Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Curso de Tecnólogo em Radiologia Artigo de Revisão REJEITOS RADIOATIVOS HOSPITALARES: ARMAZENAGEM E SEGURANÇA DE APARELHOS DE RADIOTERAPIA RADIOACTIVE WASTE HOSPITAL: STORAGE AND RADIATION SAFETY DEVICES Mirelly Gonçalves de Souza, Charlene Rodrigues Sousa Santos 1 ; Thalita Lauanna Gonçalves da Silva Ferreira 2 1 Alunas do Curso de Tecnólogo em Radiologia 2 Professora Especialista, do Curso de Tecnólogo em Radiologia Resumo Hospitais e clínicas utilizam equipamentos que podem gerar rejeitos radioativos, ou seja, material com teor de radionuclídeos impróprio para o meio ambiente e nocivo à saúde pública. O objetivo geral deste estudo é analisar as consequências que o manuseio e descarte incorreto do material hospitalar que contenha elementos radioativos podem trazer para a vida das pessoas. Os objetivos específicos são: apresentar as formas corretas de armazenamento e estabelecer os limites de ação dos órgãos fiscalizadores sobre os produtores de rejeitos radioativos. A metodologia consiste em uma revisão bibliográfica exploratória, com busca de textos baseada nos descritores “Rejeitos radioativos”, “Armazenagem”, “Descarte” e “Legislação sobre rejeitos radioativos”. Os critérios de inclusão foram: publicação entre 2004 e 2015, completos e em língua portuguesa. Foram utilizados artigos e textos informativos, além de documentos que, no caso, estão isentos do período de publicação, pois são normas ainda em vigor no Brasil. Após o estudo dos textos e dos documentos concluiu-se que o descarte e a armazenagem de rejeitos radioativos no Brasil conta com legislação bastante avançada, mas que, na prática, a fiscalização sobre os hospitais e clínicas que produzem os rejeitos não é tão eficiente. Assim, não adianta ter depósitos finais seguros se a segurança na origem não é adequada, podendo trazer riscos, principalmente para as pessoas que lidam com o material radioativo. Palavras chave: Lixo hospitalar; Rejeitos radioativos; Armazenagem; Órgãos fiscalizadores; Segurança. Abstract Hospitals and clinics use equipment that can generate radioactive waste, ie, material with inappropriate content of radionuclides to the environment and harmful to public health. The aim of this study is to analyze the consequences that the handling and incorrect disposal of hospital materials containing radioactive elements can bring to people's lives. The specific objectives are: to present the correct ways of storing and establish the limits of action of regulatory agencies on producers of radioactive waste. The methodology consists of an exploratory literature review, with search texts based on the keywords "Radioactive Waste", "Storage", "Disposal" and "Legislation on radioactive waste". Inclusion criteria were published between 2004 and 2015, complete and in Portuguese. We used articles and informational texts, plus documents in the case, they are exempt from the publication period, as standards are still in force in Brazil. After studying the texts and documents concluded that the disposal and storage of radioactive wastes in Brazil has very advanced legislation but, in practice, the control over the hospitals and clinics that produce tailings isn’t so efficient. So no use having safe final repositories whether security at the source isn’t adequate and may pose risks, especially for people who deal with radioactive material. Keywords: Medical waste; Radioactive waste; storage; Regulatory agencies; Security. Contato: mirellygs@hotmail.com; sharlene-rodrigues@hotmail.com; thalitalauanna@gmail.com. Introdução Rejeito radioativo é "qualquer material resultante das atividades humanas, que contenha radionuclídeos em quantidades superiores aos limites de isenção especificados na norma CNEN- NE-6.02, e para o qual a utilização é imprópria ou imprevista". Se esse material não for recolhido, tratado e armazenado adequadamente pode acontecer acidentes, como o que envolveu o manuseio de césio 137 por centenas de pessoas, em Goiânia, no ano de 1987 (IEN, 