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MONOGRAFIA FEMINICDIO ADAHRA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA 
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO 
INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS 
 
 
 
 
 
 
 
ADAHRA CATHARINIE REIS MENEZES 
 
 
 
 
 
 
 
 
A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO SOB A ÓTICA DO HOMICÍDIO DE MULHERES 
NO ESTADO DE RORAIMA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
BOA VISTA – RORAIMA 
2015 
 
 
 
ADAHRA CATHARINIE REIS MENEZES 
 
 
 
 
 
 
 
 
A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO SOB A ÓTICA DO HOMICÍDIO DE MULHERES 
NO ESTADO DE RORAIMA 
 
 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Instituto de 
Ciências Jurídicas da Universidade 
Federal de Roraima (UFRR), como pré-
requisito para obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
Orientadora: Profa. Msc. Ilaine Aparecida 
Pagliarini 
 
 
 
 
 
 
BOA VISTA – RORAIMA 
2015 
 
 
ADAHRA CATHARINIE REIS MENEZES 
 
 
 
 
 
A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO SOB A ÓTICA DO HOMICÍDIO DE MULHERES 
NO ESTADO DE RORAIMA 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Instituto de 
Ciências Jurídicas da Universidade 
Federal de Roraima (UFRR), como pré-
requisito para obtenção do título de 
Bacharel em Direito. Defendida em 22 de 
março de 2016 e avaliada pela seguinte 
banca examinadora: 
 
 
________________________________________________________________ 
Profa. Msc. Ilaine Aparecida Pagliarini 
Orientador / Instituto de Direito – Universidade Federal de Roraima 
 
________________________________________________________________ 
Prof. André Paulo dos Santos Pereira 
Universidade Federal de Roraima / Curso de Direito 
 
________________________________________________________________ 
Profa. Denise Meneses Gomes 
Universidade Federal de Roraima / Curso de Direito 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Mulher da Vida/ Minha irmã/ De todos os 
tempos/ De todos os povos/ De todas as 
latitudes/ Ela vem do fundo imemorial das 
idades/ E carrega a carga pesada/ Dos 
mais torpes sinônimos/ Apelidos e ápodos: 
Mulher da zona/ Mulher da rua/ Mulher 
perdida/ Mulher à-toa/ Mulher da Vida, 
minha irmã/ Pisadas, espezinhadas, 
ameaçadas/ Desprotegidas e exploradas/ 
Ignoradas da Lei, da justiça e do direito. 
 
(Cora Coralina, para o ano internacional da 
mulher, 1975) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
O presente estudo destina-se a analisar a lei 13.104 de 09 de março de 2015, que 
tipificou a conduta do feminicídio, enquadrando-o como homicídio qualificado e 
incluindo um novo rol de majorantes ao Código Penal, bem como ponderar a 
necessidade da Lei do Feminicídio por meio de dados sobre o homicídio de mulheres 
no Estado de Roraima, extraídos do Mapa da Violência 2015, e de casos 
emblemáticos de homicídio de mulheres por questões de gênero em cinco municípios 
de Roraima. Para tanto, utiliza-se de uma metodologia qualitativa, exploratória, 
bibliográfica e documental. Primeiro, analisa-se o conceito de violência de gênero, a 
qual é considerada um sinônimo de violência contra a mulher, por ser esta sua maior 
vítima, e como a cultura do patriarcado serviu para legitimar esse tipo de violência, 
num processo de inferiorização da mulher ante a figura masculina, passando por uma 
abordagem dos marcos normativos nacionais e internacionais de combate à violência 
de gênero. Em seguida, estuda-se o crime de feminicídio pontualmente, partindo-se 
da análise de seus requisitos típicos e as mudanças acarretadas no Código Penal 
Brasileiro. Discorre-se, ao final, sobre os dados alarmantes no Mapa da Violência 
2015, Homicídio de Mulheres no Brasil, no qual Roraima figura em primeiro lugar no 
ranking nacional, sendo o estado em que mais crescem as mortes de mulheres por 
questões de gênero, e alguns casos marcantes em âmbito estadual. 
 
Palavras-chave: Feminicídio. Violência de gênero. Lei do Feminicídio. Roraima. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This study aims to analyze the 11.104 law of March 9, 2015, which criminalized the 
conduct of feminicide, framing it as aggravated homicide and including a new list of 
upper bounds to the Brazilian Criminal Code, and to examine the need of the feminicide 
law by data on the murder of women in the state of Roraima, extracted from the 2015 
Violence Map, and emblematic cases of murder of women by gender in five 
municipalities of Roraima. Therefore, it uses a qualitative methodology, exploratory, 
bibliographical and documentary. First, we analyze the concept of gender violence, 
which is considered a synonym for violence against women, as they are its greatest 
victims, and how the patriarchal culture served to legitimize this kind of violence, in an 
inferiorization process of woman at the male figure, going through an approach of 
national and international laws to combat gender violence. Then, we study femicide 
crime on point, starting from the analysis of its typical requirements and changes in the 
Brazilian Criminal Code. At the end, this study talks about the alarming data on the 
Map of Violence 2015 Murder of women in Brazil, where Roraima figure as the first 
place in the country as the state wich deaths of women by gender most grow, and 
some outstanding cases at the state level. 
 
