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GRUPO DE ECOSSISTEMAS: 
 
MANGUEZAL, MARISMA E APICUM 
 
 
 
 
YARA SCHAEFFER-NOVELLI 
Consultora 
 
 
 
 
São Paulo, Brasil 
 
 2
SITUAÇÃO ATUAL DO GRUPO DE ECOSSISTEMAS: 
“MANGUEZAL, MARISMA E APICUM” 
INCLUINDO OS PRINCIPAIS VETORES DE PRESSÃO E 
AS PERSPECTIVAS PARA SUA CONSERVAÇÃO E USOS SUSTENTÁVEL 
 
 
 
Yara Schaeffer-Novelli 
 
 
CONTEÚDO 
 
 
RESUMO 
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
1.0 INTRODUÇÃO....................................................................................08 
1.1. Descrição geral do grupo de ecossistemas 
1.2. Identificação das principais unidades físico-ambientais com 
ocorrências significativas 
1.3. Tendências sócio-econômicas 
1.4. Políticas públicas e legislação que afetam o grupo de ecossistemas 
1.5. Aspectos gerais do esforço conservacionista 
 
2.0. RESULTADOS....................................................................................18 
2.1. Características gerais das unidades físico-ambientais e importância 
ecológica da região 
2.2. Avaliação do conhecimento da diversidade biológica para o grupo de 
ecossistemas 
2.3. Conhecimento da diversidade biológica 
2.4. Aplicabilidade da informação existente, visando a gestão da 
diversidade biológica 
2.5. Listagem com dados existentes de diversidade/riqueza de espécies 
2.6. Intensidade de utilização da diversidade biológica para o grupo de 
ecossistemas 
2.7. Vetores de pressão sobre a diversidade 
2.8. Impactos de origem natural 
2.9. Pressões antrópicas gerais da unidade físico-ambiental e para o 
grupo de ecossistemas 
 2.9.1. Derivadas do uso direto 
 2.9.2. Derivadas do uso indireto 
 
3.0 – ANÁLISE DOS RESULTADOS.........................................................38 
3.1. Tendências sócio-econômicas e políticas públicas 
3.2. Tendências sócio-econômicas 
3.3. Políticas públicas que influem na diversidade biológica, na unidade 
físico-ambiental 
3.4. Esforço conservacionista 
3.5. Dispositivos legais de conservação 
 3
3.6. Existência e avaliação de programas de educação ambiental e/ou de 
informação pública 
3.7. Grau de comprometimento do ecossistema manguezal na costa 
brasileira 
3.8. Espécies mais vulneráveis aos processos de degradação em curso 
 
4.0 – RECOMENDAÇÕES.........................................................................42 
4.1. Recomendações de projetos prioritários para pesquisa, conservação 
e uso sustentável 
4.2. Recomendações de áreas prioritárias para inventário biológico 
4.3. Recomendações para a conservação do grupo de ecossistemas na 
unidade físico-ambiental 
4.4. Recomendações relativas ao uso sustentável e à repartição eqüitativa 
dos produtos da diversidade biológica 
4.5. Recomendações relativas a políticas públicas em nível nacional, 
regional e local 
 
5.0 - SÍNTESE DAS RECOMENDAÇÕES.................................................52 
 
6.0 - BIBLIOGRAFIA.................................................................................57 
 
7.0 - GLOSSÁRIO DE TERMOS..............................................................61 
 
8.0 - ACRÔNIMOS....................................................................................65 
 
ANEXO, FIGURAS E TABELAS...............................................................66 
 4
Anexo, Figuras e Tabelas 
 
Anexo - Carta de Santos em Defesa dos Manguezais 
 
Figura I – Unidades fisiográficas e complexos de manguezais na América 
Latina e no Caribe, segundo Olson et al. (1996), figura 1. 
 
Figura II – Localização das figuras 3 e 4, onde aparecem assinalados os 
manguezais mais extensos da América Latina e no Caribe, 
segundo Olson et al. (1996), figura 2. 
 
Figura III – Manguezais mais extensos da costa Atlântica do sudeste da 
América do Sul, segundo Olson et al. (1996), figura 7. 
 
Figura IV – Manguezais mais extensos da costa Atlântica do nordeste da 
América do Sul, segundo Olson et al. (1996), figura 8. 
 
Figura V – Síntese do estado dos manguezais na América Latina e no Caribe, 
segundo Olson et al. (1996), figura 13. 
 
Figura VI – Nível de ameaças sobre os manguezais na América Latina e no 
Caribe, segundo Olson et al. (1996), figura 14. 
 
Figura VII – Estado de conservação das diversas unidades fisiográficas dos 
manguezais na América Latina e no Caribe, segundo Olson et al. 
(1996), figura 15. 
 
Figura VIII – Atividades conservacionistas sugeridas para os manguezais das 
diferentes unidades fisiográficas da América Latina e no Caribe, 
segundo Olson et al. (1996), figura 16. 
 
Figura IX – Unidades fisiográficas com manguezais, identificadas como de 
maior prioridade para adoção de medidas de conservação, 
segundo Olson et al. (1996), figura 17. 
 
Tabela I - Unidades físico-ambientais, segundo critérios adotados pela 
Coordenação Nacional da “Zona Costeira”, e sua correspondência 
com as unidades fisiográficas de Schaeffer-Novelli et al. (1990). 
 
Tabela II – Legislação ambiental brasileira incidente sobre o manguezal 
(organização: Yara Schaeffer Novelli). 
 
Tabela III – Lista de espécies para o grupo de ecossistemas: manguezal, 
marisma e apicum, por unidade físico-natural, organizada pela 
consultora do grupo de ecossistemas. 
 
Tabela IV – Lista de espécies de peixes associadas ao ecossistema 
manguezal, retira de Cintrón & Schaeffer-Novelli (1983). 
 
 5
Tabela V – Diagnóstico da situação atual dos manguezais no Estados do 
Nordeste, retirado de CPRH (1991). 
 
Tabela VI – Graus de comprometimento da biodiversidade para o grupo de 
ecossistemas: manguezal, marisma e apicum, segundo critérios 
sugeridos pela Coordenação Nacional da “Zona Costeira” e 
aqueles adotados por Dinerstein et al. (1995) e Olson et al. (1996). 
 
 6
SITUAÇÃO ATUAL DO GRUPO DE ECOSSISTEMAS: 
“MANGUEZAL, MARISMA E APICUM” 
INCLUINDO OS PRINCIPAIS VETORES DE PRESSÃO E AS PERSPECTIVAS PARA 
SUA CONSERVAÇÃO E USOS SUSTENTÁVEL 
 
Yara Schaeffer-Novelli 
novelliy@usp.br 
 
RESUMO 
 
Manguezais e marismas encontram-se distribuídos ao longo de 
praticamente todo litoral brasileiro. Os manguezais dominam a zona tropical 
enquanto as marismas constituem o ecossistema homólogo para a zona 
temperada. Os apicuns associam-se aos manguezais, formando na realidade 
um estádio sucessional natural do ecossistema. Tanto manguezal como 
marisma são ecossistemas complexos, altamente resilientes e resistentes. 
Manguezais são inquestionavelmente considerados como um dos 
ecossistemas mais produtivos do planeta. 
Os ecossistemas manguezal, marisma e apicum encontram-se entre as 
zonas úmidas de importância internacional no contexto da Convenção de 
Ramsar (1971). A situação atual desse grupo de ecossistemas e as 
considerações sobre os principais vetores de pressões e perspectivas de 
conservação e uso sustentável são analisadas sob a égide das oito unidades 
fisiográficas descritas por Schaeffer-Novelli et al. (1990), equiparadas aos 46 
compartimentos físico-ambientais adotados pelo Sub-projeto “Biodiversidade 
da Zona Costeira e Marinha do Brasil” e as classificações e categorizações 
segundo Dinerstein et al. (1995) e Olson et al. (1996). 
Coletânea dos diplomas legais com incidência sobre o ecossistema 
manguezal é comentada no texto e apresentada como anexo, da mesma forma 
que a tabulação das informações sobre o diagnóstico da situação atual dos 
manguezais dos estados do Nordeste e a listagem das espécies típicas e 
associadas ao grupo de ecossistemas aqui tratados, entre elas aquelas 
enquadradas nas diferentes categorias de conservação (ameaçadas, 
vulneráveis, raras). 
Com a elaboração dessas tabulações e listagens torna-se clara a falta de 
conhecimento sobre o número total das espécies de toda Zona Costeira 
Brasileira, das funções desempenhadas pelos diversos ecossistemas, assim 
como dos respectivosestados de conservação das espécies. 
São discutidos os tensores mais comuns que incidem sobre o grupo de 
ecossistemas e suas conseqüências. 
O relatório é finalizado com recomendações de projetos prioritários para 
pesquisa, conservação, restauração, inventários biológicos, monitoramento 
ambiental e políticas públicas para o grupo de ecossistemas manguezal, 
marisma e apicum. 
Como um item a parte, oferta-se glossário com os principais termos 
técnicos empregados no corpo do relatório. 
 7
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
O presente diagnóstico da situação atual do grupo de ecossistemas 
manguezal, marisma e apicum, fundamentou-se em alguns documentos 
considerados como de referência obrigatória (Schaeffer-Novelli, 1989; 
Schaeffer-Novelli et al., 1990; CIMA, 1991; CPRH, 1991; Schaeffer-Novelli, 
1994; Dinerstein et al., 1995; Olson et al., 1996; CNIO, 1998). Trechos foram 
transcritos, procurando-se alterar o mínimo possível dos respectivos conteúdos 
quando da edição do documento final. Além destes e dos demais documentos 
citados quando do atendimento aos quesitos apresentados pela Coordenação 
Geral do Sub-Projeto Biodiversidade da Zona Costeira e Marinha, merecem 
especial referência os nomes de profissionais que contribuíram decisivamente 
ao nosso entendimento dos ecossistemas costeiros brasileiros, são eles, por 
ordem alfabética: Andrea Spörl, Claudia Câmara do Vale, Clemente Coelho 
Junior, Cristiane Spörl, Marcos Souto Alves, Marília Cunha Lignon, Mário Luiz 
Gomes Soares e Paula Maria Gênova de Castro, pós-graduandos da 
Universidade de São Paulo. Especial agradecimento a bióloga Sarah Andrade 
Santos, pelo auxílio na elaboração da lista de espécies apresentada no 
relatório. 
 
