradores de rua e 7.079 em situação de acolhida, somando 
um total de 13.666 pessoas. Para obter tal resultado o município de São Paulo foi divido em 9 
distritos, correspondendo sua área total. Não foram recenseados os distritos de Anhanguera, 
Grajaú, Iguatemi, Jardim Ângela, Marsilac e Pedreira, por não terem sido encontradas para 
estas áreas, informações ou indícios de presença de pessoas em situação de rua. As equipes da 
FIPE que realizaram a pesquisa contaram com o apoio de alguns técnicos e do Movimento 
Nacional da População de Rua, para a abordagem das pessoas nas ruas, para a identificação 
dos pontos de presença, facilitando algumas vezes a aproximação dos pesquisadores. 
No entanto, apenas 24% do total desta população conhecem o MNPR, sendo que 
apenas 9% participam das atividades realizadas pelo Movimento em questão. 
Francisco11 (sujeito entrevistado da pesquisa) – 43 anos de idade, nascido em Itu, 
interior de São Paulo, e há 18 anos em situação de rua, ao ser questionado sobre sua 
participação no MNPR, fala que: 
 
 
 
10
 A população amostrada foi definida como “moradores de rua, homens e mulheres, com mais de 17 anos, 
capazes de responder às questões as eles dirigidas”. Ver mais em Schor e Vieira (2010). 
11
 Os nomes usados para a identificação dos sujeitos são fictícios, apenas como forma de indentificá-los. 
 31 
Se eu conheço o Movimento? Não conheço! Já ouvi falar muito do Movimento, 
mas isso precisa estar divulgando melhor. Tendo mais marketing pra isso né?! 
Porque isso tem que mudar na maneira de ser apresentado. Começar divulgando 
mais, ou seja, como tem delegacia, como tem posto de saúde... se perguntarem 
“Você conhece um posto de saúde, você conhece a Santa Casa?” “Conheço!” 
“Você conhece a UBS – Unidade Básica de Saúde?” “Conheço!”, porque é muito 
divulgado. Então hoje o Movimento de rua ele precisa sair do papel! Que não saiu 
do papel né?! 
 
 
Foram também entrevistadas duas pessoas que estão em situação de rua atualmente: 
Beatriz – uma adolescente de apenas 17 anos, em situação de rua há aproximadamente um 
ano, e oriunda da cidade de São Paulo; e João – senhor, há oito anos em situação de rua e 
originário de Curitiba (PR), ambos disseram nunca terem ouvido falar do MNPR. 
Nas palavras de Luiz representante do MNPR de São Paulo, este fato, entre outros 
motivos, pode ser explicado pelo receio que estas pessoas possuem de serem punidas pelo fato 
de fazerem parte de um Movimento Social: 
 
 
Quando a gente faz um simples ato, a gente tem a resposta dessa população. É pelo 
silêncio, mas é presente entendeu? Sempre aquele desejo, a gente sabe porque as 
pessoas elas não vem. É por medo, por causa dessa relação: se ela ta no albergue, 
ela vai ser desligada, se ela ta na rua ela é chutada e abarrotada daquele espaço, e 
chega no trabalho ela não tem uma referência de endereço né. 
 
 
Sobre a relação entre o Serviço Social, Luiz fala que: 
 
 
[...] há algum tempo o Serviço Social, não digo diretamente, com o movimento, 
com essa população, específica né, era arredio né, era distante [...]. Então eu falo do 
serviço de assistência social a partir da prefeitura, qualquer pesquisa vai demonstrar 
que o que está no papel, o que eles tentam fazer, diz que é efetivo, diz que colhe 
resultado, é pura demagogia [...]. 
 
 
Fazendo uma ligação com essa fala, na entrevista realizada com Carlos (jornalista e 
parceiro do MNPR), quando questionado se, para ele, o “possível” assistencialismo que 
poderia existir em muitos equipamentos e instituições em São Paulo, poderia ser uma forma 
de reprimir, quando não, impedir que a divulgação do MNPR tomasse proporções maiores, 
ele responde: 
 
 
 
 
 
 
 32 
Eu acho que em algum momento a assistência é super importante, é um direito. 
Hoje ela é um direito da pessoa, ela não é mais aquela coisa caridosa, que as 
Igrejas, elas não tinham outra possibilidade, e tiveram que fazer, e fizeram muito 
bem. A gente também não pode hoje criticar essa parte, porque ela era a única 
esperança do povo, era como se alguém movido por algum sentimento religioso o 
ajudasse. Claro que isso mudou, está mudando, acho que ainda é um processo 
longo, ainda vamos ter muita discussão para a gente ter consciência que a questão 
da pobreza é uma questão social, um problema econômico e precisa ser 
transformado em políticas públicas, políticas do Estado, mudar o sistema e tudo 
mais. [...] quando a gente fala que tem que mudar a concentração de renda que está 
acelerada, se você olhar os números a gente se assusta, 48% da riqueza brasileira 
está com 10% da população brasileira. É um absurdo essa população. E está 
aumentando. 
 
