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Cap´ıtulo 9 A Derivada de uma Func¸a˜o 9.1 Definic¸a˜o No Cap. 5, motivados pela geometria, vimos que o coeficiente angular da reta tangente ao gra´fico de uma func¸a˜o f , em um ponto (x0, f(x0)), e´ obtido tomando-se o limite das declividades de uma sequ¨eˆncia de retas secantes que convergem para a tangente, mais precisamente, o coeficiente angular m da tangente e´ dado por m = lim x→x0 f(x)− f(x0) x− x0 conforme mostra o diagrama a seguir: Esta definic¸a˜o do coeficiente angular da tangente ao gra´fico de uma func¸a˜o f , no ponto (x0, f(x0)), nos leva a` definic¸a˜o de derivada de uma func¸a˜o em um ponto. Definic¸a˜o A derivada de uma func¸a˜o f em um ponto x0 do seu domı´nio, denotada por f ′(x0) (leˆ-se f linha de x zero) e´ f ′(x0) = lim x→x0 f(x)− f(x0) x− x0 , se esse limite existir. Neste caso, dizemos que a func¸a˜o f e´ deriva´vel ou diferencia´vel nesse ponto. Se f for deriva´vel em todos os pontos do seu domı´nio, dizemos, simplesmente, que f e´ deriva´vel ou diferencia´vel. A raza˜o f(x)− f(x0) x− x0 e´ chamada de raza˜o incremental ou quociente de diferenc¸as. E´ importante notar que f ′(x0) e´ a declividade da reta tangente ao gra´fico de f no ponto (x0, f(x0)). Assim, a func¸a˜o f e´ deriva´vel em x0 se e somente se existe a reta tangente (na˜o vertical) a` curva y = f(x), no ponto (x0, f(x0)). 9.2 Calculando derivadas: alguns exemplos Exemplo 1 Considere a func¸a˜o f(x) = 1x , x 6= 0. Para determinar a derivada dessa func¸a˜o, em um ponto x0 qualquer, precisamos calcular lim x→x0 f(x)− f(x0) x− x0 , isto e´, estudar o comportamento da raza˜o incremental f(x)−f(x0) x−x0 , quando x se aproxima de x0. Neste exemplo particular f(x)− f(x0) x− x0 = 1 x − 1x0 x− x0 . 125 126 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o Com a experieˆncia adquirida no estudo de limites, sabemos que o comportamento desta raza˜o, quando x se aproxima de x0, se torna claro apo´s algumas manipulac¸o˜es alge´bricas. Assim, simplificando a frac¸a˜o, obtemos: 1 x − 1x0 x− x0 = x0−x xx0 x− x0 = − x− x0 (x− x0)xx0 = − 1 xx0 A partir desta igualdade vemos imediatamente que f ′(x0) = lim x→x0 1 x − 1x0 x− x0 = limx→x0 − 1 xx0 = − 1 x20 . Examinando o gra´fico da func¸a˜o f (veja a seguir) podemos verificar que o resultado obtido e´ consistente com o significado geome´trico da derivada de uma func¸a˜o. Como x20 e´ sempre positivo, a derivada f ′(x0) = − 1x20 e´ sempre negativa. Isso corresponde ao fato de que as retas tangentes ao gra´fico da func¸a˜o f descem em direc¸a˜o a` direita. (Por queˆ?) Ale´m disso, quando x0 esta´ pro´ximo de zero − 1x20 e´ um nu´mero negativo de valor absoluto muito grande e, portanto, a reta tangente e´ quase vertical; quando x0 cresce em valor absoluto, − 1x02 e´ quase zero e a reta tangente e´ quase horizontal. –10 –8 –6 –4 –2 0 2 4 6 8 10 –3 –2 –1 1 2 3x –10 –8 –6 –4 –2 0 2 4 6 8 10 –3 –2 –1 1 2 3x Na realidade, mais tarde, em vez de usarmos o gra´fico da func¸a˜o para verificar se a derivada foi calculada correta- mente, como foi feito neste exemplo, usaremos a derivada para nos ajudar a trac¸ar gra´ficos de func¸o˜es. Exemplo 2 Considere a func¸a˜o f(x) = x3. Como das vezes anteriores, para calcular a derivada desta func¸a˜o no ponto x0 e´ preciso calcular o lim x→x0 x3 − x30 x− x0 . Este limite pode ser calculado facilmente simplificando-se a raza˜o incremental, como se segue: x3 − x30 x− x0 = (x− x0) (x2 + xx0 + x20) x− x0 = x 2 + xx0 + x 2 0 Da´ı, conclu´ımos imediatamente que lim x→x0 x3 − x30 x− x0 = limx→x0 (x 2 + xx0 + x0 2) = 3x0 2. Exemplo 3 De um modo geral, o racioc´ınio empregado no exemplo anterior para calcular a derivada da func¸a˜o f(x) = x3 pode ser empregado no ca´lculo das derivadas das func¸o˜es f(x) = xn, onde n e´ um inteiro positivo em um ponto x0 qualquer. Para isso e´ necessa´rio calcular o lim x→x0 xn − xn0 x− x0 . Como (x − x0) e´ um fator do polinoˆmio xn − xn0 , para calcular o limite acima, basta, como no exemplo anterior, simplificar o quociente xn−xn0 x−x0 . Nesse caso geral, teremos: xn − xn0 x− x0 = x (n−1) + x0 x(n−2) + x02 x(n−3) + . . .+ x (n−2) 0 x+ x (n−1) 0 . Desta u´ltima expressa˜o, sem dificuldade, obtemos lim x→x0 xn − xn0 x− x0 = nx (n−1) 0 , qualquer que seja o ponto x0. Assim, se n e´ um inteiro positivo, f ′(x) = nx(n−1). W.Bianchini, A.R.Santos 127 Exemplo 4 Vamos, agora, calcular a derivada da func¸a˜o f(x) = √ x, em um ponto x0 > 0 qualquer. Para isso temos que calcular lim x→x0 √ x−√x0 x− x0 . Como ( √ x−√x0) ( √ x+ √ x0) = x− x0 , temos que √ x−√x0 x− x0 = ( √ x−√x0) ( √ x−√x0) ( √ x+ √ x0) = 1√ x+ √ x0 . Logo, lim x→x0 √ x−√x0 x− x0 = limx→x0 1√ x+ √ x0 = 1 2 √ x0 . Observe que este limite na˜o existe quando x0 = 0. Deste modo, o domı´nio de f ′ e´ o intervalo (0,+∞), que e´ menor que o domı´nio da func¸a˜o f . 9.2.1 Exerc´ıcios 1. Seja f(x) = x2. (a) Calcule a derivada de f nos pontos x = 1, x = 23 , x = −2. (b) O que representa, geometricamente, o valor encontrado, em cada um dos pontos dados, no item anterior? 