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Saude em Debate 78 79 80 2008

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ISSN 0103-1104
Centro Brasileiro de estudos de saúde (CeBes)
DIREÇÃO NACIONAL (GESTÃO 2006-2009)
NATIONAL BOARD OF DIRECTORS (YEARS 2006-2009) 
 Diretoria Executiva 
 Presidente Sonia Fleury (RJ) 
 1O Vice-Presidente Ligia Bahia (RJ)
 2O Vice-Presidente Ana Maria Costa (DF)
 3O Vice-Presidente Luiz Neves (RJ)
 4O Vice-Presidente Mario Scheffer (SP)
 1O Suplente Francisco Braga (RJ)
 2O Suplente Lenaura Lobato (RJ)
 
 Diretor Ad-hoc Nelson Rodrigues dos Santos (SP)
 Diretor Ad-hoc Rodrigo Oliveira (RJ)
CONSELHO FISCAL / FISCAL COUNCIL
 Áquilas Mendes (SP)
 José da Rocha Carvalheiro (RJ)
 Assis Mafort (DF)
 Sonia Ferraz (DF)
 Maura Pacheco (RJ)
 Gilson Cantarino (RJ)
 Cornelis Van Stralen (MG)
CONSELHO CONSULTIVO / ADVISORY COUNCIL
Sarah Escorel (RJ)
Odorico M. Andrade (CE)
Lucio Botelho (SC)
Antonio Ivo de Carvalho (RJ)
Roberto Medronho (RJ)
José Francisco da Silva (MG)
Luiz Galvão (WDC)
André Médici (DF)
Jandira Feghali (RJ)
José Moroni (DF)
Ary Carvalho de Miranda (RJ)
Julio Muller (MT)
Silvio Fernandes da Silva (PR)
Sebastião Loureiro (BA)
SECRETARIA / SECRETARIES
 Secretaria Geral Mariana Faria
 Pesquisadora Tatiana Neves 
 
A Revista Saúde em Debate é
associada à Associação Brasileira
de Editores Científicos
saúde em deBate
A revista Saúde em Debate é uma publicação quadrimestral 
editada pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
EDITOR CIENTÍFICO / CIENTIFIC EDITOR
Paulo Amarante (RJ)
CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL
Jairnilson Paim (BA)
Gastão Wagner Campos (SP)
Ligia Giovanella (RJ)
Edmundo Gallo (DF)
Francisco Campos (MG)
Paulo Buss (RJ)
Eleonor Conill (SC)
Emerson Merhy (SP)
Naomar de Almeida Filho (BA)
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EDITORA ExECUTIVA / ExECUTIVE EDITOR
Marília Correia 
INDExAÇÃO / INDExATION
 Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciên- 
 cias da Saúde (LILACS)
Os artigos sobre História da Saúde estão indexados 
pela Base HISA – Base Bibliográfica em História da 
Saúde Pública na América Latina e Caribe 
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
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REVISÃO DE TExTO,
CAPA, DIAGRAMAÇÃO E 
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA
Zeppelini Editorial
IMPRESSÃO E ACABAMENTO
Corbã Editora Artes Gráficas
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2.000 exemplares
Esta revista foi impressa no Rio de Janeiro em novembro 
de 2008.
Capa em papel cartão supremo 250 gr
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PROOFREADING
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DESK TOP PUBLISHING
Zeppelini Editorial
PRINT AND FINISH
Corbã Editora Artes Gráficas
NUMBER OF COPIES
2,000 copies
This publication was printed in Rio de Janeiro on november, 
2008.
Cover in premium card 250 gr
Core in kromma silk 80 gr
Saúde em Debate, Revista do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES – v.1 (out./nov./dez. 1976) 
 – São Paulo: Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES, 2008. 
 v. 32; n. 78/79/80; 27,5 cm
 
 Quadrimestral
 ISSN 0103-1104
1. Saúde Pública, Periódico. I. Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES
 CDD 362.1 
Rio de Janeiro v.32 n.78/79/80 jan./dez. 2008
ÓRGÃO OFICIAL DO CEBES
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
ISSN 0103-1104
EdItorIal / EDITORIAL
aPrESENtaÇÃo / PRESENTATION
artIgoS orIgINaIS / ORIgINAL ARTIcLES 
 Ensaio
reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir 
do materialismo dialético
Psychiatric Reform and psychosocial rehabilitation: an examination 
based on the dialectical materialism
Alice Hirdes 
 REvisão
Psicologia e Saúde Mental: três momentos de uma história
Psychology and Mental Health: three moments of a history
João Leite Ferreira Neto
Ensaio
a Estratégia atenção Psicossocial: desafio na prática dos novos 
dispositivos de Saúde Mental
Eaps: challenge in the practice of the new devices of Mental Health
Silvio Yasui, Abilio Costa-Rosa
Ensaio
algumas reflexões sobre as bases conceituais da Saúde Mental e a 
formação do profissional de Saúde Mental no contexto da promoção 
da saúde
Reflections on the conceptual bases of Mental Health and the formation 
of the Mental Health professional in the context of health promotion
Walter Ferreira de Oliveira
Ensaio
Breve história da reforma Psiquiátrica para uma melhor 
compreensão da questão atual
Brief history of the Psychiatric Reform for a better comprehension of the 
current debate
Richard Couto, Sonia Alberti
 REvisão
Saúde do trabalhador de Saúde Mental: uma revisão dos estudos 
brasileiros
The health of Mental Health workers: a review of Brazilian scientific 
literature
Tatiana Ramminger
Ensaio
a Escola livre de artes Visuais do Museu Bispo do rosário arte 
Contemporânea
The Visual Arts Free School of Museu Bispo do Rosário Arte 
contemporânea
Ricardo Aquino, Thiago Ferreira de Aquino, Rita Aquino
Ensaio
Saúde Mental e cultura: que cultura?
Mental Health and culture: what culture?
Alexandre Simões Ribeiro
Ensaio
a dimensão sociocultural da reforma Psiquiátrica e a Companhia 
Experimental Mu...dança
The socio-cultural side of Psychiatric Reform and the companhia 
Experimental Mu...dança
Myrna Coelho
 PEsquisa
a ação territorial do Centro de atenção Psicossocial em sua natureza 
substitutiva
The territorial action of the centro de Atenção Psicossocial as indicator 
of its substitutive nature
Renata Martins Quintas, Paulo Amarante
RElato dE ExPERiência
grupo como dispositivo de vida em um caPs ad: um cuidado em Saúde Mental 
para além do sintoma
group of devices of life in Caps ad: Mental Health care beyond symptoms
Milena Leal Pacheco, Luiz Ziegelmann
PEsquisa
Panorama do tratamento dos usuários de drogas no rio de Janeiro
An overview of treatment service for drug-addicts in Rio de Janeiro
Magda Vaissman, Marise Ramôa, Artemis Soares Viot Serra
PEsquisa
Homens-carrapatos e suas mulheres: relato de experiência em Saúde Mental na 
Estratégia Saúde da Família
Tick-men and their women: a report about Mental Health issue in Family Health 
Strategy
Ionara Vieira Moura Rabelo, Rosana Carneiro Tavares
Ensaio
Saúde Mental e atenção Básica à Saúde: o apoio matricial na construção de uma 
rede multicêntrica
Mental Health and primary health care: the matrix support building a multicentric 
net
Mariana Dorsa Figueiredo, Rosana Onocko Campos 
PEsquisa
a crise na rede: o SaMU no contexto da reforma Psiquiátrica
The crisis on network: SAMU at Psychiatric Reform context
Katita Jardim, Magda Dimenstein
RElato dE ExPERiência
a construção de um serviço de base territorial: a experiência do Centro 
Psiquiátrico rio de Janeiro
The construction of a territorial base service: the experience of the centro Psiquiátrico 
Rio de Janeiro
Alexandre Keusen, Andréa da Luz Carvalho
RElato dE ExPERiência
articulando planejamento e contratos de gestão na organização de serviços 
substitutivos de Saúde Mental: experiência do SUS em Belo Horizonte
Linking planning and management contracts in the organization of substitute services 
of Mental Health: experience of SUS in Belo Horizonte, Minas geraisSerafim Barbosa Santos-Filho
doCUMENtoS HIStÓrICoS / HISTORIcAL DOcUMENTS
Saúde Mental: condições de assistência ao doente mental
Comissão de Saúde Mental dos Cebes 
artIgoS orIgINaIS / ORIgINAL ARTIcLES 
Ensaio
a crise de dominação no sistema público de saúde
The domination crisis in the Brazilian public health system
Arlene Laurenti Monterrosa Ayala
Ensaio
François dagognet, por uma nova filosofia da doença
François Dagognet, for a new philosophy of disease
Sabira de Alencar Czermak
artIgo INtErNaCIoNal / INTERNATIONAL ARTIcLE 
Ensaio
Modelo de salud colombiano: exportable, en función de los intereses de mercado
colombian health model: exportable, depending on the interest of the market
Mauricio Torres Tovar
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S U M Á R I O • SUMMARY
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EdItorIal 3
ambiciosa e revolucionária, a declaração de alma-ata completou 30 anos sem que seus objetivos 
fossem totalmente concretizados. o Centro Brasileiro 
de Estudos de Saúde (cEbEs) dava seus primeiros passos 
quando, em setembro de 1978, a organização Mundial 
da Saúde (oMS) e o Fundo das Nações Unidas para a 
Infância (unicEf) reuniram no Cazaquistão os represen-
tantes de 137 países que ungiriam a meta de acesso à 
saúde digna por todos, no mais tardar até o ano 2000. 
a promessa era desenvolver ações urgentes baseadas 
na participação social e na promoção da atenção básica 
à saúde. o apelo maior era em relação à necessidade 
de uma ordem econômica mundial mais justa e mais 
solidária. 
a essência da alma-ata foi perdida, pois os resul-
tados sanitários nunca foram tão desiguais no mundo, 
assim como nunca foi tão precário e injusto o acesso 
à saúde. Hoje, é de mais de 40 anos a diferença na 
expectativa de vida entre as nações mais pobres e as 
mais ricas. os gastos públicos com a saúde nesses paí-
ses variam, respectivamente, de 20 a 6 mil dólares por 
pessoa e por ano. Muitos governos deram respostas 
inadequadas em relação a esse setor, além de terem sido 
incapazes de antecipar os problemas e impotentes na 
busca de soluções. 