Keywords: Femicide. Gender violence. Law Femicide. Roraima. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
Tabela 1 - Homicídio de mulheres, por UF e região. Brasil. 2003/2013 ............. 59 
Tabela 2 - Taxa de homicídio de mulheres (por 100 mil), por UF e região. Brasil. 
2003/20013 ............................................................................................................... 60 
Tabela 3 - Taxas de homicídio de mulheres, por capital e região. Brasil. 2003/2013 
................................................................................................................................... 64 
Tabela 4 - Taxas de homicídio de mulheres (por 10 mil), por capital e região. 
Brasil. 2003/2013 ..................................................................................................... 64 
Tabela 5 - Comparação das taxas de homicídio de mulheres (por 100 mil) nas 
UFs e em suas respectivas capitais. Brasil. 2013 ............................................... 66 
Gráfico 1 - Ordenamento das UFs, segundo taxa de homicídios de mulheres por 
(100 mil). Brasil. 2013 
................................................................................................................................... 59 
Gráfico 2 - Ordenamento das UFs, segundo taxas de homicídio de mulheres (por 
100 mil). Brasil. 2013 
................................................................................................................................... 61 
Gráfico 3 - Crescimento % das taxas de homicídio de mulheres (por 100 mil). 
Brasil. 2003/2013 ..................................................................................................... 61 
Gráfico 4 - Crescimento % das taxas de homicídio de mulheres (por 100 mil). 
Brasil. 2006/2013 ..................................................................................................... 62 
Gráfico 5 - Taxas de homicídio de mulheres (por 100 mil), por UF. Brasil. 2006 e 
2013 .......................................................................................................................... 63 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 09 
1 VIOLÊNCIA DE GÊNERO.......................................................................................131.1 DELIMITAÇÃO CONCEITUAL............................................................................ 13 
1.2 PATRIARCADO: A LEGITIMAÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER........ 16 
1.3 OS TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER ............................................. 21 
1.3.1 Violência Física............................................................................................... 22 
1.3.2 Violência Psicológica..................................................................................... 23 
1.3.3 Violência Sexual.............................................................................................. 23 
1.3.4 Violência Patrimonial...................................................................................... 24 
1.3.5 Violência Moral................................................................................................ 25 
1.4 MARCOS NORMATIVOS DE COMBATE À VIOLÊNCIA DE GÊNERO ............ 25 
1.4.1 Âmbito Internacional...................................................................................... 25 
1.4.2 Âmbito Nacional.............................................................................................. 29 
2 A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO........................................................................ 32 
2.1 O FEMINICÍDIO NA AMÉRICA LATINA............................................................... 32 
2.2 O PROJETO DE LEI Nº 292/2013 OU LEI DO FEMINICÍDIO............................. 39 
2.2.1 Antecedentes: 1992, 2003 e 2013................................................................... 39 
2.2.2 A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência Contra a 
Mulher....................................................................................................................... 40 
2.3 A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO: LEI Nº 13.104 DE 09 DE MARÇO DE 
2015........................................................................................................................... 44 
2.3.1 Requisitos Típicos.......................................................................................... 45 
2.3.1.1 Sujeito Passivo: Mulher.................................................................................. 46 
2.3.1.2 Razão da Condição de Sexo Feminino ......................................................... 47 
2.3.2 Causas de Aumento de Pena......................................................................... 50 
2.3.3 O Feminicídio como Crime Hediondo........................................................... 53 
2.3.4 Competência para o Julgamento de Feminicídio......................................... 55 
3 O FEMINICÍDIO SOB A ÓTICA DO HOMICÍDIO DE MULHERES NO ESTADO DE 
RORAIMA.................................................................................................................. 57 
3.1 O MAPA DA VIOLÊNCIA 2015 E O HOMICÍDIO DE MULHERES POR 
QUESTÕES DE GÊNERO......................................................................................... 57 
3.2 CASOS EMBLEMÁTICOS .................................................................................. 67 
3.2.1 Comarca de Boa Vista: João e Maria............................................................. 67 
3.2.2 Comarca de Mucajaí: Ana e Pedro................................................................. 69 
3.2.3 Comarca de Caracaraí: José e Tereza........................................................... 70 
3.2.4 Comarca de Rorainópolis: Paulo, Carla e Joana.......................................... 71 
3.2.5 Comarca de São Luiz do Anauá: Raul e Julia............................................... 72 
3.2.6 Onde há amor, não há morte.......................................................................... 73 
CONCLUSÃO............................................................................................................ 75 
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 78 
9 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente estudo pretende desenvolver uma análise acerca das mudanças 
acarretadas no Código Penal Brasileiro com o advento da Lei 13.104 de 09 de março 
de 2015, que incluiu o Feminicídio como mais uma qualificadora do crime de 
homicídio, e incluiu novas majorantes na hipótese de cometimento do delito, 
discutindo-se a necessidade da criação do dispositivo sob a ótica do homicídio de 
mulheres no Estado de Roraima, por meio de dados levantados pelo Mapa da 
Violência 2015 - Homicídio de Mulheres no Brasil, e de casos emblemáticos de 
homicídio de mulheres por questões de gênero em cinco municípios de Roraima, 
analisando-se o tratamento dispensado a eles pelo poder judiciário estadual. 
 
No dia 09 de março de 2015 foi sancionada a Lei nº 13.104, que trouxe 
mudanças significativas ao art. 121, §2º do Código Penal, incluindo em seu rol de 
qualificadoras o Feminicídio, qual seja o homicídio contra a mulher por razões da 
condição de sexo feminino, quando o crime envolver violência doméstica e familiar 
e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher, com o objetivo de diminuir 
a ocorrência de homicídios de mulheres no país somente por questões de gênero, 
promovendo maiores resultados na luta pela igualdade de gênero no país, bem como 
a realização de direitos humanos fundamentais. 
 
A Lei ainda acrescentou ao artigo 121 do Código Penal o parágrafo 7º, 
majorante que eleva de um terço até a metade se o crime for praticado durante a 
gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; contra pessoa menor de 14 
10 
 
(catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; ou na presença de 
descendente ou de ascendente da vítima. 
 
Em que pese a luta das mulheres por igualdade de gênero e as grandes 
conquistas já alcançadas, ainda se percebe uma disparidade de tratamento na 
sociedade entre homens e mulheres, intimamente ligado à cultura do patriarcado, uma 
vez que estas são assassinadas somente por serem mulheres, sendo vítimas no seio 
de sua própria família, dentro do ambiente doméstico e familiar. 
 
Para buscar dirimir essas diferenças e criar mecanismos de prevenção e 
coibição à violência doméstica e familiar contra a mulher, foi sancionada a Lei 
11.340/2006 – Lei Maria da Penha, que apesar do sucesso ao tratar com mais rigor o 
agressor e criar mecanismos de proteção, não conseguiu evitar que a violência 
chegasse a sua última etapa, qual seja o homicídio da mulher. 
 
Em razão disso, foi aprovada em 2011 no Congresso Nacional a instauração 
da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, com o intuito de investigar a situação da 
violência contra a mulher no país diante do agravante aumento do número de 
homicídio de mulheres. A CPMI percorreu todo o país realizando levantamento de 
dados e recomendações para cada Estado, incluindo o Estado de Roraima. 
 
Do relatório da CPMI surgiu a proposta ao Congresso Nacional do projeto lei 
n° 292/2013, batizado como a “Lei do Feminicídio”, alterando o Código Penal ao inserir 
o feminicídio como mais uma qualificadora do art. 121, §2°, tendo sido a lei 13.104 
sancionada em 09 de março de 2015, o que colocou o país entre os dezesseis países 
da América Latina a tipificarem o crime. 
 
Com a violência contra a mulher em destaque no país e no mundo, o Mapa 
da Violência 2015 de Homicídio de Mulheres reuniu dados de todos os estados do 
país entre os anos de 2003 e 2013, dando ênfase ao feminicídio, coletando dados 
relacionados a morte de mulheres por questões de gênero e em situação de violência 
doméstica e familiar. Nesse estudo, o Estado de Roraima tem destaque como o 
primeiro no ranking de crescimento de homicídio de mulheres, e Boa Vista fica entre 
as capitais que ocorreram mais mortes no período. 
11Portanto, a presente proposta de pesquisa justifica-se na necessidade de 
discutir as implicações trazidas pela Lei do Feminicídio na legislação penal, uma vez 
que o tema é bastante atual, passível, portanto, de críticas e discussões. Ademais, a 
relevância social do tema faz parte do dia-a-dia de milhares de mulheres no Estado 
de Roraima, vítimas de violência doméstica que alcança a cada ano índices maiores, 
o que demonstra uma necessidade de se discutir políticas públicas mais eficazes para 
o combate a violência de gênero no Estado. 
 