 
1.0 – INTRODUÇÃO 
 
1.1. Descrição geral do grupo de ecossistemas 
 
O litoral brasileiro tem uma extensão de 7.408 km, diversificando-se entre 
a desembocadura do Rio Oiapoque (04o52’45”N) e o Arroio Chuí (33o45’10”S) 
com uma gama de ecossistemas, que varia entre campos de dunas, ilhas, 
recifes, costões rochosos, baías, estuários, brejos, falésias e baixios. Muitos 
deles, como praias, restingas, lagunas e manguezais, embora tenham 
ocorrência constante, apresentam tal variedade biótica que a aparente 
homogeneidade em suas fácies ecológicas apenas oculta especificidades 
florísticas e faunísticas vinculadas às gêneses diferenciadas dos ambientes em 
tão longo trecho litorâneo (CIMA, 1991). 
 
As terras brasileiras são pouco elevadas, distribuindo-se em 41 % de 
terras baixas, de 0 a 200m, 58,5 % de terras altas, de 200 a 1.200m e 0,5 % de 
áreas culminantes, com mais de 1.200m de elevação sobre o nível do mar. O 
país é banhado pelo Oceano Atlântico ao longo de uma linha costeira de 7.408 
km, e faz limites com dez países ao longo de uma linha divisória de 15.719 km 
(CIMA, 1991). 
 
Os ecossistemas manguezal e marisma geralmente estão associados às 
margens de baías, enseadas, barras, desembocaduras de rios, lagunas e 
reentrâncias costeiras, onde haja encontro de águas de rios com a do mar, ou 
diretamente expostos à linha da costa. São sistemas funcionalmente 
complexos, altamente resilientes e resistentes e, portanto, estáveis. A 
cobertura vegetal, ao contrário do que acontece nas praias arenosas e nas 
dunas, se instala em substratos de vasa de formação recente, de pequena 
 8
declividade, sob a ação diária das marés de água salgada ou, pelo menos, 
salobra. 
 
A zona do apicum, segundo Bigarella (1947), faz parte da sucessão 
natural do manguezal para outras comunidades vegetais, sendo resultado da 
deposição de areias finas por ocasião da preamar. Manguezais são, 
geralmente, sistemas jovens uma vez que a dinâmica das marés nas áreas 
onde se localizam produz constante modificação na topografia desses terrenos, 
resultando numa seqüência de avanços e recuos da cobertura vegetal. 
 
A riqueza biológica dos ecossistemas costeiros, faz com que essas áreas 
sejam os grandes “berçários” naturais, tanto para as espécies características 
desses ambientes, como para peixes anádromos e catádromos e outros 
animais que migram para as áreas costeiras durante, pelo menos, uma fase do 
ciclo de vida. 
 
A fauna e a flora de áreas litorâneas, representam significativa fonte de 
alimentos para as populações humanas. Os estoques de peixes, moluscos e 
crustáceos apresentam expressiva biomassa, constituindo excelentes fontes de 
proteína animal de alto valor nutricional. Os recursos pesqueiros são 
considerados como indispensáveis à subsistência das populações tradicionais 
da zona costeira, além de alcançarem altos preços no mercado internacional, 
caracterizando-se como importante fonte de divisas para o País. 
 
MANGUEZAL - sistema ecológico costeiro tropical, dominado por espécies 
vegetais típicas, às quais se associam outros componentes da flora e da fauna, 
microscópicos e macroscópicos, adaptados a um substrato periodicamente 
inundado pelas marés, com grandes variações de salinidade. Os limites 
verticais do manguezal, no médio litoral, são estabelecidos pelo nível médio 
das preamares de quadratura e pelo nível das preamares de sizígia (Maciel, 
1991). 
 
MARISMAS - são comunidades dominadas principalmente por vegetação 
herbácea perene ou “anual”, podendo estar ainda associada a alguns arbustos, 
contrastando com o manguezal que é dominado por espécies vegetais 
arbóreas (Costa & Davy, 1992). 
 
Nas latitudes tropicais marismas e manguezais podem coexistir, tanto em 
ambientes naturais quanto nos modificados pelo homem. A maioria das 
marismas é dominada por poucas ou por uma única espécie, servindo esta 
característica para denominar cada uma das comunidades. As espécies 
vegetais das marismas suportam temperaturas do ar e da água bem inferiores 
às suportadas pelas plantas típicas do manguezal, principalmente quando se 
trata de geadas, ou de temperaturas abaixo de 0oC e, da elevada freqüência de 
recorrência desses eventos (Costa & Davy, op. cit.). 
 
As espécies vegetais das marismas dominam a zona costeira do 
entremarés das regiões temperadas, enquanto que nos trópicos e subtrópicos 
elas tendem a se comportar como pioneiras, colonizando terrenos recém-
depositados e pouco consolidados, ou onde as taxas de evapotranspiração são 
 9
elevadas demais para as plantas de mangue. Marismas ocorrem, na América 
Latina, entre as latitudes de 32oN aos 52oS (Costa & Davy, 1992). 
 
APICUM - salgado, ecótono, zona de transição, areal, são denominações 
utilizadas para designar uma zona de solo geralmente arenoso, ensolarada, 
desprovida de cobertura vegetal ou abrigando uma vegetação herbácea. 
Aparentemente desprovida de fauna, ou seja, praticamente um deserto, apesar 
de estar cercada por um ecossistema pululante de vida – o manguezal 
(Nascimento, 1993). 
 
 
 
O apicum como parte do ecossistema manguezal 
 
Apicum ou salgado, ocorre na porção mais interna do manguezal, na 
interface médio/supra litoral, raramente em pleno interior do bosque. Seu limite 
é estabelecido pelo nível médio das preamares de sizígia e o nível das 
preamares equinociais (Maciel, 1991). 
 
Amostras de sedimento coletadas por Nascimento (1993), ao longo de 
uma transversal da linha d’água até o apicum, apresentaram os seguintes 
resultados para o teor de matéria orgânica: 
 
¾ na superfície, há um decréscimo em direção ao apicum, à 20 e aos 40cm de 
profundidade; 
¾ a partir dos 60 cm de profundidade, as concentrações de matéria orgânica 
no apicum foram mais elevadas que aquelas da superfície do manguezal. 
Na estação chuvosa ocorre uma inversão em relação à estação seca; 
¾ as camadas inferiores do sedimento do apicum são tipicamente de 
manguezal, inclusive com restos de material botânico e valvas de ostras, 
denotando claramente sua origem à partir de um bosque de mangue 
assoreado naturalmente,caracterizando o apicum como área sucessional. 
 
A salinidade influencia a distribuição dos organismos no apicum, atuando 
como fator limitante (Nascimento, op. cit.). A salinidade intersticial, nos meses 
de verão (estação seca), apresentou valores crescentes da margem do rio para 
o apicum, ocorrendo o inverso no inverno (estação chuvosa), enquanto no 
manguezal foi mantido o equilíbrio da salinidade, registrando-se um decréscimo 
acentuado desses valores no apicum. 
 
Ao revolver constantemente o sedimento das galerias no inverno, os 
caranguejos Uca como outros animais escavadores estão enriquecendo a 
superfície com nutrientes retirados das camadas mais inferiores da vasa, 
desempenhando função vital na ecologia do manguezal. Esses nutrientes são 
carreados pelas águas da chuva para o manguezal, contribuindo para o 
equilíbrio orgânico-mineral do ecossistema (Nascimento, 1993). 
 
Esses resultados caracterizam a região do apicum como um reservatório 
de nutrientes, no contexto do ecossistema manguezal, mantendo em equilíbrio 
os níveis de salinidade e a constância da mineralomassa (Nascimento, op. cit.). 
 10
 
 
1.2. Identificação das principais unidades físico-ambientais com 
ocorrências significativas 
 
O Brasil é o segundo país em extensão na América Latina, ocupando 
gradiente latitudinal que vai dos 04o52’45” N aos 33o45’10” S e uma superfície 
de 8.511.996 km2, possuindo a maior extensão de zonas úmidas do continente. 
Para efeitos da Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional 
(Ramsar, 1971), da qual o Brasil é signatário, as zonas úmidas são áreas de 
pântanos, charco, turfa ou água, natural ou artificial, permanente ou temporária, 
com água estagnada ou corrente, doce, salobra ou salgada, incluindo áreas de 
água marítima com menos de seis metros de profundidade na maré baixa (art. 
1o, Convenção de Ramsar, 1971). 
 
Todos os manguezais da América Tropical, na qualidade de zonas 
úmidas, são reconhecidos como “ecossistema-chave”, cuja preservação é 
crítica para o funcionamento de outros ecossistemas maiores e mais diversos 
que se estendem além dos limites de um bosque de mangue (Dinerstein et al., 
1995). Os manguezais da América Latina e do Caribe estão compreendidos 
dentro de unidades/segmentos, segundo classificação aprovada por estudos 
desenvolvidos pelo Banco Mundial, com apoio do Fundo Mundial para a 
Natureza – WWF (Dinerstein et al., op. cit.). Cada segmento ou unidade 
corresponde a uma divisão da costa com condições ambientais e fisiográficas 
comparáveis, caracterizado por formas de relevo e por processos específicos. 
 
Esse critério, adotado pelo Banco Mundial em sua publicação sobre a 
avaliação do estado de conservação das eco-regiões terrestres da América 
Latina e do Caribe (Dinerstein et al., 1995), proporciona uma visão bio-regional 
com grande potencial para identificar prioridades de conservação e estratégias 
para o manejo dos manguezais. Cada um desses segmentos de manguezal: 
(a) ocupa um determinado lugar no contexto do relevo, típico de cada regime 
energético; (b) desenvolve sistemas com produtos e características similares 
(níveis de desenvolvimento e produtividade); (c) exibe vulnerabilidade e 
respostas similares às perturbações; e (d) são igualmente sensíveis a um 
determinado tipo de atividades de conservação. 
 
O enfoque adotado pelo Banco Mundial – BIRD (Dinerstein et al., 1995), 
havia sido empregado anteriormente por Schaeffer-Novelli et al. (1990) para 
caracterizar os ambientes de manguezal do litoral brasileiro. 
 
