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A evolução dos fundamentos da teoria do delito

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A evolução dos fundamentos da teoria do delito
Por Paulo Cesar Busato, Procurador de Justiça no MP-PR, Professor e Doutor em Direito Penal.
1. Introdução. A teoria do delito como gramática interpretativa do processo de imputação.
Para falar de uma teoria do delito, é necessário compreender que antes de tudo que ela traduz uma forma e não a única forma de se interpretar o fato ilícito. Fato concreto a demonstrá-lo é a completa ausência do sistema no âmbito do Common Law.
Assim como a gramática está para a língua, a teoria do delito e está para o crime. Trata-se de um conjunto de regras visam e permitir aos intérpretes a adequada compreensão do que se fala ou do porque se pune.
A teoria do delito visa estabelecer parâmetros gerais sobre os quais serão fixados critérios de imputação jurídico-penal. Isto significa compor um conjunto de regras que vai servir de baliza interpretativa para a subsunção do fato à norma.
É por isso que os fatores histórico e geográfico determinam o eixo sobre o qual varia sempre esta mesma fórmula de interpretação. É claro que há parâmetros mínimos comuns entre mais de uma sociedade e entre mais de um momento histórico para fixar estas regras, e em razão disso é possível encontrar pontos comuns entre mais de uma organização sistemática de imputação.
Evidentemente, as gramáticas não são iguais. Cada língua, pelos caracteres próprios de cada sociedade, possui arranjos próprios, precisa organização gramatical que sirva ao seu modelo de sociedade. Uma gramática visa permitir a comunicação, a interpretação, o a compreensão e entre os que se relacionam.
A teoria do delito funciona de idêntica maneira. Permite que o Estado se comunique com o indivíduo através das regras de imputação, e indique com isso, os mínimos múltiplos comuns de uma convivência pacífica e entrega à hermenêutica do direito uma estrutura que admita a interpretação. Ademais, deve estar organizada de maneira a que nela se possa ver, e compreender, as diretrizes e perfis políticos do Estado que ela representa.
Esta comparação permite ver claramente a razão pela qual uma teoria do delito, fora de seu contexto geográfico, cultural, sociológico ou histórico se encontra previamente fadada ao fracasso.
O que se pretende neste trabalho não é mais que demonstrar a adequação da paródia empregada, ou seja: demonstrar, de um lado, quão nefasto pode ser o empenho em conter os efeitos da natural evolução humana, cultural, histórica e social no âmbito do direito penal, agarrando-se a conceitos e modelos superados historicamente, e também, o quanto é nociva a importação de modelos prontos provenientes de outra realidade social, cultural ou política. Do mesmo modo, se pretenderá demonstrar o proveito e a necessidade de aproveitamento das conquistas derivadas da evolução técnica dos modelos de imputação penal e o ajuste do nosso modelo de imputação na direção do seu desenvolvimento.
Para tanto, o que se fará aqui é um breve resumo sobre a origem e o desenvolvimento das primeiras formulações sistemáticas de teoria do delito, ou seja, das primeiras organizações de critérios e regras para imputação delitiva dando apenas os contornos gerais de sua evolução, em seguida, apresentar as principais tendências de desenvolvimento do mencionado sistema na atualidade, procurando sublinhar os pontos positivos e negativos de cada uma, culminando por apontar, dentro de uma coerência com o ponto de partida, o modelo evolutivo que parece ser o mais adequado.
2. As origens da concepção de um modelo sistemático de teoria do delito.
Evidentemente, a idéia de um sistema que pudesse traduzir segurança jurídica para o âmbito do Direito penal somente poderia brotar do cientificismo ilustrado.
2.1. A pretensão científica do direito e sua influência no direito penal
Uma das mais destacadas questões que aparecem no direito a partir do positivismo é a que se refere ao seu caráter científico.
A separação definitiva entre moral e direito exigiu deste último uma base fundamental que fosse tão importante, do ponto de vista social, como foi em seu tempo a moral cristã e para o jusnaturalismo.
As revoluções burguesa e industrial tiveram respectivamente o condão de, a um só tempo, abrirem as portas da Universidade e da ciência a um maior número de pessoas, subtraindo-as da exclusividade do Primeiro e Segundo Estados e de dotar de impulso econômico o avanço científico.
Estes dois fatores contribuíram para levar a ciência (assim entendida a ciência natural) ao centro de interesse de desenvolvimento humano. É lógico pensar então que pretendessem os juristas em dotar o objeto de seu interesse do mesmo caráter científico então em evidência.
Não causa estranheza a pretensão de levar o direito à categoria de ciência. Para tanto, era absolutamente necessário que as ferramentas do jurista correspondessem tanto quanto possível aos padrões científicos da época.
O direito precisava livrar-se das referências metafísicas e de adotar conceitos e de padrões próprios das ciências da natureza.
A conseqüência imediata é a necessidade de negação da associação entre direito e moral e a adoção das principais características da ciência natural, a saber, a relação de causa e efeito e a busca de uma verdade absoluta.
2.1.1 A superação do direito natural. A separação entre direito e moral no âmbito do direito penal.
Evidentemente a necessidade científica associada ao momento histórico produziu uma cisão absoluta de critérios entre o direito e a moral.
O direito que atendia a aspiração dos burgueses não poderia ser o mesmo o que atendia às pretensões de controle da igreja. A dimensão tomada pelas liberdades individuais, proveniente do Iluminismo, era nitidamente oposta à idéia de controle sobre a vontade que permeava o direito, herdada do modelo de direito canônico.
As categorias do Direito penal não deveriam mais responder a pretensão de regular a norma de acordo com padrões de moral, mas sim à busca de uma verdade que correspondesse aos ideais de libertação do homem de qualquer espécie de jugo.
2.1.2. A influência do método positivista na concepção de uma teoria do delito.
As pretensões classificatórias do método cartesiano empregadas por Darwin e os cientistas naturais na construção dos seus padrões de verdade científica foram transplantadas para o âmbito do Direito penal.
Aparece aí a necessidade de suplantar a concepção hegeliana de que o crime é igual à ação criminosa. Surge a adoção da análise como método de compreensão do fenômeno do crime. Parte-se o todo em busca de elementos que, conjugados, possam conduzir à conclusão de que existe um fato criminoso. Esta conjugação obedece uma rígida composição de elementos que configuram o delito, cuja presença é capaz de determinar a verdade inarredável da necessidade de imputação das conseqüências penais.
Tendo sido o crime considerado já por Hegel, sinônimo de conduta delitiva, expressão da vontade[1]contrária ao direito, não seria próprio falar em “sistema de imputação”, pois, como adverte Roxin[2], citando Kant, um sistema é a unidade dos diversos conhecimentos sobre uma idéia ou um todo de conhecimento ordenado segundo princípios.
O crime aparecia então como uma conduta que promovia uma ofensa a um bem jurídico protegido penalmente. Para Hegel[3], crime é a “violência exercida pelo ser livre, que lesa a existência da liberdade em seu sentido concreto, que lesa o direito como tal”. Assim, cada delito era caracterizado como tal tendo em vista simplesmente a violação de um direito.
O avanço do positivismo e de seu método analítico de decomposição em elementos para o conhecimento do todo, foi o fator determinante para que a dogmática jurídico-penal passasse a buscar as características comuns entre os delitos, com a finalidade de organizar um mecanismo genérico de compreensão da figura delitiva.
Aparecem então, uma a uma, as categorias identificadas como componentes do delito iniciando pela identificação da ação como pedra básica do sistema, que aparece pela primeira vez no Manual de Albert Friedrich Berner,em 1857[4]. Logo, aparece a obra “O momento da culpabilidade no Direito privado romano” de Rudolph von Ihering, em 1867, promovendo a divisão do ilícito civil em dois distintos aspectos: objetivo e subjetivo, correspondentes respectivamente ao injusto e à culpabilidade. A identificação, que ocorre no direito civil é transportada para o campo do direito penal por Von Liszt que adota a bipartição entre um elemento objetivo do crime que é o injusto e outro subjetivo que é a culpabilidade. O próprio lado objetivo do delito, o injusto, é divido por Ernst Beling, em 1906, entre tipo e antijuridicidade.
Em geral, aponta-se como marco inicial da ciência jurídico-penal, assim considerado uso de conceitos precisos e a estruturação sistemática do objeto de estudo, a obra de Feuerbach, com seu Tratado de 1901 e o seu trabalho de elaboração legislativa do Código Bávaro de 1913[5].
Estas contribuições, havidas no final do século XIX e início do século XX, conjugadas com o cenário histórico e político da época deram ensejo à idéia de uma estruturação analítica do estudo do delito, e como tal, do sistema de imputação.
Neste momento, a sistematização, como comenta Muñoz Conde[6], tem por objetivo “racionalizar a interpretação e a aplicação do Direito Penal, excluindo [...] o acaso e a arbitrariedade, dando base à administração da Justiça justa e equitativa”.
Não é demais lembrar que recém se estava saindo dos modelos de Estado absoluto, para a configuração do chamado Império da Lei.