Este trabalho tem por objetivo geral analisar pontualmente as mudanças 
trazidas pela Lei 13.104, verificando os requisitos típicos do feminicídio no Código 
Penal, bem como demonstrar a necessidade da criação da lei para promover a 
igualdade de gênero e o combate à violência contra a mulher no Estado de Roraima. 
 
Objetiva, ainda, apresentar o conceito de violência de gênero, discutir a 
questão do patriarcado e da inferioridade da mulher, apresentar e analisar as 
mudanças no Código Penal advindas com a tipificação do feminicídio, analisar os 
dados e estatísticas de homicídio de mulheres por questões de gênero no Estado de 
Roraima sob o enfoque do Mapa da Violência de Mulheres 2015, analisar casos 
emblemáticos de homicídio de mulheres por questões de gênero no Estado de 
Roraima, demonstrando-se a necessidade da criação da Lei do Feminicídio. 
 
Para alcança-los, buscará explorar nos próximos três capítulos, os conceitos 
básicos que permeiam o tema, de modo a demonstrar se a tipificação do feminicídio 
atende ao fim proposto. 
 
Inicialmente, o primeiro capítulo buscará definir conceitos fundamentais de 
violência, sexo e gênero, estes últimos bastantes confundidos, para, em seguida, 
discorrer sobre a cultura do patriarcado como legitimação da violência de gênero, bem 
como dos tipos de violência contra a mulher elencados na Lei Maria da Penha, 
dedicando uma seção aos marcos normativos internacionais e nacionais de 
enfrentamento à violência de gênero. 
 
12 
 
O segundo capítulo será dedicado especificamente à tipificação do 
feminicídio, realizando-se um panorama da tipificação na América Latina, por meio de 
um estudo realizado por Damásio de Jesus, e explanando-se como se deu a 
tipificação do crime no Brasil, bem como os requisitos típicos da lei e as mudanças 
acarretas no Direito Penal Brasileiro. 
 
Por fim, o último capítulo pretende expor dados relativos ao homicídio de 
mulheres por questões de gênero no Estado de Roraima, analisando-se tabelas e 
gráficos do Mapa da Violência 2015, Homicídio de Mulheres no Brasil, e analisando-
se, ainda, casos emblemáticos de feminicídio – leia-se homicídio de mulheres por 
questões de gênero, em cinco municípios do Estado de Roraima, e o tratamento 
dispensado a eles pelo sistema judiciário do Estado. 
 
Assim, buscar-se-á, com a presente pesquisa, verificar as consequências da 
tipificação do feminicídio, por meio de sua inclusão no Código Penal como forma de 
homicídio qualificado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 
 
1 VIOLÊNCIA DE GÊNERO 
 
1.1 DELIMITAÇÃO CONCEITUAL 
 
A violência tem se tornado um fato social que atinge países no mundo todo, 
seja no âmbito interno ou externo, público ou privado, e por isso seu conceito está em 
constante mudança, uma vez que diversas condutas passaram a ser consideradas 
formas de violência (DAMÁSIO, 2015). 
 
Robert Muchembled (2010) ensina que a palavra violência deriva do latim 
“vis”, para indicar “força” ou “vigor”, e para caracterizar um ser humano “irascível” e 
“brutal”, bem como para identificar uma relação de força com o intuito de submissão 
e constrangimento de outro. 
 
No senso popular, a violência apoia-se num conceito único, de que seria a 
violação da integridade da vítima, seja ela física, psíquica, sexual ou moral (SAFFIOTI, 
2004). 
 
Joana Sueli De Lazari (1991, p. 75) assevera que: 
 
[a violência] não deve ser vista como transgressão de normas, leis, mas 
principalmente, como transformação de uma assimetria e de uma diferença, 
numa relação de desigualdade marcada pela hierarquia, tendo em vista a 
dominação, exploração e opressão, pelo lado mais forte. Isto conduz para a 
consideração do ser humano como uma coisa e não como um sujeito, 
estando ausentes, portanto, a atividade e a fala. Convém lembrar que na pura 
relação de força a finalidade e a destruição de uma das partes, destruindo-se 
também enquanto relação. Por outro lado, a violência pretende manter a 
relação através da justiça mediatizada pela vontade de uma das panes que 
consente na submissão a outra (1991, p. 75). 
 
Quanto ao termo gênero, este é empregado para assinalar as relações sociais 
entre o sexo masculino e feminino, rejeitando em seu conceito o determinismo 
biológico, que consubstancia várias formas de submissão da mulher, como a ideia de 
que a mulher nasceu para dar à luz e o homem possui força física superior (SCOTT, 
1995). 
 
14 
 
Nesse sentido, entende Scott (1995, p. 75) que “o termo ‘gênero’ torna-se uma 
forma de indicar ‘construções culturais’ – a criação inteiramente social de ideias sobre 
os papéis adequados aos homens e às mulheres”. 
 
 A autora ainda distingue “gênero” de “sexo”, ao afirmar que: 
 
O gênero tornou-se uma palavra particularmente útil, pois ele oferece um 
meio de distinguir a prática sexual dos papéis sexuais consignados às 
mulheres e aos homens [...] O uso de ‘gênero’ põe a ênfase sobre todo um 
sistema de relações que pode incluir o sexo, mas ele não é diretamente 
determinado pelo sexo, nem determina diretamente a sexualidade (p.7). “O 
gênero é um elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as 
diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é um primeiro modo de dar 
significado às relações de poder. O gênero é um primeiro campo no seio do 
qual, ou por meio do qual, o poder é articulado [...] Estabelecidos como um 
conjunto objetivo de referências, os conceitos de gênero estruturam a 
percepção e a organização concreta e simbólica de toda a vida social. Na 
medida em que estas referências estabelecem distribuições de poder, o 
gênero torna-se envolvido na concepção e na construção do poder em si 
mesmo [...] O gênero é então um meio de decodificar o sentido e de 
compreender as relações complexas entre diversas formas de interação 
humana” (SCOTT, 1995, p.14-16) 
 
 
Berenice Dias (2015, p. 49) esclarece que: 
 
A distinção entre sexo e gênero é inciativa. Sexo está ligado a condição 
biológica do homem e da mulher, perceptível quando do nascimento pelas 
características genitais. Gênero é uma construção social, que identifica 
papéis sociais de natureza cultural, e que levam a aquisição da masculinidade 
e da feminilidade. 
 
Da mesma forma, a antropóloga Gayle Rubin (1975) destaca que o preceito 
de sexo/gênero é um conjugado por meio do qual o determinismo sexual biológico é 
transformado pela própria atividade humana, e esta satisfaz suas necessidades 
sexuais. 
 
Assim, a compreensão de Rubin exclui indagações acerca do aspecto de 
construção sócio-cultural do sexo. Portanto, este resguarda-se em sua “natureza”. 
Gênero, ao contrário, fica acessível às transformações históricas e, 
consequentemente, à agenda de lutas feministas (SENKEVICS, 2012 e HENNING, 
2008). 
 