Para essa compartimentação foram selecionadas algumas variáveis que 
caracterizam o sistema de forças atuantes sobre o litoral, modelando sua 
fisiografia. Assim, associando-se as feições do litoral (relevo, tipo de 
sedimento, cobertura vegetal) aos valores das temperaturas médias anuais, 
evapotranspiração potencial, amplitude de marés médias e de sizígia, foi 
possível identificar oito unidades do litoral para o Brasil (Schaeffer-Novelli, 
1989). 
 
 11
Manguezais e apicuns são encontrados ao longo de praticamente toda a 
costa, do Cabo Orange (04o52’N) até Laguna (28o30’S), enquanto que as 
ocorrências das marismas passam a ser mais significativas a partir dos 25oS 
em direção às mais altas latitudes. 
 
Dos 46 (quarenta e seis) compartimentos que integram as unidades físico-
ambientais (Tabela I), a ocorrência de manguezais e apicuns é registrada da 
Foz do Rio Oiapoque (Região Norte) à Divisa Laguna/Jaguaruna (Região Sul). 
As marismas dominam a paisagem nas unidades que vão da Juréia (Região 
Sudeste) até o Chuí (Região Sul). 
 
No presente diagnóstico, no tocante ao grupo de ecossistemas: 
manguezal, marisma e apicum, serão adotados tanto no contexto das 
“unidades físicas” do litoral (itens 1.2., 2.1.) como em termos dos “graus de 
conservação / comprometimento” (item 3.8), os conceitos empregados nos 
trabalhos de Schaeffer-Novelli et al. (1990), Dinerstein et al. (1995) e Olson et 
al. (1996). Em workshop realizado na sede do Fundo Mundial para a Natureza 
– WWF sobre “Conservation assessment for Mangrove Ecosystems of Latin 
America and the Caribbean” (Washington, D.C., 2 – 4 de dezembro de 1994), 
esses conceitos foram amplamente discutidos por um grupo de especialistas, 
não sendo considerado oportuno alterá-los principalmente diante da 
coincidência de objetivos entre aquele workshop e o Programa Nacional da 
Biodiversidade no qual se insere a presente contribuição. 
 
 
1.3. Tendências sócio-econômicas 
 
O manguezal pode ser tratado como um recurso renovável, porém finito, 
quando se considera a produção natural de mel, ostras, caranguejos, 
camarões, siris e mariscos, além das oportunidades recreacionais, científicas e 
educacionais. Por outro lado, o manguezal também pode ser considerado 
como um recurso não-renovável, quando o espaço que ele ocupa é substituído 
por prédios, atracadouros, residências, portos, marinas, aeroportos, rodovias, 
salinas, aqüicultura, etc. Há ainda, entre estas duas categorias outras, que 
condenam os manguezais a receptáculos de despejos de efluentes líquidos, 
disposição de resíduos sólidos ou ao extrativismo de produtos florestais 
(Maciel, 1991). 
 
 
1.4. Políticas públicas e legislação que afetam o grupo de ecossistemas 
 
O manguezal, ecossistema bem representado ao longo do litoral 
brasileiro, encontra-se associado a estuários, baías e lagunas, ou diretamente 
exposto na linha de costa, é considerado no Brasil como de preservação 
permanente, incluído em diversos dispositivos constitucionais (Constituição 
Federal e Constituições Estaduais) e infra-constitucionais (leis, decretos, 
resoluções, convenções). A observação desses instrumentos legais impõe uma 
série de ordenações do uso e/ou de ações em áreas de manguezal (Schaeffer-
Novelli, 1994). 
 
 12
O apicum, de acordo com sua gênese, pode muito bem ser considerado 
como parte do manguezal também no que tange a aplicação da legislação, 
uma vez que em alguns documentos legais já se encontra a expressão 
“manguezal, em toda a sua extensão”, reconhecendo os diferentes 
compartimentos como parte do ecossistema. 
 
Encontra-se, em anexo, lista com elementos da legislação federal, 
mencionando também documentos de caráter internacional, fundamentando a 
posição legal dos manguezais como zona úmida de importância internacional 
(Tabela II). 
 
Segundo Paulo Afonso Leme Machado (1991), as leis brasileiras vêm 
dando maior proteção aos manguezais, culminando essa defesa com a 
Constituição Federal de 5 de outubro de 1988. A seguir, encontram-se 
transcrições do texto preparado pelo ilustre jurista por ocasião do Seminário 
Técnico sobre “Alternativas de Proteção e Uso dos Manguezais do Nordeste”, 
realizado em Recife, de 18 a 20 de outubro de 1989: 
 
“O art. 225, da ConstituiçãoFederal diz: Para assegurar a efetividade 
desse direito, incumbe ao Poder Público: III – definir, em todas as unidades da 
Federação, espaços territoriais e seus componentes, a serem especialmente 
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, 
vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que 
justifiquem sua proteção”. A nova Constituição veio dar força ao que já dizia o 
art. 2o do Código Florestal: os manguezais e as dunas só podem ser alterados 
ou suprimidos por ato legislativo, isso é, a Prefeitura Municipal, o Governo do 
Estado (através de suas Secretarias ou de seus órgãos ambientais), o Governo 
Federal (através do SPU – Serviço de Patrimônio da União ou do IBAMA) não 
podem autorizar qualquer alteração ou até extinção de manguezais e de dunas. 
Só a Lei pode tocar nesses espaços (e examinaremos logo mais qual a 
competência para legislar sobre esses espaços). A Constituição Federal tem 
uma dimensão a ser bem considerada “não só não permite a alteração e a 
supressão dos manguezais por atos dos particulares e dos Poderes 
Executivos”, como não permite que esses espaços tenham “utilização que 
comprometa a integridade” dos seus atributos. Assim, qualquer utilização que 
tire ou dificulte a integridade ou a totalidade da proteção dos manguezais e das 
dunas está proibida. Acentue-se que essa intocabilidade constitucional das 
dunas e dos manguezais visa conservá-los também para as gerações futuras, 
pois essas gerações também estão protegidas pela Constituição Federal (art. 
225, caput) contra a imprevisão, a pressa e a cupidez das gerações atuais 
princípios prevenção e da precaução (*) 
 
O Código Florestal de 1965 diz no seu artigo 2o que consideram-se de 
preservação permanente, pelo só efeito desta lei, as florestas e demais formas 
de vegetação natural situadas (alínea “f”): nas restingas, como fixadoras de 
dunas ou como estabilizadoras de mangues. A lei não tem palavras inúteis e 
que possam ser desprezadas pelos que devem aplicá-la. Assim, disse o 
Código Florestal que as florestas ou outras formas de vegetação que recobrem 
os mangues ou estão nas dunas têm caráter “permanente” e, portanto, não 
 
(*) Nota da consultora 
 13
estão ali como um favor do homem à natureza ou simplesmente à espera de 
alguém que queira modificar a paisagem. O mesmo Código disse que a 
proteção se dá “pelo só efeito desta lei”, o que significa que o próprio Código já 
protegeu – em todo o Brasil – todos os locais em que existam ou devam existir 
manguezais e/ou dunas. Assim, não é preciso que um órgão público ambiental 
baixe um ato para dizer que um manguezal ou uma duna está protegido, pois a 
própria lei federal (o Código Florestal) já o fez. Isso é importante, pois os 
manguezais e as dunas são áreas de preservação permanente pelo efeito da 
lei, e só pelo efeito de uma outra lei federal – e não por ato administrativo – 
podem ser alterados, mutilados ou suprimidos. A Resolução No 04/1985 do 
CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente veio dar ênfase a essa 
defesa legal no seu artigo 3o, incisos VIII e IX (Machado, 1991).” 
 
A Medida Provisória 1605/98 (reeditando a Medida Provisória 5111/96) 
alterou os artigos 2o e 3o do Código Florestal, reduzindo as áreas de 
preservação permanente de 80% para 20%. Enquanto que estas áreas tinham 
sido ampliadas de 50% para 80% pela Medida Provisória 1511/96. A Medida 
Provisória 1736 alterou o artigo 2o do Código Florestal permitindo o 
licenciamento ambiental e suprimindo parcial ou totalmente as áreas de 
preservação permanente. O Ministério Público do Estado de São Paulo 
questiona a constitucionalidade dessas Medidas Provisórias. 
 
A Nova Lei Ambiental 9605/98, chamada erroneamente de Lei de Crimes 
Ambientais, prevê nos artigos 38 a 53 os crimes contra a flora, sendo que nos 
artigos 38, 39, 40 e 44, refere-se especificamente às áreas de preservação 
permanente. Esta lei inclui normas de proteção ambiental já definidas em 
inúmeras leis anteriores, como as leis 4771/65 (Código Florestal), 6938/81 
(Política Nacional do Meio Ambiente), 7643/83 (Proteção dos Cetáceos), 
7679/88 (Pesca), 7661/88 (Gerenciamento Costeiro), entre outras. Esta nova 
lei inovou prevendo a possibilidade da substituição de penas de prisão por 
penas alternativas de prestação de serviços à comunidade. A Medida 
Provisória 1710/98 suspendeu a efetividade da Nova Lei Ambiental por dez 
anos, pois adia a previsão dos crimes contra a administração ambiental. Essa 
Medida Provisória premia os degradadores reincidentes que sempre atuaram 
no sentido de levar vantagem sobre os empreendedores sérios que vinham se 
esforçando, e pagando caro, para adaptar suas atividades às normas de 
conservação do meio ambiente (Capobianco, 1998). Além disso, eximiu os 
funcionários dos órgãos ambientais de cumprirem com suas obrigações 
constitucionais em defesa da saúde pública e da preservação do patrimônio 
ambiental (Capobianco, op. cit.) 
 
A Lei Federal de Recursos Hídricos No 9433/97 trata da gestão desses 
recursos em nível nacional, considerando a bacia hidrográfica como unidade 
territorial de planejamento. As diversidades das regiões no País são 
consideradas sob aspectos físicos, bióticos, demográficos, econômicos e sócio-
culturais. A gestão das bacias hidrográficas deve ser realizada de forma a 
englobar os sistemas costeiros, integrando a administração pública litorânea. 
 