3. Teorias clássicas do delito. O eixo ontológico da teoria do delito.
A composição do sistema se dá através de ordenação de elementos, de categorias, que correspondem tanto quanto possível a conceitos e categorias extraídos de verdades científicas preconcebidas por outras formas de ciência. Ademais, o sistema consiste não só na ordenação destas categorias, como também na organização em precisão das relações que estas categorias guardam entre si, de modo a facilitar o trabalho do intérprete, que é simplesmente de subsunção do fato concreto à regra normativa.
3.1. As bases científicas ontológicas do sistema e teórico do delito em um marco estritamente positivista.
Assim, as primeiras formulações de sistema de imputação jurídico penal, obedeceram a ao uma estreita vinculação com caracteres e elementos extraídos das ciências naturais. A essência do delito, o ponto nuclear sobre o qual se organizava todo o sistema era o conceito de ação. Um conceito de ação herdado da física, da mecânica, ou qual se ligava ao resultado desse valorado pelo direito através de uma relação de causa e efeito também proveniente da mesma fonte.
3.2. O causalismo.
A expressão causalismo, em Direito penal, vem sendo empregada para designar um conjunto de teorias propostas nas origens da sistematização do direito penal que nem sempre guardaram entre si tantas similitudes quanto se pretende fazer crer. Principalmente em virtude das oposições oferecidas por Welzel que situavam em um mesmo patamar dito “causalista” propostas tão distintas como neokantismo e o causal-naturalismo, é comum que se situe, a efeito de análise histórica, sob um mesmo epíteto de causalismo as tendências que têm efetivamente na relação de causalidade sua nota essencial, ainda que nos demais aspectos alberguem tendências absolutamente distintas.
A denominação causalismo e principalmente empregada no sentido mais abrangente pelos partidários do finalismo, que adotaram a proposição de Welzel no sentido de que o neokantismo e as chamadas teorias sociais da ação não faziam mais que mascarar em seu o âmago uma essência causal-naturalista.
3.2.1. O causal-naturalismo.
Com o pano de fundo positivista, é claro que o primeiro sistema de imputação jurídico penal ou só poderia receber a denominação de sistema causal- naturalista ou sistema clássico da teoria do delito.
Este sistema, desenvolvido principalmente por Von Liszt e Beling, foi dominante no início do século XX e era composto segundo a forma científica própria do positivismo, ou seja, adotava um perfil eminentemente classificatório de seus elementos, utilizando conceitos avalorativos, próprios das ciências naturais como a física ou a psicologia.
A estruturação “se baseava na hipótese de que o injusto e a culpabilidade se comportam entre si como a parte externa e a parte interna do delito”[7]. Como conseqüência disso, os elementos objetivos se distribuíam entre o tipo e a antijuridicidade, enquanto que restava para a culpabilidade todo o aspecto subjetivo do delito.
O ponto de referência sobre o qual se organiza todo o resto do sistema de imputação é o conceito de ação e como movimento voluntário capaz de causar modificação no meio externo[8].
O tipo penal, composto de elementos meramente descritivos, apresentava uma situação de fato proveniente de uma conduta.
A antijuridicidade, embora juízo de valor, era representada pela mera contradição entre a norma que ordenava obediência ao ordenamento jurídico e a conduta do agente, dada a ausência de causas de justificação.
A culpabilidade era o elemento psicológico de união entre a conduta e seu autor, o móvel da conduta, desde o ponto de vista estritamente psicológico (teoria psicológica da culpabilidade).
Se estabeleciam divisões claramente dicotômicas, formais, selecionando de um lado os aspectos objetivos do delito (tipo e a antijuridicidade) e de outro lado os aspectos subjetivos (culpabilidade); de um lado os aspectos valorativos (antijuridicidade) e de outro os meramente descritivos (tipicidade e culpabilidade).
3.2.2. O neokantismo. A agregação de fatores axiológicos ao eixo do sistema. Teoria social da ação.
O aparecimento do novo modelo de filosofia dos valores no sudoeste alemão, com a obra de Wildelband, Stamler, Rickert e Lask, questionando o paradigma positivista-naturalista do direito, trouxe à tona uma nova perspectiva de consideração da própria ciência[9]. Ao lado das ciências naturais e identificaram as ciências sociais. As primeiras associadas ao ser e as segundas ao dever ser. Dentro das ciências do dever ser apresentavam o direito. O direito como ciência da cultura apresentava um método próprio relacionado a valores.
Como efeito imediato no âmbito do direito penal aparece a admissão de fatores axiológicos na determinação dos conceitos, gerando o que se chamou sistema neoclássico ou neokantista da teoria do delito, cuja expressão melhor acabada foi o Tratado de Edmund Mezger[10].
Aparece aqui uma perspectiva de sistema já não simplesmente formalista, classificatória, mas sim teleológica.
Ademais, o próprio desenvolvimento das categorias do delito conduziram ao reconhecimento da inexistência da taxativa separação entre injusto e culpabilidade com base em seu caráter respectivamente objetivo e subjetivo. Reconheceu-se a presença de elementos subjetivos no âmbito do injusto e de elementos normativos tanto em um âmbito quanto em outro.
O próprio eixo do sistema, a saber, o conceito de ação, se identifica, em alguns casos, como "conduta socialmente relevante”[11]. Em outros, inclusive perde sua condição de primazia na teoria do delito para o próprio conceito de tipo[12].
O injusto passa a ser considerado desde o ponto de vista de sua danosidade social.
O tipo passa a ser dotado de um conteúdo material, considerado tipo de injusto, indicativo da antijuridicidade, verdadeira antijuridicidade tipificada. Os extremos desta tendência chegaram a conduzir à chamada teoria dos elementos negativos do tipo[13].
A antijuridicidade também aparece associada a critérios sociais, relacionados com seu potencial de lesividade, ampliando a fundamentação teológica das causas de justificação com base em critérios associados ao princípio de proporcionalidade.
A culpabilidade passa a ser valorada como juízo de reprovabilidade. Em seu âmbito aparecem pela primeira vez elementos normativos representados pela adição da exigibilidade de conduta diversa[14] e pela conversão do dolo em dolus maluspela associação da vontade à consciência da ilicitude[15].
3.3. O finalismo.
Em propostaabsolutamente inovadora o professor Hans Welzel propôs um modelo de sistema diferenciado, que de um lado negava a rígida separação entre o mundo ontológico e o mundo axiológico e de outro, também rechaçava a proposta de separação entre os aspectos subjetivos e objetivos do delito, sustentando que somente era dado ao direito regular aquilo que estava pré-determinado pela natureza, sem que seja possível ao primeiro ultrapassar os limites desta última. Assim, afirma[16] que “nenhuma norma, nem moral nem jurídica, pode preceituar às mulheres que dêem à luz filhos viáveis aos seis meses, ao invés de nove, como tampouco podem proibir a um aviador que se precipita ao solo que ultrapasse os trinta quilômetros por hora”.
Welzel partia, pois, da idéia de que determinadas estruturas retiradas da realidade vinculavam o direito e estabeleciam as bases sobre as quais seria construído o modelo de imputação. Assim, a partir de dizer que a toda a ação humana é dirigida a uma finalidade e que isto constitui a própria natureza do agir humano, Welzel estabeleceu uma série de valorações escalonadas que deveriam identificar o delito.
Sobre este conceito de ação se estruturava, para Welzel, toda a teoria do delito.
Se a ação é destinada a um propósito evidentemente o dolo que representa a vontade dirigida ao propósito delitivo já deve estar presente na própria ação.
O tipo corresponde simplesmente à descrição da proibição, da ação proibida. Deste modo, uma vez que a ação já é dotada de um propósito, o dolo passa a integrar o próprio tipo.
A antijuridicidade se traduz em simples ausência de causas de justificação. Estas, por seu turno, estão vinculadas à estrutura de uma ação finalista e, por isso, devem possuir um elemento subjetivo. Na medida em que a presença de uma excludente de antijuridicidade torna uma ação permitida pelo ordenamento jurídico, e que toda a ação visa a uma finalidade, é imprescindível a correspondência entre o propósito visado com o a atuação justificada e a ordem jurídica.
A culpabilidade, como juízo de reprovação pessoal, estrutura-se na idéia do livre arbítrio, da possibilidade de escolher para a conduta uma finalidade lícita.
3.3.1. Crítica ao modelo causal-naturalista.
As contundentes críticas apresentadas pelo finalismo contra o modelo causal determinaram a derrocada deste.
Ainda que houvesse concordância entre causalistas e finalistas no que se refere à situação da ação como um conceito ontológico que servia de eixo para a elaboração do sistema de imputação, havia frontal discordância no que se refere ao conceito natural de ação, é dizer, em que consiste a mencionada ação. O ponto crucial da superação do causalismo pelo finalismo reside aqui, na medida em que o próprio Welzel sustenta que sua teoria é antes de tudo uma teoria da ação, que visa explicar que a finalidade é o diferencial da ação humana, não se restringindo a um mero movimento voluntário, mas sim já de dotada previamente de uma vontade dolosa ou imprudente.