Em ano de efemérides – 20 anos de Sistema Único 
de Saúde (SUS), 30 anos de alma-ata, 60 anos da de-
claração Universal dos direitos Humanos – o Brasil tem 
bons motivos para se orgulhar do trabalho realizado na 
tentativa de melhoria da saúde de seu povo. o relatório 
anual da oMS de 2008 voltou a recomendar a adoção da 
atenção primária à saúde em todos os países e destacou 
o Brasil como exemplo. os avanços na construção da 
política nacional de Saúde Mental, um dos temas desta 
Saúde em Debate, representam bem essa conquista. 
Mesmo nesse Brasil de tantos avanços não é con-
sensual o lugar da atenção primária à saúde, tampouco 
são uniformes as abordagens em sua implementação. 
Vista por alguns gestores como programa seletivo que 
oferta uma “cesta” restrita de serviços e por outros, 
meramente como um dos níveis de atenção à saúde, 
ainda não foi viabilizada em sua concepção descentra-
lizada, mais abrangente e integral. Estratégica porta de 
entrada do sistema, a atenção primária tem um papel 
preponderante no processo de implementação do novo 
modelo assistencial do SUS, desde que superadas a 
superposição de redes de assistência, a falta de unifor-
midade na execução do Programa Saúde da Família 
(PSF), as desigualdades no acesso e na utilização dos 
serviços, a pouca valorização e formação inadequada dos 
profissionais, a focalização e seletividade de ofertas do 
pronto-atendimento mínimo – incluem-se nesse tópico 
as assistências Médicas ambulatoriais (aMa) na cidade 
de São Paulo e as Unidades de Pronto-atendimento 
(UPa) no município do rio de Janeiro, alimentadas, 
na verdade, pelo marketing eleitoral.
desde que proposta a ‘re-fundação’ do cEbEs, tem-se 
voltado muito a atenção para a necessidade de retomada 
do espírito crítico, do debate propositivo que deu origem 
ao projeto da reforma Sanitária brasileira. Não se trata 
de insistir na ressurreição da reforma em si, mas de reco-
nhecer o seu grande êxito na construção do SUS. 
da mesma forma, não se trata de reinventar o 
passado, mas de manter o clima dos movimentos que 
se organizaram em torno de ideais e projetos coletivos, 
capazes de exercitar a crítica, de reconhecer as deficiên-
cias, de reorientar os compromissos institucionais e de 
radicalizar a democracia. 
a dIrEtorIa NaCIoNal
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 3-4, jan./dez. 2008
EDITORIAL4
ambitious and revolutionary, the alma-ata decla-ration has completed 30 years, without the total 
fulfillment of its objectives. the Centro Brasileiro de 
Estudos de Saúde (cEbEs) was taking its first steps when, 
in September, 1978, the World Health organization 
(WHo) and the United Nations Children’s Fund (uni-
cEf) brought together in Kazakhstan 137 representatives 
of countries that would reach the goal of providing access 
to a deserving health for all, until 2000, at the latest.
the promise was to develop urgent actions based on 
social participation and on the promotion of basic atten-
tion to health. the greatest plea was related to the need 
for a fairer and more solidary economic world order.
the essence of the alma-ata was lost, because the 
sanitary results have never been so unequal in the world, 
as well as the access to health, which has never been so 
precarious and unfair. Nowadays, the difference of life 
expectation rates between the poorest and the richest 
nations is of more than 40 years. Public expenses with 
health in these countries vary, respectively, from 20 to 
6 thousand dollars per person and per year. Many go-
vernments have given inadequate answers regarding this 
sector, and have also been incapable of anticipating the 
problems and impotent in the search for solutions. 
on an ephemerides year – 20 years of National 
Health System (SUS), 30 years of alma-ata, 60 years of 
the Universal declaration of Human rights – Brazil has 
good reasons to be proud of the work accomplished in 
the attempt to improve people’s health. the World Health 
report 2008 has once again recommended the adoption 
of primary attention to health in all countries, and poin-
ted Brazil as an example. the advances in constructing a 
Mental Health national policy, one of the subjects of this 
Saúde em Debate, clearly represent this achievement. 
Even in Brazil, with so many advances, the placing 
of primary attention to health is not consensual, and nei-
ther are uniform the approaches in its implementation. 
Considered by many managers as a selective program 
that offers a restricted “basket” of services and, by others, 
as merely one of the levels of attention to health, it hasn’t 
been made possible in its decentralized concept, more 
extensive and complete. as a strategic front door of the 
system, primary attention plays a preponderant role 
in the process of implementing a new SUS assistance 
model, as long as some issues can be overcome, such 
as the superposition of assistance networks, the lack 
of uniformity to execute the Family Health Program 
(PSF), the inequalities to access and to use the services, 
the little importance given to professionals and their 
inadequate qualification, the focalization and selectivity 
of minimum emergency room offers – in this topic are 
included the ambulatory Medical Care (aMa), in São 
Paulo, and the Emergency rooms (UPa), in rio de 
Janeiro, sustained, in fact, by electoral marketing.
Since theproposal of re-founding cEbEs, there has 
been a lot of attention into the need to retake the critical 
spirit, the preposition debate that originated the Bra-
zilian Sanitary reform project. It is not about insisting 
on the resurrection of the reform itself, but recognizing 
its great success in constructing SUS.
also, it is not about reinventing the past, but 
keeping the atmosphere of the movements that were 
organized around collective ideas and projects, which 
were able to exercise the criticism, recognize deficien-
cies, reorient institutional commitments and radicalize 
democracy. 
THE NATIONAL DIREcTORATE
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 5-8, jan./dez. 2008
aPrESENtaÇÃo 5
Esta revista surge num momento muito especial, afinal, comemoram-se os 30 anos da reforma Psi-
quiátrica no Brasil. Para celebrar esta data, selecionamos 
uma capa estranha: a foto da grade de uma cela de um 
hospital psiquiátrico. o objetivo desta imagem provo-
cativa é demarcar a distância histórica, ética e política 
entre o momento inicial, 1978 e 1979, e o cenário atual 
de participação dos usuários na construção da política, 
serviços e estratégias em Saúde Mental.
No início deste ano, em meio às comemorações dos 
30 anos de reforma, foi realizado, no rio de Janeiro, 
o II Fórum Internacional de Saúde Coletiva, Saúde 
Mental e direitos Humanos. Mais de 3.000 pessoas, 
militantes das mais diversas áreas da saúde e dos direi-
tos humanos, participaram desse Fórum debatendo e 
construindo um novo cenário para a Saúde Mental no 
Brasil e em várias partes do mundo. 
Para encerrar o ano com chave de ouro, lançamos 
este número especialmente dedicado ao tema da Saúde 
Mental, no I Congresso Brasileiro de Saúde Mental, 
organizado pela recém-criada associação Brasileira de 
Saúde Mental (abRasmE). 