O Projeto de Lei no 3792/93 define a educação ambiental como o conjunto 
de processos que possibilitam o indivíduo e a coletividade construírem valores, 
 14
conhecimentos, atitudes e competências voltadas para a conservação do 
ambiente, devendo, assim, ser articulada com os níveis e modalidades do 
sistema educacional. Esse Projeto de Lei estabelece que o Poder Público fica 
responsável pela definição de políticas que incorporem a dimensão ambiental, 
promovendo a educação ambiental e incentivando o engajamento da 
sociedade na conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente. A 
política de educação ambiental deverá envolver órgãos integrados ao Sistema 
Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, instituições educacionais públicas e 
privadas, órgãos públicos federais e estaduais e organizações não-
governamentais. 
 
 
Direito de propriedade: dunas e manguezais 
 
Os manguezais e as dunas podem ser encontrados tanto em bens 
imóveis públicos como particulares. Quase sempre os manguezais se localizam 
sobre os terrenos de marinha e em contiguidade às praias, sendo ambos bens 
da União, como o mar (artigo 20 da Constituição Federal). Assim, nesses casos 
– tranqüilamente a competência para decidir sobre os conflitos é a Justiça 
Federal e não da Justiça Estadual, devendo funcionar a Procuradoria da 
República. Só a Lei Federal pode alterar ou suprimir (Machado, op. cit.). 
 
De outro lado, quando estiverem presentes em bens de particulares não 
precisam ser nem desapropriados, nem indenizados para que sejam 
conservados. Vigora o princípio da generalidade dos fins públicos, isto é, todos 
os que tiverem imóveis em que surjam ou existam manguezais e/ou dunas são 
obrigados gratuitamente a conservá-los. A propriedade privada, como a 
pública, deve cumprir sua função social (art. 170 e art. 5o, inciso XXIII da 
Constituição Federal, 1988), não existindo propriedade com fins 
exclusivamente privados. Os proprietários privados podem, contudo, impedir a 
entrada de outras pessoas nesses bens, como – observando as regras 
pertinentes – poderão coletar a fauna ali encontrada (Machado, 1991). 
 
A Portaria No 1.208/89, de 22 de novembro de 1989, define o tamanho 
mínimo de captura para o caranguejo-uçá, em toda região Nordeste, sendo 
proibida a captura de fêmeas de qualquer tamanho em qualquer época do ano, 
como também é proibida a capturade macho com tamanho de carapaça 
inferior a 4,5cm. A Portaria No 104/98 do IBAMA determina o período de defeso 
do Ucides cordatus de 1o de setembro a 15 de dezembro no Espírito Santo, Rio 
de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina (art. 1o), assim como proíbe 
captura, transporte, beneficiamento, industrialização e comercialização de 
fêmeas ovadas (art. 2o) e proíbe a captura de indivíduos com carapaça inferior 
a 5cm de largura (art. 3o). A Lei Paraense do Caranguejo, No 6082/97 proíbe a 
captura de machos e fêmeas do caranguejo-uçá (Ucides cordatus) no período 
de reprodução (art. 3o), como também a captura e comercialização das fêmeas 
(“canduruas”) em qualquer época do ano (art. 4o). 
 15
 
 
A criminalidade de criar perigo para os manguezais e as dunas 
 
Quem autorizar aterros em manguezais, quem fizer o transporte de materiais para os 
manguezais, quem ocupar as dunas, retirar areias, já cria uma situação de perigo para 
esses bens ambientais. A Lei Federal No 7.803/1989, dando nova redação ao art. 15 
da Lei No 6.938/1981 quer prevenir o dano e pune esses crimes com dois a quatro 
anos de reclusão (Machado, 1991). 
 
 
1.5. Aspectos gerais do esforço conservacionista 
 
A região Neotropical que inclui toda a América do Sul, América Central, 
Caribe e grande parte do México, é a mais rica e a de maior diversidade das 
oito regiões biogeográficas do globo. O número de ecossistemas presentes e a 
biodiversidade faunística e florística não tem igual nas demais partes do 
planeta (Scott & Carbonell, 1986). 
 
Com o aumento das atividades do homem moderno, os ambientes 
costeiros do Neotrópico encontram-se a cada dia sob maior pressão. Apesar da 
grande quantidade de estudos desenvolvidos sobre esses ecossistemas, se 
conhece relativamente pouco sobre a biodiversidade de suas fauna e flora 
(Scott & Carbonell, op. cit.). 
 
O Brasil é líder mundial em diversidade de plantas, primatas, anfíbios, 
peixes de água doce e insetos. Possui quase um terço das florestas tropicais 
remanescentes no mundo (WWF/Campanha “Proteja os Parques do Brasil”, 
1999). A criação e a implementação de unidades de conservação é uma das 
principais estratégias para a conservação dessa biodiversidade. No Brasil 
existem 93 unidades de conservação federais de proteção integral entre 
parques nacionais, estações ecológicas, reservas ecológicas e biológicas. O 
Fundo Mundial para a Natureza – WWF, analisou 86 dessas áreas e concluiu 
que além de proteger pouco, o Brasil também protege mal seu patrimônio 
natural: 75% de nossas unidades de conservação estão em estado precário, 
sem condições de cumprir com seu papel de garantir a proteção da natureza. O 
Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC representará um 
avanço na estruturação dos parques e reservas brasileiros, contribuindo de 
forma significativa para a conservação da diversidade biológica brasileira. 
 
 
 
 
 
 
 
 16
 
Sistema de Unidade de Conservação 
 
Em síntese o Brasil possui 1,8 % de sua extensão territorial em unidades de 
conservação de uso indireto dos recursos, que são as mais importantes para a 
preservação da biodiversidade. O total de áreas protegidas é de 3,7 % da superfície 
do País. O bioma mais privilegiado em unidades de conservação, em termos relativos, 
é a Amazônia com 3,5 % de áreas protegidas de uso direto e 4,1 % de uso indireto 
dos recursos. Em relação às unidades de conservação marinhas temos 0,8 % de 
áreas protegidas de uso indireto dos recursos. Apenas 155 mil ha são unidades de 
conservação marinhas (CIMA, 1991). 
 
 
No caso do manguezal – em toda a sua extensão (incluindo o apicum) – 
os diplomas legais em vigor dispensariam o estabelecimento formal de 
unidades de conservação, uma vez que o ecossistema é considerado de 
preservação permanente (artigo 2o, Lei federal No 4.771, 15.09.65) e como 
Reserva Ecológica, “em toda a sua extensão” (artigos 1o e 3o, Resolução 
CONAMA No 004, 18.09.85). 
 
Como a Zona Costeira é considerada Patrimônio Nacional (artigo 225 § 
4o, Constituição Federal, 05.10.88), tendo assegurada sua preservação, 
conclui-se que bastaria vontade política para o cumprimento da lei para garantir 
a conservação e o uso racional dos recursos naturais. 
 
A conservação do patrimônio natural depende do manejo adequado de 
seus recursos. Um bom manejo não depende, necessariamente, de altas 
tecnologias nem de conhecimentos “exotéricos”, requerendo apenas 
responsabilidade e vontade política. Quando se deseja manejar um organismo, 
deve ser considerada sua população. No caso de uma população deve ser 
manejada a comunidade. Em se tratando do manejo de uma comunidade, deve 
ser considerado o ecossistema. E, no caso de ecossistemas, deve ser 
manejada a unidade seguinte que é a paisagem. A complexidade aumenta em 
função do nível hierárquico do sistema, lembrando que para manejar um 
determinado componente do sistema, deve ser manejado todo o sistema. 
 
Estabelecendo as devidas correlações, deve ficar claro que a 
conservação de sistemas como manguezais, marismas, estuários ou deltas, o 
nível hierárquico a ser considerado é o da paisagem. E, nesse contexto, deve 
ser incluída a bacia hidrográfica, sob risco de se tratar apenas dos efeitos e 
não das causas, com a conseqüente perda do patrimônio natural, dos bens e 
serviços gerados gratuitamente, além dos valores sociais, culturais, estéticos, 
paisagísticos, recreacionais e educacionais. 
 
 
Conservação da fauna e da flora silvestres 
 
Há que se ressaltar alguns projetos de conservação da fauna silvestre 
brasileira, no âmbito dos ambientes marinho-costeiros, que o órgão 
responsável, IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos 
 17
Naturais Renováveis vem realizando com sucesso e que tiveram início em fins 
da década de 1970: 
 
¾ Centro de Estudos de Migrações de Aves – CEMAVE - coordena e 
armazena dados de anilhamento de aves silvestres em liberdade, bem 
como outros tipos de marcação, visando o conhecimento em nível nacional 
e internacional dos movimentos desses animais, possibilitando estudos 
mais avançados sobre os mesmos; 
¾ Projeto TAMAR - distribuição, proteção e conservação das tartarugas 
marinhas - consiste basicamente em determinar as áreas de ocorrência de 
desova, a identificação das espécies e sua respectiva distribuição, 
efetuando estudos de biologia e comportamento, e implantando vários 
locais de efetiva proteção; e, 
¾ Projeto Peixe-Boi - estudo, distribuição e proteção do peixe-boi marinho, 
objetiva identificar as áreas de ocorrência, efetuar um senso preliminar dos 
indivíduos, proteger as áreas para evitar a extinção iminente; pesquisas 
sobre biologia e comportamento estão sendo iniciadas (CIMA, 1991). 
 
A referência a estes projetos diz respeito às dependências das aves 
limícolas, tartarugas marinhas e do peixe-boi com os ambientes costeiros 
abrigados para sua sobrevivência – estuários, enseadas, manguezais, 
marismas. 
 
 
2.0– RESULTADOS 
 
2.1. Características gerais das unidades físico-ambientais e importância 
ecológica da região 
 
O Brasil com uma superfície de 8.511.996 km2, é o maior país da América 
do Sul. Com esta extensão territorial, abrangendo desde regiões equatoriais ao 
norte até áreas extratropicais ao sul, diferenciadas climática e 
geomorfologicamente, o País conta com extraordinária diversidade ecológica e 
biológica. Do ponto de vista paisagístico podem ser reconhecidos seis 
domínios morfoclimáticos brasileiros, caracterizados por combinações distintas 
de fatores climáticos e geomorfológicos que se espraiam por milhões até 
centenas de milhares de quilômetros quadrados de extensão. Embora essas 
áreas naturais possam abrigar várias regiões naturais e compartimentos 
biogeográficos, elas guardam, assim mesmo, um conjunto de feições 
geomórficas,associações de solos, formações vegetais características e 
regimes hidrológicos que distinguem os domínios uns dos outros (CIMA, 1991). 
 