2. (a) Levando em conta a definic¸a˜o geome´trica da derivada de uma func¸a˜o, o que se pode concluir a respeito da derivada de uma func¸a˜o constante? (b) Prove a sua conclusa˜o, isto e´, usando a definic¸a˜o, mostre que se f(x) = c, c um nu´mero real qualquer, enta˜o f ′(x) = 0 para todo x. (c) Qual o maior domı´nio da derivada calculada no item anterior? (d) Os itens anteriores mostram que a reta tangente ao gra´fico de uma func¸a˜o constante coincide com o gra´fico desta func¸a˜o. Deˆ exemplo de uma func¸a˜o na˜o constante, cujo gra´fico coincida com a sua reta tangente em todos os pontos de seu domı´nio. Neste caso, o que se pode afirmar a respeito da derivada desta func¸a˜o? (Veja o pro´ximo exerc´ıcio) 3. (a) Se o gra´fico de y = f(x) e´ uma reta, qual a derivada de f? (b) Qual a derivada da func¸a˜o f(x) = a x+ b? (Observac¸a˜o: Voceˆ na˜o precisa fazer nenhuma conta para responder as perguntas anteriores!) (c) Se f(x) e´ a func¸a˜o definida no item anterior, prove, analiticamente, que f ′(x) = a. (d) Qual o maior domı´nio da derivada calculada no item anterior? 4. (a) Qual a declividade da reta tangente ao gra´fico da func¸a˜o f(x) = x3 no ponto (2, 8). (b) Seja g a reta tangente ao gra´fico de f no ponto (a, a3). Ache uma equac¸a˜o desta reta. (c) Se a 6= 0, mostre que f e g se interceptam em dois pontos. 5. Use a fo´rmula obtida no Exemplo 3 para calcular a derivada de: (a) f(x) = x5 (b) f(x) = x100 6. Suponha que f(x) = x3. Calcule: (a) f ′(9), f ′(25), f ′(36) (b) f ′(32), f ′(52), f ′(62) (c) f ′(a), f ′(a2), f ′(x2) 7. Se f(x) e´ uma func¸a˜o diferencia´vel e c um nu´mero real qualquer, use o significado geome´trico da derivada de uma func¸a˜o para obter uma fo´rmula para g′(x) em cada um dos itens abaixo: (Veja Atividades de Laborato´rio.) (a) g(x) = f(x) + c (b) g(x) = f(x+ c) (c) g(x) = c f(x) (d) g(x) = f(c x) (e) g(x) = c f(c x) (f) Use a definic¸a˜o de derivada para comprovar a sua intuic¸a˜o geome´trica. (g) Use os resultados obtidos acima para calcular f ′(x), nos seguintes casos: i. f(x) = (x+ 3)5 ii. f(x) = x5 + 100 iii. f(x) = 2 (x4 − 3) iv. f(x+ 3) = x5 v. f(x+ 3) = (x+ 5)7 128 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o 9.3 Outras notac¸o˜es para a derivada de uma func¸a˜o Na definic¸a˜o de derivada de uma func¸a˜o f em um ponto x0, f ′(x0) = lim x→x0 f(x)− f(x0) x− x0 fazendo x− x0 = ∆x, ou seja, x = x0 +∆x, o limite acima se transforma em f ′(x0) = lim ∆ x→0 [ f(x0 +∆x)− f(x0) ∆x ] . Quando na˜o estamos interessados em caracterizar um determinado ponto x0, escrevemossimplesmente para um ponto x qualquer: f ′(x) = lim ∆ x→0 [ f(x+∆x)− f(x) ∆x ] . Esta notac¸a˜o nos mostra claramente que a cada x associamos o valor f ′(x), obtendo assim uma nova func¸a˜o f ′, a derivada da func¸a˜o original f . O domı´nio de f ′ e´ o conjunto de todos os pontos x do domı´nio de f tais que este limite existe. Outros s´ımbolos podem ser empregados para denotar a derivada de uma func¸a˜o. A`s vezes pode ser conveniente denotar f ′(x) por Dx(f(x)). O ı´ndice x, em D, tem por objetivo designar a varia´vel independente em relac¸a˜o a` qual estamos calculando a derivada da func¸a˜o f . Por exemplo, se a func¸a˜o f e´ uma func¸a˜o da varia´vel independente t, escreve-se f ′(t) = Dt(f(t)). Quando na˜o houver possibilidade de du´vida em relac¸a˜o a esta varia´vel, isto e´, quando a varia´vel independente for claramente explicitada, podemos escrever D(f(x)) ou, simplesmente, D(f) para designar a derivada da func¸a˜o f em relac¸a˜o a sua varia´vel independente. Os s´ımbolos Dx, Dt, D sa˜o chamados operadores diferenciais, porque quando aplicados a uma func¸a˜o teˆm o efeito de uma operac¸a˜o, cujo resultado e´ a derivada (ou diferencial) da func¸a˜o dada. Os s´ımbolos, acima, isoladamente, na˜o teˆm significado algum, no entanto quando aplicados a uma expressa˜o obte´m-se a sua derivada. Veja os exemplos abaixo: (a) Dx(3x 2 − 5x+ 4) = D (3x2 − 5x+ 4) = 6x− 5 (b) D f(x) = f ′(x) (c) Dx(a x+ b) = a O Maple usa o s´ımbolo D para calcular a func¸a˜o derivada de uma dada func¸a˜o f . Veja como isto pode ser feito nos exemplos abaixo: > f:=x->3*x^2-5*x+4; f := x→ 3x2 − 5x+ 4 > derivada:=D(f); derivada := x→ 6x− 5 > D(f)(x); 6x− 5 > D(f)(2); 7 > g:=y->a*y+b; g := y → a y + b > D(g); y → a 9.3.1 A notac¸a˜o de Leibniz Leibniz, ao desenvolver sua versa˜o do ca´lculo (por volta de 1675), denotou as derivadas pelo s´ımbolo dfdx , em vez de f ′(x). Sua notac¸a˜o prove´m da definic¸a˜o de derivada e nos ajuda a ter em mente seu significado geome´trico. Para explicar a notac¸a˜o de Leibniz, vamos comec¸ar com uma func¸a˜o y = f(x) e escrever o quociente f(x)−f(x0)x−x0 . Este quociente, que representa, geometricamente, a declividade da reta secante a` curva y = f(x), que passa pelos pontos (x0, f(x0)) e (x, f(x)), pode ser escrito na forma ∆ y ∆ x , onde ∆x = x− x0 e ∆ y = f(x)− f(x0). O denominador, portanto, e´ a diferenc¸a de dois valores de x e o numerador, a diferenc¸a correspondente nos valores de f . Por este motivo e´ chamado de quociente de diferenc¸as. Este fato e´ ilustrado no desenho: W.Bianchini, A.R.Santos 129 x∆ y∆ f(x )o x o f(x) x E´ importante ressaltar que, neste contexto, ∆ y na˜o e´ uma diferenc¸a entre quaisquer dois valores da func¸a˜o f , mas o incremento ocorrido nos valores da func¸a˜o f quando a varia´vel independente muda de x0 para x0 +∆x, isto e´, quando ha´ um incremento de valor ∆x na varia´vel independente. Por este motivo este quociente e´ tambe´m chamado de raza˜o incremental e pode ser interpretado como a raza˜o da variac¸a˜o de y pela variac¸a˜o de x ao longo da curva y = f(x). (Veja o cap´ıtulo Velocidade, Acelerac¸a˜o e Outras Taxas de Variac¸a˜o). O limite deste quociente de diferenc¸as quando ∆x tende a zero e´, como ja´ vimos, a derivada da func¸a˜o f , isto e´, se y = f(x), f ′(x) = lim ∆ x→0 ∆ y ∆x . Leibniz usou a notac¸a˜o dydx (leia-se: a derivada de y em relac¸a˜o a x ou, simplesmente, dy,dx) para denotar este limite. Assim, usando a notac¸a˜o de Leibniz, temos que dy dx = lim ∆ x→0 ∆ y ∆x , isto e´, dy dx = f ′(x). Note que dydx , apesar da forma como e´ escrito, e´ um u´nico s´ımbolo individual, na˜o o quociente de duas quantidades, dy e dx, que, ate´ agora, na˜o foram definidas. (Para entender como e´ poss´ıvel definir dy e dx de tal modo que o s´ımbolo dy dx , usado para denotar a derivada de uma func¸a˜o y = f(x), seja realmente a raza˜o entre duas quantidades veja o Cap. 19 ). A notac¸a˜o de Leibniz apresenta a vantagem de nos fazer lembrar, rapidamente, de todo o processo de se formar o quociente de diferenc¸as ∆ y∆ x e calcular o seu limite quando ∆x→ 0 (a passagem ao limite e´ simbolicamente expressa pela substituic¸a˜o da letra grega ∆ pela letra d). Ha´ muitas variac¸o˜es sobre esta notac¸a˜o, escolhidas de acordo com as convenieˆncias do contexto onde sa˜o empre- gadas. Por exemplo, se y = 2x2 + x ⇒ dy dx = 4x+ 1 , ou, ainda, se f(x) = 2x2 + x ⇒ df dx = 4x+ 1 , ou, ainda, d (2x2 + x) dx = 4x+ 1 . Todas estas sa˜o maneiras aceita´veis de se dizer que a derivada da func¸a˜o definida por f(x) = 2x2 + x e´ uma outra func¸a˜o dada por f ′(x) = 4x+ 1. De maneira ana´loga, d (5 t 2−4 t) dt = 10 t− 4, e se z = 12x2 − 4, enta˜o dzdx = 24x. A notac¸a˜o dydx ∣∣∣ x=x0 expressa a derivada da func¸a˜o y = f(x) calculada no ponto x = x0, isto e´, se y = f(x)⇒ dy dx ∣∣∣∣ x=x0 = f ′(x0) . A notac¸a˜o de Leibniz e´ particularmente apropriada nas aplicac¸o˜es. Ale´m disso, certas regras fundamentais e propriedades operato´rias sa˜o mais fa´ceis de lembrar e usar quando as derivadas sa˜o escritas na notac¸a˜o de Leibniz. (Veja o cap´ıtulo Teoremas e Propriedades Operato´rias.) O Maple usa o comando diff(f,x) para calcular a derivada de uma func¸a˜o ou expressa˜o alge´brica em relac¸a˜o a` varia´vel x. O programa usa tambe´m uma simbologia um pouco diferente para designar derivadas com a notac¸a˜o de Leibniz arredondando a letra d. Voceˆ vera´ posteriormente em Ca´lculo II a utilizac¸a˜o deste s´ımbolo para designar derivadas parciais para func¸o˜es de va´rias varia´veis. Assim, para o Maple, df dx = ∂ ∂x f . Veja os exemplos abaixo: 130 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o > diff(x^2,x); 2x > f:=x->x^2; f := x→ x2 > diff(f(x),x); 2x > Diff(f(x),x)=diff(f(x),x); ∂ ∂x x 2 = 2x 9.3.2 Exerc´ıcios 1. As afirmac¸o˜es abaixo foram escritas usando-se a notac¸a˜o de Leibniz para derivadas. Interprete cada uma delas. (a) d x n dx = nx (n−1) (b) Se z = 1y , enta˜o dz dy = − 1y2 (c) d [f(x)+c]dx = d f(x) dx 2. Seja y = f(x) e z = y + c. Calcule dzdx . 9.4 Derivadas laterais e diferenciabilidade Pela nossa experieˆncia no estudo de retas tangentes e´ fa´cil concluir que existem func¸o˜es que, em alguns pontos, na˜o teˆm reta tangente; portanto, em tais pontos, f ′ na˜o esta´ definida. Consequ¨entemente, em alguns casos o domı´nio de f ′ e´ um conjunto menor que o domı´nio de f . Vamos ilustrar esta afirmac¸a˜o com alguns exemplos. Exemplo 1 Considere a func¸a˜o f(x) = |x |. Ja´ vimos, geometrica- mente, que na˜o existe reta tangente ao gra´fico dessa func¸a˜o no ponto (0, 0). Geometricamente tambe´m e´ fa´cil ver que, para cada x > 0, a inclinac¸a˜o da reta tangente a esse gra´fico e´ 1 (por queˆ?); e que, para cada x < 0, a inclinac¸a˜o da tan- gente e´ −1 (por queˆ?). 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 –2 –1 1 2 x Na primeira sec¸a˜o deste cap´ıtulo, definimos a derivada de uma func¸a˜o em um ponto x0 como a declividade da reta tangente ao seu gra´fico neste ponto. Vamos usar esta definic¸a˜o para mostrar, rigorosamente, que a func¸a˜o f(x) = |x |, na˜o tem derivada no ponto (0, 0), portanto, na˜o existe reta tangente ao gra´fico desta func¸a˜o neste ponto. Para isso vamos calcular o lim x→0 f(x)− f(x0) x− x0 , para x0 = 0. Neste caso particular, lim x→0 f(x)− f(x0) x− x0 = limx→0 |x | x . Como, | x |x = 1, para x > 0, enta˜o lim x→0+ |x | x = 1, e como | x |x = −1, para x < 1, temos que lim x→0− |x | x = −1. Como os limites laterais sa˜o diferentes, podemos concluir que na˜o existe o limite procurado. Os dois limites laterais calculados no exemplo anterior sa˜o chamados