15 
 
A definição de gênero relaciona-se, portanto, com características da cultura 
atribuídas a cada um dos sexos, baseando-se em uma construção cultural para a 
definição de ser homem e ser mulher em uma determinada sociedade. O que é 
estabelecido pela cultura como masculino só pode ser aferido partindo-sedo feminino, 
e vice-versa, determinando-se os modelos de masculinidade e feminilidade que serão 
adotados como padrão dentro de uma sociedade. (GOMES, 2008). 
 
Valéria Scarance Fernandes (2013), entende que o conceito de gênero parte 
das desigualdades históricas, econômicas e sociais entre os sexos, e a forma como o 
homem e a mulher se relacionam, naturalizando um modelo desigual que resulta em 
submissão da mulher ao homem. 
 
Caroline Peixoto Rodrigues, citada por Fernandes (2013, p. 92), explica a 
existência de um aspecto de relação de poder inerente ao conceito de gênero, 
 
O conceito de violência de gênero deve ser entendido como relação de poder 
de dominação do homem e submissão da mulher. Ele demonstra que os 
papéis impostos às mulheres e aos homens, consolidados ao longo da 
história e reforçados pelo patriarcado e sua ideologia induzem relações 
violentas entre os sexos e indicam que a prática desse tipo de violência não 
é fruto da natureza, mas sim do processo de socialização das pessoas. 
 
Na mesma linha, Adriana Ramos de Mello (2015): 
 
O conceito de gênero procura esclarecer as relações entre mulheres e 
homens. Ele apareceu após muitos anos de luta feminista e de formulação 
de várias tentativas de explicações teóricas sobre a opressão das mulheres. 
A ideia de que existe uma construção social do ser mulher já estava presente 
há muitos anos. Mas, permaneciam dificuldades teóricas sobre a origem da 
opressão das mulheres, sobre como inserir a visão da opressão das mulheres 
no conjunto das relações sociais, sobre a relação entre essa e outras 
opressões, como, por exemplo, a relação entre opressão das mulheres e 
capitalismo. Não existia uma explicação que articulasse os vários planos em 
que se dá a opressão sobre as mulheres (trabalho, família, sexualidade, 
poder, identidade) e, principalmente, uma explicação que apontasse com 
mais clareza os caminhos para a superação dessa opressão. 
 
Nessa baila, a dificuldade de se conceituar a violência de gênero é ainda 
maior, uma vez que “são muito tênues os limites entre quebra de integridade e 
obrigação de suportar o destino de gênero traçado para as mulheres” (SAFFIOTI, 
2004, p. 75). 
 
16 
 
Assevera Saffioti (2004) que a subordinação da mulher já é, por si só, um 
forma de violência de gênero, determinada por um sistema frágil que diferencia 
poderes para homens e mulheres. Desse modo, a Autora conceitua violência como 
toda ação capaz de violar direitos humanos. 
 
A Declaração para a Eliminação da Violência Contra Mulheres (Nações 
Unidas, 1993) versa em seu artigo primeiro que a violência de gênero corresponde a 
“qualquer ato violento baseado no gênero que resulte em, ou é passível de resultar 
em dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico”. 
 
A violência de gênero caracteriza-se pela ação violenta em razão do gênero 
das pessoas envolvidas, ou seja, a violência existe pelo fato de ser homem ou mulher. 
Na opinião de Khouri (2012), “a expressão violência de gênero é quase um sinônimo 
de violência contra a mulher, pois são as mulheres as maiores vítimas da violência”. 
 
Como bem aponta Valéria Fernandes (2013, p. 98), “a cultura da violência 
está associada nos dias atuais, ao caráter masculino, daí porque as mulheres figuram 
em regra como vítimas, e não causadoras da violência”. 
 
Concluem Maria Amélia Teles e Mônica de Melo (2002), que a violência de 
gênero “(...) demonstra que os papéis impostos às mulheres e aos homens, 
consolidados ao longo da história e reforçados pelo patriarcado e sua ideologia, 
induzem relações violentas entre os sexos”. 
 
1.2 PATRIARCADO: A LEGITIMAÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER 
 
Nas palavras de Simone de Beauvoir (1980, p. 9), em seu livro “O Segundo 
Sexo”, “ninguém nasce mulher: torna-se mulher”. Não é seu destino biológico que 
determina o papel da fêmea na sociedade, “mas somente a mediação de outrem pode 
constituir um indivíduo como outro”. 
 
Entende a autora que uma criança não tem o discernimento de que é 
sexualmente diferenciada de outra. A menina, por exemplo, “até os doze anos é tão 
17 
 
robusta quanto os irmãos e manifesta as mesmas capacidades intelectuais; não há 
terreno em que lhe seja proibido rivalizar com eles”. (BEAUVOIR, 1980, p.9). 
 
Butler (1999), citado por Bento Berenice (2006, p. 71), afirma que “o corpo 
aqui é pensado como naturalmente dimórfico, como uma folha em branco, esperando 
o carimbo da cultura, que, por meio de uma série de significados culturais, assume o 
gênero”. 
 
Logo, quem determina padrões comportamentais é a família, e os filhos os 
incorporam e repetem na fase adulta naturalmente. Os meninos são educados para 
serem fortes, impávidos e até agressivos se for o caso, e ensina-se que estes 
possuem necessidades sexuais diferentes das mulheres, o que justifica a necessidade 
de terem outros relacionamentos, ao passo de que a mulher deve ter fidelidade e 
decoro, pois pertence ao seu companheiro (FERNANDES, 2013). 
 
A mulher é tomada como sinônimo de família, sendo que, nesse ponto, não 
existe qualquer menção ao pai. Ao se tentar viabilizar os processos culturais mediante 
os quais o feminino está sempre no polo subordinado, invisibilizou-se o masculino, 
naturalizando-o. (BERENICE, 2006, p. 73). 
 
No conceito de Regina Lins (2011), o patriarcado é uma organização social 
com base no poder do pai, em que os descentes e parentes seguem a linha do 
masculino, e na qual as mulheres são consideradas inferiores e, como consequência, 
subordinadas à sua dominação. 
 
Em uma sociedade na qual a mulher ainda é obrigada, às vezes por si mesma, 
a receber o sobrenome do marido ao casar-se, percebe-se que o patriarcado se 
estabelece naturalmente, passando por vezes, despercebido. 
 
O patriarcado é um sistema autoritário tão bem-sucedido que se sustenta 
porque as pessoas subordinadas ajudam a estimular a subordinação. Ideias 
novas são geralmente desqualificadas e tentativas de modificação dos 
costumes são rejeitadas explicitamente, inclusive pelas próprias mulheres, 
que, mesmo oprimidas, clamam pela manutenção de valores conservadores. 
A abrangência da ideologia de dominação é ampla. Partindo da opressão do 
homem sobre a mulher, a mentalidade patriarcal se estende a outras esferas 
da dominação.” (LINS, 2011, p. 42-43). 
18 
 
 
Por um longo período da história, o patriarcado foi incontestavelmente aceito 
por homens e mulheres. Ainda que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5°, 
inciso I e art. 226, §5°, tenha igualado homens e mulheres, a ideologia do patriarcado 
continua existindo (DIAS, 2015). 
 