Para Welzel[17], a «finalidade» é guia da ação e consiste justamente na capacidade compreensão a respeito do possível ou provável resultado da ação. A base do finalismo é justamente admitir que o dolo não é outra coisa que “a vontade final que rege o acontecimento causal”de realização do fato típico.
A partir desta concepção, os finalistas apresentaram distintas conseqüências para a teoria do delito, demonstrando que em vários pontos, o causal-naturalismo apresentava irremediáveis falhas.
A mais evidente delas, que salta logo à vista é a situação do delito omissivo. Em se considerando a ação um “movimento voluntário modificativo do meio exterior”, não era explicável a relevância da omissão[18].
Assim, se o dolo encontra-se na ação, está presente no ilícito tentado, com o que não é razoável deslocá-lo à culpabilidade tão somente no momento da consumação. A conclusão inarredável é que o dolo não faz parte da culpabilidade.
3.3.2. A oposição ao neokantismo.
A força das críticas de Welzel[19] e dos demais finalistas relacionando o neokantismo ao causal-naturalismo, em especial ao colocar em evidência as coincidências sistemáticas entre as duas tendências no que tange à pretensão de separação entre o “causal-objetivo” e o “anímico-subjetivo”, ao isolar a voluntariedade, o querer, da consciência deste querer, levou esta perspectiva à idêntica ruína. Tanto mais diante da evidente existência de elementos subjetivos no tipo ou no tipo de injusto. Tudo isso levou a rechaçar, sob idênticos argumentos dogmáticos, ambas as perspectivas.
Por outro lado, no ponto de vista dos fundamentos, Welzel[20] negou o dualismo metodológico proposto pelo neokantismo, sustentando o a existência de uma relação presente entre o ser e o dever ser o no campo do direito. Isto porque o direito consiste em uma forma de regulação da realidade, mas não pode negá-la. O mundo possui uma lógica natural, da qual extrai elementos e o sistema não pode pretender ultrapassar esta determinação. Assim, somente após uma prévia análise da realidade ontológica, é possível ao direito proceder a valoração que lhe é própria.
Com isto Welzel admitia que existe um mundo de fenômenos naturais que se comunicam e ao mesmo tempo condicionam o trabalho do legislador.
Esta perspectiva conflitava diretamente com o dualismo metodológico neokantista, com a separação entre o mundo do ser e do dever ser.
3.3.3. A prevalência do finalismo.
As propostas finalistas culminaram por receber larga aceitação no meio doutrinário e as críticas aos modelos causal-naturalista e neokantista fizeram do finalismo o modelo padrão de teoria do delito.
De outro lado é certo que o finalismo supõe uma base muito mais associada aos primeiros critérios do sistema causal naturalista do que ao neokantismo, dada sua estreita ligação com o mundo do ser e sua pretensão formalista.
Não se pode negar a evidente contribuição do finalismo para a evolução da teoria do delito.
De outro lado, ao identificar os modelos causal-naturalista e neokantista em uma frente única contra a qual se opôs, o finalismo pretendeu fazer prevalente uma concepção baseada essencialmente em um alto grau de condicionamento ontológico que afastou, durante longo tempo, a discussão dogmática dos aspectos valorativos e, por via de conseqüência, do âmbito político-criminal.
Em recente e decisivo estudo, Muñoz Conde destacou a importância da adesão de Edmund Mezger, então o mais consagrado penalista alemão, ao aprofundamento da discussão a respeito do direito penal com base no aspecto ontológico do conceito de ação[21], afastando do que se pretendia fosse o espaçoonde deveria mover-se o jurista, todas as considerações de ordem filosófica, criminológica ou política. Assim, restava para o jurista a simples discussão dogmática, a análise e aperfeiçoamento das normas que regem o sistema de imputação.
Assim, malgrado os êxitos técnicos logrados, também é certo que esse isolamento dogmático também foi nocivo, por desprezar por completo os condicionamentos político criminais do sistema de imputação.
Estes dados supuseram um evidente retrocesso, ainda que não se possa negar a importante contribuição que o finalismo supôs para a evolução do estudo das categorias sistemáticas que compõem o delito.
4. O duplo esgotamento do sistema finalista.
O finalismo, porém, após viver seu auge desde o pós-guerra até o início dos anos 70, parece haver chegado ao fim de sua capacidade de geração de propostas para a evolução da teoria do delito. E isto aparece claramente quando se observa os trabalhos dos mais modernos e atualizados autores que defendem perspectivas estritamente finalistas, os quais já não se ocupam de propor avanços com relação ao sistema e sim, principalmente, de criticar as constantes e crescentes oposições que surgem a sua teoria[22].
De outro lado, a crítica fundamental que sofre todo o raciocínio sistemático jurídico penal ancorado em teorias ontológicas é justamente sua evidente contradição para com a própria concepção de direito. O direito, como sistema de valores confeccionadopara gerir a vida social, é absolutamente incompatível, em seus fundamentos, com a pretensão de neutralidade que representa a confecção de um sistema fechado, cujas bases metodológicas estejam vinculadas exclusivamente a imutáveis princípios ontológicos.
O modelo de sistema penal proposto pelo finalismo vem sendo pressionado claramente em duas frentes. Uma delas, relacionada com sua aplicação, diz com a freqüente confrontação de resultados insatisfatórios derivados da aplicação rígida do modelo de imputação proposto pelo finalismo, principalmente em face da moderna realidade criminológica. De outro lado, aparece também um desmantelamento de sua própria teoria de base: o neo-ontologicismo.
O próprio Roxin[23] reconhece que a conclusão pela necessidade de superação do modelo de imputação jurídico penal é solução comum a que se pode chegar através de dois caminhos distintos: o aprimoramento dogmático das categorias delitivas ou a evolução promovida no estudo do direito proveniente da perspectiva da filosofia da linguagem ao admitir que tanto uma como outra avançaram até um ponto comum.
4.1. A crise dos fundamentos filosóficos.
A superação da perspectiva finalista aparece vinculada completamente à própria evolução do pensamento humano, especialmente à necessidade de transcender a norma enquanto modelo sistemático fechado de solução de problemas.
Dentro do marco filosófico é corrente a idéia de superação do positivismo, mesmo dentro de suas mais modernas roupagens, como a oferecida por Hart[24] ou por Bobbio[25]. Porém é notório que a discussão filosófica se trava atualmente no campo do pós-positivismo[26].
As modernas correntes filosóficas põem em cheque algumas teses centrais do positivismo jurídico, tais como as conexões entre direito, moral e política e os problemas associados à indeterminação do próprio direito, referida em Vives Antón[27] como "pretensão de verdade".
Refere Calsamiglia[28] que “o enfoque positivista clássico kelseniano defendia o positivismo metodológico segundo o qual o único objeto da ciência do direito é o direito positivo”. Se estabelecia assim é uma limitação ao direito enquanto ciência: estudar a norma posta. Este princípio decorria de um lado o afastamento de questões axiológicas ou relacionadas com a moral e com a política e de outro lado, restringindo as perspectivas de interpretação à busca de conceitos absolutos e inflexíveis.
Evidentemente a filosofia do direito não tardou em descobrir a prevalência de uma indeterminação jurídica conceitual no âmbito do direito, assim também a imprestabilidade de um direito que produz resultados precisos, certos e intrinsecamente verdadeiros, porém injustos.
Restaram evidenciadas a impossibilidade de alcançar pretensão de neutralidade do direito, já que ele próprio é prenhe de conceitos que demandam valorações e a insuficiência do mero socorro do conjunto de conceitos jurídicos para a resolução dos problemas concretos que incumbem ao jurista[29].
Alcançou-se, assim, através da conclusão pela necessidade de superação do paradigma positivista, um ponto de insustentabilidade das teorias que de algum modo contribuíram para preservar estes pressupostos metodológicos.
4.2. A crise dos fundamentos dogmáticos.
O finalismo, consoante já referido, em seu intento exitoso de superação do neokantismo, soterrou, entre outras coisas a importante contribuição que esta perspectiva trouxe ao Direito penal, no sentido da busca de conteúdo material para as categorias do delito.
Resultou disso um retorno à chamada falácia naturalista, determinante de uma configuração da teoria do delito apoiada em estruturas lógico-reais.
Não tardaram em aparecer problemas insuperáveis tanto para a lógica interna do próprio sistema, quanto em face dos resultados de sua aplicação.
Apenas para nos fixarmos em uns poucos exemplos, vale comentar a incompatibilidade das funções atribuídas ao conceito de ação, que a um só tempo deveria ser dotado de conteúdo material suficiente para converter os demais degraus de identificação do delito em “aclarações pormenorizadas” e isolar-se completamente de quaisquer valorações jurídicas, sob o risco de invadir a esfera de domínio de outros elementos do delito[30].
Isto gerou o questionamento a respeito da capacidade de um conceito de ação puramente ontológico ser capaz de funcionar como o eixo do sistema de imputação.