Particularizações regionais nas composições bióticas desses 
ecossistemas homólogos devem-se não só aos mecanismos originadores, 
resultantes das variações do nível médio do mar, principalmente durante o 
quaternário, mas também às condições ambientais do presente. A evolução 
histórica desses ambientes a partir de matrizes geológicas distintas, 
composições petrográficas, mineralógicas e cristalográficas dos substratos; 
morfologias variadas da costa primitiva; padrões de correntes e de circulação 
das águas e condições diferenciadas de clima em termos de temperaturas e 
 18
precipitações, principalmente, fez com que esses ecossistemas, assemelhados 
em seu aspecto morfológico, exibam diferenças não apenas na diversidade de 
espécies, mas também nas suas dinâmicas próprias de funcionamento trófico e 
energético (CIMA, op. cit.). 
 
A diversidade de litorais brasileiros, que constitui a gama de substratos 
dos ecossistemas costeiros, pode ser subdividida, levando em conta elementos 
oceanográficos, climáticos e continentais. As características bióticas 
encontram-se associadas a esses tipos de substratos. Schaeffer-Novelli et al. 
(1990) dividiram a linha de costa em 8 (oito) unidades fisiográficas. Para essa 
caracterização, aqueles autores utilizaram dados da literatura existente sobre o 
assunto, além de suas próprias experiências de campo. 
 
Unidade I : do Cabo Orange (04°30'N) ao Cabo Norte (01°40'N), no limite 
norte da Foz do Amazonas. Segmento caracterizado por bosques homogêneos 
dominados pelo gênero Avicennia, formando verdadeiros siriubais. Os 
manguezais colonizam rios costeiros, extendendo-se até consideráveis 
distâncias. Rhizophora ocupa a porção estuarina dos rios, onde a influência 
marinha é direta. Nessas áreas Montricardia e Laguncularia ocupam a porção 
interior dos bosques. 
 
Unidade II : do Cabo Norte (01°40'N) à Ponta Curuçá (00°36'S). O 
desenvolvimento e a cobertura dos manguezais é escasso neste segmento 
devido a influência da descarga fluvial do Rio Amazonas. Os bosques são 
mistos, com formações lodosas de água doce dominando a parte norte da Foz 
do Amazonas. Avicennia forma verdadeiros siriubais em locais de pequena 
elevação e baixa salinidade, enquanto Rhizophora ocorre em locais com 
influências marinhas mais significativas, ou inundados periodicamente pelas 
marés. 
 
Unidade III : Ponta Curuçá (00°36'S) à Ponta Mangues Secos (02°15'S). 
Rhizophora domina as franjas dos bosques. As faixas mais elevadas, 
posteriores às franjas são colonizadas por Avicennia e Laguncularia. 
Ambientes de baixa energia deposicional são colonizados por Spartina. O 
gênero Conocarpus é encontrado nas faixas de transição para terra firme. 
 
Unidade IV : Ponta Mangues Secos (02°15'S) ao Cabo Calcanhar 
(05°08S). Manguezais são pobremente desenvolvidos ao longo deste trecho da 
costa devido à falta de aporte de água doce, associada a estações secas 
prolongadas. Altas concentrações de sais limitam os manguezais às 
desembocaduras dos rios. 
 
Unidade V : Cabo Calcanhar (05°08'S) ao Recôncavo Baiano (13°00'S). 
Devido a alta energia desse trecho da costa, os manguezais se desenvolvem 
em áreas protegidas, associados a estuários e lagunas costeiras. Rhizophora e 
Laguncularia aparecem como pioneiras. Nas partes mais internas dos bosques, 
Avicennia e Laguncularia formam bosques mistos. 
 
Unidade VI : do Recôncavo Baiano (13°00'S) a Cabo Frio (23°00'S). 
Manguezais relativamente extensos são comumente encontrados por trás de 
 19
restingas. Os três gêneros de mangue são encontrados, podendo compor 
formações mistas ou monoespecíficas. Na Baía de Todos os Santos 
Laguncularia é dominante, colonizando solos areno-argilosos. Rhizophora é 
encontrada somente nas margens, formando estreita faixa na franja dos 
bosques ou quando dominante, constitui faixas monoespecíficas 
freqüentemente inundadas pelas marés. Avicennia e Laguncularia também 
podem formar bosques mistos nas franjas. 
 
Unidade VII : Cabo Frio (23°00'S) à Torres ( 29°20'S). Os bosques 
apresentam gradiente em termos estruturais, com indivíduos mais altos 
margeando estuários, canais e à jusante de alguns rios. Os bosques podem ser 
monoespecíficos ou mistos, com Laguncularia, Avicennia e Rhizophora. Na 
Baía de Guanabara, Rhizophora domina as franjas dos bosques, ou sítios 
protegidos por Spartina e Laguncularia. Em Guaratiba, os sedimentos recentes 
de ilhas barreiras são colonizados por Spartina, formando marismas que são 
totalmente inundadas pelas marés altas. Rhizophora coloniza sedimentos 
lamosos com grande quantidade de matéria orgânica, enquanto Avicennia é 
encontrada em depósitos mais altos formando extensos bosques. 
 
Na região estuarina de Santos e Bertioga, Rhizophora ou Avicennia 
dominam as franjas dos bosques, enquanto a parte interna pode ser ocupada 
pelas duas espécies anteriores ou por Laguncularia, formando bosques mistos. 
 
Os bosques de Itanhaém apresentam na parte posterior junto a terra 
firme, faixas de transição colonizados por Hibiscus, Crinum e Acrosthicum, em 
contato com a mata de restinga. 
 
A região de Cananéia-Iguape possui áreas deposicionais recentes, 
freqüentemente colonizada por Laguncularia e Spartina. As franjas são 
dominadas por Rhizophora, enquanto as partes mais internas podem formar 
bosques mistos com Avicennia e Laguncularia, ou ainda apresentar um 
gradiente estrutural de bosque monoespecífico de Rhizophora. Neste último 
caso, o bosque do tipo ilhote, como o da Ilha de Pai Matos, não apresenta 
gradiente por ser freqüentemente inundado pelas preamares. 
 
O limite latitudinal para espécies vegetais típicas de mangue ocorre no 
litoral de Santa Catarina, aos 27°30'S para Rhizophora mangle e aos 28°30'S 
para Avicennia schaueriana e Laguncularia racemosa. 
 
Unidade VIII : Torres (29°20'S) ao Chuí (33°45'S). Este trecho do litoral é 
formado por extensos depósitos praiais, associados a cordões de dunas e 
pontais arenosos. Ao longo da linha de costa são encontradas formações 
lagunares, isoladas do Oceano Atlântico por barreiras múltiplas, resultantes de 
sucessivos eventos trangressivos e regressivos. Baixas temperaturas no 
inverno e grande amplitude térmica inibem o crescimento de espécies típicas 
de mangue, privilegiando as marismas. 
 
 
 
 
 20
2.2. Avaliação do conhecimento da diversidade biológica para o grupo de 
ecossistemas 
 
Biodiversidade e extinção das espécies, segundo CIMA (1991) 
 
“A extinção de espécies, quer pela pressão direta da exploração 
econômica, quer pela destruição de habitats, é um dos temas globais mais 
candentes da atualidade, e também de mais difícil abordagem ou metodologia. 
A preocupação deriva da constatação de que metade ou mais das espécies 
existentes na Terra vivem nas florestas tropicais úmidas, que ocupam apenas 
6% da superfície dos continentes e vêm sendo destruídas a uma taxa de 105 
mil km2 por ano. A dificuldade resulta da atual ignorância do número de 
espécies existentes e da grande complexidade da estrutura das comunidades 
biológicas e da ecologia e distribuição geográfica de espécies tão distintas 
como grandes insetos, mamíferos, fungos ou árvores. 
 
Apesar dessas dificuldades vários autores têm feito estimativas teóricas 
de taxas de extinção, usando as chamadas curvas de espécies por área (da 
forma S = cAz, onde S é o número de espécies, A é a área, e c e z são 
parâmetros constantes para situações específicas), e considerando-se uma 
redução progressiva da área segundo diversas taxas de desmatamento. Os 
resultados dessas estimativas, expressos como uma porcentagem de espécies 
perdidas globalmente por décadas, variam dentro de uma faixa de 1 a11 %, 
dependendo das premissas adotadas pelos diferentes autores. 
 
A lista de espécies da fauna brasileira ameaçadas de extinção, preparada 
por zoólogos com grande experiência de campo, e que inclui todos os animais 
classificados nas três categorias mais críticas da União Mundial para a 
Natureza – UICN (vulneráveis, ameaçados e extintos), relaciona apenas seis 
espécies como provavelmente extintas dentre as 171 espécies listadas para a 
floresta atlântica incluídas na lista. Parte da dificuldade reside, sem dúvida, no 
nível de conhecimento taxonômico da flora e da fauna originais, e mesmo atual, 
o que impossibilita qualquer comparação. 
 
Apesar dessas dificuldades metodológicas, não se pode ter dúvidas 
quanto à realidade do perigo de empobrecimento biológico da biosfera que se 
antecipa principalmente se considerarmos a perda de diversidade funcional (*). 
Desde 1600, foram extintas 724 espécies de animais e plantas, número que 
deve representar apenas uma fração do total. 
 
Essas incertezas dizem respeito a estimativas globais de extinção, a 
tentativas de se considerar homogêneos, padrões de distribuição geográfica e 
comportamentos ecológicos reconhecidamente complexos nos níveis regional 
e local. Nesses níveis, o conhecimento existente permite a adoção de uma 
estratégia de planejamento visando um comportamento racional face à 
conservação da biodiversidade. Evidentemente que esse conhecimento é de 
fundamental importância para um plano de conservação da biodiversidade por 
intermédio de parques, reservas biológicas e outros tipos de unidades de 
conservação. 
 