John Stuat Mill, citado por Carole Pateman (1993, p. 240), em sua obra O 
contrato sexual, aduz que o casamento “confere a uma das partes do contrato poder 
legal e domínio sobre a outra pessoa, propriedade e liberdade de ação, 
independentemente dos desejos e vontades da outra parte”. 
 
E continua afirmando que para a mulher, “a posição de ‘esposa’ é a única que 
sua criação, sua deficiência, de educação e de instrução, e as pressões legais e 
sociais concretas deixam em aberto para elas” (MILL, apud PATEMAN, 1993, p. 241). 
 
O pacto original é um contrato tão sexual como social, é sexual no sentido de 
patriarcal – ou seja, o contrato estabelece o direito político dos homens sobre 
as mulheres – e é também sexual no sentido de estabelecer um acesso 
ordenado, para os homens, aos corpos das mulheres. O contrato está longe 
de se opor ao patriarcado, é o meio através do qual se constitui o moderno 
patriarcado. (PATEMAN, 1993, p. 02) 
 
Portanto, a sexualidade se mostra como um ponto de passagem das relações 
de poder entre homens e mulheres. (Foucault,1988). 
 
Segundo Gilles Lipovetsky (2000), existe um princípio universal que rege as 
coletividades humanas desde tempos mais remotos, qual seja o princípio da divisão 
segundo o sexo dos papéis desempenhados por homens e mulheres dentro de uma 
sociedade. Contudo, este é acompanhado por outro princípio universal, que é o da 
construção da hierarquia dos sexos, no qual o masculino sempre tem valor superior 
ao feminino. 
 
Em determinadas sociedades primitivas, a mulher detém direitos e poderes 
em matéria de propriedade, vida doméstica, educação, mas não assumem cargos 
altos, nem funções políticas, militares e sacerdotais que levem a um reconhecimento 
19 
 
social. “Apenas as atividades atribuídas aos homens são fonte de glória” 
(LIPOVETSKY, 2000, p. 233). 
 
Michael Rosaldo (1979), citado por Bento Berenice (2006), divide a sociedade 
em dois campos incomunicáveis: o público e o doméstico. Isso explica a estrutura 
hierárquica, binária e dicotômica dos gêneros, uma vez que o homem sempre ocupou 
o polo em que se concentra a autoridade, o mundo público. 
 
O que legitima essa diferenciação de papéis no gênero são valores 
associados à divisão sexual nas esferas pública e privada (DIAS, 2015). 
 
Nesse mesmo contexto, entende Damásio de Jesus (2015, p. 7) que, 
 
Nas sociedades onde a definição de gênero feminino tradicionalmente é 
referida à esfera familiar e à maternidade, a referência fundamental da 
construção social do gênero masculino é sua atividade na esfera pública, 
concentrador dos valores materiais, o que faz dele o provedor e protetor da 
família. Enquanto atualmente, nessas mesmas sociedades, as mulheres 
estão maciçamente presentes na força de trabalho e no mundo público, a 
distribuição da violência reflete a tradicional divisão dos espaços: o homem é 
a vítima da violência na esfera pública, e a violência contra a mulher é 
perpetuada no âmbito doméstico, onde o agressor é, mais frequentemente, o 
próprio parceiro.. 
 
Corroborando com esse pensamento, Daniel Wezer Lang (2001, p.461) expõe 
que “os homens dominam coletiva e individualmente as mulheres. Esta dominação se 
exerce na esfera privada ou pública e atribui aos homens privilégios materiais, 
culturais e simbólicos”. 
 
O espaço público sempre foi incumbido ao homem, enquanto a mulher foi 
destinada à fronteira da família e do lar, o que resultou na formação de dois mundos: 
um de dominação, externo e produtor, e outro de submissão, interno e reprodutor, 
sendo outorgado ao macho, pela sociedade, o papel paternalista, o qual demanda 
uma posição de submissão da fêmea. (DIAS, 2015). 
 
Com os avanços da medicina, o surgimento de métodos contraceptivos, e 
ainda, com as lutas e conquistas promovidas pelo movimento feminista, o modelo de 
20 
 
família sofreu uma redefinição. A mulher ingressando no mercado de trabalho e saindo 
do lar, e o homem assumindo responsabilidades domésticas, acarretou um 
distanciamento dos parâmetros de família preestabelecidos (DIAS, 2015). 
 
Essa lógica de dependência diante dos homens, já não é o que rege mais 
profundamente a condição feminina nas democracias ocidentais. 
Desvitalização do ideal da mulher do lar, legitimidade dos estudos e do 
trabalho femininos, direito de voto, “descasamento”, liberdade sexual, 
controle da procriação: manifestações do acesso às mulheres à inteira 
disposição de si em todas as esferas da existência, dispositivos que 
constroem o modelo da “terceira mulher” (LIPOVETSKY, 2000, p. 233) 
 
Apesar de todas essas mudanças, a inferiorização da mulher ainda está longe 
de ser eliminada por completo, 
 
“A mulher foi degradada, convertida em servidora, em escrava do prazer do 
homem e em mero instrumento de reprodução. Esse rebaixamento da 
condição da mulher, (...) tem sido gradualmente retocado, dissimulado e, em 
alguns lugares, até revestido de formas mais suaves, mas de modo algum 
eliminado.” (ENGELS, 1997, p. 75). 
 
Segundo Maria Berenice Dias (2015, p. 26), “nesse contexto é que surge a 
violência, justificada como forma de compensar possíveis falhas no cumprimento ideal 
dos papéis de gênero”. 
 
Para Dias (2015, p. 25), “venderam para a mulher a ideia de que ela é frágil e 
necessita de proteção. Ao homem foi delegado o papel de protetor e provedor. Daí a 
dominação, do sentimento de superioridade à agressão, é um passo”. 
 
A própria sociedade é responsável por proteger a agressividade masculina, 
ao respeitar sua virilidade e construir uma crença de sua superioridade. O homem 
ainda é tomado como dono do corpo e da vontade da mulher. 
 
“Essa errônea consciência de poder é que assegura a ele o suposto direito de 
fazer uso de sua força física e superioridade corporal sobre todos os membros da 
família” (DIAS, 2015, p. 25). 
 
Portanto, o patriarcado legitima a violência contra a mulher, uma vez que é 
sustentado pela própria sociedade, partindo de uma construção universal e histórica 
21 
 
da superioridade masculina, em que, muitas vezes, a própria mulher inferioriza-se por 
acha-lo natural. 
 