Há um consenso na área da saúde coletiva sobre a 
importante contribuição que o campo da Saúde Mental 
tem trazido para a saúde de forma geral, problematizan-
do a relação instituição-usuário e de institucionalização, 
destacando a importância do trabalho e do envolvimento 
da família, bem como a importância do trabalho no 
território. Enfim, são muitas, e reconhecidas, as contri-
buições. Sabemos que uma revista sobre Saúde Mental 
não será consultada apenas por profissionais da área, 
mas de toda a saúde pública.
a revista é iniciada com uma série de artigos de 
natureza conceitual. aqui se incluem os artigos de 
alice Hirdes, com uma leitura da reforma psiquiátrica 
e da reabilitação psicossocial a partir do materialis-
mo dialético, de João leite Ferreira Neto, com uma 
análise história de três momentos da psicologia em 
Belo Horizonte, de Silvio Yasui e abilio Costa-rosa, 
que discorrem sobre a estratégia e os desafios do novo 
modelo de atenção psicossocial, de Walter oliveira 
que aborda as bases conceituais da Saúde Mental 
e sua relação com a formação dos profissionais no 
contexto da promoção da saúde. o artigo de richard 
Couto e Sonia alberti apresenta um histórico sobre 
o conceito de reforma Psiquiátrica e a tensão entre 
clínica e atenção psicossocial e, para finalizar a série, 
uma importante revisão de estudos brasileiros sobre 
Saúde Mental do trabalhador, de autoria de tatiana 
ramminger.
a intervenção no campo da cultura tem assumido 
um papel importante no processo da reforma Psiqui-
átrica brasileira e, por isso, um outro bloco de artigos 
é dedicado à relação entre cultura e Saúde Mental. 
o texto de ricardo aquino trata dos fundamentos e 
princípios da Escola livre de artes Visuais do Museu 
Bispo do rosário de arte Contemporânea. alexandre 
ribeiro aborda as articulações entre Saúde Mental 
e cultura e Myrna Coelho tece comentários sobre a 
dimensão sociocultural da reforma Psiquiátrica a 
partir das experiências vivenciadas na companhia 
Experimental Mu...dança.
os Centros de atenção Psicossocial (caPs), dispo-
sitivos estratégicos da política pública de Saúde Mental 
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 5-8, jan./dez. 2008
aPrESENtaÇÃo6
brasileira, são objetos de pesquisa no artigo de renata 
Quintas e Paulo amarante que discorrem sobre as 
características inovadoras e substitutivas de tais dispo-
sitivos. o artigo de autoria de Milena leal Pacheco e 
luiz Zielgman traz algumas reflexões sobre a terapia em 
grupo em um caPs especializado em dependência quí-
mica; contemplamos, ainda, uma análise do tratamento 
dos usuários de drogas no rio de Janeiro no texto de 
Magda Vaissman et al.
outro tema importante diz respeito às relações e 
possibilidades entre a área da Saúde Mental e a Saúde 
da Família que, de formas distintas, está presente nas 
abordagens dos artigos de Ionara rabelo e rosana 
Carneiro tavares, através dos resultados de uma in-
tervenção psicossocial em mulheres que faziam uso de 
ansiolíticos, e de Mariana dorsa Figueiredo e rosana 
onocko Campos, que traz algumas observações acerca 
do apoio matricial à Saúde Mental na atenção básica 
à saúde. 
a atenção aos usuários em crise é um dos aspectos 
mais sérios e que coloca em xeque todo o processo da 
reforma Psiquiátrica. três artigos são dedicados a esse 
tema: o de Katita Jardim e Magda dimenstein, que traz 
um análise das práticas do Serviço de atendimento Mó-
vel de Urgência (samu) em aracaju e suas articulações 
com a rede de atenção psicossocial; o artigo de alexandre 
Keusen e andréa da luz Carvalho relata a trajetória de 
um centro de atenção em Saúde Mental que atende à 
crise e se baseia na lógica do trabalho territorial. Serafim 
Santos-Filho aborda a rica experiência de planejamento 
e gestão da rede de serviços de saúde e Saúde Mental 
em Belo Horizonte, indicando importantes caminhos 
para os gestores.
Na seção de documentos Históricos, republicamos 
uma das primeiras manifestações políticas do processo 
de reforma Psiquiátrica no Brasil, um marco da pro-
dução crítica em Saúde Mental no país. trata-se de um 
documento elaborado pelo Comissão de Saúde Mental 
do cEbEs, intitulado condições de assistência ao doente 
mental que, trazendo uma análise bastante precisa das 
características de desassistência e violência institucional 
do modelo psiquiátrico de então, foi apresentado no 
I Simpósio de Políticas de Saúde da Câmara dos de-
putados em outubro de 1979. Nesse mesmo simpósio, 
o cEbEs apresentou à sociedade brasileira a proposta 
do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir do histórico 
texto A questão democrática na área da saúde. a capa da 
presente edição traz uma das ilustrações desse texto.
temos uma pauta bastante ampla e variada, que 
caracteriza a transdiciplinaridade e enorme dimensão 
do campo da Saúde Mental.
Na seção de temas gerais, publicamos os artigos de 
arlene laurenti ayala com uma instigante análise sobre a 
crise de dominação ou controle das instituições de saúde 
por parte dos trabalhadores de saúde e da população. o 
texto de Sabira de alencar traz as reflexões do filósofo, 
médico e epistemólogo François dagognet, o precursor, 
a seu modo, da tradição de seu mestre georges Cangui-
lhem. Na seção internacional, Maurício torres analisa 
em seu artigo os aspectos relacionados à estrutura, ao 
financiamento e funcionamento do modelo de saúde 
colombiano.
Boa leitura!
Paulo amaRantE
EditoR ciEntífico
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 5-8, jan./dez. 2008
PRESENTATION 7
this magazine appears at a very special moment, after all, the thirtieth anniversary of the Psychiatric 
reform in Brazil is commemorated. to celebrate this 
date, we have selected a strange cover: a picture of prison 
cellbars of a psychiatric hospital. the purpose of this 
provocative image is to delimit the historical distance, 
ethics and politics between the initial moment, 1978 
and 1979, and the current scenery of users’ participation 
in the construction of Mental Health politics, services 
and strategies. 
In the beginning of this year, during celebrations 
for the thirty years of the reform, the 2nd International 
Forum about Collective Health, Mental Health and 
Human rights took place in rio de Janeiro. More than 
3 thousand people, militants in different fields of health 
and human rights, have participated in this Forum, 
debating and constructing a new scenery for Mental 
Health in Brazil and around the world. 
to end the year with a cherry on top, we have 
released this issue, specially dedicated to the theme of 
Mental Health, at the 1st Brazilian Congress of Mental 
Health, organized by the recently created associação 
Brasileira de Saúde Mental (abRasmE).
there is consensus in the collective health area 
about the important contribution brought by the 
Mental Health field for health in general, rendering 
problematic to the relation institution-user and institu-
tionalization, accentuating the importance of health and 
family involvement, as well as the importance of field 
work. anyway, there many recognized contributions. 
We know that a magazine about Mental Health will 
not be consulted only by professionals of the field, but 
by the whole public health.
the magazine starts with a series of articles of 
conceptual nature. Here are included articles by alice 
Hirdes, reading the psychiatric reform and the psycho-
social rehabilitation from dialectic materialism; by João 
leite Ferreita Neto, with historical analysis of three 
moments of psychology in Belo Horizonte; by Silvio 
Yasui and abilio Costa-rosa, who discourse about the 
strategies and challenges of the new model of psychoso-
cial attention; by Walter oliveira, who approaches the 
conceptual basis of Mental Health and its relation to 
the graduation of professionals in the context of pro-
moting health. the article by richard Couto and Sonia 
alberti presents the history of the Psychiatric reform 
concept and the tension between clinic and psychosocial 
attention and, to end the series, an important review of 
Brazilian studies about Mental Health of workers, by 
tatiana ramminger. 
the intervention in the culture field has been 
assuming an important role in the process of the Bra-
zilian Psychiatric reform and, because of that, another 
block of articles is dedicated to the relation between 
culture and Mental Health. a text by ricardo aquino 
about the fundamentals and principles of the Escola 
livre de artes Visuais from the Museu Bispo do ro-
sário de arte Contemporânea is presented. alexandre 
ribeiro approaches the articulations between Mental 
Health and culture and Myrna Coelho comments on 
the sociocultural dimension of the Psychiatric reform 
from experiences seen in the dancing group companhia 
Experimental Mu…dança.
the Psychosocial Care Centers (the so called caPs 
in Brazil), strategic devices from the public policy of 
Brazilian Mental Health, are objects of research in the 
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 5-8, jan./dez. 2008
PRESENTATION8
article by renata Quintas and Paulo amarante, who 
discourse about the innovative and substitutive charac-
teristics of these institutions. the article by Milena leal 
Pacheco and luiz Zielgman brings subjects to reflect 
about group therapy at a caPs that is specialized in 
chemical dependence; we also contemplate an analysis 
of drug users` treatment in rio de Janeiro, in the text 
by Magda Vaissman et al. 
other important theme argues about the relations 
and possibilities between the field of Mental Health and 
Family Health that, in distinct ways, is present in the 
analysis of articles by Ionara rabelo and rosana Carnei-
ro tavares, through results of a psychosocial intervention 
in women who were on anxiolytics, and by Mariana 
dorsa Figueiredo and rosana onocko Campos, that 
brings some observations about matricial support to 
Mental Health in the primary health care.
the attention to users in crisis is one of the most 
serious aspects and jeopardizes the whole process of the 
Psychiatric reform. three articles are dedicated to this 
subject: the one by Katita Jardim and Magda dimens-
tein, which brings an analysis of practices of the Mobile 
Urgency Service (the so called samu in Brazil) in aracaju 
and its articulations with the net of psychosocial atten-
tion; the article by alexandre Keusen and andréa da luz 
Carvalho narrates the trajectory of a Psychosocial Care 
Center that attends to the crisis and is based on the logic 
of territorial work. Serafim Santos-Filho approaches the 
rich experience in planning and managing the net of 
services of health and Mental Health in Belo Horizonte, 
pointing out important directions for managers.
In the section of Historical documents, we have 
republished one of the first political manifestations on 
the process of Psychiatric reform in Brazil, a mark of 
critical production on Mental Health in the country. It 
is a document developed by the Mental Health Com-
mittee of cEbEs, entitled condições de assistência ao 
doente mental, that, by bringing a very precise analysis 
of the characteristics of unassistance and institutional 
violence of the early psychiatric model, was presented 
at the 1st Symposium of Health Policies in the deputy’s 
in october, 1979. In this symposium, cEbEs presented 
to the Brazilian society the proposal of the Unified 
National Health System (the so called SUS in Brazil) 
from the historical text A questão democrática na área da 
saúde. the cover of the present edition has one of the 
illustrations of this text. 
the subjects are very broad and varied, which cha-
racterizes the transdisciplinarity and the huge dimension 
of the Mental Health field.