Tanto isto é verdadeiro, que um dos imediatos efeitos da superação do marco ontológico como eixo do sistema de imputação foi a clara tendência, expressa em muitos manuais a partir dos anos 70, de iniciar a descrição da teoria do delito através da tipicidade.
Giorgio Marinucci, na interessante monografia Il reato come azione. Crítica di un dogma[31], retrata claramente que a incapacidade do conceito ontológico de ação para responder às funções que lhe foram exigidas pela teoria do delito conduziu, por uma parte, à redução das referidas funções e por outra na remodelação da própria estrutura da teoria do delito, subtraindo a condição de primazia do conceito de ação como eixo do sistema.
Ademais, em sendo o direito penal um sistema marcadamente político, já que se trata de escolher condutas as quais se vai imputar uma pena, não é possível manter um sistema ancorado em um conceito pretendidamente neutro, pré-determinado, correspondente a uma verdade absoluta.
De outro lado, também se pode mencionar o exagero subjetivista de concentrar toda a carga de desvalor do delito no âmbito da conduta, tornando irrelevante o resultado, que a cúmulo do exagero, conduziu à idêntica desvaloração do delito tentado e do consumado, consoante aparece na fundamentação de Zielinski[32].
O reconhecimento do injusto como mera realização da norma e contrariedade do ordenamento, conduzia à punibilidade objetiva de condutas que não representam a criação ou o incremento de um risco a um bem jurídico penalmente relevante, conduzindo a um gritante conflito entre os fins da pena, e os fundamentos de aplicação do sistema penal.
A idéia de que o sistema fechado de uma dogmática formalista e classificatória era capaz de dar resposta mais justa aos problemas práticos, mediante simples subsunção do fato à norma, mostrou-se claramente insuficiente.
Assim, paulatinamente, passou-se a exigir do direito penal, enquanto manifestação mais grave do arcabouço jurídico, instrumento mais contundente de que dispõe o Estado para a realização do controle social, uma preocupação maior para com os seus efeitos.
Em resumo, destes dois fatores - insuficiente resposta técnica e superação da teoria de base - derivou a necessidade de renovação do sistema de imputação, tanto no que concerne à definição, à organização, quanto no que refere ao conteúdo dos componentes do delito e à associação do conteúdo de cada um dos elementos que compõem o sistema de imputação às funções que deve cumprir o Direito penal.
5. O Funcionalismo
Deste modo, com a superação do paradigma ontológico-positivista, somado ao fracasso prático do isolamento do sistema penal em critérios formais-ontológicos, a necessária da superação da idéia de uma teoria do delito meramente descritiva aparece justamente na retomada de postulados já destacados por ocasião do neokantismo e que foram obinubilados pelo êxito do finalismo.
Estes postulados dizem respeito à busca de fundamentação material já não só para o sistema penal como um todo, ou seja, para o resultado da imputação, mas como justificação interna, para a composição de cada uma das categorias ou elementos que o compunham.
A verdade absoluta, a idéia de uma realidade unívoca, própria das teorias ancoradas em pressupostos ontológicos é substituída pelo reconhecimento da plurivocidade da realidade, da co-existência de distintas formas de interpretação. Isso conduz, naturalmente, ao envio dos problemas jurídico-penais para uma solução no campo axiológico dos valores que subjazem ao próprio sistema penal.
Assim, a proposta passa a ser de harmonizar os objetivos gerais do Direito penal, do objetivo que cumprem suas formas de reação, com oque se requer de cada um dos elementos que compõe o todo da imputação.
O raciocínio é absolutamente consentâneo com a idéia de preocupação com as conseqüências da aplicação do Direito penal.
Já não se trata de aplicar o sistema de imputação tendo como único objetivo o enquadramento do fato no sistema, gerando uma realidade de imputação imutável e presumivelmente verdadeira.
Se trata, melhor, de partir das funções que cumpre ou que deve cumprir o Direito penal para, através delas, determinar a configuração dos elementos que compõem a teoria do delito.
A construção do sistema de imputação não deve vincular-se a pressupostos metodológicos extraídos de dados ontológicos como a ação ou a relação de causalidade, e sim afinar-se às missões que se atribui, ou que se pretende alcançar através da aplicação do próprio sistema aos casos concretos.
Ocorre aqui uma ampliação do nível de exigência da capacidade de rendimento de cada uma das categorias do delito, no sentido de que estas estejam orientadas coincidentemente à consecução dos objetivos gerais do próprio sistema de imputação.
A essa tendência, denominou-se funcionalismo.
Ocorre, entretanto, que não existe uma completa harmonia doutrinária no que se refere à identificação das funções que cumpre ou deve cumprir o Direito penal. E justamente por não existir esta harmonização, o funcionalismo culminou por não ser representado também por uma perspectiva uniforme.
Esta variação guarda estreita relação com a conjugação entre a função ou missão do sistema de imputação e a função ou missão da reação penal.
Muñoz Conde e Winfried Hassemer expuseram com clareza meridiana a dicotomia que sofre o funcionalismo, ao analisarem as funções e missões do Direito penal.
Para os mencionados juristas, é necessário diferenciar entre missão e função do Direito penal, sendo que a primeira traduziria os propósitos desejados, enquanto que a segunda, as conseqüências, almejadas ou não, produzidas por alguma coisa ou algum evento[33].
Nesse sentido, entendem de suma importância distinguir três distintas posições a respeito das missões que deve o Direito penal cumprir. Apontam que a opinião majoritária refere que a missão do Direito penal deve ser a de proteção de bens jurídicos contra lesões ou perigos; que, em posição intermediária, preconizava Welzel que a missão do Direito penal seria a proteção de valores da atitude interna de caráter ético-social, posto que nela estaria incluída a proteção de bens jurídicos; finalmente, em posição diamentralmente oposta à primeira, Jakobs considera que esta missão é a confirmação do reconhecimento normativo[34].
De qualquer modo, o certo é que as tendências modernas a respeito das missões do Direito penal podem ser agrupadas em dois grupos essenciais que se distinguem exatamente em razão das funções atribuídas ao sistema de imputação e à própria pena[35].
5.1. O funcionalismo teleológico.
As origens de todo o funcionalismo se encontram na obra Kriminalpolitik und Strafrechtssystem de Claus Roxin, considerada pedra fundamental desta nova maneira de interpretar a teoria do delito e de compor as bases do sistema de imputação.
Roxin[36] parte de uma idéia a respeito do Direito penal, identificada com a proteção subsidiária de bens jurídicos e a respeito da pena, que deve ter um caráter preventivo geral e especial[37], para chegar à composição de um novo modelo de sistema de imputação.
Para Roxin o Direito penal é instrumento de ultima ratio, associado à proteção de bens jurídicos fundamentais ao desenvolvimento social do indivíduo. Daí decorre a necessidade de associação da fundamentação das categorias do delito a um fundamento material de ofensa ao bem jurídico.
De outro lado, para Roxin a pena cumpre uma dupla função: preventiva geral, aí entendida a perspectiva positiva limitadora, ou seja, a função de gerar o efeito afirmativo da permanência de proteção ao bem jurídico através da afirmação da continuação da vigência da norma turbada, e de prevenção especial, associada à idéia de ressocialização, ou pelo menos de controle da possível dessocialização.
Finalmente, convém sublinhar que a pretensão do funcionalismo dentro da idéia preconizada por Roxin não pode descurar, ao visar seus objetivos, da preservação dos seus princípios fundamentais de intervenção mínima, de legalidade e de culpabilidade.
5.1.1. As o perfil das categorias do delito segundo o funcionalismo teleológico.
No sistema de imputação funcionalista-teleológico, em seu modelo proposto por Roxin[38], a tipicidade penal já não se configura como simples adequação do fato à previsão típica, esta é considerada por Roxin tão só como a função sistemática do tipo. Mais que isso, o tipo cumpre uma função delimitadora negativa da intervenção jurídico penal, em sua associação com o princípio de legalidade, chamada por Roxin de “função político-criminal” e ainda uma função dogmática, de “descrever os elementos cujo desconhecimento exclui o dolo”, que se trata evidentemente de uma função dogmática sobre a qual se sustenta a teoria do erro de tipo.
A delimitação entre dolo e imprudência já não decorre simplesmente de análise binária de ausência ou presença de elementos psicológicos como a vontade ou o conhecimento, mas se ancora precisamente no questionamento a respeito da adequação ou não da aplicação da pena pelo delito doloso, ou seja, se leva em conta a necessidade ou não do recrudescimento da resposta penal.
A antijuridicidade não se traduz simplesmente na contrariedade entre o ordenamento e a ação finalisticamente realizada sem amparo em causas de justificação. Ela cumpre o papel de resolução do conflito entre interesses sociais e interesses individuais, já que representa o campo no qual os referidos interesses entram em choque[39].
A culpabilidade não se resume a um mero juízo de reprovação. Ela sofre uma completa remodelação, sendo substituída pela categoria da “responsabilidade”, assim entendida a possibilidade de responsabilização penal segundo critérios funcionais da pena, ou seja, trata-se essencialmente de uma avaliação do merecimento de pena. Não se despreza a culpabilidade como categoria. A culpabilidade passa a ser um dos componentes da responsabilidade, ao lado da necessidade de pena.
