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Luta de classes socias

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Alunas:
Edilane Raimundo Pessanha.
Nilda Maria da Silva.
Monica Machado de Araújo
Texto: Crítica da metamorfose do conceito de sociedade civil em “terceiro setor”.
Erika T. Veira de Almeida
Introdução
O final dos anos 1980 e o decorrer da década de 1990 configuraram mudanças na organização da sociedade civil devido ao desmonte da política social. Tal fato tem como característica fundante a transformação da política social em ações pontuais e compensatórias, visando 0à privatização e descentralização Estas mudanças corroboraram para a reformulação da atuação dos movimentos sociais.
O uso recente e quase sempre indiscriminado do termo sociedade civil por analistas, militantes de movimentos sociais e organizações não governamentais como o caso do Banco Mundial bem reivindicando uma tarefa nem sempre fácil a de retornaremos a teoria da sociedade civil no sentido de recuperar a trajetória teórica de um conceito que foi recebendo múltiplo de significados, nem sempre inconciliável pelas principais forças sociais.
De acordo com Bobbio (1987) +a expressão sociedade civil é geralmente empregado com O um dos termos da grande dicotomia da sociedade Civil / Estado. O que significa dizer que o seu sentido e extensão não podem ter ser definidos fora da redefinição de concepção de Estado
Entretanto o uso funcional e ideológico do conceito de sociedade civil pelos neoliberais nessas duas últimas décadas e a sua metamorfose em terceiro setor têm contribuído para transformar a sociedade civil em um conjunto virtuoso de utilização e iniciativas privadas voltadas para a produção de bens e serviços públicos (Fernandes, 1994).
Segundo Fernandes o "terceiro setor" ou setor não lucrativo surge como se fosse uma alternativa a velha divisão entre público e privado que consequentemente da à possibilidade de substituir o Estado em crise, sobretudo no que se refere ao enfrentamento da "questão social."
Dessa forma a sociedade civil vem sendo muitas vezes confundida com as ONGs, revelando uma crescente e indiscriminada utilização desse conceito que expressa alguns de seus principais problemas. Diante disso a importância da recuperação do sentido concedido por Gramsci ao conceito de sociedade civil.
A governança neoliberal e a ressignificação da sociedade civil.
O padrão de acumulação mundial foi alterado com o conjunto de mudanças que ocorreram no final de 1960 e no começo de 1970. O fim do ciclo de expansão e de crescimento das economias capitalistas centrais iniciado no pós-Segunda Guerra Mundial, a mundialização do capital e respectivamente o crescimento vertiginoso do fenômeno da financeirização produziu uma completa reestruturação do mundo da produção, centrada principalmente, na substituição da força de trabalho (trabalho vivo) por maquinas (trabalho morto). 
Ficou conhecida como revolução tecnológica ou como terceira revolução Industrial, a reestruturação no mundo da produção que não pode ser compreendida fora do contexto da crise de acumulação mundial nos anos de 1960-70 nem, tampouco, desvinculada das medidas necessárias, do ponto de vista dos grandes investidores globais, e á contenção da queda das taxas de lucro dos grandes corporações transnacionais. 
Agravada pela crise do petróleo e pelo crescimento dos déficits públicos, a recessão mundial ou, se preferirmos a crise de acumulação, passa a ocupar um lugar de destaque na agenda internacional, somando governos, agencias multilaterais, representantes do capital financeiro e também as grandes corporações mundiais em torno de medidas que pudessem garantir a reprodução ampliada do capitalismo em seu novo padrão de acumulação. 
O déficit público é acusado como principal responsável pela inflação segundo os economistas e políticos neoliberais que não poupam criticam ao Estado de bem estar social e á sua rede de proteção universal e de direitos sociais que, segundo eles , sobrecarregam os orçamentos públicos, produzindo endividamento e inflação. O corte nos gastos sociais passa a ser adotado como estratégia fundamental de controle inflacionário e de retomada do crescimento do Estado. O padrão de seguridade social, construído o pós-guerra, se transforma no principal alvo das reformas neoliberais em curso em todo o mundo ocidental. 
As mudanças ultraconservadoras que reivindicam a mercantilização das esferas da vida social, sem nenhum tipo de limite ou regulamentação pública, o projeto de globalização neoliberal em curso quer nos fazer acreditar que o modo de produção capitalista e sua forma politica, a democracia liberal minimalista, constituem uma fase superior e, portanto insuperável da historia. 
A este conjunto de mudanças que compreende as transformações no mundo da produção, os ajustes estruturais, a nova divisão internacional do trabalho, os acordos internacionais de livre comercio, as estratégias comerciais, as relações de subordinação às agencias multilaterais, dentre outras, somam-se valores, crenças, ponto de vistas e conceitos considerados fundamentais ao processo de legitimação da governança global. Dentre eles, a concepção de sociedade civil, transformação (metamorfose) em “terceiro setor”, vem se destacando em virtude da sua força na construção da hegemonia neoliberal. 