derivada lateral a` direita e derivada lateral a` esquerda, respectivamente, da func¸a˜o f no pontozero. A derivada desta func¸a˜o existe em qualquer outro ponto x0 6= 0. De fato, f ′(x) = { 1, x > 0 −1, x < 0 –1 –0.8 –0.6 –0.4 –0.2 0.2 0.4 0.6 0.8 1 –1 –0.8 –0.6 –0.4 –0.2 0.2 0.4 0.6 0.8 1x W.Bianchini, A.R.Santos 131 Repare que f ′(x) na˜o esta´ definida para x = 0 e, portanto, f na˜o e´ diferencia´vel neste ponto. Exemplo 2 Uma dificuldade semelhante a`quela apresentada no exemplo anterior ocorre com a func¸a˜o f(x) = { x2 , se x ≥ 0 −x , se x < 0 . No ponto x0 = 0, temos que f(x)−f(0) x = { x2 x x > 0−x x x < 0 , ou seja, f(x)− f(0) x = { x, x > 0 −1, x < 0 . Consequ¨entemente, lim x→0+ f(x)− f(0) x = 0 e lim x→0− f(x)− f(0) x = −1. Como as derivadas laterais sa˜o diferentes, podemos concluir que na˜o existe f ′(0) = lim x→0 f(x)− f(0) x , isto e´, f na˜o e´ diferencia´vel em zero. Novamente, podemos facilmente concluir que f ′(x) existe para qualquer outro ponto x0 6= 0. Exerc´ıcio Demonstre que f ′(x) = { 2x, x > 0 −1, x < 0 . Os gra´ficos de f e de f ′, respectivamente, sa˜o mostrados a seguir. –2 –1 0 1 2 y –2 –1 1 2 x –2 –1 0 1 2 y –2 –1 1 2 x Exemplo 3 Vamos examinar agora a func¸a˜o f(x) = x( 1 3 ) cujo gra´fico trac¸amos abaixo. Conve´m observar aqui que o Maple define esta func¸a˜o apenas para valores positivos de x. Se quisermos considerar esta func¸a˜o definida em toda a reta real usando o Maple, precisamos utilizar uma sub-rotina, chamada surd, que faz esta conversa˜o automaticamente da seguinte maneira: Se x ≥ 0, enta˜o surd(x, n) = x( 1n ). Se x < 0, enta˜o surd(x, n) = −(−x( 1n )). Abaixo, utilizamos este comando para trac¸ar o gra´fico desta func¸a˜o no intervalo [−2, 2]. > f:=x->surd(x,3): > plot(f(x),x=-2..2,y=-2..2); –2 –1 0 1 2 y –2 –1 1 2 x Neste caso, para x0 = 0, f(x)− f(0) x = x( 1 3 ) x = 1 x( 2 3 ) . A expressa˜o acima se torna arbitrariamente grande quando x→ 0; portanto, a func¸a˜o f na˜o e´ diferencia´vel no zero, pois na˜o existe o lim x→0 f(x)− f(0) x . 132 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o Observe os diagramas a seguir e examine o comportamento das retas secantes a` curva passando pela origem e por um ponto (x, f(x)) qualquer da curva a` medida que x se aproxima de zero pela esquerda e pela direita, respectivamente. Geometricamente, este comportamento significa que, embora f na˜o seja diferencia´vel em (0, 0), o gra´fico de f apresenta uma reta tangente vertical neste ponto. Exemplo 4 A situac¸a˜o se torna um pouco pior quando examinamos a func¸a˜o y = √|x|, cujo gra´fico e´ seguinte: 5 10 15 20 25 30 –1000 –600 –200 0 200 400 600 800 1000x Calculando o quociente de diferenc¸as para x0 = 0, obtemos: f(x)− f(0) x = { √ x x , x > 0√−x x , x < 0 = { 1√ x , x > 0 − 1√−x , x < 0 . Neste caso, mais uma vez, como os limites laterais na˜o existem, f ′(0) = lim x→0 f(x)− f(0) x tambe´m na˜o existe e, consequ¨entemente, f na˜o e´ diferencia´vel em x0 = 0. Ale´m disso, lim x→0+ f(x)− f(0) x = lim x→0+ 1√ x = +∞, pois os valores de 1√ x se tornam arbitrariamente grandes quando x se aproxima de zero pela direita e, lim x→0− f(x)− f(0) x = lim x→0− − 1√−x = −∞ pois, quando x se aproxima de zero pela esquerda, os valores de − 1√−x se tornam arbitrariamente grandes em valor absoluto, mas sa˜o sempre negativos. O diagrama a seguir ilustra estas afirmac¸o˜es. –1 –0.8 –0.6 –0.4 –0.2 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 –2 –1 1 2 x W.Bianchini, A.R.Santos 133 Estes dois u´ltimos exemplos motivam a definic¸a˜o dada a seguir. Definic¸a˜o: Reta tangente vertical A curva y = f(x) admite uma reta tangente vertical no ponto (x0, f(x0)) se f e´ cont´ınua em x0 e f ′(x) tende a +∞ ou −∞ quando x → x+0 e/ou quando x → x−0 . Se f ′(x) tender a +∞ por um lado e a −∞ por outro, dizemos que a func¸a˜o tem uma cu´spide em x0. (A exigeˆncia de que f seja cont´ınua em x = x0 implica que f(x0) deve ser definida neste ponto, pois na˜o teria sentido exigir uma reta (vertical ou na˜o) tangente a uma curva y = f(x) em um ponto x0 onde a func¸a˜o na˜o estivesse definida.) Dos exemplos acima, podemos concluir que, graficamente, o domı´nio de f ′ e´ o conjunto de todos os pontos para os quais a func¸a˜o original f tem uma tangente na˜o vertical. Portanto, a func¸a˜o f na˜o e´ diferencia´vel nos pontos onde o seu gra´fico forma “bicos” ou muda abruptamente de direc¸a˜o ou nos pontos onde a reta tangente e´ vertical ou nos pontos onde ela na˜o e´ cont´ınua. Nos exemplos dados, o domı´nio de f ′ esta´ contido (estritamente) no domı´nio de f . Ate´ agora estudamos a diferenciabilidade de func¸o˜es em determinados pontos. Como foi feito no estudo de con- tinuidade (Cap. 8 ), podemos estender este conceito a todo um intervalo. As definic¸o˜es a seguir teˆm este objetivo. Definic¸a˜o: Diferenciabilidade em intervalos abertos Dizemos que uma func¸a˜o e´ diferencia´vel em um intervalo aberto (a, b) se o e´ para todo ponto x0 em (a, b). Esta definic¸a˜o e´ estendida, naturalmente, a`s func¸o˜es definidas em intervalos do tipo (a,∞), (−∞, a) ou