2012). A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) recebe e armazena, em seus Institutos, fontes radioativas em desuso, provenientes de locais como hospitais, clínicas radiológicas, centros de pesquisa e indústrias. Esses materiais são transportados de acordo com normas especiais, tratados e armazenados conforme padrões internacionais de segurança, recomendados pela Agência Internacional de Energia Atômica (IRD, 2012). Contudo, clínicas e hospitais não seguem corretamente as normas destinadas ao manuseio, descarte e armazenamento provisório, interno e externo, do material radioativo fora de uso, fazendo com que as pessoas e o meio ambiente corram risco de adquirirem doenças e de contaminação, respectivamente. A fiscalização, que deveria ser rígida, por parte da CNEN, 2 parece não estar sendo adequada (OLIVEIRA; CARVALHO, 2010). Assim, o objetivo geral deste estudo é analisar as consequências que o manuseio e descarte incorreto do material hospitalar que contenha elementos radioativos podem trazer para a vida das pessoas, bem como as formas corretas de armazenamento desses materiais e a ação dos órgãos fiscalizadores, no sentido de promover o descarte correto, evitando os riscos provocados pela radiação ionizante. Metodologia O presente artigo constitui uma revisão bibliográfica, desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. Trata-se, portanto, de um estudo exploratório, no sentido de aprofundar os conhecimentos a respeito de um determinado tema. A busca de textos para a revisão bibliográfica foi feita em bibliotecas virtuais, a partir dos descritores “Rejeitos radioativos”, “Armazenagem”, “Descarte” e “Legislação sobre rejeitos radioativos”. Foram incluídos textos publicados 2004 e 2015, completos e em língua portuguesa. Foram excluídos os textos anteriores a esse período, incompletos e em idiomas diversos da língua portuguesa. Como o tema envolve menção a um caso histórico, o acidente com o Césio 137, em Goiânia, também foi utilizado material jornalístico, bem como documentos oficiais que estão isentos do período de publicação, visto que são normas que ainda estão em vigor no Brasil. Este estudo obedece as normas do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa (NIP), da Faculdade ICESP/PROMOVE. Revisão da Literatura Para que se possa entender melhor o assunto abordado é preciso compreender alguns conceitos. Dentre eles está a diferença entre irradiação e radiação. A irradiação é a exposição de um objeto ou um corpo à radiação, o que ocorre à distância, sem necessidade de contato, ou seja, irradiar não quer dizer contaminar. A contaminação pode ser ou não caracterizada pela presença indesejável de um material em local onde não deveria estar. No caso de materiais radioativos, a contaminação gera irradiações (CARDOSO et al., 2005). Por outro lado, a radiação é o fenômeno pelo qual a energia, na forma de ondas eletromagnéticas, se desloca através do espaço, na forma de raios. A radiação só é considerada ionizante, danificando o DNA das células, quando qualquer partícula ou radiação consegue interagir com a matéria e arrancar elétrons dos átomos ou moléculas, transformando-os em íons (PALHETA, 2005). Quando juntamos prótons e nêutrons, apenas algumas combinações apresentarão Núcleos Estáveis. Nas outras combinações o núcleo possuirá um excesso de energia, apresentando então um Núcleo Instável. Este núcleo tentará retornar ao seu estado de estabilidade liberando a energia excedente em forma de partículas de ondas eletromagnéticas. Os núcleos instáveis são radioativos ou radionuclídeos (OKUNO,2013). Os radionuclídeos estão presentes na vida desde os primórdios da formação da Terra, há 4,8 bilhões de anos. Essa interação tem sido contínua, por meio de reações cósmicas, dos radionuclídeos presentes no solo, nos alimentos, água e ar consumido pelos seres vivos. Os elementos aos quais esses seres estão expostos podem levar muito tempo para se tornarem estáveis e parar de emitir radiação, a chamada meia vida e, enquanto isso, ambiente e seres vivos podem ser contaminados por suas irradiações (MAZZILLI; MÁDUAR; CAMPOS, 