Nesta perspectiva, a sociedade civil para a designar tudo aquilo que não é nem Estado e nem mercado. Segundo Rubem Cesar Fernandes ( 1994:19),
“além do Estado e do mercado, há um terceiro setor. Não governamental e não lucrativo, é, no entanto organizado, independente e mobiliza particularmente a dimensão voluntaria do comportamento das pessoas. Sua emergência é de tal relevância que se pode falar de uma virtual revolução a implicar mudanças gerais nos modos de agir e pensar. A relação entre o Estado e o mercado, que tem dominado a cena pública, hão de ser transformadas pela presença desta terceira figura – as associações voluntarias”. 
Definido por uma formula negativa (não-governamental; não lucrativa), o “ terceiro setor” se caracteriza pela negação tanto do lucro quanto no poder do Estado. Além disso, segundo Fernandes, as organizações de terceiro setor distinguem-se pela insistência de valores que ultrapassam a utilidade. Para ele a gratidão, a lealdade, a caridade, o amor, a compaixão e a solidariedade, numa perspectiva individualizada, são alguns dos sentimentos que mobilizam as iniciativas do terceiro setor na produção de bens e serviços públicos, em substituição ao sentimento da solidariedade coletiva que mobilizou e ainda mobiliza as classes e frações das classes subalternas em suas articulações e reivindicações politicas. Ainda declara Fernandes que é preciso superar os parâmetros hiperpolitizados dos anos 1960, numa referencia clara á tese de que os conflitos contemporâneo não se articulam mais a partir da divisão capital e trabalho e nem da oposição público e privado.
Essa tese é comprovada em um relatório elaborado para o banco Mundial , denominado do confronto á colaboração – Relações entre Sociedade Civil, o governo e o Banco Mundial no Brasil, no qual o autor John Garrison (2002), afirma que o termo sociedade civil esta relacionado ao vasto setor não governamental, formado por associações comunitárias, movimentos sociais, ONGS, entidades beneficentes, associações profissionais, igrejas e fundações de empresas. Citando Fukuyama, o mesmo autor que nos lembra que a sociedade civil, ou terceiro setor, desempenha um papel relevante no bem estar geral das sociedades desenvolvidas, e que a arte da associação não é crucial apenas do ponto de vista politico , mas também para o vigor da economia. Ainda o relatório expressa a perspectiva adotada pelos defensores da ideia de terceiro setor, na qual a sociedade civil, reduzida as organizações não governamental, parece como colaboradora e parceira do Estado, bem como das organizações multilaterais e do próprio mercado. 
A ideia de terceiro setor vem propondo inúmeras possibilidades e diferentes formas de relação entre as organizações da sociedade civil e Estado, mas que ao mesmo tempo que ideia de terceirosetor é defendida , também é debatido sobre a importância das parceiras e da colaboração entre a esfera estatal e as iniciativas da sociedade civil, visando minimizar a ausência ou insuficiência da ação do Estado, nas mais variadas situações e área de atuação em que eles acabam fazendo coro com aqueles que defendem a minimização do Estado no enfrentamento da questão social. (Desresponsabilização do Estado).
A utilização abusiva e indiscriminada do conceito de sociedade civil, associada a uma forte tendência á sua despolitização e homogeneização expressa um dos seus maiores problemas, pois é atribuído a sociedade civil a definição do terceiro setor, que essa definição vem mais confundir do que revelar a complexidade, a pluralidade, bem como os conflitos e as disputas no interior dessa esfera da vida social.
A autora Ana Claudia Teixeira (2000) desenvolveu um trabalho que revela os falsos dilemas que estão em constante debate, como reconhecer as diferenças e o antagonismo presente no associativismo brasileiro, que tem aumento expressivo nas décadas de 1980 e 1990, sem perder de vista a heterogeneidade que se expressa na diversidade de projetos políticos, de retoricas e de praticas sociais. A autora chama atenção para os vínculos existentes entre os interesses das ONGS e aqueles propostos tanto pelo governo quanto pelo mercado.
Com as relações que se estabelece entre as ONGs e os governos a autora tras três formas de encontro: a primeira dominada de “encontro de pressão”, consite em uma relação assentada na pressão das ONGs em torno de projetos, programas, normatizações, recursos, legislações, etc. A segunda caracteriza-se por uma relação mais formal e esta baseada numa ligação de prestação de serviços, isto é, as ONGs são contratadas pelo governo para prestarem determinado serviço, geralmente na área social. A terceira e forma de econtro é o encontro participativo, que consiste numa relação de corresponsabilidade entre governo e ONGs. 
A Autora Ana Claudia também destaca a relação das ONGs com as agencias internacionais, que são as maiores financiadoras das ONGs, que enfrentam problemas para aprovações de seus projetos, pois as instituições internacionais cobravam mais submissão as suas diretrizes, princípios, prioridades e exigências, dando prioridade na aprovação não só em projetos considerados políticos, mas nos de agentes financiadores. 