a toda reta. Definic¸a˜o: Diferenciabilidade em intervalos fechados Uma func¸a˜o f e´ diferencia´vel em um intervalo fechado [a, b] se e´ diferencia´vel em (a, b) e se existem as derivadas laterais a` direita no ponto a e a` esquerda no ponto b, isto e´, se existem os limites lim h→0+ f(a+ h)− f(a) h e lim h→0− f(b+ h)− f(b) h . Se f esta´ definida em um intervalo [a,b], as derivadas laterais acima nos permitem, tambe´m, definir a declividade da reta tangente a` curva y = f(x) nos pontos (a,f(a)) e (b,f(b)). Assim, o coeficiente angular da reta tangente a` curva no ponto (a,f(a)) e´ dado por lim h→0+ f(a+ h)− f(a) h e o coeficiente angular da reta tangente no ponto (b,f(b)) por lim h→0− f(b+ h)− f(b) h . Veja os gra´ficos a seguir, onde a func¸a˜o y = −x2 + 4 esta´ definida no intervalo fechado [a, b] = [−2, 2]. O primeiro mostra a derivada lateral a` direita em a = −2; o segundo, a derivada lateral a` esquerda em b = 2. 2 4 6 8 10 y –2 –1 1 2 x 2 4 6 8 10 y –2 –1 1 2 x Utilizando-se as derivadas laterais em um dos extremos, define-se de maneira ana´loga a diferenciabilidade em intervalos da forma [a,b), [ a, ∞ ), (a,b] e ( −∞, b]. Da mesma maneira, dizemos que uma curva y = f(x) tem uma reta tangente vertical no extremo de um intervalo fechado onde estiver definida se f for cont´ınua neste ponto e se as derivadas laterais (a` esquerda ou a` direita, conforme o caso) crescerem sem limite, em valor absoluto. Veja o gra´fico a seguir que exemplifica esta situac¸a˜o para a func¸a˜o y = √ x cujo domı´nio e´ o intervalo [0,∞). 134 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o 9.4.1 Exerc´ıcios 1. (a) Calcule a derivada da func¸a˜o f(x) = [[x]], onde o s´ımbolo [[ . ]] denota o maior inteiro menor ou igual a x. (b) Calcule lim x→0+ f(x)− f(0) x e lim x→0− f(x)− f(0) x . O que significam estes limites? (c) Qual o domı´nio de f ′. 2. Mostre que a func¸a˜o f(x) = −x( 13 ) apresenta uma reta tangente vertical em (0, 0). 9.5 Diferenciabilidade e continuidade Na sec¸a˜o Derivadas Laterais e Diferenciabilidade, estudamos alguns exemplos de func¸o˜es que sa˜o cont´ınuas mas na˜o sa˜o diferencia´veis. Quando estudamos func¸o˜es cont´ınuas, afirmamos que ser cont´ınua seria a primeira propriedade que uma func¸a˜o “razoavelmente bem comportada” deveria satisfazer. De uma certa maneira, as func¸o˜es diferencia´veis teˆm um “comportamento melhor” do que aquelas que simplesmente sa˜o cont´ınuas. Neste sentido, ser diferencia´vel e´ uma condic¸a˜o mais forte que ser cont´ınua. O teorema abaixo tornaclara esta u´ltima afirmac¸a˜o. Teorema Se f e´ uma func¸a˜o diferencia´vel em um ponto x0, enta˜o f e´ cont´ınua em x0. Demonstrac¸a˜o Para mostrar que f e´ uma func¸a˜o cont´ınua, precisamos provar que lim x→x0 f(x) = f(x0). Isto e´ equivalente a mostrar que lim x→x0 (f(x)− f(x0)) = 0. Como x 6= x0 (por queˆ?), temos que lim x→x0 (f(x)− f(x0)) = lim x→x0 (f(x)− f(x0)) (x− x0) (x− x0) . Como, por hipo´tese, f e´ diferencia´vel em x0, existe o lim x→x0 f(x)− f(x0) x− x0 , e este limite e´ igual a f ′(x0). Estes fatos nos permitem afirmar que lim x→x0 ( (f(x)− f(x0)) (x− x0) (x− x0) ) = lim x→x0 ( f(x)− f(x0) x− x0 ) . lim x→x0 (x− x0) = f ′(x0).0 = 0 , o que demonstra o teorema. E´ muito importante lembrar que a rec´ıproca do teorema acima na˜o vale. Uma func¸a˜o diferencia´vel e´ cont´ınua, mas uma func¸a˜o cont´ınua na˜o precisa ser, necessariamente, diferencia´vel (se voceˆ se lembrar da func¸a˜o f(x) = |x |, jamais esquecera´ qual dessas duas afirmac¸o˜es e´ a verdadeira e qual e´ a falsa). W.Bianchini, A.R.Santos 135 As func¸o˜es cont´ınuas, examinadas na sec¸a˜o Derivadas Laterais e Diferenciabilidade, sa˜o diferencia´veis, exceto em um ponto. E´ fa´cil dar exemplos de func¸o˜es cont´ınuas que na˜o sa˜o diferencia´veis em va´rios pontos, ate´ mesmo em um nu´mero infinito de pontos (veja figura ao lado). Existem exemplos muito piores do que esse. Existem func¸o˜es que sa˜o cont´ınuas em todos os pontos da reta mas na˜o sa˜o difer- encia´veis em nenhum! –1.5 –1 –0.5 0.5 1 1.5 –20 –10 10 20 x Em 1872, o matema´tico alema˜o Weierstrass chocou a comunidade matema´tica com um exemplo deste tipo, apre- sentando a seguinte func¸a˜o: f(x) = ∞∑ n=0 ( 1 2 )n cos(13n pi x) Evidentemente, num curso de Ca´lculo I na˜o e´ poss´ıvel demonstrar a afirmac¸a˜o acima, mas voceˆ pode ter uma ideia geome´trica desta func¸a˜o observando o gra´fico abaixo para n = 15 e deduzindo como seria uma func¸a˜o deste tipo. –1.5 –1 –0.5 0 0.5 1 1.5 2 0.5 1 1.5 2 2.5 3 x 9.5.1 Exerc´ıcios Exerc´ıcio 1 1. Deˆ exemplo de uma func¸a˜o f : R→ R cont´ınua em toda a reta e que na˜o tenha derivada em x = 2. 