In the general themes section, we have published 
the articles by arlene laurenti ayala with a provoking 
analysis about the domination crisis or the control of the 
health institutions by the health workers and the popu-
lation. the text by Sabira de alencar brings reflections 
of the philosopher, doctor and epistemologist François 
dagognet, the predecessor, in his way, of the tradition 
of his master georges Canguilhem. In the international 
section, Maurício torres analyzes the aspects related to 
the structure, financing and functioning of the Colom-
bian health model. 
Enjoy your reading!
Paulo amaRantE
sciEntific EditoR
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
artIgo orIgINal / ORIgINAL ARTIcLE 9
reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: 
uma leitura a partir do materialismo dialético
Psychiatric Reform and psychosocial rehabilitation: 
an examination based on the dialectical materialism
RESUMO Este estudo traz uma reflexão teórica acerca da utilização do referencial 
teórico metodológico do materialismo dialético como suporte para interpretação 
e discussão do processo de Reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial no 
contexto brasileiro. Para tanto, utilizamos as leis da dialética e a dialética do 
concreto como substrato teórico para analisar os movimentos que se desenvolveram 
historicamente no campo da Saúde Mental e assim como na área da reabilitação 
psicossocial. 
PALAVRAS-CHAVE: Saúde Mental; Serviços de Saúde Mental; 
Desinstitucionalização; Marxismo.
ABSTRACT This paper is a theoretical reflection on the use of the methodologicaltheoretical reference of dialectical materialism as a basis to interpret and discuss 
the process of Psychiatric Reform and psychosocial rehabilitation in Brazil. The 
laws of dialectic and the dialectic of the concrete have been used as theoretical 
support to the analysis of the movements that have taken place in the field of 
mental health as well as in psychosocial rehabilitation.
KEYWORDS: Mental Health; Mental Health services; Deinstitutionalization; 
Marxism.
alice Hirdes 1
1 Mestre em Enfermagem pela 
Universidade Federal de Santa Catarina 
(UFSC); docente de Saúde Mental 
da Universidade luterana do Brasil 
(UlbRa).
alicehirdes@gmail.com
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
10 HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
I N T R O D U ç Ã O
Este artigo tem como objetivo realizar uma re-
flexão teórica sobre o tema da reforma Psiquiátrica 
e da reabilitação psicossocial a partir do materialismo 
dialético. recorreu-se a autores como lukács (1979), 
Konder (1981), Kosik (1995) e lefebvre (1991), a fim 
de se resgatarem os princípios e leis da dialética que 
sustentam uma interpretação dos fenômenos com base 
materialista. Para tais autores, nada que existe é eterno, 
fixo, absoluto. toda vida humana é social e está sujeita 
a transformações, ou seja, está historicamente condi-
cionada. o sujeito humano é essencialmente ativo e 
interfere na realidade. Para a história sociológica (ou 
sociologia histórica), os seres humanos não são apenas 
objeto de investigação, mas sujeitos em relação ao pro-
cesso investigatório. 
UMA BREVE VISÃO HISTÓRICA DO 
MATERIALISMO DIALÉTICO
a lógica dialética, conforme Minayo (1998), 
“introduz na compreensão da realidade o princípio 
do conflito e da contradição como algo permanente 
que explica a transformação” (p. 68). outra tese 
fundamental da dialética é “o caráter total da exis-
tência humana e da ligação indissolúvel entre história 
dos fatos econômicos e sociais e história das idéias” 
(p. 69-70). 
a partir do conceito de totalidade, que busca reter 
a explicação do particular no geral e vice-versa, ocorre 
o processo de pesquisa. o princípio metodológico da 
totalidade significa: 
compreender as diferenças numa unidade ou totalidade 
parcial; buscar a compreensão das conexões orgânicas, 
isto é, do modo de relacionamento entre as várias 
instâncias da realidade e o processo de constituição da 
totalidade parcial; entender, na totalidade parcial em 
análise, as determinações essenciais e as condições e 
efeitos de sua manifestação. (minayo, 1988, p. 70). 
ao abordar a dialética da totalidade concreta, Kosik 
(1995) dá ênfase à idéia de que esse não é um método 
que pretende conhecer todos os aspectos da realidade, um 
panorama total da realidade, mas é uma teoria da realidade 
e do conhecimento que se tem dela como realidade. É 
a partir do entendimento da realidade como concretude 
possuidora de uma estrutura própria que se desenvolvem 
concepções da realidade. dessas concepções decorrem 
conclusões metodológicas que se convertem em princípios 
epistemológicos para o estudo de temas da realidade ou 
de práticas relativas à organização da vida humana e da 
situação social. Kosik enfatiza que 
a totalidade concreta não é um método para captar 
e exaurir todos os aspectos, caracteres, propriedades, 
relações e processos da realidade; é a teoria da realidade 
como totalidade concreta. (1995, p. 44). 
Pontua, também, que totalidade não significa conhe-
cer todos os fatos, mas reconhecer a realidade como um 
todo estruturado, dialético, no qual um fato ou conjunto 
de fatos pode vir a ser racionalmente compreendido. o 
conhecimento de fatos acumulados da realidade não sig-
nifica o conhecimento da realidade, assim como a reunião 
de determinados fatos não constitui ainda a totalidade. 
Se compreendidos como partes estruturais de um todo 
dialético, os fatos são conhecimentos da realidade.
Konder (1981) também ressalta a característica 
totalizante do conhecimento na dialética marxista. Essa 
teoria decompõe o todo em partes para depois recompô-
lo e chegar à totalidade. Entretanto, o autor salienta que 
tal totalidade não é simplesmente a soma das partes do 
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11HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
todo. Por exemplo, em um trabalho de reabilitação de-
senvolvido por uma equipe interdisciplinar, ou transdis-
ciplinar, os conhecimentos se entrelaçam e os resultados 
obtidos certamente serão mais ricos do que o trabalho 
realizado por uma equipe multidisciplinar. Nesta última, 
o trabalho é realizado em equipe, entretanto os saberes e 
práticas são executados de forma isolada, estanque, cada 
um com um papel fixo, pré-determinado. Isso que dizer 
que o resultado dessa intervenção será um, ao passo que 
a ocorrência simultânea de várias abordagens articuladas 
entre si, será outra.
Este autor chama atenção para o fato de que a apro-
ximação da realidade não é a realidade, e que a realidade 
é sempre mais rica do que o conhecimento que se tem 
dela. outra noção diz respeito à visão de conjunto da 
realidade. Esta visão é sempre provisória, pois a reali-
dade não é estática, mas dinâmica e em está constante 
transformação; não se pode pretender o esgotamento 
da realidade de determinado contexto. ou seja, nunca 
a realidade alcança uma forma definitiva, acabada.
a dialética, enquanto conceito grego da arte do 
diálogo é utilizada cotidianamente pelos profissionais 
de Saúde Mental nas negociações com os usuários e seus 
familiares, assim como pela interlocução estabelecida 
entre profissionais de equipes interdisciplinares. a dia-
lética enquanto conceito moderno do modo de pensar 
as contradições da realidade e modo de compreender 
a realidade em constante transformação nos remete 
à busca constante de novas formas de abordagem da 
complexidade dos transtornos mentais. Procura-se por 
formas mais completas nas quais, através da construção 
de novas possibilidades, o portador de sofrimento psí-
quico reencontre e reescreva a sua história. 
Por outro lado, dialética, enquanto modo de pen-
sar as contradições da realidade, a história humana e a 
transformação da sociedade, nos leva a uma permanente 
inquietação, porque não se satisfaz com a aparência 
das coisas, está sempre à procura de sua essência. Para 
isso é necessário que sejam desveladas as partes, em um 
constante caminho traçado do concreto ao abstrato 
e vice-versa. Mas isso não significa, de modo algum, 
deixar de lado a totalidade, a conexão e interligação dos 
fenômenos do todo. a complexidade da dialética se dá 
pela busca constante da superação, pela não-satisfação 
com o já atingido, pela busca por formas mais elevadas 
de apreensão da realidade e a explicitação que as contra-
dições da realidade e dos fenômenos encerram.
de acordo com lukács:
o conhecimento, que está em condições de apreender 
dialeticamente as ‘astúcias’ da evolução histórica, só é vá-
lido e eficaz quando suas aquisições forem outros tantos 
expedientes para a ação prática, cujas experiências virão, 
por sua vez, enriquecer o conhecimento e fornecer-lhe 
uma força sempre nova. (1979, p. 237).