5.2. O funcionalismo sistêmico.
Em um segundo momento, partindo da mesma idéia de funcionalismo de Roxin, mas já com uma perspectiva absolutamente distinta no que se refere aos fundamentos, o Prof. Günther Jakobs propôs um modelo de imputação ao redor da idéia central de estabilização da norma. Para tanto, afirma que o Direito penal tem como missão principal a busca do reconhecimento da necessidade de estabilização normativa.
Jakobs se vale, como teoria de base, da teoria dos sistemas cujo principal artífice no âmbito das ciências sociais foi Niklas Luhmann[40]. Daí a denominação desta tendência de Funcionalismo Sistêmico.
Para Jakobs, o mundo é formado por sistemas e subsistemas autopoiéticos, e o Direito penal, como subsistema do sistema jurídico, tem uma concepção fechada, que visa sua própria subsistência enquanto sistema. Para tanto, o objetivo central do Direito penal é a busca de estabilização da norma que é o seu elemento estrutural próprio. A aplicação da reação penal, ou seja, da pena e da medida de segurança, tem por objetivo gerar a confiança da população no sentido da vigência da norma que foi desafiada pelo autor do delito.
Nesse sentido, Jakobs[41] refere expressamente:
“[...] não se pode considerar como missão da pena evitar lesões de bens jurídicos. Sua missão é, isto sim, reafirmar a vigência da norma, devendo equiparar-se, a tal efeito, vigência e reconhecimento. [...] Missão da pena é a manutenção da norma como modelo de orientação para os contatos sociais. Conteúdo da pena é uma réplica, que tem lugar à custa do infrator, frente ao questionamento da norma”.
Evidentemente, trata-se de um modelo que parte, antes de qualquer coisa, de um sistema fechado[42], na medida em que identifica um ponto de referência concreto na expressão normativa. Sem dúvida,e em igual medida, este modelo promove um alto grau de segurança jurídica e um ínfimo grau de flexibilidade.
5.2.1. O perfil das categorias do delito segundo o funcionalismo sistêmico.
Do ponto de vista das categorias do delito, Jakobs refere a uma ação já culpável, no sentido de Hegel[43], desprezando-a como elemento do delito, na medida em que somente concebe ação em sentido ontológico do termo, e configura seu sistema dentro de padrões absolutamente normativos.
De outro lado, Jakobs concebe diretamente o injusto como a “ação intolerada socialmente”[44], que pode sustentar todos os elementos da ação antijurídica ou apresentar todos os elementos da ação antijurídica e da justificação, ou ainda não apresentar nenhum destes elementos. A presença dos elementos que tornam intolerável um comportamento, conjugado com a ausência de elementos justificantes, conduz ao que Jakobs[45] denomina “tipo de injusto”.
Com isso, o sistema de Jakobs aproxima-se demasiadamente das teorias que tratam a antijuridicidade como “elemento negativo do tipo”, ficando aberto a todas as críticas que contra elas se apresentam. Vários autores[46] chegam a qualificar a proposta de Jakobs como uma teoria dos elementos negativos do tipo.
No que se refere à culpabilidade, sua função na teoria de Jakobs[47] é justamente de caracterizar a motivação do autor como uma daquelas que estão em desconformidade com a norma, gerando o conflito. Assim, entende Jakobs[48] que quando “há um déficit de motivação jurídica, deve-se castigar o autor”. Trata-se, sem dúvida alguma de uma evidente pretensão de determinação do comportamento conforme a norma, muito mais próximo da intenção de uma regulação moral do que jurídica, com tintas nitidamente totalitárias.
5.3. Principais distinções entre o funcionalismo teleológico e o funcionalismo sistêmico.
São inúmeras as diferenças entre os sistemas de Roxin e de Jakobs. É possível diferenciar os dois sistemas a partir dos mais distintos pontos de vista, tanto internos (dentro da teoria do delito) como externos (a partir de sua consideração macro), por isso, com vistas a concentrar esta análise, optamos simplesmente por resumir, neste tópico, as características que o próprio Roxin aponta como nodais para a diferenciação entre estes dois sistemas de imputação.
Em primeiro lugar, Roxin[49] se refere ao fato de que Jakobs limita as missões do seu sistema de imputação à pretensão de estabilização normativa, que configura tão somente a idéia de justificação da pena através da prevenção geral, enquanto que Roxin entende que esta missão é a prevenção de bens jurídicos, que inclui os direitos fundamentais do acusado, e por isso, se traduz na prevenção geral positiva, mas também na prevenção especial.
Em segundo lugar, Roxin[50] aponta uma diferença quanto ao método consistente na admissão, de sua parte, da limitação negativa da determinação normativa com base empírica, fator negado veementemente por Jakobs, que adota um plano metodológico normativo absoluto.
Outro aspecto muito importante referido por Roxin[51]é que sua idéia de funcionalismo presume a pretensão de converter os princípios orientadores de um Estado social e democrático de Direito em “categorias dogmáticas e soluções de problemas jurídicos, enquanto que nos pressupostos sistemático-teóricos de Jakobs não existe nenhum conteúdo nem orientação político-criminal”.
6. O sistema significativo de Vives Antón[52].
Tendo recebido muito menos atenção da doutrina do que quiçá fosse merecedora, já em 1996, surgiu na Espanha interessante estudo elaborado pelo professor Tomás Salvador Vives Antón a respeito do que ele considera os dois pilares fundamentais do Direito penal, quais sejam, a conduta e a norma.
O professor Vives ancora sua proposta nas mais modernas teorias do direito, em especial no giro pragmático da filosofia de Wittgenstein e na metodologia própria desenvolvida por Habermas, que avançam a partir da semiótica para uma estruturação do discurso pragmático da linguagem. Supedaneado por estas teorias, Vives produz um sistema absolutamente congruente e ao mesmo tempo respeitoso para com a idéia de humanização na formulação de categorias do delito[53].
A idéia de Vives é estruturar a ação e a norma dentro de uma proposta de significado.
A importância que assume esta proposição reside justamente no fato de sua estreita harmonização para com as modernas teorias do direito que surgiram a partir do pensamento filosófico pós-positivista.
Vives[54] assinala que não tem por objetivo a demolição da construção dogmática que se foi erigindo nos últimos séculos, mas simplesmente propor uma nova perspectiva de consideração destas categorias, através de um novo modelo de compreensão do significado dos conceitos jurídico-penais.
Para tanto, Vives inicia assinalando que considera a ação e a norma os dois conceitos fundamentais do Direito penal.
No que tange à ação, ressalta que o esgotamento desta categoria no âmbito da teoria do delito está associada à sua concepção como algo que há no mundo, como fato ontológico.
Na verdade, a ação deve ser entendida não sobre algo que os homens fazem, senão o significado do que fazem. Não o substrato de um sentido, mas o sentido de um substrato[55]. Os fatos acontecem, as ações significam, tem sentido. Nas palavras de Martínez Buján-Pérez[56], a ação “não é nenhuma classe de objeto do mundo que percebemos, mas sim se limita a significar”.
De outro lado, no que se refere à norma Vives conclui que ela possui uma essência dupla, de decisão de poder e de determinação da razão. Assim, tanto em seu aspecto de valoração quanto de determinação[57], não há uma via impositiva, senão dialética. Porém, o que mais resulta importante destacar é que tanto ao decidir pelo conteúdo da norma quanto em sua dimensão mandamental, a norma possui uma pretensão de validez. Esta pretensão somente pode ter lugar se se obedece não simplesmente a uma decisão de poder, mas também se limita por uma argumentação racional. Justamente por este caráter de racionalidade a pretensão de validez não pode reduzir-se a uma pretensão de verdade absoluta, já que o crime não é um fato ontológico. A dogmática não é mais que uma forma de argumentação, segundo a qual se organiza um conjunto de valores que visam conjugar ação e norma. Estes valores, referidos por Vives[58] como sendo “segurança jurídica, liberdade, eficácia, utilidade”, entre outros não são mais que “aspectos parciais da idéia central de justiça que o ordenamento jurídico pretende instaurar”.
6.1. A organização do sistema significativo.
Vives estabelece que o ponto de partida da estruturação do sistema é a relação entre a norma e a ação que se resume, segundo seu ponto de vista no reconhecimento do que ele chama de “liberdade de ação”.
Se a ação é um significado, um sentido, obviamente não está regida unicamente por normas causais. Liberta dos grilhões da causalidade a ação é livre. Justamente por constituir um significado de livre eleição, a ação justifica o seu controle por normas. Vives[59] propõe então, que a liberdade da ação seja o eixo central da organização do sistema penal.
Esta mudança de perspectiva tem efeitos diretos na desconstituição do perfil de culpabilidade clássica que se identifica como a possibilidade de agir de modo diverso, ancorada no livre arbítrio. Em realidade, Vives[60] subtrai esta discussão do âmbito da culpabilidade e diz que a liberdade é pressuposto da própria ação e como tal, não pode ser afirmada ou negada, mas tão só percebida.