2011). Tipos de rejeitos A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) classifica os resíduos gerados pelos serviços hospitalares em cinco grupos. O grupo A é representado por material potencialmente contaminante, com resíduos biológicos; o grupo B é representado por resíduos químicos; o grupo C é composto por rejeitos radioativos, contaminados com radionuclídeos; no grupo D estão os resíduos comuns, que não necessitam de tratamento especial; e no grupo E são considerados os resíduos perfurocortantes, como objetos e instrumentos que podem causar acidentes e contaminação (OLIVEIRA NETO; SHIBAO, 2013). A quantidade de radionuclídeos que podem estar contidos nos rejeitos do grupo C é estabelecida pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Esses rejeitos provêm de laboratórios de análises clínicas, radioterapia e Medicina Nuclear e não podem ser reutilizados em nenhuma hipótese. Precisam receber tratamento prévio antes de serem armazenados, tanto de forma temporária, quanto definitiva e não podem ser manuseados sem a obediência às normas de segurança (BRASIL, 2006). Quanto aos riscos que oferecem, os resíduos hospitalares podem ser classificados em três classes. Na classe 1 estão os rejeitos perigosos, devido à inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade e patogenicidade; na classe 2 estão os resíduos não inertes, por seu potencial combustível, biodegradável ou solubilidade em água; e na classe 3 estão os resíduos inertes, que não se 3 decompõem ou não se degradam em contato com o solo. No caso da classe 1, o gerador do resíduo é responsável pelo seu armazenamento e descarte correto (JESUS; SANTOS, 2009). Tipos de armazenamento O armazenamento de rejeitos radioativos constitui uma atividade de gerenciamento, que pode ser definida como: Conjunto de atividades administrativas e técnicas, envolvidas na coleta, segregação, manuseio, tratamento, acondicionamento, transporte, armazenamento, controle, eliminação e deposição de rejeitos radioativos (XAVIER, 2012, p. 12). Os princípios desse gerenciamento são garantir a proteção da saúde humana, do meio ambiente, consideração da expansão dos efeitos para a saúde humana além das fronteiras nacionais, previsão de impactos futuros menores ou iguais aos atuais, estabelecimento de responsabilidades regulatórias, geração cada vez menor de rejeitos, interdependência entre as etapas da gerência e segurança das instalações (XAVIER, 2012). Visando o cumprimento desses princípios, a CNEN estabeleceu três tipos de instalações para armazenagem de rejeitos radioativos. A armazenagem é a estocagem não definitiva dos rejeitos, enquanto aguardam a disposição final. Os depósitos iniciais de rejeitos radioativos são de responsabilidade do titular da licença de operação da instalação que os tenha gerado e se localizam no seu espaço; e os depósitos intermediários e finais são de responsabilidade da CNEN, sendo gerenciados por institutos a ela ligados, como se mostra nas figuras 1, 2 e 3 (PEREIRA, 2005). Figura 1 – Depósito inicial (lixeira blindada) Fonte - GRX, 2015 Nos depósitos iniciais, a responsabilidade pelo planejamento, execução e administração cabe àquele que gerou o rejeito radiativo, que também se responsabiliza por qualquer dano ao meio ambiente ou pessoas. Nos depósitos intermediários e finais, os usuários pagam taxas para a CNEN, das quais 10% são repassados ao município onde se localiza o depósito. Conforme a meia vida do rejeito depositado esse tempo de pagamento pode chegar até 300 anos (BRASIL, 2003). Figura 2 – Depósito intermediário, no IEN Fonte – IEN, 2012 Figura 3 – Depósito final dos rejeitos do Césio 137, em Goiás Fonte – TARDIO; BERNSTEIN, 2013 O ambiente hospitalar geralmente possui equipamentos com fontes radioativas seladas, cujo tempo de uso depende da meia vida do radionuclídeos nela contidos. Quando estiver fora de uso, de acordo com as instruções do fabricante, a CNEN deve ser notificada, pois há uma documentação a ser preenchida, para que depois o recolhimento seja feito (BORGES; MARQUES, 2012). Essa comunicação