Entendo que o conhecimento deverá ser passível de 
ser traduzido em uma prática; prática essa transforma-
dora e que, se entendida a partir do conceito marxista 
de práxis – união da prática com a teoria – pode levar 
à emancipação do ser humano. Nessa perspectiva, o 
estudode outras formas de tratamento e recuperação 
de portadores de transtornos psíquicos emerge como 
uma força que se empenha na busca de soluções mais 
completas e complexas, visualizando a totalidade do 
ser humano. Na perspectiva dialética, a transformação 
das idéias acerca da realidade e a transformação dessa 
realidade devem caminhar juntas. 
de acordo com Kosik (1995) o homem não está 
emparedado na subjetividade, mas tem com a sua 
existência a capacidade de conhecer as coisas como elas 
realmente são. E este conhecimento se dá através da 
práxis. a dialética, para o autor, trata da “totalidade do 
mundo revelada pelo homem na história e o homem 
que existe na totalidade do mundo” (p. 248).
o princípio metodológico da investigação dialética 
da realidade social é, para o autor anteriormente referido, 
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12 HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
o ponto de vista da totalidade concreta. Isso significa 
que cada fenômeno pode ser compreendido como um 
momento do todo. ressalta-se que um fenômeno social é 
um fato histórico que desempenha dupla função: definir 
a si mesmo e definir o todo, ser produtor e produto, ser 
revelador e ao mesmo tempo decifrar a si mesmo, con-
quistar o próprio significado e conferir um sentido a algo 
mais. Essa conexão das partes e do todo demonstra que 
os fatos isolados são momentos artificiosamente separa-
dos do todo, os quais só adquirem verdade e concretude 
quando inseridos no todo correspondente. assim como 
o todo, se os momentos não forem separados tornam-se 
um todo vazio e abstrato (KosiK, 1995).
Nas palavras de Konder (1981), para Hegel, filósofo 
alemão e um dos expoentes do pensamento dialético, o 
trabalho é a mola propulsora do desenvolvimento hu-
mano através da qual pode ser compreendida a atividade 
criadora do ser. Hegel introduziu a concepção de supe-
ração dialética utilizando a palavra alemã aufheben, que 
significa suspender. o filósofo emprega três diferentes 
sentidos à palavra: o primeiro sentido é negar, anular, 
cancelar; o segundo, erguer alguma coisa e mantê-la 
suspensa; o terceiro, elevar a qualidade, promover a 
passagem de alguma coisa para um plano superior. a su-
peração dialética, para Hegel, é a ocorrência simultânea 
da negação de uma determinada realidade, a conservação 
do essencial que existe na realidade negada e a elevação 
dela a um nível superior (KondER, 1981).
abstraindo da concepção dialética a questão 
negação-superação para o referencial de reabilitação 
psicossocial, trago a negação da realidade assistencial 
dos portadores de transtornos mentais centrado no 
modelo do dano, nos déficits, assim como o resgate 
e a centralização do foco nas habilidades e a busca do 
trabalho para se atingirem os objetivos de reinserção 
social, cidadania e qualidade de vida. ou seja, nega-se 
a primeira realidade, a centralização do foco nos sinais 
e sintomas; em suma, na doença resgata-se e centraliza-
se a atenção nos aspectos sadios e concomitantemente 
busca-se melhorar a vida do ser humano portador de 
transtornos psíquicos através de práticas de reabilitação 
psicossocial.
aos novos serviços deverá corresponder uma clínica 
renovada, com tratamentos diferenciados e, na qual 
simultânea ou seqüencialmente, sejam desenvolvidos 
projetos terapêuticos que contemplem as necessidades 
psicossociais das pessoas envolvidas. Isto é o que poderá 
efetivamente trazer uma pessoa a ser cidadã. Importante 
se faz pontuar que os projetos não podem ser modelos 
construídos a partir dos profissionais; devem ser cons-
truídos coletivamente com os maiores interessados: os 
usuários.
PRINCIPAIS LEIS
Segundo Konder (1981), em virtude do pensamen-
to dialético de Hegel ser considerado abstrato, vago, 
idealista, Marx e Engels reescreveram a dialética dentro 
de uma perspectiva materialista. as três leis da dialética 
formuladas por Engels com base em Hegel são: lei da 
passagem da quantidade à qualidade (e vice-versa); lei 
da unidade e luta dos contrários e lei da negação da 
negação.
alguns autores contemporâneos como lefebvre 
e Konder entendem que as leis da dialética não se 
deixam reduzir a três. Esse reducionismo, na visão 
de Konder (1981), é arbitrário, mas isso não significa 
que as leis devem ser esquecidas, e sim utilizadas com 
precaução. lefebvre (1991, p. 237) entende que as leis 
do método dialético deverão ser universais e concre-
tas. Para este autor o método representa o universal 
concreto. E estas leis deverão ser, ao mesmo tempo, 
leis do real e do pensamento. deverão ser concretas 
para atingir toda a realidade, mas não podem subs-
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
13HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
tituir a investigação e o contato com o conteúdo. 
através da investigação das realidades particulares, 
da experiência e do contato com o conteúdo pode-se 
chegar à essência, ao conceito e às relações das leis 
particulares. o autor ressalta:
o método é alternadamente a expressão das leis uni-
versais e o quadro de aplicação delas ao particular; 
ou, ainda, o meio, o instrumento que faz o singular 
subunir-se ao universal.(1991, p. 237). 
as grandes leis do método dialético para lefebvre 
são: lei da interação universal (da conexão, da media-
ção recíproca de tudo que existe); lei do movimento 
universal; lei da unidade dos contrários; transformação 
da quantidade em qualidade (lei dos saltos); lei do de-
senvolvimento em espiral (da superação).
a lei da interação universal prevê que nada é 
isolado. o isolamento dos fatos e fenômenos significa 
uma privação de sentido, de explicação, de conteúdo. 
a pesquisa dialética considera cada fenômeno no 
conjunto da inter-relação com os demais fenômenos 
e, também, o conjunto da realidade na qual ele é 
fenômeno. 
Essa lei estabelece uma conexão importante dos 
processos de institucionalização/ desinstitucionalização 
e da discussão da reabilitação psicossocial. Sem o enten-
dimento anterior sobre a conformação do instituciona-
lismo em psiquiatria e dos saberes e práticas que durante 
décadas legitimaram essa especialidade, não haverá o 
entendimento ulterior da reabilitação psicossocial em 
sua totalidade. a reabilitação psicossocial nasceu de 
um conjunto de situações: a diminuição dos pacientes 
internados em hospitais psiquiátricos a partir dos anos 
1960, em todo o mundo; as demandas dos pacientes 
ainda hospitalizados e a evolução dos conhecimentos 
psiquiátricos (saRacEno, 1999). dessa forma, a rea-
bilitação psicossocial não pode ser tratada como um 
fenômeno isolado.
E esta lei encontra-se atrelada à lei do movimento 
universal, que reintegra o movimento interno dos fatos 
e fenômenos e o movimento externo, que os envolve no 
devir e vir-a-ser universal. a pesquisa dialética considera 
cada fenômeno no conjunto de suas relações com os 
demais fenômenos e com a realidade. Nessa lei, compre-
endemos a reintegração dos fenômenos – institucionali-
zação/desinstitucionalização/reabilitação psicossocial em 
seu movimento próprio. através do movimento destes 
fenômenos se estabelece o entendimento essencial e a 
conexão entre eles. 
a lei da unidade (interpretação) dos contrários nos 
fornece a idéia de que a contradição dialética é uma 
inclusão concreta dos contraditórios um no outro e, 
simultaneamente, uma exclusão ativa. diferentemente 
da lógica formal que conserva os dois contraditóriosà 
margem um do outro, que estabelece uma relação de 
exclusão. a contradição dialética se situa no universal 
concreto, enquanto a contradição formal permanece na 
generalidade abstrata.
O método dialético busca captar a ligação, a unidade, 
o movimento que engendra os contraditórios, que os 
opõe, que faz com que se choquem, que os quebra ou 
os supera. (lEfEbvRE, 1991, p. 238). 
Nessa lei, situo a institucionalização e a desins-
titucionalização em psiquiatria (intrinsecamente 
contraditórias), como dois lados opostos um ao 
outro, mas com uma unidade em comum: o foco na 
abordagem da doença mental. Conforme o contexto, 
prevalecerá um ou outro – a institucionalização ou 
a desinstitucionalização. as idéias contidas em um 
e em outro modelo entram em choque na realidade 
concreta através das práticas executadas. a realidade 
da desinstitucionalização não pode ser compreendida 
sem o prévio entendimento da institucionalização, 
assim como a conexão estabelecida com a reabilitação 
psicossocial.
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
14 HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
as modificações quantitativas, lentas e graduais 
desembocam em uma modificação qualitativa que apre-
senta características bruscas, tumultuosas, expressam a 
crise e a metamorfose através da intensificação de todas 
as contradições. É a transformação da quantidade em 
qualidade, também chamada lei dos saltos. o salto 
dialético implica, simultaneamente, a continuidade e a 
descontinuidade. ou seja, o movimento que continua 
e o aparecimento do novo. 
trago, nesta lei, as mudanças ocorridas com o 
processo de desinstitucionalização identificadas em 
alguns lugares do mundo a partir da década de 1960 e 
no Brasil mais tardiamente, após a redemocratização. as 
transformações políticas, a redemocratização no país, a 
Constituição de 1988, a luta pelos direitos humanos e 
o Movimento pela reforma Sanitária desembocaram 
em um movimento pela reforma Psiquiátrica no Bra-
sil. Neste movimento, pode-se observar que ocorreram 
mudanças bruscas, o ‘salto’ dialético, através das de-
núncias expostas à opinião pública e o surgimento de 
novas experiências em Saúde Mental, com características 
desinstitucionalizantes. observa-se como característica 
do salto dialético a continuidade, ou seja, o hospital 
psiquiátrico como realidade ainda presente, os saberes 
e práticas hegemônicos de exclusão e segregação ainda 
não superados; e a descontinuidade, que compreende 
o aparecimento de novos serviços respaldados pelas 
iniciativas das políticas públicas de Saúde Mental.