(*) Nota da consultora 
 21
 
A biodiversidade engloba todas as espécies de plantas, animais e 
microorganismos, os ecossistemas e ainda os processos ecológicos dos quais 
são componentes. Constitui um termo abrangente para o grau de variedades 
da natureza que inclui o número e a freqüência de espécies ou genes e os 
respectivos ecossistemas. Consideram-se três níveis distintos para expressar a 
biodiversidade: variabilidade genética, diversidade de espécies e de 
ecossistemas. A variabilidade genética é constituída pela soma total da 
informação genética contida nos genes de indivíduos de plantas, animais e 
microorganismos que habitam a Terra. A diversidade de espécies refere-se aos 
organismos vivos na Terra. A diversidade de ecossistemas refere-se aos 
habitats, às comunidades bióticas e aos processos ecológicos na biosfera, 
assim como à enorme diversidade dentro dos ecossistemas em termos de 
diferenças de habitats e dos vários processos ecológicos. 
 
A Carta Mundial para a Natureza, redigida pela ONU reconhece que o 
homem é parte da natureza e que toda forma de vida merece respeito, 
independentemente de sua utilidade para o homem e que os benefícios atuais 
da natureza dependem da manutenção dos processos ecológicos e dos 
sistemas que sustentam a vida em suas diversas formas. De acordo com a 
estratégia Mundial e o Grupo de Trabalho sobre “Ética de Conservação” ambos 
da UICN, a base para a conservação da biodiversidade deve ser coerente com 
os princípios ecológicos que essencialmente promovem atividades que sejam 
sustentáveis a longo prazo, visando o desenvolvimento social e econômico. O 
bem-estar das futuras gerações constitui responsabilidade social da presente 
geração visando assegurar que os recursos naturais renováveis sejam 
adequadamente cuidados para garantir sua produtividade sustentável. 
 
A visão ética e cultural da diversidade voltada para a natureza e a vida 
humana deve ser encorajada através de promoções que respeitem e melhorem 
a diversidade de vida, independentemente de ideologia política, econômica ou 
religião dominante numa sociedade. 
 
Outro fator importante para se considerar a necessidade de conservação 
da biodiversidade, sobretudo nos trópicos onde ocorrem dois terços das 
espécies da Terra, relaciona-se à evolução das espécies para se adaptarem às 
mudanças climáticas. A extinção das espécies sempre ocorreu desde os 
primórdios da existência da vida na Terra, causada entretanto por fatores 
naturais, porém, nunca pelo próprio homem. Mas, graças à variabilidade 
genética, os organismos foram capazes de se adaptar às diversas mudanças 
climáticas com o surgimento de novas espécies cujos descendentes 
atualmente enriquecem flora e fauna. Com o acelerado processo de extinção 
em marcha, estamos limitando o processo evolutivo para a adaptação às 
mudanças climáticas em curso, sobretudo aquelas resultantes do “efeito 
estufa” e da destruição da camada de ozônio. As conseqüências são 
imprevisíveis, mas certamente serão catastróficas e poderão comprometer a 
sobrevivência da biodiversidade, incluindo a da própria espécie humana. 
 
O desconhecimento dos valores reais da biodiversidade tem constituído 
sério obstáculo para que os tomadores de decisão reconheçam a necessidade 
 22
da conservação dos recursos biológicos nos planos nacionais de 
desenvolvimento, entretanto, a alocação de valores qualitativos e quantitativos 
certamente justificariam ações governamentais de incentivos à conservação 
(CIMA, 1991).” 
 
O manguezal é considerado um dos ecossistemas mais complexos do 
ambiente marinho, não apenas por sua diversidade biológica mas 
principalmente devido à diversidade funcional. Sistemas complexos tendem a 
resistir mais eficientemente às perturbações tanto naturais quanto induzidas 
pelo homem. Mas a cada perturbação há perda de elementos do sistema, 
levando a uma simplificação, tornando-o menos apto a ação de novos tensores 
e por conseqüência, mais vulnerável e com menor capacidade de suporte. 
 
 
2.3. Conhecimento da diversidade biológica 
 
As estimativas da diversidade de espécies vegetais e animais na Terra 
variam entre 2 e 100 milhões, sendo que as mais precisas giram em torno de 
10 milhões, e dentre estas, somente 1,4 milhões já estão classificadas 
(Courrier, 1992). A diversidade dos ecossistemas marinhos, desde as florestas 
de mangues, de estrutura complexa, até os sistemas marinhos mais simples, é 
no mínimo comparável à diversidade terrestre (Courrier, op. cit.). Os 
ecossistemas costeiros, que recebem influências dos ambientes marinho e 
terrestre, apresentam alta diversidade biológica (Tabela III). 
 
 
Cobertura vegetal 
 
MANGUEZAL 
 
As angiospermas do mangue do litoral brasileiro pertencem a três 
gêneros, contando com um total de 6 espécies (Schaeffer-Novelli & Cintrón, 
1986). 
 
Gênero Rhizophora 
Mangue vermelho, sapateiro ou verdadeiro, encontra-se geralmente nas 
franjas dos bosques em contato com o mar, ao longo dos canais, na 
desembocadura de alguns rios ou, nas partes internas dos estuários onde a 
salinidade não é muito elevada. 
 
As espécies encontradas ao longo do litoral brasileiro são: Rhizophora 
mangle, da desembocadura do Rio Oiapoque, à latitude da Ilha de Santa 
Catarina; e R. racemosa e R. harrisonii encontram-se da região norte até o 
Delta do Rio Parnaíba, no Piauí. 
 
Gênero Avicennia 
Siriúba ou mangue preto ocupa terrenos da zona entremarés, ao longo 
das margens lamacentas dos rios ou diretamente exposta às linhas de costa, 
desde que submetidas a intrusões salinas. Essas plantas toleram salinidades 
 23
intersticiais muito mais altas que os demais gêneros de mangue, chegando a 
sobreviver em locais com salinidades de 90. 
 
As espécies encontradas em nossos manguezais são: Avicennia 
germinans, do norte até a desembocadura do Rio Macaé (Soffiatti, com. pes.), 
ao norte do Estado do Rio de Janeiro; e A. schaueriana, ao longo de todo 
litoral, com seu limite austral coincidindo com o próprio limite sul dos 
manguezais no Atlântico Sul Ocidental. 
 
Gênero Laguncularia 
Mangue branco ou tinteira, encontrado em costas banhadas por águas debaixa salinidade, às vezes ao longo de canais de água salobra ou, em praias 
arenosas protegidas. 
 
É um gênero monoespecífico, i.e., possui apenas um espécie 
Laguncularia racemosa, encontrada associada aos manguezais ao longo de 
todo litoral. Merece destaque o fato de ser a única espécie típica de mangue 
encontrada no Arquipélago de Fernando de Noronha, no único manguezal, na 
Baía do Sueste. 
 
 
Criptógamas associadas aos manguezais 
 
Para as áreas de manguezal do Atlântico Sul Ocidental, Cordeiro-Marino 
et al. (1992) fazem referência a um total de 21 espécies de Chlorophyceæ, 37 
de Rhodophyceæ e 4 de Phaephyceæ. 
 
Segundo Maciel (1991), podem ocorrer fanerógamas halófitas (Salicornia 
gaudechodiana, Chaenopodiaceæ e Sesuviam portulacastrum, Aisoaceæ) e 
criptógamas abundantes, sobre as quais se alimentam caranguejos de diversas 
espécies. 
 
Marismas 
 
As marismas, segundo Panitz (1992), constituem um dos mais produtivos 
ecossistemas costeiros, principalmente aquelas dominadas pela gramínea 
Spartina. Sua produtividade é controlada pela amplitude das maré, salinidade, 
grau de inundação, disponibilidade de nutrientes e temperatura que determina 
um ciclo sazonal no desenvolvimento das espécies da cobertura vegetal das 
marismas. À semelhança dos manguezais nas regiões tropicais, as marismas 
representam nas regiões temperadas importante fonte de nutrientes e de 
detritos para a cadeia alimentar, além de abrigo e substrato para inúmeras 
espécies animais de importância econômica e ecológica. 
 
A maioria das espécies vegetais das marismas da América Latina 
pertence a gêneros amplamente distribuídos pelas comunidades halofíticas, 
representantes de um número relativamente reduzido de famílias (Costa & 
Davy, 1992). 
 
 
 24
Fauna Associada 
 
A fauna dos manguezais, marismas, estuários e deltas tem sua origem 
nos ambientes terrestre, marinho e de água doce, permanecendo nesses 
ecossistemas toda sua vida como residentes ou apenas parte dela, na 
condição de semi-residentes, visitantes regulares ou oportunistas. Seja qual for 
a condição, esses animais estão sempre intimamente associados e 
dependentes desses ecossistemas. 
 
Para as áreas úmidas, como no caso dos manguezais, alguns grupos, 
como o das aves aquáticas, contam com bom acervo bibliográfico, 
possivelmente devido sua popularidade e facilidade de identificação. Certas 
aves percorrem grandes distâncias em seus movimentos migratórios, passando 
às vezes por vários países, demonstrando a necessidade de cooperação 
internacional no que tange a proteção desse recursos naturais. 
 
Devido à importância desses animais como indicadores da qualidade 
ambiental e sob a égide da Convenção de Ramsar (São Paulo, 1997a), 
atenção especial foi dada aos habitats de aves aquáticas, como contribuição às 
propostas a planos de desenvolvimento e manejo auto sustentáveis que 
envolvam esse tipo de recurso. 
 
Durante os meses de verão é reduzido o número de animais se 
deslocando sobre a área do apicum (Nascimento, 1993). Aquela autora 
descreve a presença de alguns caranguejos “chama-maré”, do gênero Uca, 
encontrados nas proximidades da vegetação. A partir do mês de maio, com o 
início das chuvas de “inverno”, a quantidade de Uca das espécies U. thayeri, U. 
mordax, U. leptodactyla, U. rapax, além de outras formava um verdadeiro 
tapete por todo o apicum, numa densidade aproximada de 250ind/m2. Na 
proximidade da parte mais sombreada das árvores de mangue a densidade de 
tocas de Ucides cordatus jovens (caranguejo-uçá) chegou a 30ind/m2. Nessas 
áreas os Uca escavam suas tocas que chegam a 70 e 80cm de profundidade. 
Nas pequenas poças d’água no apicum, encontrou-se quantidade 
representativa de Calinectes (siri), todos em estágio juvenil (Nascimento, 
1993). 
 