não ocorreu em relação ao equipamento de radioterapia abandonado em uma clínica, em Goiânia e que motivou o acidente com o césio 137. Quando o procedimento é feito corretamente, a fonte é encaminhada à CNEN, que a repassa ao IEN, para armazenamento. O aparelho não é aberto de qualquer maneira, como ocorreu em Goiânia, em que ele foi aberto a marretadas e seu conteúdo, o césio 137, foi manuseado livremente pelas pessoas, inclusive contaminando a alimentação (IPEN, 2002). Etapas de armazenamento Antes de serem liberados para o meio ambiente ou para armazenamento os rejeitos radioativos precisam receber tratamento 4 adequado. A liberação ambiental só ocorre quando o nível de radioatividade é equivalente ao da natureza e não há toxidez química. Rejeitos hospitalares como luvas, aventais, sapatilhas contaminadas são colocados em sacos plásticos, tambores ou caixas de aço, após separação e identificação, pois são considerados de baixa atividade (CNEN, 2014). A armazenagem inicial deve ser feita no próprio ambiente do hospital, com acondicionamento nos recipientes adequados, identificação e vedação. O ambiente de armazenagem deve possuir sistemas de ventilação, exaustão e filtragem. Esse material tem um tempo de decaimento da radioatividade: Cada elemento radioativo, seja natural ou obtido artificialmente, se transmuta (se desintegra ou decai) a uma velocidade que lhe é característica. Para se acompanhar a duração (ou a vida) de um elemento radioativo foi preciso estabelecer um parâmetro, dado pelo tempo que leva para um elemento radioativo ter sua atividade reduzida à metade da atividade inicial. Esse tempo foi denominado meia vida do elemento. Exemplo: U-238 sofre decaimento até se transformar em Pb-206, num tempo de 4,5 bilhões de anos(MÖLLER, 2010, p. 2). O lixo hospitalar, seja líquido, sólido ou gasoso, de natureza comum, não envolvendo equipamentos, tem meia vida considerada em 53 dias e a partir daí pode ser descartado no lixo comum. Contudo, os aparelhos que contenham radioisótopos e que não estejam mais em funcionamento devem ser encaminhados à CNEN, para a destinação correta e armazenamento, no IEN, nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais ou São Paulo (ALMEIDA JÚNIOR; MARTINS; SOUZA, 2007). No ambiente produtor do rejeito radioativo a sequência de armazenagem é a seguinte (CNEN, 2014): a. Seleção dos recipientes ou embalagens apropriados para cada tipo de rejeito; b. Identificação, conforme o radioisótopo, colocando o símbolo internacional da radiação; c. Fechamento, selagem e etiquetamento das embalagens quando estiverem com dois terços de sua capacidade; d. Transferência para o local de armazenagem, que deve ser blindado; e. Medição da taxa de contaminação que pode chegar às proximidades; f. Cálculo do tempo de decaimento dos radioisótopos presentes no material, considerando-se a meia vida de cada elemento radioativo; g. Decorrido esse tempo, nova medição daradioatividade do rejeito e, se estiver apto para eliminação, remoção dos sinais de indicação de atividade radioativa e dando-lhe o destino comum do lixo gerado pelo hospital. Figura 4 - Lixo hospitalar acondicionado Fonte - FRAGMAQ, 2013 Se o nível de radiatividade ainda for alto o material deve ficar armazenado por mais tempo. Material com resíduos biológicos e químicos devem receber o tratamento apropriado, antes de ser eliminado no meio ambiente e materiais ou equipamentos que forem ser reutilizados pela unidade hospitalar devem ser descontaminados, de forma a reduzir ao máximo os rejeitos radioativos que possam ter (CNEN, 2014). Descarte Os rejeitos sólidos até 10 6 Bq/kg 1 podem ser eliminados no lixo urbano, seguidas as medidas gerais de limites máximos de contaminação em áreas livres, estabelecidas pela CNEN (CNEN, 2014). Rejeitos sólidos são descartados em frascos de vidro, colocados em caixas de material perfurocortantes e etiquetados conforme o radioisótopo presente. As seringas também devem ser colocadas no mesmo tipo de caixa. Sacos brancos (Figura 4) deverão ser utilizados para tubos de plástico, eppendorf e