2. A figura a seguir mostra o gra´fico da derivada de uma func¸a˜o f . Sabendo que f e´ cont´ınua em x = 1, trace um esboc¸o do seu gra´fico. –6 –4 –2 2 x 9.6 Derivadas de ordem superior Vimos nas sec¸o˜es anteriores que, por meio do processo de derivac¸a˜o, e´ poss´ıvel obter, a partir de uma dada func¸a˜o f , uma outra func¸a˜o f ′, a derivada de f , cujo domı´nio pode ser consideravelmente menor do que o domı´nio da func¸a˜o f original. E´ claro que a noc¸a˜o de derivabilidade e o processo de derivac¸a˜o podem ser aplicados a esta nova func¸a˜o f ′, definindo-se, assim, uma outra func¸a˜o (f ′)′, cujo domı´nio consiste de todos os pontos x0 tais que f ′ e´ deriva´vel em x0. A func¸a˜o (f ′)′ e´ denotada, simplesmente por f ′′ (leˆ-se: f duas linhas) e chamada a derivada segunda de f . Se f ′′(x0) existe, enta˜o dizemos que f e´ duas vezes deriva´vel (diferencia´vel) em x0, e o nu´mero f ′′(x0) e´ a derivada segunda de f calculada no ponto x = x0. Da mesma maneira podemos definir a derivada terceira de f como f ′′′ = (f ′′)′, e assim por diante. De uma maneira geral, se k e´ um inteiro positivo, enta˜o f (k) denota a derivada de ordem k de f , que e´ obtida derivando-se f , 136 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o sucessivamente, k vezes. As va´rias func¸o˜es para k ≥ 2 sa˜o, usualmente, chamadas derivadas de ordem superior de f . A`s vezes, e´ conveniente pensar na func¸a˜o original como a derivada de ordem zero e escrever f = f (0). Muitas notac¸o˜es podem ser empregadas para as derivadas de ordem superior de uma func¸a˜o. Usando a notac¸a˜o de operadores escrevemos f ′′(x) = Dx(f ′(x)) = Dx(Dx(f(x))) = Dx2 (f(x)) e, de maneira geral, f (k)(x) = Dx k f(x). Quando na˜o houver possibilidade de du´vidas a respeito da varia´vel independente podemos escrever, simplesmente, f ′′ = D2 f e f (k) = Dk f . Usando a notac¸a˜o de Leibniz escreve-se f ′′(x) = d 2 f(x) dx 2 e, de maneira geral, f (k)(x) = dk f(x) dxk De maneira ana´loga, o Maple denota estas derivadas usando a seguinte notac¸a˜o: f ′′(x) = ∂2 ∂x2 f(x) , f ′′′(x) = ∂3 ∂x3 f(x) . . . Os exemplos a seguir mostram como as derivadas de ordem superior esta˜o relacionadas com a func¸a˜o original. 9.6.1 Exemplos Exemplo 1 Seja f(x) = x2. Enta˜o, e´ fa´cil verificar que f ′(x) = 2x, f ′′(x) = 2 e f (k)(x) = 0, para k ≥ 3. Observando os gra´ficos destas func¸o˜es, trac¸ados a seguir, tente relacionar as principais caracter´ısticas da func¸a˜o original com o comportamento das suas duas primeiras derivadas. 0 1 2 3 4 –2 –1 1 2 x f –4 –2 2 4 –2 –1 1 2 x Derivada de f 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2 2.4 2.6 2.8 3 –2 –1 0 1 2 x Derivada Segunda de f Exemplo 2 Um exemplo mais ilustrativo e´ dado pela func¸a˜o f(x) = { x2 , x > 0 −x2 , x ≤ 0 . E´ fa´cil ver que f ′(x) = { 2x , x > 0 −2x , x < 0 . Ale´m disso, f ′(0) = lim x→0 f(x)− f(0) x = lim x→0 f(x) x . Como lim x→0+ f(x) x = lim x→0+ x2 x = 0 e lim x→0− f(x) x = lim x→0− −x 2 x = 0, enta˜o f ′(0) = 0. Resumindo, f ′(x) = 2 |x |. Veja os gra´ficos de f e f ′, a seguir. –4 –2 2 4 –2 –1 1 2 x 0 1 2 3 4 –2 –1 1 2 x Neste caso, f ′′(x) = { 2 , x > 0 −2 , x < 0 e, como ja´ vimos, na˜o existe f ′′(0). Veja, abaixo, o gra´fico de f ′′. –2 –1 1 2 –2 –1 1 2 x W.Bianchini, A.R.Santos 137 Repare que mesmo func¸o˜es aparentemente “suaves”, como a analisada neste exemplo, revelam um certo tipo de irregularidade quando se examina a sua segunda derivada. Portanto, exigir que uma func¸a˜o seja duas vezes deriva´vel (diferencia´vel) e´ mais restritivo do que exigir, simplesmente, que ela seja deriva´vel. De um modo geral, quando dizemos que uma func¸a˜o e´ “bem comportada” estamos afirmando que tal func¸a˜o e´ pelo menos duas vezes deriva´vel em todos os pontos do seu domı´nio. Exemplo 3: Derivando func¸o˜es com o aux´ılio do Maple Veja como e´ poss´ıvel usar o Maple para calcular as treˆs primeiras derivadas da func¸a˜o f(x) = x4. Primeiro, definimos a func¸a˜o f > f:=x->x^4; f := x→ x4 e a seguir calculamos as suas derivadas: > Diff(f,x)=diff(f(x),x); ∂ ∂x f = 4x 3 > Diff(f,x,x)=diff(f(x),x,x); ∂2 ∂x2 f = 12x 2 > Diff(f,x,x,x)=diff(f(x),x,x,x); ∂3 ∂x3 f = 24x ou, equivalentemente: > Diff(f,x$3)=diff(f(x),x$3); ∂3 ∂x3 f = 24x Observe agora como podemos definir as treˆs primeiras func¸o˜es derivadas de f usando o Maple: > D(f); x→ 4x3 > D(D(f)); x→ 12x2 > (D@@2)(f); x→ 12x2 > (D@@2)(f)(x); 12x2 9.6.2 Exerc´ıcios 1. Ache f ′′(x) se: (a) f(x) = x3 (b) f(x) = x5 (c) f ′(x) = x4 (d) f(x+ 3) = x5 2. Seja f(x) = { x3 , x ≥ 0 −x3 , x < 0 . Calcule f ′(x) e f ′′(x). Existe f ′′′(x), para todo x? 9.7 Atividades de laborato´rio Usando um computador e o Maple, fac¸a as atividades propostas no arquivo labder.mws da versa˜o eletroˆnica deste texto. 138 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o 9.8 Exerc´ıcios adicionais 1. Considere o gra´fico da func¸a˜o y = f(x): x5x4x3x2x1 (a) Se f ′(x1) = a, quanto vale f ′(x2)? (b) Existe f ′(x3)? Justifique geometricamente sua resposta. (c) Qual o sinal de f ′(x4) e de f ′(x5)? Justifique geometricamente sua resposta. 2. Nos exerc´ıcios abaixo, supondo-se conhecido o valor de f ′(x0), calcule f ′(−x0) se: (a) f e´ uma func¸a˜o ı´mpar, isto e´, f(x) = −f(−x) em todos os pontos do seu domı´nio. (b) f e´ uma func¸a˜o par, isto e´, f(x) = f(−x) em todos os pontos do seu domı´nio. (c) Prove que, se f e´ uma func¸a˜oı´mpar, enta˜o f ′(x) e´ par. (d) Prove que, se f e´ uma func¸a˜o par, enta˜o f ′(x) e´ ı´mpar. (e) Se f e´ par, o que se pode afirmar a respeito de f ′′ ? E se f e´ ı´mpar? (f) Ilustre estes fatos usando func¸o˜es polinomiais. 