O trabalho da Ana Claudia trás um debate muito importante, por meio de uma pesquisa empírica a heterogeneidade desse campo, superando a ingenuidade e a ausência de problematização quanto à autonomia e o papel das ONGs no processo de democratização da vida brasileira. 
O debate também diz a respeito ao comprometimento do processo de universalização da cidadania em decorrência da expansão desse terceiro setor, como forma de substituição das politicas de Estado. Segundo Vera Telles (1999), a crescente participação do terceiro setor na execução de politicas públicas, especialmente nas politicas sociais, tem favorecido não só a estratégia da focalização, mas também a fragmentação desses politicas, que mesmo nunca tenham sido universais, estão deixando de ter o principio da universalização e da equidade como referencia possível e necessária. 
Como essas experiências de cooperação entre Estado e terceiro setor não são acompanhadas por um debate democrático e seguidas de um controle social por parte das esferas públicas competentes entende-se que a responsabilização social do Estado brasileira fica comprometida e que a autora chama de privatização social.
No contexto de restruturação do capital que inclui um conjunto de mudanças estruturais no campo econômico, social, politico e cultural que compreendeu as estratégias e diretrizes no Consenso de Washington em 1989 e que marcou definitivamente o significado atribuído ao termo sociedade civil que passa a integrar o discurso dos representantes das agencias multilaterais e governantes responsáveis pelo cumprimento da agenda neoliberal. 
Enquanto o terceiro setor a sociedade civil passa a fazer parte de um conjunto de conceitos e ideias estratégicas a governança neoliberal e consequentemente ao projeto de mercantilização e desregulamentação da vida em sociedade. A tese de George Yúdice (2000), para quem as ONGs latino-americanas não só nutrem a sociedade civil no sentido da sua democratização, como também garantem a estabilidade e a legitimação politica neoliberalismo. 
De acordo com Ronfeldt (apud Yúdice,2000) , um defensor do neoliberalismo, a sociedade civil deve ser gerenciada visando maximizar a estabilidade politica e a transformação econômica, tendo em vista a manutenção do sistema capitalista, pensando como único solo fértil o suficiente para a democracia enraizar. O autor classifica como qualquer iniciativa contraria ao capitalismo como sociedade incivil, que demonstra sua posição conservadora aos movimentos anticapitalistas. 
Em meio as disputas politicas em torno da desregulamentação da economia, da flexibilização dos direitos sociais, da elitização da politica e do crescente processo de privatização e de vínculos promíscuos entre o público e o privado, interessa as grandes corporações transnacionais despolitizar e deseconomicizar a concepção de sociedade civil, apresentando-a completamente despida das suas relações sociais. Daí a necessidade de resgatarmos tal conceito como uma arena de organização dos interesses de classe e de articulação politica tendo em vista a realização de um projeto que se quer hegemônico. 
 
A Sociedade Civil como Portadora Material da Hegemonia – uma análise gramsciana
Segundo a autora, o conceito-chave para a reconstrução do pensamento político de Gramsci está voltado para a compreensão do processo de socialização da política, a emergência da sociedade civil e do Estado em sua forma ampliada. A sociedade civil como um conjunto de aparelhos privados de hegemonia que está ligada a participação política representando os interesses de vários grupos sociais. Influenciada pelo pensamento hegeliano a definição de sociedade civil de Gramsci apresenta o conflito de classe na construção da hegemonia e do projeto de classe.
Destaca o compromisso de Gramsci de apresentar uma sociedade civil que tem autonomia e protagonismo político dentro do processo de disputa entre as principais forças políticas. A superestrutura é formada pela sociedade política (Estado) e pela sociedade civil que representam a ditadura e a hegemonia, coerção e ideologia, sendo representados pelos aparelhos do Estado (polícia, exército e justiça) e organismos sociais coletivos. A sociedade civil exerce uma função de organicidade das massas em partidos e sindicatos, atuando como mediadora entre a base econômica e o Estado, além de garantir a legitimidade deste Estado e exercendo o papel de base ética no Estado moderno. 
Segundo a autora, Gramsci afirma que a hegemonia se realiza na e pela sociedade civil, mas na modernidade vem ocupando os espaços destinados a construção de projetos coletivos voltados para a ampliação dos direitos de cidadania, além de representar interesses econômicos-corporativos, gerando contradições e derrubando o conceito de sujeito virtuoso, identificado como um lugar de oposição ao Estado no enfrentamento das desigualdades sociais promovendo a privatização da “questão social”. 
Faz-se necessário, segundo a autora, voltar ao conceito de Gramsci que coloca a sociedade civil como espaço no qual os interesses de classe se organizam e se articulam na construção de uma contra-hegemonia com diferentes atores, organizações e partidos políticos, sindicatos e associações comprometidos com a ética e a superação do capitalismo.

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