pipetas, dentre outros materiais plásticos (GUIMARÃES, 2010). Para eliminação na rede de esgotos, os rejeitos líquidos devem estar solúveis ou serem de fácil dispersão em água, considerando-se o valor máximo conforme o radioisótopo contido no material e não excedendo 9,3 Bq/m 3 anualmente. Os rejeitos gasosos não podem exceder 5,6x10 3 Bq/m3 (CNEN, 2014). Soluções cintiladoras devem ser coletadas em bombonas, devidamente identificadas. Todo o material deve ser despachado pelo hospital bimestralmente para o depósito radioativo e transportado em carrinho protegido ou recipiente plástico (GUIMARÃES, 2010). 1 Bequerel por grama. 5 Órgãos fiscalizadores Os órgãos fiscalizadores do descarte de resíduos hospitalares são a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). A fiscalização da ANVISA é feita por meio da RDC n. 306, de 7dedezembro de 2004, com o objetivo de preservar a saúde pública e a qualidade do meio ambiente. Recomenda ao gerador o gerenciamento dos resíduos perigosos, para evitar acidentes ocupacionais e trazer benefícios para a saúde pública, por meio de técnicas adequadas de manejo, desde o acondicionamento até a disposição final (ANVISA, 2004). O CONAMA fiscaliza a geração de resíduos pelos serviços de saúde por meio da Resolução n. 358, de 29 de abril de 2005, a qual lembra que ações preventivas custam menos do que ações corretivas. O órgão fiscaliza todos os rejeitos produzidos pelas unidades hospitalares, com exceção das fontes radioativas seladas, que devem ser encaminhadas à CNEN (CONAMA, 2005). Assim, a fiscalização de resíduos radioativos, como no caso das fontes seladas, é feita pela CNEN, por meio da Resolução n. 167, de 30 de abril de 2014, que aprovou a Norma CNEN NN 8.01 Gerência de Rejeitos Radioativos de Baixo e Médio Níveis de Radiação, que estabelece os critérios gerais e requisitos básicos para o gerenciamento desse tipo de material. A norma classifica os rejeitos conforme o estado físico, natureza da radiação, concentração e taxa de exposição dos radionuclídeos, explanando sobre as formas corretas de armazenamento e descarte, bem como sobre as responsabilidades do órgão gerador e as suas, como órgão fiscalizador e receptor de rejeitos radioativos (CNEN, 2014). Essa fiscalização não é feita de forma individual, por cada órgão, mas em conjunto, com apoio dos organismos municipais, estaduais e federais. A maior responsabilidade pelos rejeitos radioativos é da CNEN, mas os demais órgãos atuam como co-fiscalizadores, contribuindo para a preservação do meio ambiente e da saúde da população. Riscos O acelerado avanço tecnológico das últimas décadas fez com que a população leiga tivesse que aprender, até mesmo com a ocorrência de acidentes, que é preciso considerar os riscos do uso de determinados aparelhos, como os que contêm materiais radioativos. A palavra “risco” implica em algo que pode ou não ocorrer no futuro e que traga perigo para um determinado grupo ou local. Na atualidade, o risco deriva eminentemente das atividades da ciência e dos resultados da aplicação da tecnologia (PEREIRA; SOUZA, 2006). Em relação à tecnologia nuclear em equipamentos hospitalares, o risco deriva da exposição ocupacional e daqueles que são expostos aos rejeitos das fontes seladas, quando descartadas. Enquanto estão em uso os possíveis efeitos danosos da radiação ionizante produzida por esses aparelhos podem ser determinados e os riscos evitados. Mas quando são estocados esses efeitos não podem mais serem determinados com tanta precisão e podem causar danos à saúde (MONTEIRO, 2005). O tipo de depósito que causa maior apreensão na população próxima e também nos trabalhadores é aquele realizado próximo à superfície do solo, em trincheiras simples; criptas de concreto; e cavernas rochosas. Neles são colocados rejeitos contendo radionuclídeos de meia vida curta (até 30,02 anos), como o Césio 137 e radionuclídeos de meia vida longa (>30 anos) em baixa concentração, como o Urânio 238. O Brasil possui apenas um exemplar desse tipo de depósito, que é o situado em Abadia de Goiás, abrigando os rejeitos