Acostumada a realizar-se exclusivamente com o sucesso do par e o 
desenvolvimento dos filhos, a mulher não consegue encontrar, em si, um 
centro de gratificação própria. O medo, a dependência econômica, o 
sentimento de inferioridade, de menos valia, decorrentes da ausência de 
espaços de realização pessoal, impuseram-lhe a lei do silêncio. Nem sempre 
é por necessidade, de sustento ou por não ter condições de prover sozinha a 
própria subsistência que ela se submete e não noticia as agressões de que é 
vítima. Em seu íntimo, se acha merecedora da punição por ter deixado de 
cumprir as tarefas que acredita serem de sua exclusiva responsabilidade. Um 
profundo sentimento de culpa a impede de usar a queixa como forma de fazer 
cessar a agressão. Por isso, ainda é insignificante o número de denúncias da 
violência ocorrida dentro do lar. (DIAS, 2015, p. 26). 
 
1.3 OS TIPOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER 
 
 Conceituada a violência de gênero, cumpre-se destacar os tipos de violências 
perpetradas contra a mulher, uma vez que, em regra, entende-se por violência 
somente a física. Apesar de esta ser a mais denunciada e divulgada, são diversas as 
expressões que a violência pode ter, dentre as quais elencamos as trazidas no rol do 
art. 7° da Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha, que versa: 
 
Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre 
outras: 
 
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua 
integridade ou saúde corporal; 
 
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause 
dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe 
o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, 
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, 
humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição 
contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do 
direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde 
psicológica e à autodeterminação; 
 
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a 
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, 
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a 
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a 
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, 
à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, 
suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos 
sexuais e reprodutivos; 
 
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configureretenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos 
22 
 
de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos 
econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; 
 
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure 
calúnia, difamação ou injúria. 
 
1.3.1 Violência física 
 
A violência física acontece quando, para agredir, usa-se a força física ou de 
arma que possa provocar ou não lesões, como por exemplo, socos, bofetadas, 
empurrões, mordidas, tapas, chutes, cortes, queimaduras, fraturas, estrangulamento 
ou lesões por armas ou objetos, entre outros. 
 
Ensina Dias (2015) que não é necessário que a agressão deixe marcas 
aparentes, pois o uso de força física que ofenda o corpo ou a saúde da vítima já é 
uma vis corporalis. 
 
Não é sempre que a agressão contra a mulher se inicia por violência física. 
Na maior parte dos casos a agressão se inicia com violência moral e psicológica e 
evolui para a agressão física, uma vez que a mulher já se encontra frágil e não 
consegue opor resistência (FERNANDES, 2013). 
 
A violência física está prevista em condutas como as dos art. 129 e 121, §2°, 
VI do Código Penal Brasileiro (lesão corporal e feminicídio), bem como nas Lei de 
Contravenções Penais (art. 21). Mônica de Melo e Maria de Almeida Teles, citadas 
por Sanches e Pinto (2015, p. 79), destacam que 
 
A prática da violência de gênero é transmitida de geração em geração, tanto 
por homens quanto por mulheres. Basicamente tem sido o primeiro tipo de 
violência em que o ser humano é colocado em contato direto. A partir daí, as 
pessoas aprendem outras práticas violentas. E ela torna-se de tal forma 
arraigada no âmbito das relações humanas que é vista como se fosse natural, 
como se fizesse parte da natureza humana. A sociedade legitima tais 
condutas violentas e, ainda nos dias de hoje, é comum ouvir que “as mulheres 
gostam de apanhar”. Isso dificulta a denúncia e a implantação de processos 
preventivos que poderão desarraigar por fim a prática da violência de gênero. 
A erradicação da violência social e política passa necessariamente pelo fim 
da violência de gênero, que, sem dúvida, dá origem aos demais tipos de 
violência. 
 
 1.3.2 Violência psicológica 
23 
 
 
A violência psicológica foi incorporada na legislação brasileira como violência 
contra a mulher pela Convenção de Belém do Pará. Ela consiste em uma agressão 
emocional, que é tão ou mais grave que a agressão física, e ocorre quando o agente 
ameaça, rejeita ou discrimina a vítima, sentindo prazer em ver a vítima com medo e 
diminuída. É a chamada vis compulsiva (DIAS, 2015). 
 
Via de regra, a conduta típica desse tipo de violência é o crime de ameaça, 
previsto no art. 147 do Código Penal, mas nada impede que outras condutas recaiam 
sobre a violência psicológica. Nas palavras de Jones Figueiredo Alves (2014), 
 
De ver que a cláusula “qualquer outro meio”, contida no dispositivo, implica 
em refletir situações não taxativamente previstas, uma delas podendo ser 
considerada a própria dependência econômica da mulher, que sirva de causa 
eficiente e deliberada para a dominação psicológica. No viés, é também 
causa determinante de dominação a que se submete a mulher por 
insegurança quanto a manutenção de sua própria subsistência. 
 
Para Tânia Rocha Andrade Cunha (2007), a mulher vítima é mantida sempre 
com medo das atitudes do agressor, seja em relação a ela própria, a algum familiar, 
especialmente os filhos, amigos, objetos pessoais, animais de estimação e etc. 
 
Assevera a autora que “por ter uma continuidade no tempo e, muitas vezes, 
não ser identificada pela vítima, é de mais difícil reconhecimento, na medida em que 
não deixa marcas visíveis no corpo da vítima” (CUNHA, 2007, p. 101). 
 
Esse tipo de violência deixa dores na alma, razão pela qual suas 
consequências são mais graves. “Muitos companheiros se utilizam de xingamentos, 
palavras depreciativas para reduzir sua companheira a uma condição inferior, 
enquanto ele se coloca em um patamar de superioridade” (DIAS, 2015, p. 73). 
 
1.3.3 Violência sexual 
 
O “débito conjugal” era o termo utilizado no meio jurídico para determinar o 
“dever” da esposa de ter relações sexuais com seu marido, questionando-se se 
24 
 
ocorria estupro entre o casal, uma vez que cabia à esposa o dever de submeter-se à 
prática sexual (SCARANCE, 2013). 
 
No mesmo sentido, assevera Maria Berenice Dias, 
 
A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência 
Doméstica também reconheceu a violência sexual como violência contra a 
mulher. Ainda assim, historicamente sempre houve resistência em admitir a 
ocorrência de violência sexual no âmbito dos vínculos afetivos. A tendência 
ainda é identificar o exercício da sexualidade como um dos deveres do 
casamento, a legitimar a insistência do homem, como se estivesse ele a 
exercer um direito. Aliás, a horrível expressão “débito conjugal” parece 
chancelar tal proceder, como se a mulher tivesse o dever de submeter-se ao 
desejo sexual do par. (2015, p. 74). 
 
Com as mudanças na sociedade e na legislação penal, substituiu-se o 
entendimento de “débito” para a “liberdade sexual”, bem tutelado no Código Penal 
Brasileiro no que diz respeito à dignidade sexual. (SCARANCE, 2013). São condutas 
que configuram crime de estupro, entre outros (SANCHES e PINTO, 2015). 
 