Uma característica da lei se refere ao fato de as coisas 
não mudarem sempre no mesmo ritmo. transpondo 
para a questão da reforma Psiquiátrica, foi possível 
observar, nas últimas décadas, alguns períodos em que se 
intensificaram as discussões e o surgimento de novos ser-
viços, assim como períodos em que houve uma desace-
leração do processo. Historicamente, podemos situar as 
décadas de 1980 e 1990 como marcos significativos nas 
discussões pela reestruturação da assistência psiquiátrica 
no país. Em 1987, ocorreu a 1
a Conferência Nacional de 
Saúde Mental; em 1990, realizou-se a Conferência para 
a reestruturação da atenção Psiquiátrica, em Caracas, 
que resultou na Declaração de caracas. Finalmente, em 
1992, aconteceu a 2ª Conferência Nacional de Saúde 
Mental. Em seguida, houve uma lacuna no que se refere 
às conferências e à legislação (porque os serviços conti-
nuaram sendo constituídos) até a aprovação, em abril 
de 2001, da lei de reforma Psiquiátrica. Em 2001, Foi 
estabelecido um novo fórum de discussões por meio da 
3ª Conferência Nacional de Saúde Mental.
a lei do desenvolvimento em espiral defende que 
há um salto dialético entre a vida e a matéria sem vida, 
e não uma descontinuidade absoluta. Há uma unidade 
sempre renovada entre o individual e o universal, que 
submete esse individual às leis universais. É na sociedade 
e no pensamento que se revela o movimento em espiral: 
o retorno acima do esperado, para aprofundá-lo e elevá-
lo em nível, libertando-o de seus limites. É a contradição 
dialética da negação da negação.
APLICAçÃO DO MATERIALISMO 
DIALÉTICO NA REFORMA PSIQUIÁTRICA E 
REABILITAçÃO
Considero esta lei fundamental para a compreensão 
das mudanças e movimentos que o processo de reforma 
Psiquiátrica encerra, pois ela contempla os refinamentos 
conceituais produzidos. Cita-se como exemplo a dife-
renciação entre tratamento e reabilitação, o enfoque do 
trabalho terapêutico sobre os aspectos da história de vida 
das pessoas portadoras de sofrimento psíquico. No mo-
delo tradicional biomédico, centraliza-se no diagnóstico, 
nos sinais e sintomas, nos déficits. através da modificação 
da centralização do trabalho terapêutico, não no modelo 
da doença, do dano, mas nos aspectos sadios das pessoas, 
permitiu-se aprofundar a questão do sofrimento psíquico, 
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
15HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
e introduzir novos olhares e perspectivas, libertando o 
usuário/paciente e o profissional desses limites. ocorre aí 
um salto dialético e não uma descontinuidade absoluta, já 
que o tratamento continua a ser realizado, mas associado 
com técnicas de reabilitação psicossocial. a partir da 
união tratamento-reabilitação psicossocial a compreensão 
do indivíduo portador de transtorno psíquico torna-se 
aprofundada e, dessa forma, realizam-se abordagens mais 
completas. a lei da negação da negação promove refina-
mentos que são introduzidos aos poucos como estratégia 
para se promover a superação dialética. 
dentro de uma perspectiva mais ampla, de to-
talidade, considera-se de fundamental importância o 
diagnóstico de vida de uma pessoa e o conseqüente 
estabelecimento de um projeto terapêutico a partir do 
contexto no qual se insere. Este projeto deve ser sufi-
cientemente flexível para que incorpore mudanças e dê 
margem a possíveis redimensionamentos. ressalta-se 
a necessidade de leitura do contexto dentro de uma 
mudança de óptica: comumente, tal leitura é realizada 
em cima dos déficits, dos aspectos negativos. Sublinhar 
as forças e os aspectos sadios constitui uma transição 
importante no processo de tratamento e reabilitação, 
assim como a noção de indissociabilidade de ambos. 
lefebvre (1991) assinala que todas as leis dialéticas 
constituem uma análise do movimento e no movimento 
real estão implicadas a continuidade e a descontinui-
dade, o aparecimento e choque de contradições, saltos 
qualitativos e superação. Encontram-se aí os aspectos 
do movimento. as leis dialéticas pressupõem uma uni-
dade fundamental, que é encontrada no movimento, 
no devir universal. o que ocorre, segundo o autor, é a 
ênfase sobre uma ou outra lei, dependendo do tipo de 
estudo realizado.
a partir desta constatação, utilizo como referência 
para o processo analítico neste estudo a lei do desenvolvi-
mento em espiral, representado pela negação – superação 
dialética. Muitos avanços ocorreram com as experiências 
de desinstitucionalização. Entretanto, penso que, a des-
peito de muitos serviços que trabalham sob a égide da 
reforma Psiquiátrica em nosso país, há a necessidade de 
constantemente redimensionarmos o olhar para as práticas 
em curso para que aos novos serviços correspondam as 
balizas propostas; nesse caso, particularmente, o referencial 
da reforma Psiquiátrica italiana. Sabe-seque os projetos 
de reforma não são homogêneos, pois as práticas são exe-
cutadas conforme a concepção teórica dos profissionais 
da área. dessa forma, é possível visualizar a existência de 
princípios orientadores gerais, mas que em última análise 
estão subordinados aos settings específicos das práticas. 
através da negação da negação, ou seja, a negação de uma 
determinada realidade centrada na exclusão (na doença) 
para se afirmar outra realidade, focada nos aspectos sadios, 
na identidade e cidadania dos portadores de sofrimento 
psíquico, deverá prevalecer a superação dialética. 
os serviços se constituem, para Saraceno (1999), 
como a variável que influi no processo reabilitativo. 
o autor assinala como característica de um serviço de 
alta qualidade a capacidade do serviço em se ocupar de 
todos os pacientes e a todos oferecer possibilidades de 
reabilitação. Saraceno pontua, ainda, que os serviços 
que não oferecem essas possibilidades acabam gerando 
hierarquias de intervenção, e os menos dotados são 
excluídos do processo. o autor ressalta que um serviço 
de alta qualidade deverá ser permeável e dinâmico, com 
alta integração interna e externa:
[...] um serviço onde a permeabilidade dos saberes e 
dos recursos prevalece sobre a separação dos mesmos e 
em que a organização está orientada às necessidades 
do paciente e não às do serviço.(1999, p. 96-97). 
a integração interna e externa também deverá 
acontecer nos movimentos que perpassam o tratamen-
to e a reabilitação psicossocial. Essa integração se fará 
possível e concreta se os profissionais visualizarem a 
importância da não-dissociação e assumirem ambos, 
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
16 HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
o tratamento e a reabilitação. a idéia contida nessa 
proposta enfrenta um embate que se estabelece muitas 
vezes no cotidiano dos serviços: o tratamento é execu-
tado por uns e a reabilitação, por outros. ou seja, há 
a necessidade de não-separação do trabalho manual do 
intelectual reproduzido dentro dos serviços para que 
haja a superação dialética.
Saraceno (1999) alerta que, na integração interna 
de um bom serviço devem ser contempladas estratégias 
organizativas e afetivas. a permeabilidade dos recursos 
e dos saberes deve superar a sua separação. Compreen-
demos que esse patamar deveria se constituir no ideal 
a ser alcançado pelos serviços. os movimentos nos ser-
viços, quando encaminhados às questões organizativas 
e afetivas concomitantemente, conduzirão à superação 
dialética. da mesma forma, quando os conflitos e 
contradições forem dialeticamente trabalhados, e não 
ocultados, será promovida a descontinuidade; o apa-
recimento do novo e a explicitação das contradições 
conduzirá a saltos qualitativos que processarão mudanças 
reais nos serviços.
Saraceno, asioli e tognoni (1997) destacam a 
atitude de integração da equipe como uma das muitas 
variáveis que determinam a enfermidade e a eficácia da 
intervenção. tais variáveis, relacionadas à organização e 
ao estilo de trabalho da equipe, podem ser favoráveis ou 
desfavoráveis. os autores conceituam uma equipe inte-
grada com variável favorável e que deve ter as seguintes 
características: distribuição do poder; importância dos 
conhecimentos; comunicação clara e não-contraditória; 
discussão e planificação do trabalho; socialização dos 
conhecimentos; autocrítica e avaliação periódica dos 
resultados. Entre os fatores que colcoam obstáculos 
à integração interna, os autores apontam a separação 
prática entre os diferentes papéis profissionais, os dife-
rentes níveis de capacitação e de aspectos culturais dos 
papéis profissionais e os conflitos ou frustrações entre 
os membros da equipe.
acrescentam-se aqui as inquietações que Basaglia 
(1985) já enfatizava: não é a redefinição da instituição 
em termos estruturais, através de novos esquemas, 
que garantirá ações terapêuticas, mas as relações 
que se estabelecerão dentro das novas organizações 
assistenciais. os novos serviços deverão atentar para 
as possíveis (e concretas) contradições que podem se 
configurar no seu interior. Uma dessas contradições 
se refere ao discurso sobre a prática muitas vezes não 
ser condizente com a prática desenvolvida. Basaglia 
postula que as contradições do real deverão ser 
dialeticamente vividas. É importante ressaltar que, 
nessa tentativa de criação de um mundo ideal, se as 
contradições não forem ignoradas ou postergadas, 
mas enfrentadas dialeticamente, a comunidade se 
tornará terapêutica. Para isso, devem existir alterna-
tivas, possibilidades. 