3. Em cada um dos itens a seguir, encontre a inclinac¸a˜o da reta tangente ao gra´fico de y = f(x) no ponto (x1, y1). Escreva a equac¸a˜o da reta tangente ao gra´fico da func¸a˜o nesse ponto. Ache os pontos onde o gra´fico tem uma tangente horizontal. (a) y = 9− x2 (b) y = x24 (c) y = √ x+ 1 4. (a) Mostre que os gra´ficos das equac¸o˜es y = 3x2 e y = 2x3 + 1 teˆm a mesma tangente no ponto (1, 3). (b) Encontre as equac¸o˜es das retas que passam pelo ponto (3,−2) e sa˜o tangentes a` curva y = x2 − 7. (c) Ache duas retas que passam pelo ponto (2, 8) que sejam tangentes a` curva y = x3 . 5. Em cada um dos itens abaixo, encontre os valores de α e β para que exista f ′(1). (a) f(x) = { x2 , x < 1 αx+ β , x ≥ 1 (b) f(x) = { αx2 + β , x ≤ 1 1 | x | , x > 1 6. Em cada um dos itens abaixo: (a) Determine se f e´ cont´ınua em x1. (b) Encontre as derivadas laterais de f no ponto x1, se existirem. (c) Decida se f e´ diferencia´vel em x1. i. f(x) = {√ 1− x , x < 1 (1− x)2 , x ≥ 1 , x1 = 1 ii. f(x) = 1 + |x+ 2 |, x1 = 2 iii. f(x) = { 1 (x+1)2 , x 6= −1 1 , x = −1 , x1 = −1 iv. f(x) = { x2−1 | 1−x | , x 6= 1 2 , x = 1 , x1 = 1 v. f(x) = √ x , x ≤ 25 x2 500 + 75 20 , x ≥ 25 10x+ 75 , x > 50 , x1 = 25 e x1 = 50 7. Seja f(x) = { xn , x ≥ 0 0 , x ≤ 0 . Prove que f (n) existe para todo n e para todo x 6= 0 (ache uma fo´rmula para estas derivadas). W.Bianchini, A.R.Santos 139 9.9 Problemas propostos 1. Com os conhecimentos obtidos nesse cap´ıtulo, voceˆ e´ capaz de resolver completamente o problema da caixa, proposto na sec¸a˜o Motivac¸a˜o do Cap. 4? Isto e´, qual o tamanho do corte que se deve fazer nos cantos de uma folha de pla´stico quadrada de 20 cm de lado, de modo a formar uma caixa sem tampa que contenha o maior volume de a´gua poss´ıvel quando completamente cheia? Sugesta˜o: Nessa mesma sec¸a˜o do Cap. 4 vimos que, para resolver esse problema, era necessa´rio encontrar o valor do corte x, entre 0 e 10, para o qual a func¸a˜o V = x (20− 2x)2 atinge o seu valor ma´ximo. Caracterize geometricamente esses pontos. Use a definic¸a˜o de derivada e a caracterizac¸a˜o geome´trica desses pontos para resolver esse problema. 2. Suponha que a reta L e´ tangente a` curva y = f(x) no ponto (1, 1) como indicado na figura. y=f(x) L Sabendo que a reta L corta o eixo x no ponto (3, 0), ache f(1) e f ′(1). 3. A curva a seguir representa a derivada de uma func¸a˜o y = f(x). –1 –0.8 –0.6 –0.4 –0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 1 2 3 4 5 6 7 x (a) Esboce a curva y = f(x) a partir do ponto x = pi, onde a func¸a˜o vale zero. (b) Qual o aˆngulo de intersec¸a˜o da curva y = f(x) com o eixo y? (c) Qual o aˆngulo de intersec¸a˜o da curva com o eixo x, em x = pi? 4. (a) Ache a equac¸a˜o da reta tangente a` curva y = x4 − 2x2 − x no ponto (1,−2). (b) Verifique que a reta obtida no item anterior tangencia a curva em outro ponto e ache este ponto. 5. (a) Determine o valor de k, sabendo que a reta 3x− 4 y = 0 e´ tangente a` curva y = x3 + k, definida para x > 0. (b) Ache uma equac¸a˜o da reta que passa pelo ponto (1, 5) e e´ tangente a` curva y = x3. (c) Ache duas retas passando pelo ponto (2, 8) que sejam tangentes a` curva y = x3. (d) Determine as constantes a, b, c, e d para que a curva y = a x3 + b x2 + c x+ d tenha tangentes horizontais nos pontos (0, 1) e (1, 0). (e) Prove que a curva y = x5 + 2x na˜o tem tangentes horizontais. Qual e´ o menor coeficiente angular que uma reta tangente a esta curva pode ter? (f) Ache a declividade ma´xima do gra´fico de y = −x3 + 3x2 + 9x− 27. (g) Seja f(x) = x3 − x2 − 4x+ 4. O ponto (a,b) pertence ao gra´fico de f e a reta tangente ao gra´fico de f em (a,b) passa pelo ponto (0,−8) que na˜o esta´ no gra´fico de f . Ache o valor de a e b. 6. (a) Considere func¸a˜o g(x) = { x sen( 1x ) , x 6= 0 0 , x = 0 . Observe que | g(x) | ≤ x, para todo x. Esta func¸a˜o e´ difer- encia´vel no zero? –0.4 –0.2 0.2 0.4 –0.4 –0.2 0.2 0.4x 140 Cap. 9. A Derivada de uma Func¸a˜o (b) A seguir trac¸amos o gra´fico de uma func¸a˜o g(x) = { x2 sin( 1x ) , x 6= 0 0 , x = 0 . Observe que | g(x) | ≤ x2, para todo x. –0.2 –0.1 0.1 0.2 –0.4 –0.2 0.2 0.4x i. Prove que g′(0) = 0 e que o mesmo acontece para toda func¸a˜o com a propriedade acima. ii. Verifique que g′(x) na˜o tem limite quando x tende a zero. (Os dois exerc´ıcios acima mostram que quando calculamos a derivada g′(x) de uma func¸a˜o g em um ponto qualquer x, o ca´lculo de g′(x0) so´ e´ poss´ıvel se a derivada g′ for cont´ınua em x0). iii. As func¸o˜es f(x) = x |x|, g(x) = x2 |x|, h(x) = x3 |x| possuem derivada no ponto zero? Em caso afir- mativo, quanto vale a derivada neste ponto? 