A dificuldade em identificar esse tipo de violência reside no fato de que a 
vítima, muitas vezes por medo ou vergonha, deixa de denunciar, 
 
Casos de abuso sexual ocorrem em condições de dependência material e 
emocional do papel de filha ou submissa, que tornam, nesse caso, a questão 
da denúncia um problema e não uma solução. Daí a razão do reduzido 
número de acusações. (DAMÁSIO, 2015, p. 9). 
 
Tânia Rocha Andrade Cunha (2007) destaca que, pelo decorrer da história, o 
corpo da mulher é tratado pelos homens como sua propriedade, que tem como base 
o pensamento de supremacia do homem sobre a mulher, e na visão de que a 
sexualidade se respalda nessa mesma supremacia. Desse modo, a violência sexual 
praticada no âmbito de relação conjugal, relaciona-se com o uso do autoritarismo do 
homem, que obriga a mulher a ter relações sexuais, e por causa dessa cultura, as 
mulheres autorizam o ato sem vontade, acreditando ser essa sua obrigação. 
 
1.3.4 Violência patrimonial 
 
25 
 
Sobre a violência patrimonial, aduz Fernandes (2013, p. 129) que esta rompe 
com o conceito de violência como agressão física, sendo adotada como a “conduta 
violadora dos direitos patrimoniais da mulher. Violência é, então, violação dos direitos 
da mulher e não agressão física”. 
 
Rogério Sanches e Batista Pinto (2015, p. 87) conceituam violência 
patrimonial como a conduta que “configure retenção, subtração, destruição parcial ou 
total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores 
e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas 
necessidades”. Por isso, este tipo de violência dificilmente se apresenta apartado das 
demais, sendo, frequentemente, um meio para agredir fisicamente, ou 
psicologicamente a mulher. 
 
A conduta recai nos crimes contra o patrimônio do Código Penal Brasileiro, 
como furto, dano, apropriação indébita, entre outros. 
 
1.3.5 Violência moral 
 
Sanches e Pinto (2015) conceituam a violência moral como sendo os delitos 
que protegem a honra, 
 
A violência verbal, entendida como qualquer conduta que consista em calúnia 
(imputar à vítima a prática de determinado fato criminoso sabidamente falso), 
difamação (imputar à vítima a prática dedeterminado fato desonroso) ou 
injúria (atribuir à vítima qualidades negativas), normalmente se dá 
concomitantemente à violência psicológica. 
 
Esta é uma das formas mais usadas para dominação da mulher, por meio de 
xingamentos públicos e privados, denegrindo sua autoestima e expondo a mulher 
perante seus amigos e familiares, o que contribui para seu silêncio (FERNANDES, 
2013). 
 
1.4 MARCOS NORMATIVOS DE COMBATE À VIOLÊNCIA DE GÊNERO 
 
1.4.1 Âmbito Internacional 
 
26 
 
Após as considerações acerca da violência de gênero, faz-se necessário uma 
exposição dos marcos normativos em âmbito nacional e internacional que 
demonstram o compromisso de vários países, bem como do Brasil, em combater esse 
tipo de violência, por meio de leis internas e tratados internacionais de direitos 
humanos, colocando a mulher como enfoque central na discussão de políticas 
públicas e legislação. 
 
No âmbito do Direito Internacional, produziu-se uma enorme evolução acerca 
dos direitos das mulheres, por meio de instrumentos que partem de uma interpretação 
de igualdade formal entre homens e mulheres, até aqueles que abarcam a 
desigualdade e discriminação das mulheres, e a necessidade de se revisar o modo 
como seus direitos são tratados (VÁSQUEZ, 2009). 
 
A ONU já reconheceu a violência contra a mulher como forma de violação aos 
direitos humanos, e trouxe garantias de proteção a mulher por meio de acordos 
internacionais, realizando no México a I Conferência Mundial sobre a Mulher, 
proclamando o ano de 1975 como o Ano Internacional da Mulher, e de 1975 a 1985 a 
Década das Nações Unidas Para a Mulher (DIAS, 2015). 
 
Da Conferência no México, resultou a Convention on the Elimination of all 
forms of Discrimination Against Women – CEDAW, em português a chamada 
Convenção sobre eliminação de todas as formas de Discriminação Contra as 
Mulheres, ou Convenção da Mulher, adotado pela Assembleia Geral da ONU em 18 
de dezembro de 1979, entrando em vigor em 03 de setembro de 1981 (DIAS, 2015). 
 
Na CEDAW, os países signatários devem tomar uma gama de medidas e 
ações no intuito de alcançar a igualdade plena entre homens e mulheres, em áreas 
como trabalho, saúde, educação, capacitação, emprego, dentre outras necessidades 
(VÍLCHEZ, 2008). 
 
É o que versa o artigo 3º da Declaração (Nações Unidas, 1979): 
 
Os Estados Partes tomarão, em todas as esferas e, em particular, nas esferas 
política, social, econômica, e cultural, todas as medidas apropriadas, inclusive 
de caráter legislativo, para assegurar o pleno desenvolvimento e progresso 
27 
 
da mulher, com o objetivo de garantir-lhe o exercício e gozo dos direitos 
humanos e liberdades fundamentais em igualdade de condições com o 
homem 
 
Pastili Toledo Vásquez (2008, p. 39) assevera que, 
 
Da análise inicial sobre a discriminação a partir da equiparação com os 
direitos dos homens – que são tomados como paradigma –, deu-se lugar a 
uma interpretação a partir da realidade de subordinação e submissão que 
vivem as mulheres no mundo, sem que necessariamente existam um 
equivalente direto e imediato com o direito dos homens, ou seja, não se trata 
de apenas conseguir o reconhecimento dos mesmos direitos que a eles foram 
reconhecidos historicamente – direito ao voto, ao trabalho, a participação 
política, a mesma remuneração, etc. – mas também do reconhecimento de 
direitos que surgem a medida em que se consideram as características 
próprias da realidade das mulheres, por exemplo, em relação a questões 
relacionadas a violência e ao aborto. 
 
Apesar de a Convenção não ter expressamente previsto a questão da 
violência de gênero, esta “deve ser tomada como parâmetro mínimo das ações 
estatais para promover os direitos humanos das mulheres” (DIAS, 2015, p. 39). 
 
Em 1980 ocorreu em Copenhague na Dinamarca a II Conferência Mundial 
sobre a Mulher, que incrementou o Plano elaborado na primeira conferência, 
incorporando novas preocupações. A III Conferência realizou-se em Nairóbi, no 
Quênia em 1985, e avaliou os objetivos traçados para a década da mulher. 
 
Mas, segundo Maria Berenice Dias (2015, p. 39), “foi a Conferência de Direitos 
Humanos das Nações Unidas, realizada em Viena, Áustria, no ano de 1993, que 
definiu formalmente a violência contra a mulher como violação de direitos humanos”. 
 