do acidente com o Césio 137, em Goiânia, na década de 1980 (AGUIAR, 2008). Importância do armazenamento O armazenamento correto dos resíduos radioativos é fundamental para que as pessoas não se contaminem. Quando ele for temporário, o material não deve ficar diretamente no chão, mas em recipientes apropriados, sendo que as janelas devem ter telas, para evitar que os insetos se tornem vetores de contaminação. Quando o material é recolhido por empresa especializada, geralmente ela mesma incinera o material. No destino final os resíduos geralmente vão para o solo, dentro de material adequado e depois recoberto com concreto, para não afetar as pessoas e nem o meio ambiente (COSTA; FONSECA, 2010). Esses procedimentos de armazenamento fazem parte do gerenciamento dos resíduos gerados em unidades hospitalares, dentre eles aqueles de natureza radioativa. Para que ele seja feito de maneira correta, sem causar riscos para as pessoas e o meio ambiente, alguns princípios devem ser seguidos (XAVIER, 2012): a. Controle das possíveis vias de exposição dos seres humanos e contaminação do meio ambiente, conforme a legislação e considerando o território nacional e internacional; b. O impacto para as gerações futuras não pode ser maior do que aquele considerado para a geração atual; as gerações futuras deverão ser 6 responsáveis apenas pelo controle institucional; c. A legislação deve estabelecer claramente as responsabilidades e os critérios de regulação, para que ninguém se exima de não ter feito o que deveria; deve-se, ainda, garantir o financiamento para manter os depósitos pelo tempo que for necessário; d. A geração e o armazenamento de rejeitos devem ser reduzidos ao máximo, garantindo-se a segurança operacional do momento, sem comprometer a segurança futura; e. A construção ou o descomissionamento dos depósitos de rejeitos deve se cercar de toda a segurança. É de fundamental importância que esses princípios sejam seguidos por aqueles que geram os resíduos radiativos, como pelos responsáveis pelo transporte e destinação final, pois do contrário a saúde humana e o meio ambiente ficarão prejudicados. Por isso, é fundamental que a CNEN,o órgão responsável pela fiscalização, realize-a constantemente e de forma adequada, para que acidentes, como o que ocorreu em Goiânia, não se repitam. São muitas as clínicas e hospitais que não cumprem as resoluções e a CNEN apresenta falhas na fiscalização (OLIVEIRA; CARVALHO, 2010). Conclusão O ser humano não dispõe de sistemas para detecção da presença de radiação ionizante, que é inodora, incolor, não é palpável e inaudível. No século XX o uso de elementos químicos radioativos, principalmente na medicina nuclear, provocou uma grande revolução e o seu uso desenfreado também. Ao ter contato com elementos tão nocivos deve-se sempre buscar proteger os indivíduos e seus descendentes, e também o meio ambiente contra os possíveis danos provocados pelo mau uso desses elementos. Aqueles que deles fazem uso, no intuito de curar determinadas doenças, devem trabalhar de acordo com as normas estabelecidas pelos órgãos responsáveis, lembrando que existem metodologias e tecnologias capazes de minimizar os efeitos adversos desses elementos sobre a saúde humana e o meio ambiente. Contudo, isso não exime o Estado de fiscalizar rigorosamente o uso de aparelhos radiológicos, por exemplo, nas clínicas especializadas e ainda de informar a população sobre os riscos que corre ao trabalhar com eles ou se submeter a exames e tratamentos. A CNEN segue uma legislação amparada nas melhores normas internacionais, mas a literatura pesquisada, contudo, é unânime em afirmar sobre as deficiências na fiscalização e sobre a falta de informações adequadas às vítimas de acidentes, como o que ocorreu em Goiânia, em 1987. A educação, levada a efeito por meio da correta informação, é o melhor meio para se evitar acidentes como o que ocorreu em Goiânia, em 1987, e que ainda causa transtornos e dores para muitas vítimas e seus descendentes. Esse acidente, ainda que tenha produzido conhecimentos sobre a contaminação por