Um exemplo da dependência da produção da zona costeira com os 
manguezais pode ser ilustrado pela listagem apresentada por Cintrón & 
Schaeffer-Novelli (1983), onde aparecem 67 espécies de peixes, 
representando 24 famílias, associadas a diversas áreas estuarinas do litoral 
brasileiro (Tabela IV). Como através da pesca parece ser mais fácil quantificar 
uma determinada parcela da produção dos recursos naturais marinhos, o 
exemplo acima serve para caracterizar a diversidade da ictiofauna que 
depende, de alguma maneira, dos fluxos de energia e matéria gerados pelos 
manguezais (Schaeffer-Novelli, 1989). 
 
 
 
 
 
 25
2.4. Aplicabilidade da informação existente, visando a gestão da 
diversidade biológica 
 
As áreas protegidas ao longo da costa que fornecem abrigo e alimento 
farto, foram as que serviram de ponto de partida para a ocupação dos 
europeus com seus primeiros núcleos de colonizadores. Coincidentemente, 
propiciavam aos recém chegados a mesma proteção exigida pelos manguezais 
para seu desenvolvimento. E assim, enquanto se expandiam os povoados, se 
reduziam as áreas de manguezal, primeiramente com uma taxa pouco 
pronunciada (de 1500 a 1900) e, depois de forma avassaladora, provocando 
alterações por vezes irreversíveis (Schaeffer-Novelli, 1989). 
 
Sambaquis datados de 7.000 a 10.000 anos B.P. contendo restos de 
conchas de bivalves, carapaças de crustáceos e espinhas de peixes, 
comprovam as evidências de que os primeiros americanos já se utilizavam dos 
recursos dos manguezais, marismas e estuários para sua sobrevivência. O 
comportamento semi-nômade daqueles grupos de caçadores e coletores, bem 
como seu comportamento social, garantiu o uso eficiente dos recursos 
disponíveis através dos tempos (Figuti, 1993). Quando a esquadra de Cabral 
aportou na Terra do Brasil estima-se que houvesse menos de 4 milhões de 
indígenas, em sua maioria ocupando as várzeas dos rios, as florestas e os 
manguezais da planícies costeiras (Schaeffer-Novelli & Cintrón-Molero, in press 
a). 
 
 
 
2.5. Listagem com dados existentes de diversidade/riqueza de espécies 
 
Ainda falta muito para um conhecimento completo sobre o número total 
das espécies da fauna e da flora existentes nos manguezais, nas marismas e, 
por que não dizer em toda a Zona Costeira Brasileira. Com exceção do Projeto 
BIOTASP/FAPESP (Migotto & Tiago, 1999), patrocinado pela Fundação de 
Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, não são muitos os 
projetos específicos para identificação da diversidade biológica na Zona 
Costeira do País. Mas mesmo assim, com base em levantamentos 
bibliográficos, é possível ter uma idéia dos organismos a eles associados, 
integrantes dos grupos taxonômicos: Procariontes, Protistas, Fungos, Liquens, 
Vegetais e Animais, revelando a riqueza de espécies desses ecossistemas. 
 
Algumas das espécies de aves associadas aos manguezais brasileiros 
são consideradas raras, ameaçadas ou vulneráveis para vários países da 
América do Sul e do Caribe, incluindo-se Ajaia ajaia (colhereiro), Cosmorodium 
albus (graça branca grande), Egretta thula (graça branca pequena), Eudocimus 
ruber (guará), Pandion halliaetus (águia pescadora), e Sterna hirundo (trinta-
réis de bico vermelho), de acordo com Saenger et al. (1983) e Marcondes-
Machado & Monteiro Filho (1989) (Tabela III). Além destas espécies existem as 
endêmicas da região Neotropical, consideradas bastante escassas em alguns 
segmentos do litoral brasileiro, podendo estar envolvidas com algum tipo de 
ameaça iminente. Neste caso acham-se incluídas as espécies Eudocimus 
 26
ruber, Ixobrychus involucris, Oxyura dominica e Netta erythrophthalma (Scott & 
Carbonell, 1986). 
 
Trichechus manatus (peixe-boi) é considerada como espécie vulnerável 
pela classificação da UICN (Fonseca et al., 1994) e sua conservação depende 
também da preservação dos ecossistemas costeiros, principalmente dos 
manguezais (Tabela III). 
 
Dermochelys coriacea (tartaruga-de-couro ou tartaruga gigante) e 
Chelonia mydas (tartarugaverde) entram no complexo estuarino-lagunar de 
Iguape-Cananéia para alimentar-se. As espécies Caretta caretta (tartaruga 
amarela), Eretmochelys imbricata (tartaruga de pente) e Lepidochelys olivacea 
(tartaruga pequena), todas ameaçadas, ocorrem no litoral brasileiro e podem, 
também, estar associadas a outros sistemas estuarinos da nossa costa (Tabela 
III). Pendoley & Fitzpatrick (1999) observaram a espécie Chelonia mydas 
abrigando-se em áreas de manguezais da Austrália, alimentando-se de folhas 
de Avicennia marina. A conservação deste sistema natural é de fundamental 
importância para auxiliar a preservação dessas espécies marinhas. 
 
 
2.6. Intensidade de utilização da diversidade biológica para o grupo de 
ecossistemas 
 
Nas regiões Norte e Nordeste, segundo Schaeffer-Novelli (1989), primam 
o empirismo e o imediatismo sobre os seguintes produtos: derrubada de 
árvores de mangue para lenha; madeira para construção e extração de tanino; 
pesca predatória incidindo sobre moluscos, crustáceos e peixes (inclusive 
utilizando explosivos); atividades salineiras, além da instalação de viveiros e 
tanques para aqüicultura (Tabela V). 
 
Nas regiões Sudeste e Sul, o extrativismo continua imperando porém, 
devido às formas mais desenvolvidas de uma sociedade de consumo, 
aparecem aterros, lixões, empreendimentos imobiliários, distritos industriais, 
todos se utilizando dos manguezais como terras de “baixo custo”, ignorando 
seu valor como verdadeiros celeiros biológicos (Schaeffer-Novelli, 1989). 
 
Ainda sobre este aspecto, a demanda por produtos provenientes do 
ecossistema manguezal provocou aumento na captura de caranguejo-uçá 
(Ucides cordatus), pela utilização predatória de artefatos como redinhas, 
armadilhas denominadas “ratoeiras” e substâncias químicas como o carbureto, 
colocando em risco o estoque deste organismo em diversos setores do litoral. 
Ostras de mangue também vêm sendo explotadas com tamanhos abaixo do 
previsto pela legislação, principalmente quando raízes inteiras do mangue 
vermelho (rizóforos de Rhizophora mangle) são cortadas pelos coletores. 
 
 
2.7. Vetores de pressão sobre a diversidade 
 
Na obra “Os ecossistemas brasileiros e os principais macrovetores de 
desenvolvimento: subsídios ao planejamento da gestão ambiental” (Brasil, 
 27
1996), as áreas costeiras e a região da floresta atlântica consideradas como 
“as dependências ecológicas entre a Floresta Atlântica, as Áreas Costeiras 
emersas, sob influência das marés e submersas até os rebordos da Plataforma 
Continental”, mereceram tratamento conjunto, embora os responsáveis tenham 
reconhecido ser compartimentos totalmente diferenciados. Aquele documento 
adotou metodologia que fosse capaz de apresentar resultados que atendessem 
aos seguintes requisitos: visão integrada do desenvolvimento brasileiro atual e 
seus rebatimentos especificamente ambientais na escala da União; apreensão 
das principais macrotendências, além de diagnóstico ambiental básico. 
 
Assim, os compartimentos dos macrovetores identificados com atuação 
sobre os Ecossistemas das Áreas Costeiras e da região de Floresta Atlântica 
no tocante ao uso e ocupação das terras foi, de uma maneira geral, assim 
caracterizado: 
 
ƒ extrativismo animal e vegetal nos ecossistemas flúvio-marinhos e flúvio-
lacustres; 
ƒ infra-estruturas urbana, portuária, de turismo e lazer; e, 
ƒ localizadamente, agricultura, pastagens e silvicultura. 
 
Passando de uma escala da União para uma regional, no Nordeste um 
dos fatores responsáveis pela degradação do mangue é o despejo de vinhoto 
das usinas produtoras de álcool, causando grande mortalidade de peixes e 
crustáceos. A isso se acrescenta a grande quantidade de inseticidas e 
fungicidas usados na cultura de cana-de-açúcar e que escorre para as áreas 
de mangue. A cultura de cana-de-açúcar, depois de ocupar os “tabuleiros” 
pouco adequados para o plantio, se extende para os terrenos próximos aos 
manguezais (Diegues, 1991). 
 
A ocupação urbana também é um grande fator de degradação dos 
manguezais, como o que ocorreu com a Coroa do Meio, em Aracajú/SE. O 
manguezal, ocupado por catadores, foi cortado para dar origem a um bairro 
residencial de luxo. A orla de Coroa, desprovida das árvores de mangue, 
começou a sofrer erosão do mar, causando destruição de parte da estrada 
asfaltada recém-construída (Diegues, op. cit.). 
 
Embora os manguezais não tenham valor de mercado, sabe-se que 
exercem uma série de funções gratuitas, como por exemplo a preservação da 
linha de costa, retenção de sedimentos, filtro biológico, berçário. A destruição 
dessas funções obriga a sociedade a pagar muito caro pela sua recriação 
artificial (amuradas de cimento, enrocamentos) (Diegues, 1991). 
 
A poluição de importantes ecossistemas costeiros e estuarinos em nível 
nacional, onde se dá a produção de alimento e o crescimento de fases larvares 
e juvenis dos recursos pesqueiros, vêm acarretando redução dos estoques em 
níveis tão acelerados, que seu impacto é sensível na produtividade e índices 
de abundância (CIMA, 1991). 
 
A redução significativa das áreas de manguezal e a desfiguração de 
importantes complexos estuarinos e de baías, vem reduzindo o habitat de 
 28
muitas espécies, implicando em maior competição pelo alimento e predação 
entre espécies, contribuindo de forma importante para a aceleração da curva 
de mortalidade (CIMA, op. cit.). 
 
A falta de proteção aos estoques que em sua fase juvenil sofrem a ação 
da pesca indiscriminada e pouco seletiva, com insustentável índice de refugo 
ou descarte, é poderoso entrave à racionalização da explotação pesqueira, 
colocando em risco de sobrepesca inúmeros recursos (CIMA, 1991). 
 