7. Utilize o gra´fico de dydx = f ′(x) = (x− 1) (x− 2)2 (x− 3)3 a seguir para esboc¸ar o gra´fico de y = f(x). –1 –0.8 –0.6 –0.4 –0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 y 1 2 3 4 5x 8. (a) Seja P um ponto da curva y = x3 e suponha que a reta tangente a` curva em P intercepte-a novamente em Q. Mostre que a inclinac¸a˜o da reta tangente em Q e´ quatro vezes a inclinac¸a˜o da reta tangente em P . (b) Encontre os pontos P e Q na para´bola y = 1− x2, tais que o triaˆngulo ABC formado pelo eixo x e pelas retas tangentes ao gra´fico em P e Q seja equila´tero. (c) Considere a para´bola y = x2 e um ponto x0 6= 0 no eixo das abscissas. Por x0, trac¸a-se uma paralela ao eixo das ordenadas, que ao interceptar a para´bola, determina Q0. Por Q0 trac¸a-se a reta normal a` para´bola cuja intersec¸a˜o com o eixo das ordenadas determina P0. Este procedimento define uma func¸a˜o f que a cada x0 6= 0 associa P0 = f(x0). Determine, se existir, a posic¸a˜o limite de P0 quando x0 → 0 tende a zero. 9.10 Para voceˆ meditar: Um sofisma Sabemos (sec¸a˜o Diferenciabilidade e Continuidade) que se uma func¸a˜o y = f(x) e´ diferencia´vel em um ponto x0, enta˜o e´ necessariamente cont´ınua neste ponto. No entanto, a interpretac¸a˜o geome´trica de derivada parece nos levar ao paradoxo descrito a seguir. O gra´fico a seguir mostra uma func¸a˜o cont´ınua com a sua reta tangente no ponto de abscissa x0. x o 0 10 20 30 1 2 3 4 5 6 7 8 Na˜o existe nenhuma du´vida quanto ao fato de a curva ser diferencia´vel em x0. Considere, agora, uma nova func¸a˜o f(x) obtida a partir da func¸a˜o anterior “cortando-se” a curva dada no ponto x0 e transladando-se para cima “a parte da direita do seu gra´fico”. 0 10 20 30 40 50 1 2 3 4 5 6 7 8 x W.Bianchini, A.R.Santos 141 “Por construc¸a˜o, vemos que, no ponto de abscissa x0, a declividade da tangente ao arco de curva a` esquerda (derivada lateral a` esquerda) e´ igual a declividade da tangente ao arco de curva a` direita (derivada lateral a` direita). Portanto, o caso acima e´ um exemplo de uma func¸a˜o deriva´vel em x0 e, evidentemente, descont´ınua neste ponto, o que contradiz o teorema citado!” - Mostre onde esta´ o erro no racioc´ınio acima, reafirmando, assim, a veracidade do teorema. 9.11 Um pouco de histo´ria: Curvas sem tangentes e Movimento Brow- niano Vimos, na sec¸a˜o Diferenciabilidade e Continuidade, que existem curvas cont´ınuas sem derivada em nenhum ponto, ou seja, func¸o˜es cont´ınuas cujos gra´ficos na˜o teˆm tangente em nenhum ponto. Va´rios matema´ticos, dentre eles Bolzano (1781-1849) e Weierstrass (1815-1897), constru´ıram func¸o˜es deste tipo. O exemplo que atraiu mais atenc¸a˜o foi o que Weierstrass apresentou a` Academia de Berlim em 1872. Embora a ide´ia geome´trica da construc¸a˜o de tais func¸o˜es possa parecer simples (trata-se de obter, por um processo de limite,uma func¸a˜o cujo gra´fico seja composto somente por pontos angulosos!), a construc¸a˜o anal´ıtica de uma func¸a˜o com esta propriedade e´ um processo muito delicado, que na˜o cabe fazer num curso de Ca´lculo. A ide´ia de curva cont´ınua sem tangente na˜o condiz com a nossa intuic¸a˜o geome´trica. Seria de esperar que tais curvas na˜o passassem de exemplos matema´ticos, sem aplicac¸o˜es no mundo f´ısico. No entanto, acontece o contra´rio! Existe na natureza um tipo importante de movimento, chamado movimento Browniano, cuja trajeto´ria e´ uma curva cont´ınua sem tangente. Em 1827, um botaˆnico escoceˆs chamado Robert Brown (1773-1858), investigando o processo de polinizac¸a˜o numa certa espe´cie de flor, observou no microsco´pio um ra´pido movimento desordenado de part´ıculas em suspensa˜o num meio fluido. Os f´ısicos so´ comec¸aram a estudar este movimento muito mais tarde, sem resultados significativos, ate´ que, em 1905, Albert Einstein, num estudo memora´vel sobre o efeito fotoele´trico, lanc¸ou a ide´ia deste movimento ser devido a` agitac¸a˜o te´rmica das part´ıculas. Nesta e´poca, as ide´ias de a´tomos e mole´culas eram mais usadas pelos f´ısicos como um meio de explicar determinados fenoˆmenos e muito pouco como part´ıculas com existeˆncia real. Einstein procurou deduzir consequ¨eˆncias que pudessem ser verificadas experimentalmente, o que confirmaria a existeˆncia dessas part´ıculas atoˆmicas. Procedendo deste modo e considerando que part´ıculas em suspensa˜o num fluido sofrem o impacto de inu´meras mole´culas a` sua volta, Einstein foi levado a prever um movimento desordenado das part´ıculas, o chamado movimento Browniano. E´ curioso notar que Einstein descobriu esse fenoˆmeno num estudo puramente teo´rico, so´ vindo a conhecer os estudos anteriores sobre este movimento depois de ter terminado suas investigac¸o˜es. Na de´cada de 1920, o matema´tico americano Nobert Wiener (1894-1964) iniciou uma teoria matema´tica sobre o movimento Browniano, dando uma interpretac¸a˜o precisa de “movimento ao acaso” de uma part´ıcula. Neste trabalho, ele demonstrou que a trajeto´ria de uma part´ıcula em suspensa˜o num fluido e´ uma curva cont´ınua sem tangente em nenhum ponto. Isto acontece porque a part´ıcula, a cada instante, esta´ recebendo o impacto desordenado das mole´culas do fluido, de maneira que, em seu movimento, muda continuamente de direc¸a˜o, na˜o possuindo velocidade instaˆntanea definida em nenhum ponto.
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