radiação ionizante, não fez com que esses conhecimentos chegassem à população ou aos profissionais que trabalham com a vigilância sanitária, de forma a que utilizem as informações corretas para o manuseio, descarte e armazenamento correto do material utilizado. O Brasil, detentor de uma usina nuclear, para geração de energia elétrica e com milhares de clínicas radiológicas espalhadas pelo país, continua sem contar com um esquema apropriado de informação e de fiscalização. O risco de que outros acidentes venham a acontecer não está, dessa forma, completamente descartado, principalmente pela falta de informação para a sociedade e para os profissionais que dela cuidam, na área da saúde pública e da vigilância sanitária. 7 Referências 1. AGUIAR, LA et al. Análise de risco aplicada à gestão de rejeitos: uma revisão aplicada aos depósitos de rejeitos radioativos próximos à superfície. Rio de Janeiro: CETEM/MCT, 2008. Disponível em: <http://mineralis.cetem.gov.br/bitstream/handle/cetem/340/sgpa- 9_final.pdf?sequence=1>. Acesso em 28 maio 2015. 2. ALMEIDA JÚNIOR, A.T.; MARTINS, P.R.; SOUZA, W.J. Atuação da Higiene Ocupacional na gerência de rejeitos radioativos em serviços de saúde. Belo Horizonte: FELUMA, 2007. Disponível em: <http://www.nrcomentada.com.br/download/monografia/1rejeitos%20radioativos%20%28doc%29.pd f>. Acesso em 17 maio 2015. 3. ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. RDC n. 306, de 7 de dezembro de 2004, dispõe sobre o Regulamento Técnico para o gerenciamento de resíduos de serviços de saúde. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/10d6dd00474597439fb6df3fbc4c6735/RDC+N%C2%B A+306,+DE+7+DE+DEZEMBRO+DE+2004.pdf?MOD=AJPERES>. Acesso em 1 maio 2015. 4. BORGES, B.; MARQUES, J. Rejeitos radioativos. RadiologiaPA, 14 fev. 2012. Disponível em: <http://radiologiapa.blogspot.com.br/2012/02/rejeitos-radioativos.html>. Acesso em 17 maio 2015. 5. BRASIL. Comissão Nacional de Energia Nuclear. Resolução CNEN n. 010, de 18 de agosto de 2003. Aprova em caráter provisório e experimental, a Nota Técnica 01/2003, onde estabelece a metodologia de cálculo da compensação financeira mensal aos municípios que abriguem depósitos iniciais, intermediários ou finais de rejeitos radioativos. Brasília, D.O.U., 26 ago. 2003. Disponível em: <http://www.cnen.gov.br/Doc/pdf/Legislacao/RS_CNENCD_10_2003.pdf>. Acesso em 4 maio 2015. 6. BRASIL. Ministério da Saúde. Gerenciamento de resíduos de serviço de saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2006. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/servicosaude/manuais/manual_gerenciamento_residuos.pdf>. Acesso em 12 abr. 2015. 7. CARDOSO, EM et al. Apostila educativa: radioatividade. Rio de Janeiro: CNEN, 2005. Disponível em: <http://www.cnen.gov.br/ensino/apostilas/radio.pdf>. Acesso em 2 maio 2015. 8. CNEN. Comissão Nacional de Energia Nuclear. Resolução CNEN n. 167, de 30 de abril de 2014, aprova a Norma CNEN NN 8.01 Gerência de Rejeitos Radioativos de Baixo e Médio Níveis de Radiação. Brasília, D.O.U., n. 91, Seção 1, p. 7, 15 maio 2014. Disponível em: <http://www.lex.com.br/legis_25519842_RESOLUCAO_N_167_ DE_30_DE_ABRIL_DE_2014.aspx>. Acesso em 1 maio 2015. 9. CONAMA. Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução n. 358, de 29 de abril de 2005, dispõe sobre o tratamento e a disposição final dos resíduos dos serviços de saúde e dá outras providências. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/res35805.pdf>. Acesso em 1 maio 2015. 10. COSTA, W.M.; FONSECA, M.C.G. A importância do gerenciamento dos resíduos hospitalares e seus aspectos positivos para o meio ambiente. Hygeia, v. 5, n. 9), p. 12-31, dez. 2009. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/hygeia/article/viewFile/16924/9329>. Acesso em 18 jun. 2015. 11. ERDTMANN, BK. Gerenciamento dos resíduos de serviço de saúde: biossegurança e o controle das infecções hospitalares. Rev. Texto Contexto enferm., v. 13 n. espec., p. 86-93, Florianópolis, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/tce/v13nspe/v13nspea10.pdf>. Acesso em 3 maio 2015. 