Desta forma, a proposta de Vives é a reordenação das categorias do delito segundo uma perspectiva que arranca da relação descrita entre norma e ação. Ao reconhecer uma pretensão de validez genérica da norma, Vives propõe que as distintas pretensões que compõem esta pretensão de validez representem as categorias do delito. Convém notar que Vives[61] não rechaça as categorias do delito tradicionalmente conhecidas, propondo tão só um cambio de perspectivas de sua composição.
6.1.1. A pretensão de relevância: o tipo de ação ea antijuridicidade material.
Assim, como categoria central do sistema de imputação, ponto de partida da análise do delito, aparece não já a ação típica, senão o tipo de ação, identificado como uma realização de algo que interessa ao direito penal[62]. Deste modo, o tipo de ação corresponde a uma pretensão de relevância.
É oportuno ressaltar que não aparece no tipo de ação a intenção, já que se reconhece que as condutas podem ser realizadas estando ou não presente a intenção. O conteúdo do tipo de ação se resume a uma pretensão conceitual de relevância, que equivale à adequada compreensão lingüística da definição típica pela lei (tipicidade formal) - e sua conseqüente limitação pelo princípio de legalidade em todas as suas vertentes - e uma pretensão de ofensividade que corresponde ao caráter de dano ou perigo ao bem jurídico (antijuridicidade material)[63].
Dentro da idéia de tipo de ação, evidentemente, restam compreendidos elementos do tipo configurados normativamente e não ontologicamente. É que se o tipo de ação é o reconhecimento de um significado, é certo que sua configuração somente pode ser normativa. Porém, a aferição dos elementos subjetivos do tipo de ação não responde ao questionamento a respeito dos processos psicológicos por que passa o agente, mas sim à observação de suas manifestações externas[64], que não compõe o tipo desde um ponto de vista conceitual, mas sim substantivo. O problema da ação ou omissão torna-se então meramente aparente, na medida em que se trata de identificar, circunstancialmente a existência de ação ou omissão tipicamente relevante. Assim também a relação de causalidade, pois a identificação do sentido de causa só é possível a partir de “práticas, interpretações e novas práticas”[65].
Finalmente, deve-se observar que com a introdução da antijuridicidade material, incorpora-se definitivamente o resultado no tipo de ação, afastando os problemas que o finalismo trouxe na questão do desvalor do ilícito tentado.
6.1.2. A pretensão de ilicitude: elementos subjetivos do injusto e justificação.
A segunda pretensão específica a compor a pretensão genérica de validez na norma é a pretensão de ilicitude, que corresponde a antijuridicidade formal acrescida dos aspectos subjetivos do injusto.
Neste ponto, de um lado propõe Vives que se faça a identificação da intenção de violação da norma, de realização de uma ação ofensiva de um bem jurídico não suportável pelas exigências do ordenamento jurídico[66]. A pretensão de ilicitude se desdobra na intenção regente já não do tipo de ação, mas da existência ou não de um compromisso com a violação de um bem jurídico, que corresponde ao tipo subjetivo – assim entendido o dolo e a imprudência – e, de outro lado, a consideração a respeito da exclusão da ilicitude pela presença de permissividades do sistema, que podem ser permissões fortes(causas de justificação) ou permissões fracas (escusas ou causas de exclusão de responsabilidade pelo fato)[67].
Os elementos subjetivos referidos por Vives compõem uma “intenção subjetiva” que não define a ação, mas sim permite ou não a persecução da conduta realizada pelo sujeito. O que se verifica aqui é a intenção a que alude o sentido da ação[68], é dizer, se a ação realizada manifesta o compromisso de atuar por parte do autor[69], caso em que haverá dolo, ou se há uma dupla ausência de compromisso: com o resultado típico e com possibilidade de evitá-lo, caso em que está presente a falta de dever de cuidado que caracteriza a imprudência, isso sim, analisada aqui desde um ponto de vista eminentemente subjetivo, já que a análise de violação do dever objetivo já figura na pretensão de relevância.
No que tange à antijuridicidade formal, Vives[70] propõe a realização de uma dupla verificação: da presença de causas de justificação e de excludentes de responsabilidade, por entender que o mesmo fundamento conduz o legislador a afastar a ilicitude com uma permissão forte ou fraca[71].
6.1.3. A pretensão de reprovação: o juízo de culpabilidade.
Ademais das pretensões de relevância e de ilicitude que se referem evidentemente à ação, aparece a pretensão de reprovação, que se dirige ao sujeito e se traduz em um juízo de culpabilidade[72].
Em conformidade com o postulado central da construção de Vives, qual seja, o da liberdade de ação, se reprova juridicamente ao autor uma a realização de um ato ilícito, em situação em que lhe era exigível que se comportasse de acordo com o direito, porém, não aqui no sentido do livre arbítrio[73], senão no sentido de que a ação é fundamentalmente a expressão de um atuar incondicionado pelo meio, pois do contrário, não transmite este sentido, senão o mero sentido de um acontecimento.
Esta pretensão de reprovação se apóia em duas condições: a imputabilidade, consistente na verificação de se o sujeito possui a capacidade de ser reprovado e a consciência da ilicitude de sua ação, que cuida em concreto da análise das hipóteses de erro de proibição. Aqui a análise se reduz a se o sujeito possui capacidade de reprovação (imputabilidade) e consciência da ilicitude de sua ação.
6.1.4. A pretensão de necessidade de pena: punibilidade
Além dos demais requisitos do delito, Vives acrescenta uma pretensão de necessidade de pena, que deve fazer parte da pretensão de validez normativa, que pode eventualmente ser comparada com o que alguns autores classificam de punibilidade, porém, com conteúdo diverso.
Aqui já não se trata tão só da análise da presença ou ausência de condições objetivas de punibilidade ou de causas pessoais de exclusão da pena, senão que se inserem também as causas pessoais de anulação ou suspensão da pena, graça, anistia e todos os demais institutos que afastam a possibilidade de aplicação da pena ao caso concreto, quer derivadas ou não da lei[74].
Trata-se, em verdade, de levar a extremo a aplicabilidade do princípio de proporcionalidade, que claro, desempenha função de marco abstrato nas demais pretensões de validez e aqui se consagra concretamente[75].
7. A importância do garantismo na formação das modernas teorias do delito.
Diante das perspectivas apresentadas, parece claro que vivemos um momento de ruptura de paradigmas e de novas proposições para a teoria do delito.
São apresentados novos modelos de sistemas de imputação que requerem do operador jurídico, do cientista do direito penal, do professor, do jurista, do advogado, do juiz, do Promotor de Justiça e da própria sociedade um posicionamento claro.
Faz-se necessária a eleição de um novo modelo de imputação. É o momento de dar um passo à frente e várias são as direções que se nos oferecem.
Entretanto, é válida a advertência da história no sentido de que o avanço social, cultural e técnico do ser humano se produz em marchas e contra-marchas em que se evidencia, por vezes, que tomou-se o caminho errado, exigindo retroceder para voltar a seguir adiante.
Evidentemente, por imprevisível que seja o curso dos acontecimentos, e por inevitáveis que sejam os erros, porque próprios da condição humana, é dever daqueles que se dedicam ao estudo e ao aprimoramento científico dos institutos jurídicos, evitar tanto quanto possível estes erros através da adoção de uma atitude preventiva.
Assim, em termos de sistema de imputação penal, algo resta como lição dos refluxos anteriormente vividos: que não se pode transigir com garantias fundamentais. Esta lição, pedra de toque do garantismo, aplicada à discussão que travamos hoje, nos indica claramente a opção por um caminho, tanto em sentido positivo quanto em sentido negativo.
Assim convém acudir às lições trazidas pela Escola desenvolvida por Luigi Ferrajoli[76], que se esmera em identificar e lutar pela preservação das garantias fundamentais do ser humano no âmbito do Direito penal.
7.1. O garantismo como referente negativo da teoria do delito.
O garantismo aparece, segundo palavras de seu autor mais consagrado, como um instrumento delimitador negativo, marcando limites de contenção para o Direito penal, para o sistema dogmático de imputação, deixandoclaro que a adoção de determinadas perspectivas, por implicar em supressão de garantias, não pode ser, de modo algum, admitida. Ferrajoli[77] comenta que “a função específica das garantias em direito penal [...] em realidade não é tanto permitir ou legitimar, como condicionar ou vincular e, portanto, deslegitimar o exercício absoluto da potestade punitiva”.
Isso marca exigências que nem todos os sistemas de imputação hodiernamente apresentados estão habilitados a atender.