CONSIDERAçÕES FINAIS
resgato a lei da dialética, defensora de que a nega-
ção é a força motriz do progresso. Negação essa, enten-
dida como a negação de uma determinada realidade e 
a força, como aquela que se empenha na construção de 
outra realidade mais rica e completa. Essa lei poderá ser 
empregada no campo da Saúde Mental, mais especifi-
camente na área da reabilitação psicossocial. resgata-se, 
neste processo, toda a potencialidade para a produção 
de vida significativa ao ser humano. Nesse momento 
ocorre um salto qualitativo significativo, através de 
uma práxis transformadora que vislumbra todas as 
possibilidades que se descortinam frente ao cuidado à 
pessoa portadora de transtorno psíquico. Isso permite 
alcançar refinamentos conceituais que, em última análi-
se, proporcionarão um olhar crítico em relação à práxis 
da reforma Psiquiátrica. 
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 9-17, jan./dez. 2008
17HIrdES, a. • reforma Psiquiátrica e reabilitação psicossocial: uma leitura a partir do materialismo dialético
o foco do trabalho terapêutico sobre a escuta, a 
validação da identidade dos usuários, bem como a abor-
dagem aos pontos positivos, introduzem refinamentos 
conceituais que se traduzem uma filosofia dos novos 
serviços pautada na égide da reforma Psiquiátrica. Esses 
diferenciais que contornam as ações introduzem saltos 
qualitativos que se inserem na vida cotidiana das pesso-
as. a superação dialética é alcançada no momento em 
que são reunidos, no mesmo sujeito histórico, aspectos 
subjetivos e objetivos oriundos das demandas singulares 
de cada pessoa.
Enquanto as práticas tradicionais objetalizavam o 
doente (e o seu corpo), hoje rompe-se uma nova aurora, 
na qual a subjetividade é reintegrada com o corpo social 
dos portadores de sofrimento psíquico. Essa tomada 
de consciência sobre a importância dessas intervenções 
produz movimentos de superação da objetalização a que 
foi submetido o doente e, também, a reconstrução de 
um corpo físico, subjetivo e social.
R E F E R Ê N C I A S
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recebido: abr./2008
aprovado: nov./2008
Saúdeem Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 18-26, jan./dez. 2008
artIgo orIgINal / ORIgINAL ARTIcLE18
Psicologia e Saúde Mental: três momentos de uma história
Psychology and Mental Health: three moments of a history
RESUMO Neste artigo são apresentados e analisados três momentos da trajetória 
dos psicólogos no Sistema Único de Saúde (SUS), a partir do campo da Saúde 
Mental, no município de Belo Horizonte, Minas gerais. O primeiro é aqui 
chamado de implantação, o segundo de antimanicomial e o terceiro de apoio 
matricial. Trabalha-se com revisão de literatura e com documentos da área. 
conclui-se que o psicólogo na Saúde Mental tem, por um lado, uma formação 
clínica que não o preparava para a opção prioritária do Programa de Saúde 
Mental e, conseqüentemente, sua formação ocorreu em serviço. Por outro lado, a 
ênfase presente em sua formação para práticas grupais o capacita para a presente 
prática matricial.
PALAVRAS-CHAVE: Saúde Mental; Psicologia; Movimento antimanicomial; 
Apoio matricial; Psicoterapia de grupo.
ABSTRACT This article presents an analysis of three moments of psychologists 
trajectory in the Brazilian Single Health System (SUS), starting with the field 
of Mental Health, in the city of Belo Horizonte, Minas gerais, Brazil. The first 
moment is herein named implantation, the second, anti-asylum, and the third, 
matrix support. This paper is examines a literature review and documents of 
the area. The conclusion is that the psychologist in Mental Health has a clinical 
training which wasn’t enough to prepare him to the priority option of the Mental 
Health Programme, and his training happened at work. The current emphasis 
in training on group practices and psychosocial interventions, on the other hand, 
enables the professional to work with present-day practice in matrix support.
KEYWORDS: Mental Health; Psychology; Anti-asylum movement; Matrix 
support; Psychotherapy, group.
João lei te Ferre i ra Neto 1
1 Professor do Programa de Pós-
graduação em Psicologia da Pontifícia 
Universidade Católica de Minas gerais 
(PUC Minas); doutor em psicologia da 
PUC São Paulo.
jleite.bhe@terra.com.br
19
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 18-26, jan./dez. 2008
FERREIRA NETO, J.L. • Psicologia e saúde mental: três momentos de uma história
I N T R O D U ç Ã O
Quando a psicologia foi reconhecida como profis-
são em 1962, suas três áreas de atuação eram: as psicote-
rapias, dentro do modelo liberal-privado de consultório, 
a organizacional e a educacional. a saúde pública ainda 
não era tratada como campo de atuação, e após 44 anos 
essa situação mudou drasticamente. 
Uma pesquisa realizada a partir dos dados do Ca-
dastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) 
contabilizou 14.407 psicólogos no Sistema Único de 
Saúde (SUS) em 2006, o que representa 10,08% dos 
profissionais registrados no Sistema Conselhos de Psi-
cologia (sPinK, 2007). diversos estudos apontam que a 
crescente presença dos psicólogos na saúde pública no 
Brasil aconteceu em associação com a reforma psiquiátri-
ca e com a criação do campo chamado de Saúde Mental 
(dimEnstEin, 1998; fERREiRa nEto, 2004). 
o objetivo deste artigo é a apresentação de al-
guns elementos da história da entrada e do percurso 
dos psicólogos no SUS, a partir do campo da Saúde 
Mental, no município de Belo Horizonte, Minas 
gerais. as fontes bibliográficas e documentais pesqui-
sadas indicam que a construção desse percurso nesse 
município ocorreu em três momentos, marcados por 
características próprias, em que a noção de Saúde 
Mental sofreu variações quanto a seu sentido e à suas 
diretrizes, na direção de sua consolidação e de sua 
integração no contexto do SUS. Na década de 1980, 
ocorreu o primeiro período chamado de implantação, 
seguido pelo antimanicomial e o apoio matricial, 
respectivamente nas décadas de 1990 e 2000. Essa 
análise histórica abordará com maior atenção a pre-
sença de duas polaridades que atravessam este campo. 
a polaridade entre abordagens individuais e coletivas, 
e a composta pela especificidade da Saúde Mental e 
da reforma psiquiátrica são o contexto mais amplo 
da saúde geral e reforma sanitária. além da necessá-
ria revisão de literatura sobre o tema, nossa fonte de 
dados será um conjunto de documentos produzidos 
no decorrer da história mineira e da nacional.
MOMENTO ‘IMPLANTAçÃO’ – ANOS 1980
o Programa de Saúde Mental foi oficialmente 
implantado em Minas gerais, na região Metropolitana 
de Belo Horizonte, em 1984, durante a gestão do go-
vernador tancredo Neves pelo Partido do Movimento 
democrático Brasileiro (PMdB). Nesse período, um 
número expressivo de profissionais de saúde com perfil 
progressista ocupou postos importantes na Secretaria de 
Estado de Saúde. É importante lembrar que o período 
de abertura democrática no país consolidou uma
[...] tática desenvolvida inicialmente no seio do mo-
vimento sanitário, de ocupação de espaços públicos 
de poder e de tomada de decisão como forma de in-
troduzir mudanças no sistema de saúde. (amaRantE, 
1998, p. 91).
a chamada Nova república tornou-se o apogeu 
dessa tática de ocupação, quando o movimento sanitário, 
juntamente com o da reforma psiquiátrica, se confundiu 
com o próprio Estado.
os antecedentes dessa iniciativa são: o Programa 
Integrado de Saúde Mental (Pisam), proposto na VI 
Conferência Nacional de Saúde, que teve curta duração 
entre 1977 e 1979 e, grupos de profissionais isolados 
atendendo em centros de saúde sem ligação com um 
projeto ou programa que organizasse ações em Saúde 
Mental. 
20
Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 18-26, jan./dez. 2008
FERREIRA NETO, J.L. • Psicologia e saúde mental: três momentos de uma história
a proposta do Pisam parte da avaliação de uma 
prevalência de transtornos mentais de 18% e uma 
demanda atendida de 0,28%. Suas diretrizes envolvem 
ações de prevenção primária, integração da Saúde 
Mental nas atividades básicas de saúde, utilização de 
leitos em hospitais gerais e a integração de profissionais 
não-médicos na assistência psiquiátrica. Na prevenção 
primária era considerada eficaz a realização de “grupos 
operativos de gestantes, mães, professores e o atendi-
mento a crises” (mEndonça filho; alKimin, 1998, p. 
25). Particularmente, o grupo de professores deveria ser 
conduzido por psicólogos. 