12. FRAGMAQ. Descarte de lixo e resíduos hospitalares. Fragmaq, 9 jan. 2013. Disponível em: <http://www.fragmaq.com.br/lixo-hospitalar/descarte-de-lixo-hospitalar-e-residuos-hospitalares/>. Acesso em 17 maio 2015. 13. GUIMARÃES, M.I.C.C. Grupo C: rejeitos radioativos. In: HC - FMUSP. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Cartilha de orientação para descarte de resíduos. São Paulo: FMUSP, 2010. Disponível em: <http://www2.fm.usp.br/gdc/docs/cep_5_grss_2_cartilha.pdf>. Acesso em 18 maio 2015. 14. GRX. Lixeira radiológica blindada 9 litros. Grupo GRX São Paulo, 2015. Disponível em: <http://www.grxsp.com.br/medicina-nuclear-acessorios-radiologicos/lixeira-radiologica-blindada-9- litros-3mm-pb.html>. Acesso em 30 jun. 2015. 15. IEN. Instituto de Engenharia Nuclear. Recebimento de rejeitos radioativos. IEN, Produtos e Serviços, 2012. Disponível em: <http://www.ien.gov.br/produtos/recrej.php>. Acesso em 3 maio 2015. 8 16. IRD. Instituto de Radioproteção e Dosimetria. O que são rejeitos radioativos? IRD, 2012. Disponível em: <http://ird.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=60>. Acesso em 3 maio 2015. 17. JESUS, MM; SANTOS, SC. Resíduos e rejeitos. Salvador: RENORBIO/UFBA, 2009. Disponível em: <http://www.labimuno.org.br/aulas/bioseguranca/Seminario_Residuos_Rejeitos.pdf>. Acesso em 12 abr. 2015. 18. MAZZILLI, BP; MÁDUAR, MF; CAMPOS, MP. Radioatividade no meio ambiente e avaliação de impacto radiológico ambiental. São Paulo: IPEN, 2011. Disponível em: <http://www.ipen.br/conteudo/upload/201103311026310.Apostila%20TNA-5754%20abr-2011.pdf>. Acesso em 23 mar. 2015. 19. MÖLLER, S.V. Aplicações industriais dasradiações ionizantes. Porto Alegre: UFRGS/LMF, 2010. Disponível em: <http://www.segurancaetrabalho.com.br/download/radioatividade.pdf>. Acesso em 16 maio 2015. 20. MONTEIRO, IHTS. Determinação das taxas de doses ambientais e ocupacionais de radiação gama, em consequência da presença do RDS-111 e do Depósito de Rejeitos Radioativos do IEN/CNEN. Dissertação (Ciências em Engenharia Nuclear). Rio de Janeiro: UFRJ, 2005. 21. OKUNO, E. Efeitos biológicos das radiações ionizantes. Acidente radiológico de Goiânia. Rev. Estudos Avançados, v. 27, n. 77, p. 185-199, 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ea/v27n77/v27n77a14.pdf>. Acesso em 3 maio 2015. 22. OLIVEIRA, A.M.; CARVALHO, P.R.S.F. Análise do gerenciamento dos rejeitos e resíduos radiativos de uma clínica de medicina nuclear em Teresina-PI. CONNEPI, 2010. Disponível em: <http://connepi.ifal.edu.br/ocs/index.php/connepi/CONNEPI2010/paper/viewFile/1348/895>. Acesso em 19 jun. 2015. 23. OLIVEIRA NETO, GC; SHIBAO, FY. Gestão de resíduos infectantes e radioativos em três hospitais de São Paulo: indicadores de desempenho para o controle do processo. XVI Simpósio de Administração da Produção, Logística e Operações Internacionais, São Paulo, 28-30 ago. 2013, p. 1-13. Disponível em: <http://www.simpoi.fgvsp.br/arquivo/2013/artigos/E2013_T00459_PCN22093.pdf>. Acesso em 12 abr. 2015. 24. PALHETA, FC. Radiação: o que é? Ciência, Tecnologia e Sociedade, 2005. Disponível em: <http://www2.ufpa.br/ensinofts/radiologia.html>. Acesso em 3 maio 2015. 25. PEREIRA, EC. Risco e vulnerabilidade socioambiental: o ‘Depósito Definitivo de Rejeitos Radioativos’ na percepção dos moradores de Abadia de Goiás. Dissertação (Sociologia). Goiânia: UFG, 2005. 26. PEREIRA, EC; SOUZA, MR. Interface entre risco e população. XV Encontro Nacional de Estudos Populacionais - ABEP, Caxambu, 18-22 set. 2006. Disponível em: <http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_592.pdf>. Acesso em 28 maio 2015. 27. TARDIO NETO, V.G.; BERNSTEIN, A. Césio 137: um drama antigo que serve de exemplo. Educação Pública, Química, 8 out. 2013. Disponível em: <http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/quimica/0018.html>. Acesso em 30 jun. 2015. 28. XAVIER, AM. Gerência de rejeitos radioativos. Rio de Janeiro: CNEN, 2012. Disponível em: <http://www.ilea.ufrgs.br/radioisotopos/Aula%2025%20Julho%20Arquivo%203.pdf>. Acesso em 4 maio 2015.
Compartilhar