 
 E ainda completa: 
 
 
Então a questão da Assistência, a gente está vendo ela como um mal necessário. 
Algumas situações de miserabilidade, que só você dando a comida, dando cobertor, 
você dando acolhida, você conseguir que a pessoa não morra. É uma emergência. A 
assistência para mim está muito ligada à questão da emergência. 
 
 
Sobre essa questão, de como ocorre (ou se ocorre) o vínculo entre os assistentes 
sociais junto ao MNPR, Rosa (assistente social), conclui que: 
 
 
[...] as organizações que atendem a população de rua, muitas delas não participam 
da Política Nacional. Então elas simplesmente vão lá fecham um convênio para 
atender, elas vão e fazem seu trabalho. Atendem as pessoas, dá café da manhã, 
almoço, acolhida. Não to dizendo que não fazem bem, mas elas simplesmente 
atendem, não estão muito preocupadas na questão política né! Não participaram da 
construção da Política Nacional da População de Rua. [...] então, existe ainda uma 
barreira muito grande entre o Movimento e algumas organizações. Normalmente, 
quem participa é as mesmas organizações que participa do Movimento. Então ai 
fica um grande número de pessoas em situação de rua que acaba não tendo acesso 
ao Movimento. 
 
 
Por fim, pode-se dizer que a população em situação de rua vivencia o processo de 
exclusão existente na sociedade, mencionado inclusive na Política Nacional de Assistência 
Social (PNAS). Este é um conceito que na matriz teórica metodológica desse trabalho é de 
difícil problematização, uma vez que a forma de organização da atual sociedade gera 
diferentes acessos à riqueza socialmente produzida. A discussão da exclusão na PNAS inclui 
o não acesso à riqueza socialmente constituída, e outras situações que vulnerabiliza ainda 
mais o ser humano, como,por exemplo, a situação se rua. Ora, já foi mencionado que tal 
população possui como uma de suas características a pobreza extrema, o que não remete, no 
entanto, à questão da exclusão, uma vez que a exclusão para além da pobreza, nas palavras de 
 33 
Sposati (1999) “[...] supõe também preconceito e discriminação como processos éticos e 
culturais. [...] A exclusão é um processo que soma várias situações em graus diversos na 
escala entre exclusão-inclusão social.” (SPOSATI, 1999, p. 66-67). 
Ainda segundo a autora: 
 
 
O morador de rua acaba na situação de exclusão por uma série de perdas: o 
emprego, a auto-estima e o rompimento ou a fragilidade das relações familiares. Os 
olhos discriminadores e preconceituosos vêem o morador de rua com repulsa, como 
estorvo ou como marginal/ bandido, sem levar em conta o seu passado: nas ruas da 
cidade de São Paulo, a maioria já teve carteira assinada e é alfabetizada. 
(SPOSATI, 1999, p. 66). 
 
 
 A exclusão social ser torna, pois, multidimensional, indo além da causas econômicas e 
individuais, possuindo razões de convívio, fazendo com que pessoas e grupos sejam 
rejeitados, apartados. Dessa forma, a autora ainda afirma que a “[...] exclusão social aponta 
para as insuficiências e as falhas de serviços e das políticas voltadas para várias necessidades 
[...]”, e cita uma vivência de privação, inclusive com violência, fato este sempre presente na 
vida das pessoas que vivem nas ruas. (SPOSATI, 1999, p. 67). 
 
1.4 O surgimento do MNPR e sua atuação em São Paulo: seus princípios, objetivos e 
parcerias 
 
 Sou movimento da 
população de rua 
 
Levantamos a bandeira da esperança 
Azul celeste, esta é a nossa lança 
Ouro vasado abandonado pelas praças 
Se levantando pelas ruas das cidades 
Nossas pegadas, rastros da bandeira branca 
são nossa marca ao transitar por qualquer via 
A liberdade, a nossa maior conquista 
Sou movimento da população de rua. 
Maciel Silva 
 
O Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) é um movimento social 
composto por pessoas que vivem ou viveram em situação de rua (sendo este inclusive um dos 
critérios para se fazer parte do Movimento) e que se põem em movimento pela conquista de 
direitos que a elas são negados. O Movimento surgiu depois de um episódio lamentável que 
ficou conhecido como “Chacina da Sé” em 19 de agosto de 2004, no qual sete moradores de 
 34 
rua foram assassinados, sendo que os responsáveis por essa tragédia até hoje não foram a 
julgamento. 
Após a chacina, os grupos e as pessoas que desenvolviam trabalhos com a população 
em situação de rua mobilizaram algumas lideranças desta própria população, no sentido de 
cobrar ações concretas das autoridades, com alternativas para as pessoas que se encontram 
nessa situação. O Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), já 
promovia pela quarta vez, o “Festival do Lixo e Cidadania”, cuja proposta é dar visibilidade 
ao trabalho dos catadores. As organizações junto com pessoas de trajetória de rua 
aproveitaram o evento e convidaram moradores de rua de outras cidades para participarem do 
encontro. Tal iniciativa provocou o desejo entre a população em situação de rua de se 
organizar, surgindo como consequência o MNPR. 
Com o fim do Festival em 2004, e com o Movimento recém-formado, foi marcada 
uma reunião com as lideranças de São Paulo e Belo Horizonte, na qual foram acordadas as 
primeiras diretrizes. 
O MNPR é composto hoje por representantes de alguns Estados brasileiros, dentro das 
capitais de Belo Horizonte, São Paulo, Fortaleza, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Salvador. Os 
princípios adotados pelo Movimento giram em torno da “democracia direta, ação direta, ser 
apartidário, apoio mútuo interno, solidariedade com as causas sociais, não violência, 
honestidade e transparência, compromisso pessoal, igualdade, justiça e controle social”. 
Como principais objetivos do MNPR, destacam-se, o resgate da cidadania, a reinserção no 
mercado de trabalho, habitação, entre outras. Para poder concretizar tais objetivos o MNPR 
busca através de discussões de propostas de políticas públicas junto às organizações sociais e 
ao poder público, sem contar com a fiscalização e controle social das políticas que já estão em 
vigor. Em entrevista com um dos sujeitos da pesquisa, representante do MNPR de São Paulo, 
Luiz, em se tratando dos objetivos do Movimento: 
 
 
[...] o grande objetivo seria a luta por implantação de políticas públicas né?! E ter, 
como todo cidadão deveria ter, respeito e um tratamento adequado, não só pelo 
Serviço Social... O Serviço Social distribui tarefas também com outras secretariais 
com outros ministérios né! 
 
 
 
 
 
 
 
 35 
No que se refere às intenções do Movimento Luiz afirma ainda: 
 
[...] a gente não quer mostrar a população sendo agredida, sendo violentada, a gente 
quer mostrar a realidade, a partir do que a gente puder conquistar. E a gente fala 
agente, porque o Movimento para gente é esse trabalhador, é essas pessoas que ta 
na rua, mas também é o acadêmico, o profissional de serviço de saúde, o 
profissional de serviço do trabalho, enfim e ter essa sensibilização, a gente quer a 
proteção da pessoa humana mesmo. 
 
 
Baseado em um Regimento Interno12, o MNPR está estruturado da seguinte forma: é 
composto por homens e mulheres adultas que vivem ou viveram nas ruas; para se filiar ao 
Movimento é assinado um termo de filiação; e as bandeiras de luta é que dão norte às 
discussões realizadas pelo Movimento. 
Com relação à organização do MNPR, Luiz ainda cita: 
 
 
[...] para nós é muito difícil a gente está se organizando. O Movimento prima de 
não ter uma organização de CNPJ ou coisas do gênero para que a gente também 
não perca essa identidade, principalmente essa população né, que ta disposta a tudo 
né! No sentido tudo de exclusão, de se negar ao que é ruim, e ruim é deixar de 
pensar em conquistar esses espaços. 
 
 
O Movimento foi então conquistando seu espaço, e em 2005 foi realizado em Brasília, 
o I Encontro Nacional sobre a População em Situação de Rua, que levantou discussões acerca 
desta população. Fato este, que possibilitou à população em situação de rua adentrar em um 
espaço governamental. E como afirma Iamamoto (2007, p. 142) “[...] ao alcançarem à cena 
pública, os interesses das maiorias adquirem visibilidade, tornando-se passíveis de serem 
considerados e negociados no âmbito das decisões políticas.” 
Dessa forma, a visibilidade pode ser considerada uma grande conquista do 
Movimento, e como afirma Luiz: 
 
 
Quando a gente pensa numa grande conquista, é que a gente conseguiu dar essa 
visibilidade né. A gente hoje, esse Movimento chega em qualquer Estado, ele é 
solicitado para falar. [...] A população de rua não tinha espaço de fala, não tinha 
espaço de manifestação. [...] E hoje a gente vê, como por exemplo, tem muita 
dificuldade desses companheiros em “olha vamos se organizar, vamos para a rua 
fazer um ato”, mas a gente consegue dar essa visibilidade, conseguir das pessoas 
que elas digam: “olha eu tô em situação de rua” né. [...] Então quando ele fala, ele 
tem um espaço de pensar, de se organizar e aí ele consegue dar um norte assim para 
gente a partir do sentimento do ser humano. 
 
 
 
12
 Anexo C. 
 36 
Posteriormente, em 25 de outubro de 2006, após estudos e análises feitas tanto pelo 
governo, quanto pela sociedade civil organizada, foi assinado pelo então Presidente da 
República, Sr. Luis Inácio Lula da Silva, o decreto de 25 de outubro de 2006, criando o Grupo 
de Trabalho Interministerial (GTI), formados por representantes de seis Ministérios: do 
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Saúde, do Trabalho,

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