O corte indiscriminado das árvores de mangue pode vir a transformar 
esses manguezais em marismas, cujas espécies vegetais seriam mais 
resistentes às novas condições antropizadas. Considerando-se a importância 
do manguezal como exportador de carbono orgânico e de nutrientes para as 
águas costeiras, uma substituição dos manguezais por marismas ocasionaria, 
certamente, um declínio da produtividade e conseqüentemente das atividades 
pesqueiras junto a costa (Costa & Davy, 1992). 
 
A privatização de áreas de praias e junto às margens dos rios e estuários, 
onde tradicionalmente e legalmente os pescadores artesanais praticavam suas 
atividades de subsistência, vem reduzindo as oportunidades de sobrevivência 
dessas populações ribeirinhas como também, reduzindo os estoques dos 
recursos vivos (Schaeffer-Novelli, 1989). 
 
 
2.8. Impactos de origem natural 
 
Existem diversas perspectivas considerando o aumento do nível médio 
relativo do mar para as próximas décadas, porém qualquer elevação irá afetar 
o ecossistema manguezal e a resposta a tal elevação estará relacionada às 
taxas em que esse aumento ocorrer (Schaeffer-Novelli et al., in press b). 
 
Para o Brasil, os diferentes tipos fisiográficos descritos anteriormente 
(Schaeffer-Novelli et al., 1990), mais precisamente para cada tipo de bosque ao 
longo da linha de costa, irão responder diferentemente ao aumento do nível 
relativo do mar, como também ao aumento da temperatura na atmosfera 
terrestre devido ao efeito estufa. 
 
Em primeiro lugar, deve-se considerar alguns aspectos importantes, no 
que se reporta aos efeitos das mudanças climáticas globais sobre o 
ecossistema manguezal: 
 
ƒ existência de locais de provável refúgio no caso de uma "migração" do 
bosque em direção à terra firme; 
ƒ aumento da produção de serapilheira devido ao aumento das temperaturas; 
ƒ efeito sobre o aporte de sedimento nos rios e deltas; e, 
ƒ efeito dos processos geomorfológicos (erosão, sedimentação e 
subsistência/ progradação). 
 
Nas regiões Sudeste e Sul, a substituição de alguns ecossistemas 
(marismas e faixa de transiçãopara restinga) seriam diretamente afetados, 
 29
sendo que para as marismas, um pequeno aumento do nível médio do mar 
seria suficiente para acarretar mudanças na zonação desse ecossistema, até 
sua total eliminação (Huiskes, 1990). Nas Unidades III e IV, descritas por 
Schaeffer-Novelli et al. (1990), bancos de Spartina, em áreas de baixa energia 
e suave topografia, poderão ser afetados diretamente pelo aumento da 
freqüência de inundação e por uma elevação do nível das águas do estuário, 
induzindo modificações na topografia do terreno. Para a faixa de transição com 
a terra firme, a substituição das espécies deste ecótone se daria devido a 
inundações pelas preamares e o conseqüente aumento da salinidade no 
sedimento, favorecendo uma substituição por espécies típicas de mangue ou 
por outras espécies psamohalófitas. Os espaços das restingas seriam erodidos 
e os sedimentos retrabalhados. As espécies adaptadas aos sedimentos 
arenosos, com baixa freqüência de inundações, seriam privilegiadas na 
competição pelo substrato. Na região Sudeste, a exemplo de Cananéia-Iguape, 
Laguncularia racemosa poderia ser a espécie pioneira. 
 
Porém, em regiões onde praticamente inexistem “áreas refúgio”, como na 
Baía de Todos os Santos, cujas planícies costeiras são limitadas por rochas 
sedimentares encaixadas em rochas cristalinas (Ramos, 1993), a perda das 
faixas anteriores dos bosques de mangue seria inevitável. 
 
Em regiões onde os manguezais colonizam extensas planícies costeiras, 
como no Delta do Parnaíba, os bosques poderiam estar menos vulneráveis 
devido ao equilíbrio entre os processos de subsidiência e de progradação. 
Segundo Woodroffe (1990) devemos considerar que em relação aos ambientes 
deltaicos a resposta dependerá tanto do fornecimento de sedimento ao 
sistema, como das características fluviais e tidais. O mesmo autor enfatiza que 
os manguezais podem resistir a taxas de elevação do nível médio relativo do 
mar de 100 a 150 cm/século. 
 
As respostas do ecossistema manguezal são bastante previsíveis. As 
mudanças serão observadas em nível da zonação e da 
colonização/distribuição das espécies da fauna (endofauna e incrustante) e, 
principalmente da flora. Dessa forma podemos salientar que na partes frontal 
do bosque (franja) e posterior (transição para terra firme) os efeitos serão mais 
mensuráveis, enquanto que para a região central (bacia) serão menos 
sensíveis (Schaeffer-Novelli & Cintrón-Molero, in press b). 
 
Ao confrontarmos com a realidade brasileira, podemos afirmar que as 
planícies salgadas de maré, mais conhecidas como "apicuns", seriam 
colonizadas por espécies de mangue. As marés altas de sizígia seriam 
responsáveis pela preparação desses substratos no que se refere a diluição 
dos sais acumulados. Posteriormente, os propágulos seriam trazidos pelas 
preamares, colonizando o ambiente previamente modificado. 
 
A ocupação desordenada das áreas adjacentes aos bosques de mangue, 
provocada pelo crescimento das cidades litorâneas, expansão industrial e 
aqüicultura, entre outros, levaria a um comprometimento considerável das 
possíveis “áreas refúgio”. 
 
 30
O aumento do nível dos oceanos devido às mudanças climáticas globais, 
e a conseqüente barragem na foz dos rios, deverão aumentar as áreas 
inundadas e as inundáveis em muitos rios grandes ou pequenos ao longo da 
costa. Se em algumas destas áreas costeiras houver um aumento de 
precipitação como está previsto como parte das mudanças climáticas globais, 
as situações em alguns locais que já são críticas, poderão se tornar 
calamitosas como é o caso do Vale do Ribeira ao sul do Estado de São Paulo, 
ou dos estuários dos rios da área do Recife/PE (CIMA, 1991). 
 
No caso mais específico de áreas naturais de produção, especialmente de 
camarões nas áreas costeiras, o problema pode tornar-se bastante sério, pois 
qualquer aumento do nível dos oceanos, ou alteração da qualidade das águas, 
poderá alterar a capacidade de produção destes sistemas (CIMA, op. cit.). 
 
 
 
 
 
2.9. Pressões antrópicas gerais da unidade físico-ambiental e para o 
grupo de ecossistemas 
 
2.9.1. Derivadas do uso direto 
 
Usos tradicionais, segundo Diegues (1991) 
 
“Os mangues foram utilizados pelas populações indígenas antes da 
chegada dos colonizadores europeus como atestam os montes de ostras 
retiradas das raízes de mangue. 
 
No período colonial, além de fonte de alimento (peixes e crustáceos), o 
mangue era utilizado para retirada de madeira de lenha e tanino para curtumes. 
Já no século XVIII a extração de madeira de mangue era tamanha, 
particularmente no Nordeste onde era usada como lenha para as usinas de 
açúcar, que o Rei D. José em Alvará com força de lei datado de 1760 proíbe o 
corte, reservando a vegetação para extração do tanino para os curtumes da 
metrópole. 
 
Até as primeiras décadas do século XX, as áreas de mangue eram 
exploradas de forma pouco intensa para a pesca, construção de “viveiros” de 
peixes (aqüicultura extensiva) em áreas estuarinas, pesca esportiva, “caiçaras” 
(galhos de mangue usados para construção de habitats para peixes) e retirada 
de material para construção de casas e cercos. No Nordeste, especialmente no 
Rio Grande do Norte, áreas de mangue começaram a ser utilizadas para 
construção de salinas. 
 
Com exceção dessa última atividade (salinas), as áreas de mangue ainda 
hoje são utilizadas por comunidades de pescadores e extrativistas que delas 
dependem para sua sobrevivência (Diegues, 1987). 
 
 31
A partir da década de 50, as áreas estuarinas e de mangue começaram a 
ter uma utilização intensa para fins de implantação de indústrias e expansão 
imobiliária. Os manguezais foram cortados para implantação de pólos 
industriais e minero-metalúrgicos. Nesses empreendimentos não houve 
somente a degradação de um dos ecossistema mais produtivos da biosfera, 
mas um empobrecimento ainda maior das populações tradicionais que 
dependem dele para sobreviver (Diegues, 1991).” 
 
 
Aqüicultura, considerações gerais e comentários, segundo Maciel (1991) 
 
“A construção de tanques para cultivo de camarão no manguezal começa 
pela remoção total da cobertura vegetal, seguida de escavação do terreno, 
compactação dos taludes feitos com material da escavação, e sistema de 
comportas para manter estável o nível d’água em qualquer estágio da maré. 
 
A produtividade nos tanques com água salobra é relativamente baixa 
devido a presença de enxofre no sedimento, tendendo a ser anti-econômica, 
pois é necessário usar grandes quantidades de carbonatos para ajustar o pH 
garantindo o crescimento dos camarões. Culturas semi-intensivas envolvem 
fertilização, alimentação suplementar, controle de doenças e manipulação dos 
estoques. 
 
Um tanque de cultivo é uma fonte potencial de poluição, resultante do 
excesso de fertilizantes e alimentos, causando eutroficação do estuário (FAO, 
1982). Biocidas são usados também para eliminar moluscos que competem por 
alimentos no fundo dos tanques, crustáceos parasitas, caranguejos e peixes 
predadores de camarão, além das doenças produzidas por fungos. 
 
A captura intensiva de larvas para povoar os tanques reduz os estoques 
naturais dos estuários, causando declínio da pesca artesanal, com graves 
prejuízos sociais. 
 
Nas áreas de mangue, vizinhas aos tanques, a flora e a fauna do 
ecossistema vão sendo prejudicadas devido a alteração na drenagem, na 
freqüência de inundação, bem como pelas águas servidas (tóxicas) 
provenientes das descargas dos tanques e dos canais de drenagem 
construídos sobre sedimento rico em enxofre, que em contato com o ar pode 
transformar-se em ácido sulfúrico. 
 
A maioria dos empresários brasileiros usa o Equador como exemplo da 
lucratividade da criação de camarão no mangue, citando os milhões de dólares 
que

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