Quanto ao atendimento clínico individual, os 
pacientes egressos de hospitais psiquiátricos e os casos 
graves eram a prioridade. Entretanto, mantinha-se uma 
franca divisão nesses atendimentos: os egressos com os 
psiquiatras e, os neuróticos e as crianças com a psico-
logia. o Pisam teve curta duração devido, entre outras 
causas, à falta de apoio político e pressão dos grupos 
privados (mEndonça filho; alKimin, 1998).
Na Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, desde 
1984, havia 12 psicólogos distribuídos por oito centros 
de saúde. No relatório de atividades de 14 de dezembro 
de 1984, é possível observar que nesse ano ocorreram 
as primeiras reuniões dos psicólogos que atuavam em 
centros de saúde no município. a atuação na época era 
voltada para a demanda infantil, para a participação em 
outros programas em andamento nas unidades (pueri-
cultura, pré-natal) e conselhos de saúde e, para atuação 
junto a instituições comunitárias. Existe uma indicação 
no documento pela priorização do trabalho em grupos, 
“por permitir uma melhor resposta a demanda” (sEcRE-
taRia municiPal, 1984, p. 2). Nenhuma menção é feita 
ao paciente psicótico ou mesmo ao egresso hospitalar, 
eixo fundamental da reforma psiquiátrica. Em suma, 
a expressãoSaúde Mental era tomada de um modo 
genérico, sem relação com as propostas da reforma 
psiquiátrica. 
Nos antecedentes à oficialização do Programa 
de Saúde Mental, temos uma compreensão ampliada 
e genérica do que poderia ser definido como Saúde 
Mental na rede pública. algumas vezes, era entendida 
como parte mental da saúde geral, incluindo tanto o 
doente grave, como as ações preventivas e a participação 
nos programas prevalentes de saúde pública. Contudo, 
mesmo quando as ações incluíam o paciente grave, ainda 
pertencia ao domínio exclusivo do psiquiatra. 
Já no Programa de ações da Saúde Mental da re-
gião Metropolitana realizado em 1985, início oficial do 
programa na região metropolitana de Belo Horizonte, 
Minas gerais, e anterior à municipalização da saúde, fo-
ram apresentadas 23 equipes de Saúde Mental divididas 
em 18 centros de saúde e em cinco unidades em serviços 
de pronto atendimento e da rede hospitalar, em parceria 
com algumas prefeituras. as equipes são estabelecidas 
como referência secundária, ou seja, como atendimento 
especializado. a princípio, o Programa de Saúde Men-
tal buscava formular, de modo ainda primário, uma 
concepção integral de saúde – o famoso trinômio do 
bio-psico-social. Por isso, as primeiras equipes de Saúde 
Mental respeitavam essa conformação: psiquiatra (bio), 
psicólogo (psico) e assistente social (social). a falta de 
experiência para uma formulação mais sofisticada do 
que seria um trabalho em equipe multiprofissional e 
interdisciplinar, conduziu a essa opção por uma alter-
nativa mais óbvia.
o documento retoma o histórico anterior do Pisam 
e faz referência às práticas isoladas de psicólogos com 
muitos pacientes em centros de saúde, afirmando seu ob-
jetivo de sistematização das ações em Saúde Mental.
Sua atuação preconiza seis eixos: atendimento à 
demanda específica (doença mental), apoio aos demais 
programas dos centros de saúde integrando a Saúde 
Mental no contexto global da saúde, apoio técnico 
ao nível primário, articulação com os recursos das 
comunidades (escolas, creches, hospitais e associações 
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Saúde em Debate, rio de Janeiro, v. 32, n. 78/79/80, p. 18-26, jan./dez. 2008
FERREIRA NETO, J.L. • Psicologia e saúde mental: três momentos de uma história
de bairro), atendimento à criança e avaliação periódica 
do programa. apenas no primeiro eixo é mencionada a 
necessidade de uma atenção especial aos egressos. Final-
mente, as equipes foram cogitadas para um trabalho de 
‘integração’ com os hospitais psiquiátricos, no sentido 
de evitar ‘internações desnecessárias’ (sEcREtaRia dE 
Estado dE saúdE, 1985, p. 8). ainda não se falava em 
substituição do modelo hospitalar.
a ênfase nas ações coletivas permanecia: “o aten-
dimento em grupos tem lugar privilegiado como forma 
de abordagem das questões de Saúde Mental” (sEcRE-
taRia dE Estado dE saúdE, 1985, p. 7). aponta ainda 
que a intervenção em grupos é um trabalho que exige 
constante discussão e aprofundamento por parte dos 
profissionais envolvidos e deve ser acompanhada por 
avaliação de seus impactos. 
a partir desse período os psicólogos continuam 
envolvidos com as práticas coletivas nos programas dos 
serviços, mas também começam a receber a clientela 
prioritária do Programa de Saúde Mental e os pacientes 
com transtornos graves e persistentes. Como notificado 
no documento, a formação em serviço por meio de su-
pervisões de casos clínicos passa a ser uma prática mais 
constante. além disso, inicia-se o curso de Especializa-
ção em Saúde Mental, formando os primeiros grupos 
de psiquiatras, psicólogos e assistentes sociais da rede, 
oferecido pela Escola de Saúde de Minas gerais (Esmig), 
com forte acento na prática clínica de base psicanalítica 
lacaniana tendo parte do corpo docente pertencente 
ao Simpósio do Campo Freudiano, que mais tarde se 
tornará Escola Brasileira de Psicanálise.
Conclui-se que o momento de ‘implantação’ é por-
tador de algumas características. anterior à implantação 
oficial temos a presença da ação dispersa de profissionais 
de Saúde Mental, com uma concepção genérica desse 
campo. No caso dos psicólogos, a ênfase é nos progra-
mas gerais de promoção da saúde já desenvolvidos e na 
atenção clínica voltada à criança. Mesmo no período do 
Pisam, quando a questão do atendimento aos casos gra-
ves aparece, essa clientela aparece ainda como domínio 
da psiquiatria. Somente quando Programa de ações é 
implantado, em 1984, esse quadro começa a se alterar, 
e o momento seguinte ‘antimanicomial’ consolidará a 
atuação dos psicólogos aos pacientes graves.
Nesse momento, é marcante a preocupação da 
integração da Saúde Mental no contexto geral da saúde 
e a participação de seus profissionais em ações cole-
tivas com outros profissionais do serviço. as práticas 
de grupo se constituem numa importante diretriz de 
trabalho, tendo nos psicólogos um de seus principais 
agentes. além disso, é preconizado o apoio técnico ao 
nível primário, estratégia que somente se consolidará 
no terceiro momento de ‘apoio matricial’.
MOMENTO ‘ANTIMANICOMIAL’ – ANOS 1990
a passagem entre os dois primeiros momentos 
analisados está atravessada por alguns importantes 
eventos. o primeiro deles, no ano de 1987, foi o II 
Encontro Nacional dos trabalhadores em Saúde Mental 
em Bauru. Nesse encontro foi produzida a consigna por 
uma sociedade sem manicômios e instituído o dia 18 de 
maio como o dia Nacional da luta antimanicomial. os 
psiquiatras já não são mais maioria entre os trabalhadores 
presentes, grande parte desses são psicólogos. Contando 
com a participação de intelectuais de diversas áreas, ela-
borou-se uma pauta de conceitos para instrumentalizar 
a luta pela reforma psiquiátrica, visando à autonomia do 
movimento em relação ao Estado. as diretrizes apon-
tavam para um caminho de alargamento das fronteiras 
da luta para uma ação no interior da própria cultura, 
trazendo a discussão sobre a loucura para o cotidiano 
da sociedade, numa estratégia que ampliava a atividade 
puramente assistencial e criava pontes entre as ações no 
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FERREIRA NETO, J.L. • Psicologia e saúde mental: três momentos de uma história
âmbito do Estado com a sociedade civil. Prevaleceu, 
desde então, um ideário de “desinstitucionalização ou 
da desconstrução/invenção” (amaRantE, 1998, p. 93), 
induzindo a uma disjunção com o movimento sanitarista 
e sua tática de ocupação da máquina estatal. desde essa 
nova direção, seriam visadas alianças com a sociedade 
civil e os movimentos populares e com as associações de 
usuários e de familiares, em busca da rua, da imprensa 
e da opinião pública. 
através do segundo evento, em 1989, a reforma 
psiquiátrica assumiu repercussão nacional com a inter-
venção da Secretaria de Saúde do Município de Santos 
na Casa de Saúde anchieta e a seqüente criação de dis-
positivos antimanicomiais na cidade, numa gestão que 
inspirou várias experiências posteriormente conduzidas 
por todo o país (amaRantE, 1998, p. 83).
Finalmente, no mesmo ano temos a apresentação 
ao Congresso do Projeto de lei 3.657/89 visando re-
gulamentar o processo de reestruturação da atenção à 
Saúde Mental no país, de autoria do deputado federal 
Paulo delgado (Partido dos trabalhadores de Minas 
gerais, Pt/Mg).
Em Belo Horizonte, somente durante a gestão 
municipal do prefeito Patrus ananias, do Pt (1993 
a 1996), a Secretaria de Municipal de Saúde (SMSa) 
de Belo Horizonte definiu e conduziu suas ações para 
priorizar, essencialmente, o atendimento clínico dos 
pacientes

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