Especificamente referindo-se ao funcionalismo, Ferrajoli manifesta claramente sua oposição à perspectiva sistêmica de Jakobs, dado seu desprezo pela preservação de princípios próprios de um modelo de Estado social e democrático de Direito, atribuindo-lhe, em face de sua pretensão de prevenção geral positiva fundamentadora, o defeito de confundir direito e moral. Afirma Ferrajoli[78]:
“As doutrinas penais que atribuem ao direito penal funções de prevenção geral requerem ao contrário uma discussão diferenciada. Com certeza confundem direito e moral, inscrevendo-se no inesgotável filão do legalismo e do estadismo éticos, as recentes doutrinas da prevenção geral chamada positiva, que atribuem às penas funções de integração social através do geral reforço da fidelidade ao Estado assim como de promoção do conformismo das condutas: desde as doutrinas que concebem genericamente o direito penal como um instrumento insubstituível de «orientação moral» e de «educação coletiva», até a recente doutrina de Günther Jakobs que, inspirando-se nas idéias sistêmicas de Niklas Luhmann, justifica a pena como fator de coesão do sistema político-social mercê de sua capacidade de restaurar a confiança coletiva, sobressaltada pelas transgressões, na estabilidade do ordenamento e por conseguinte, de renovar a fidelidade dos cidadãos às instituições”[79].
Ademais, refere Ferrajoli que a perspectiva de Jakobs não é nova e tem raízes em teorias de base já bastante criticadas, a que o autor italiano qualifica de “perversões ético-formalistas do positivismo alemão da primeira metade do século XX”[80].
Com acerto, Ferrajoli[81] procede a ácida crítica ao sistema proposto por Jakobs, ao afirmar parecer claro que “ao reduzir o indivíduo a um «subsistema psíquico-físico» funcionalmente subordinado às exigências do sistema social em geral, referida doutrina se acompanha inevitavelmente de modelos de direito penal máximo e ilimitado, programaticamente indiferentes aos direitos da pessoa”.
7.2. O garantismo como referente positivo da teoria do delito.
De outro lado, como referente positivo da teoria do delito, o garantismo encontra ao menos em dois dos três sentidos do termo, evocados por seu autor[82], perfeita consonância com as bases gerais do funcionalismo denominado teleológico, bem assim do modelo de sistema significativo, na medida em que se acumulam, em ambas as perspectivas, a preocupação de preservação de um sistema ancorado em princípios que sejam coincidentes com uma política que preserve, tanto quanto possível o delicado equilíbrio entre liberalismo e democracia[83] e a adoção, como referente central, da teoria do bem jurídico, limitando negativamente a intervenção penal.
Os postulados do garantismo exigem a preservação das garantias conquistadas no decorrer da evolução do modelo de controle da intervenção penal que somente podem ser preservados mediante a adoção de um sistema de imputação que parta destas mesmas premissas.
Assim, se buscamos evoluir com preservação dos princípios indispensáveis ao ser humano, é possível aceitar as bases metodológicas do funcionalismo apresentadas por Roxin, desde que não se derive daí para um funcionalismo-sistêmico, na linha de Jakobs. É também perfeitamente aceitável a proposta de Vives Antón, que se funda na moderna filosofia da linguagem justamente porque se plasma a partir da interação entre ação e norma, em um modelo comunicativo que só existe pela inclusão do ser humano.
Considerações Finais
Parece claro, portanto, que a elaboração dos sucessivos sistemas de imputação jurídico-penal derivam de uma associação clara com teorias de base, teorias gerais do direito que correspondem a determinado patamar de evolução do conhecimento humano. Este conhecimento é marcado por escolas filosóficas que servem de suporte à construção jurídica.
Assim, temos que o sistema clássico, causal-naturalista respondeu ao pensamento jurídico próprio do positivismo científico que tinha por referência o modelo científico natural darwiniano, segundo um método analítico cartesiano.
O sistema neo-clássico ou neokantista veio ancorado pelo pensamento da escola filosófica neokantiana de Stamler Rickert e Lask.
O sistema finalista do delito foi desenvolvido ao redor das considerações filosóficas de seu próprio idealizador, Hans Welzel, cujas bases podem ser encontradas na ontologia crítica de Nicolai Hartmann[84].
A proposta de funcionalismo teleológico de Roxin avança a partir do funcionalismo estrutural de Parsons, enquanto que a vertente radical de funcionalismo sistêmico proposto por Jakobs se ampara na teoria dos sistemas autopoiéticos de Maturana e Varela trazida para o âmbito sociológico por Niklas Luhmann.
Finalmente, a proposta de Vives Antón, que bem poderia ser qualificada de teoria significativa do delito, se ampara nas construções da filosofia da linguagem de Ludwig Wittgenstein e na teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas.
Esta evolução do raciocínio jurídico deve sempre corresponder a um crescimento espiral, onde embora se retome periodicamente um ponto de partida já visto, isso se realize sempre desde um ponto de vista mais elevado, derivado do aprendizado com os erros do passado.
Em termos de sistema de imputação, isso se traduz da seguinte maneira: um sistema de imputação atual, em seu afã de dar resposta às exigências da modernidade, não deve jamais prescindir das contribuições derivadas do passado.
Nesse sentido, não se pode perder de vista que a história do direito penal corresponde, malgrado alguns percalços, à história de sua progressiva humanização e controle, o que constitui a mensagem central claramente exposta pelo garantismo.
Desde modo, se vivemos um momento de ruptura de paradigmas do passado, e de necessidade de decisão a respeito dos modelos que nortearão nosso futuro, parece fora de dúvida que dentre as opções que se nos apresentam há caminhos respeitadores das conquistas principiológicas das últimas centenas de anos de construção dogmática jurídico-penal e outros que, em nome de uma pretensa e fácil eficiência, deslocam para um patamar subalterno e insignificante o homem, que no dizer do professor René Dotti[85] é ”início e o fim da aventura do direito”. Adotar uma postura intransigente no sentido da preservação do humano no Direito penal resulta importante especialmente agora, em que vivemos certas tendências de retrocesso a um chamado Direito penal do inimigo, para onde a pena crítica de nosso homenageado, Prof. Muñoz Conde, tem voltada sua atenção.
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[1] HEGEL, Georg Wilhelm Friederich.Lecciones sobre la filosofia de la historia universal. 6areimpressão, tradução para o espanhol de José Gaos, Madrid: Alianza editorial, 1997, p. 102-103.
[2] ROXIN, Claus. Derecho penal. Parte General. Tomo I.2a ed., tradução para o espanhol de Diego-Manuel Luzón Peña, Miguel Díaz y García Conlledo e Javier de Vicente Remesal, Madrid: Civitas, 2000, p. 193.
[3] HEGEL, Georg Wilhelm Friederich. Princípios da Filosofia do Direito. Tradução de Orlando Vitorino, Lisboa: Guimarães Editores, 1986, p. 106.
[4] Cf. ROXIN, Claus. Derecho penal...cit., p. 196.
[5] Nesse sentido anota WELZEL, Hans. Derecho penal alemán. 4a ed., tradução para o espanhol de Juan Bustos Ramírez e Sergio Yáñez-Pérez. Santiago: Editorial Jurídica de Chile, 1997, p. 13.
[6] MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al Derecho penal.Barcelona: Bosch. 1975, p. 118.
[7] ROXIN, Claus. Derecho penal....cit., p. 198.
[8] En esse sentido LISZT, Franz von. Tratado de Derecho penal.Vol. II. 4a, ed., tradução para o espanhol de Luiz Jiménez de Asúa, Madrid: Editorial Reus, 1999, p. 304.Assim também foi admitido por prestigiados autores brasileiros, como aparece em BRUNO, Aníbal. Direito Penal. Vol. I, tomo 1o. 2a ed., Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 282 e HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal, vol. I, tomo 2º.Rio de Janeiro: Forense, 1955, p. 8.
[9] Nesse sentido VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos del sistema penal.Valencia: Tirant lo Blanch, 1996, p. 415; MEZGER, Edmund. Modernas orientaciones de la dogmática jurídico penal.Tradução para o espanhol de Francisco Muñoz Conde, Valencia: Tirant lo Blanch, 2000, p. 21; e MIR PUIG, Santiago.Derecho penal. Parte General.5ª ed., Barcelona: Reppertor, S.L., 1998, p. 155. Gallas, en GALLAS, Wilhelm. La teoría del delito en su momento actual. Tradução para o espenhol de Juan Córdoba Roda, Barcelona: Bosch, 1959, p. 8, relaciona algunos de los más significativos autores en cuyas obras se manifiesta la influencia neokantista. Aponta Edmund Mezger, com seu Lehrbuch, 2ª edición, de 1933, Eberhardt Schmidt com a atualização da 26ª ed. do Lehrbuch de von Liszt, elaborada em 1932; Erik Wolf, comseuStrafrechtliche Schuldlehre, de 1928; Swinge com Teolosgische Begriffsbildung im Strafrecht, de1930; e H. Mittasch, autor deDie Auswirkungen des werbeziehenden Denkens in der Strafrechtsystematik, em1939.
[10] Existe edição espanhola: MEZGER, Edmund. Tratado de Derecho penal.Tradução para o espanhol de José Arturo Rodrígez Muñoz, Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1935.
