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MORTE,SEPARACAO (1)

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MORTE, SEPARAÇÃO, PERDAS 
E O PROCESSO DE LUTO
A morte do outro se configura como a vivência da morte em vida. É a possibilidade de experiência da morte que não é a própria, mas é vivida com se uma parte nossa morresse, uma parte ligada ao outro pelos vínculos estabelecidos.
É a morte da qual todos temos recordações, desde a mais tenra infância, nas inevitáveis situações de separação da figura materna temporárias ou definitivas, mas sempre dolorosas. Separação ou morte de figuras parentais, amigos, amores, filhos, todos temos histórias a contar. A perda e a sua elaboração são elementos contínuos no processo de desenvolvimento humano. É neste sentido, que a perda pode ser chamada de morte “consciente” ou de morte vivida.
A morte como perda nos fala em primeiro lugar de um vínculo que se rompe, de forma irreversível, sobretudo quando ocorre perda real e concreta. 
A morte como perda supõe um sentimento, uma pessoa e um tempo. È a morte que envolve, basicamente, a relação entre as pessoas. Se ocorre de maneira brusca e inesperada tem a potencialidade de desorganização, paralisação e impotência. 
Ver a perda como fatalidade, ocultar os sentimentos, eliminar a dor, apontar o crescimento possível diante dela, podem ser formas de negar os sentimentos que a morte provoca, para não sofrer.
Sabe-se que a expressão de sentimentos nessas ocasiões é fundamental para o desenvolvimento do processo de luto. No entanto, as manifestações diante da perda e do luto sofreram alterações no decorrer dos tempos. Cada cultura apresenta algumas prescrições de como a morte deve ser enfrentada e quais os comportamentos e rituais devem ser cumpridos pelos enlutados. Segundo Ariès (1977), na Idade Média era autorizada a manifestação dos sentimentos diante de uma perda. Com o desenvolvimento do poder da Igreja, esta passou a exigir uma atitude mais contida e digna, assumindo o controle dos rituais e ditando as formas de comportamento adequadas.
No século XIX, a morte romântica traz em seu bojo a idéia de morte como uma ruptura insuportável, porque representa a morte do outro. É o período das grandes explosões sentimentais, a tristeza e a dor cantadas em verso e prosa.
O século XX, segundo Ariès, traz a representação da “ morte invertida”. É a morte que se esconde e que é vergonhosa, o grande fracasso da humanidade. Há uma supressão da manifestação do luto, a sociedade condena a expressão e a vivência da dor, atribuindo-lhe uma qualidade de fraqueza. Há uma exigência de domínio e controle. A sociedade capitalista, centrada na produção, não suporta ver os sinais da morte. Os rituais do nosso tempo clamam pelo ocultamento e disfarce da morte, como se esta não existisse. As crianças devem ser afastadas do seu cenário, como se esta não ocorresse. Esta supressão do processo de luto traz sérias conseqüências do ponto de vista psicológico. Sabe-se que muitas doenças psíquicas podem estar relacionadas com um processo de luto mal-elaborado.
O processo de luto por definição é um conjunto de reações diante de uma perda. Bowlby (1985) refere-se às quatro fases do luto:
Fase do choque que tem a duração de algumas horas ou semanas e pode ser acompanhada de manifestações de desespero ou de raiva.
Fase de desejo e busca da figura perdida, que pode durar também meses ou anos.
Fase de desorganização e desespero.
Fase de alguma organização. (KOVÁCS, 2002, P.155)
Bowlby levanta alguns aspectos, que podem afetar o processo de luto que talvez facilitem a evolução de um quadro patológico. Ele chama atenção para cinco pontos importantes:
Identidade e papel da pessoa que foi perdida.
Idade e sexo do enlutado.
As causas e circunstâncias da perda.
As circunstâncias sociais e psicológicas que afetam o enlutado, na época e após a perda.
A personalidade do enlutado, com especial referência a sua capacidade de amar e responder a situações estressantes.
Cada uma das características pode facilitar ou dificultar o processo de luto. Temos de levar em conta as características de personalidade do enlutado antes da perda: se era uma pessoa centrada, equilibrada, ou se era frágil ou desestruturada. A perda é considerada como uma crise e que será enfrentada com as características que a pessoa já possuía. 
Até aqui demos destaque ao processo de luto diante de perdas definitivas, como é a morte. Igor Caruso (1982), em seu trabalho, refere-se a um outro tipo de morte, a separação, que ele relaciona a uma fenomenologia da morte. Uma das experiências mais dolorosas para o ser humano é a separação, que todos, inevitavelmente, viveremos. Segundo Caruso, estudar a separação amorosa é estudar a presença da morte na nossa vida. É uma morte psíquica na vida dos seres humanos. Separa ou partir é morrer um pouco. A separação pode ser em muitos casos pior do que a própria morte porque significa uma capitulação diante da morte ainda em vida. Por outro lado, a separação pode ser a saída menos dolorosa, em alguns casos, porque evita a morte.
A separação traz o sentimento de “nunca mais”, como na situação de morte, só que o companheiro não morreu. 
As várias fases do desenvolvimento são também experiências de morte em vida. O desenvolvimento humano representa perda, morte e sacrifício de formas anteriores. Como nos dizem Aberastury e Knobel (1973), o adolescente tem de realizar o luto do corpo, da identidade e dos pais infantis. Há a perda de algo conhecido e a angústia diante do novo. A velhice é também um momento de profundas separações, em que o indivíduo tem de se despedir do trabalho, dos familiares, do seu corpo e pertences e finalmente da vida.
De todos os aspectos que vimos até agora, podemos observar que as perdas e sua elaboração fazem parte do cotidiano, já que são vividas em todos os momentos do desenvolvimento humano. São as perdas por morte, as separações amorosas, bem como, as perdas consideradas como “ pequenas mortes” , como, por exemplo as fases do desenvolvimento, da infância para a adolescência , da vida adulta e velhice. São também vividas como “equenas mortes” mudanças de casa, de emprego. O matrimônio e o nascimento do filho também são “ mortes simbólicas” , em que uma pessoa perde algo “ conhecido” , como o papel de solteiro e o de filho, e vive o “ desconhecido” de ser cônjuge ou pai. Estas situações podem despertar angústia, medo, solidão e, neste ponto, trazem alguma analogia com a morte. Carregam em si elementos de sofrimento, dor, tristeza e uma certa desestruturação egóica. Um tempo de elaboração se faz necessário.
KOVÁCS,M.J. Morte e desenvolvimento humano,São Paulo: Casa do Psicólogo,2002

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