[11] Assim em MAIHOFER, Werner. Der Handlungsbegriff im Verbrechenssystem.Tübingen: J.C.B. Mohr , 1953, p. 72, ENGISCH, Karl.Vom Weltbild des Juristen. Heidelberg: Carl Winter Universitätsverlag, 1965, pp. 38 e ss, MAIHOFER, Werner. “Der soziale Handslungnegriff”, en Festschrift für Eberhard Schmidt.Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1971, p. 178; MAURACH, Reinhart e ZIPF, Heinz.Derecho penal, parte general, I.Tradução da 7ª ed. alemã para o espanhol por Jorge Bofia Gensch e Enrique Aimone Gibson, Buenos Aires: Astrea, 1994, p. 269 e SCHMIDT, Eberhart.“Soziale Handlungslehre”, enFestschrift für Karl Engish. Frankfurt: Vittorio Klostermann, 1969, p. 339.
[12] Assim em RADBRUCH, Gustav. “Zur Systematik der Verbrechenslehre”,in Festgabe für Reinhardt Frank, vol.I. Reedição, Tubingen: J.C.B. Mohr, 1969, p. 158.
[13] Para esta tendência, somente existe o tipo de injusto, composto por elementos positivos (tipicidade) e negativos, (causas de justificação). A crítica central contra esta tendência diz respeito à colocação em um mesmo plano de desvaloração dos aspectos da tipicidade e antijuridicidade, de modo a igualar o desvalor da conduta de matar uma mosca (atípica) à conduta de matar um homem em legítima defesa (justificada).
[14] FRANK, Reinhard. Estructura del concepto de culpabilidad.Tradução para o espanhol de Gonzalo D. Fernández, Montevideo-Buenos Aires: B. de F. Editora, 2000.
[15] GOLDSCHMIDT, James. “Normativer Schuldbegriff” in Festgabe für Reinhard von Frank, t. I.Tübingen: J.C.B. Mohr, 1930.
[16] WELZEL, Hans. Introducción a la Filosofía del Derecho.Derecho natural y Justicia material. Tradução para o espanhol de Felipe Gonzáles Vicén Madrid: Aguilar, 1977, p. 257.
[17] WELZEL, Hans.Derecho penal alemán..cit., p. 40.
[18] Isso gerou a reção desesperada dos causalisas no sentido de preservar seu posicionamento aludindo às hipóteses de “ação esperada” como pretendeu Von Liszt LISZT, Franz von. Tratado de Derecho penal.Vol. II...cit., p. 303.
[19] WELZEL, Hans. Derecho penal alemán..cit., p. 40.
[20] WELZEL, Hans. Introducción a la Filosofía del Derecho...cit., pp. 191-199.
[21] A respeito, veja-se MUÑOZ CONDE, Francisco.Edmund Mezger e o Direito penal do seu tempo.Trad. de Paulo César Busato, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
[22] Esta circunstância é perceptível, por exemplo na obra de Hirsch. O mesmo fenômeno é perceptível no Brasil em autores como Régis Prado (ver especialmente, a manifestação deste autor a respeito de temas de fundo axiológico como a imputação objetiva).
[23] ROXIN, Claus. Derecho penal...cit., p. 254.
[24] HART, Herbert L.A.. O conceito de direito.5a ed., tradução de Ribeiro Mendes, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
[25] BOBBIO, Norberto. O Positivismo Jurídico.Tradução de Márcio Pugliesi, Édson Bini e Carlos E. Rodrigues, São Paulo: Ícone, 1995.
[26] Há autores como Casalmiglia que preferem referir não a uma “superação do positivismo”, mas a um “deslocamento da agenda de problemas que interessam” ao direito. Em CALSAMIGLIA, Albert. “Postpositivismo” in DOXA - Cuadernos de Filosofía del Derecho, nº 21 I, pp. 209-220, Alicante : Instituto Juan Gil - Albert, Departamento de Filosofía del Derecho de la Universidad de Alicante, 1998, p. 210.
[27] VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos...cit., p. 481.
[28] CALSAMIGLIA, Albert. “Postpositivismo”...cit., p. 209.
[29] Nota Casalmiglia que esta percepção está intimamente associada à mudança de perspectiva de apreciação do direito, saindo do ponto de vista do legislador (no caso penal, da criminalização primária), para o ponto de vista do aplicador do direito (no caso penal, da criminalização secundária). Afirma o autor que “Los positivistas - y en cierta medida también los jusnaturalistas – tenían al legislador como el centro básico de análisis de la ciencia jurídica. El postpositivismo ha desplazado el centro de la atención de la legislación a la adjudicación. El intérprete del derecho y el juez ocupan el lugar que antes ocupaba el legislador como objeto de análisis”. Idem, p. 215.
[30] Essa era a pretensão exposta, por exemplo, por Jescheck, em JESCHECK, Heinz-Heinrich. Tratado de derecho penal- parte general.4a ed., traduzida para o espanhol por José Luis Manzanares Samaniego, Granada: Comares, 1993, p. 197.
[31] A obra possui uma versão em espanhol: MARINUCCI, Giorgio.El delito como acción. La crítica de un dogma.Tradução para o espanhol de José Eduardo Sáinz-Cantero Caparrós, Madrid: Marcial Pons, 1998, 181.
[32] ZIELINSKI, Diethart. Disvalor de acción y disvalor de resultado en el concepto de ilícito.Tradução para o espanhol de Marcelo A. Sancinetti. Buenos Aires: Hammurabi, 1990.
[33] HASSEMER, Winfried e MUÑOZ CONDE, Francisco.Introducción a la Criminología y al Derecho Penal.Valencia: Tirant lo Blanch, 1989, p. 99.
[34] Idem,p. 100.
[35] Aqui entendida como “conseqüência jurídica do delito”, englobando pena e medida de segurança.
[36] ROXIN, Claus.Derecho penal...cit., p. 51.
[37] Idem, p. 103.
[38] Idem, p. 277.
[39] ROXIN, Claus. Política Criminal e Sistema Jurídico-Penal.Tradução de Luís Greco, Renovar: Rio de Janeiro, 2000, p. 30.
[40] Em realidade, a teoria dos sistemas tem origem no âmbito das ciências naturais, mais precisamente nos trabalhos de Humberto Maturana e Francisco Varela. A respeito, veja-se MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco. De Máquinas e Seres Vivos.3a ed., tradução de Juan Acuña Llorens, Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[41] JAKOBS, Günther. Derecho Penal. Parte General.2a ed., tradução para o espanhol de Juaquín Cuello Contreras e José Luis Serrano González de Murillo, Madrid: Marcial Pons, 1997, pp. 13-14.
[42] Segundo Juarez Tavares in TAVARES, Juarez. Teoria do Injusto Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000, p. 129, “deve-se entender por sistema fechado aquele no qual as regras e princípios que o estruturam estão, de antemão, submetidos a determinadas restrições metodológicas”.
[43] Trata-se de um conceito total de ação, no sentido de igualar o crime à ação criminosa.
[44] JAKOBS, Günther. Derecho Penal..cit., p. 190.
[45] Idem, p. 191.
[46] Nesse sentido (ROXIN, Claus. Derecho penal....cit., p. 248), Gimbernat, (GIMBERNAT ORDEIG, Enrique.Estudios de Derecho penal.3a Ed., Madrid: Tecnos, 1990, pp. 203-204) e Mir Puig (MIR PUIG, Santiago. Derecho penal. ..cit., p. 159).
[47] JAKOBS, Günther. Derecho Penal..cit, p. 579.
[48] Idem, p. 579.
[49] ROXIN, Claus. La evolución de la Política criminal, el Derecho penal y el Proceso penal.Tradução para o espanhol de Carmen Gómez Rivero e María del Carmén García Cantizano. Valencia: Tirant lo Blanch, 2000, p. 52.
[50] Idem, pp. 52-53.
[51] Idem, p. 53.
[52] Para maiores de detalhes sobre o assunto, veja-se BUSATO, Paulo César. Direito penal e Ação Significativa. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
[53] Na opinião de Carlos Martínez Buján-Perez, catedrático de Direito Penal da Universidade de La Coruña, Espanha, trata-se do nascimento do grande sistema penal do século XXI.InMARTÍNEZ BUJÁN-PÉREZ, Carlos.“La concepción significativa de la acción de T. S. Vives y su correspondencia sistemática con las concepciones teleológico-funcionais del delito”, inHomenaje al Dr. Marino Barbero Santosp. 1075-1104. Coordenador, Adán Nieto Martín, Cuenca: Ediciones de la Universidad de Castilla-La Mancha; Salamanca: Ediciones Universidad de Salamanca, 2001, p. 1076.Há versão brasileira de recente publicação, MARTÍNEZ BUJÁN-PÉREZ, Carlos. A concepção significativa da ação de T. S. Vives. Trad. de Paulo César Busato, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
[54] VIVES ANTÓN, Tomás Salvador. Fundamentos...cit., p. 29.
[55] Idem, p. 205. É o que Vivesqualifica de um “giro copernicano” na teoria da ação.
[56] MARTÍNEZ BUJÁN-PÉREZ, Carlos.“La concepción significativa de la acción de T. S. Vives...cit., p. 1079.
[57] O reconhecimento de uma função de determinação, motivadora, da norma em Vives não se traduz em adesão

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