A IV Conferência Mundial Sobre a Mulher, em 1995 resultou na Plataforma de 
Pequim, identificando a violência contra as mulheres como uma das 12 áreas críticas 
de preocupação, requerendo ações a fim de atingir a igualdade, o desenvolvimento e 
a paz (SENADO FEDERAL, p. 29). 
 
O Brasil está entre os países signatários desses instrumentos internacionais 
de proteção aos direitos humanos das mulheres, no âmbito global e regional. 
Destacam-se em âmbito global a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas 
de Discriminação contra a Mulher – Convenção CEDAW - e seu Protocolo Facultativo, 
28 
 
a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Convenção 
Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial 
(SENADO FEDERAL, p. 29). 
 
No âmbito regional, o Brasil é signatário da Convenção Interamericana para 
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, mais conhecida como 
Convenção de Belém do Pará. Ela foi aprovada pela Assembleia Geral da 
Organização dos Estados Americanos - OEA e trouxe em seu art. 1° o conceito de 
violência contra a mulher, sendo ratificada pelo Brasil em 27 de novembro de 1995 e 
promulgada em 1996, como o Decreto 1.973/96 (DIAS, 2015). 
 
A Convenção ainda determinou que toda mulher tem direito ao 
reconhecimento, gozo, exercício e proteção de todos os direitos humanos e liberdades 
consagrados pelos instrumentos regionais e internacionais que tratem sobre o 
assunto. Os países signatários assumiram, dentre outras recomendações, a 
obrigação de legislar pela prevenção e erradicação da violência contra a mulher. 
(VÍLCHEZ, 2008, p. 10). É o que versa o artigo 8 da Convenção de Belém do Pará 
(1994): 
 
Artigo 8 
Os Estados Partes convêm em adotar, progressivamente, medidas 
específicas, inclusive programas destinados a: 
a. promover o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma vida 
livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus 
direitos humanos; 
b. modificar os padrões sociais e culturais de conduta de homens e mulheres, 
inclusive a formulação de programas formais e não formais adequados a 
todos os níveis do processo educacional, a fim de combater preconceitos e 
costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade 
ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para 
o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a 
mulher; 
c. promover a educação e treinamento de todo o pessoal judiciário e policial 
e demais funcionários responsáveis pela aplicação da lei, bem como do 
pessoal encarregado da implementação de políticas de prevenção, punição 
e erradicação da violência contra a mulher; 
d. prestar serviços especializados apropriados à mulher sujeitada a violência, 
por intermédio de entidades dos setores público e privado, inclusive abrigos, 
serviços de orientação familiar, quando for o caso, e atendimento e custódia 
dos menores afetados; 
e. promover e apoiar programas de educação governamentais e privados, 
destinados a conscientizar o público para os problemas da violência contra a 
mulher, recursos jurídicos e reparação relacionados com essa violência; 
29 
 
f. proporcionar à mulher sujeitada a violência acesso a programas eficazes 
de reabilitação e treinamento que lhe permitam participar plenamente da vida 
pública, privadae social; 
g. incentivar os meios de comunicação a que formulem diretrizes adequadas 
de divulgação, que contribuam para a erradicação da violência contra a 
mulher em todas as suas formas e enalteçam o respeito pela dignidade da 
mulher; 
h. assegurar a pesquisa e coleta de estatísticas e outras informações 
relevantes concernentes às causas, consequências e frequência da violência 
contra a mulher, a fim de avaliar a eficiência das medidas tomadas para 
prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, bem como formular e 
implementar as mudanças necessárias; e 
i. promover a cooperação internacional para o intercâmbio de ideias e 
experiências, bem como a execução de programas destinados à proteção da 
mulher sujeitada a violência. 
 
Estes instrumentos em âmbito internacional estabeleceram direitos e 
obrigações a serem observados por seus Estados signatários, incluindo o Brasil, de 
modo a criar todo um sistema normativo internacional de proteção às mulheres. 
 
1.4.2 Âmbito Nacional 
 
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, elenca direitos e garantias 
fundamentais como o direito à vida, à igualdade, à propriedade, etc. Ainda, em seu 
inciso I, o artigo estabelece que homens e mulheres são iguais em direitos e 
obrigações. 
 
Sobre a isonomia de que trata o artigo, ensina José Afonso da Silva (2008, p. 
220): 
 
Importa mesmo é notar que é uma regra que resume décadas de lutas das 
mulheres contra discriminações. Mais relevante ainda é que não se trata aí 
de mera isonomia formal. Não é igualdade perante a lei, mas igualdade em 
direitos e obrigações. 
 
A Constituição Federal de 1988 também proclama em seu artigo 226 “que a 
família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado” e assegura no § 8º do 
mesmo artigo que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um 
dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas 
relações”. 
 
30 
 
No campo infraconstitucional, a Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340, de 2006 – 
é a pedra angular no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Com 
a edição da Lei, o Estado brasileiro firmava o compromisso internacional e 
constitucional de prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher. 
 
Nas lições de Fernandes (2013, p. 84): 
 
A Constituição Federal de 1988, atenta aos movimentos de valorização 
da mulher, previu textualmente a igualdade de homens e mulheres em 
direitos e obrigações. E, o reconhecimento desta igualde formal foi o 
primeiro passo, retirando do ordenamento diferenças discriminatórias. 
Contudo, a efetividade da igualde exige algo mais. (...) A igualdade 
entre homens e mulheres somente tem efetividade (...) se reconhecida 
a posição jurídica de cada um e se houver instrumentos de tutela que 
permitam a realização prática desta igualdade. A Lei 11.340/2006 
definiu a posição jurídica da vítima e criou este instrumento de tutela, 
um sistema interdisciplinar de enfrentamento e prevenção à violência. 
 
Segundo a ONU, 7 em cada 10 mulheres no mundo já foram ou serão 
violentadas em algum momento da vida. No Brasil, entre 2000 e 2010, 43,7 mil foram 
assassinadas, das quais cerca de 41% foram mortas em suas próprias casas, muitas 
pelos companheiros ou ex-companheiros, com quem mantinham ou haviam mantido 
relações íntimas de afeto e confiança. Entre 1980 e 2010, o índice de assassinatos de 
mulheres dobrou no país, passando de 2,3 assassinatos por 100 mil mulheres para 
4,6 assassinatos por 100 mil mulheres. Esse número coloca o Brasil na sétima 
colocação mundial em assassinatos de mulheres, figurando, assim, entre os países 
mais violentos do mundo nesse aspecto1. 
 
Apesar de não resolver, por si só, o problema da violência estrutural no país, 
a Lei Maria da Penha expôs um Brasil que ainda subordina suas mulheres ao poder 
do patriarcado. Dessa forma, despontou como um avanço simbólico no discurso 
político que deu visibilidade a uma realidade que ficava escondida no ambiente 
doméstico. 
 
Oliveira; Santos (2014, p. 3766) observam que: 
 
 
1 http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/77282-aumento-da-pena-para-feminicidio-da-maior-protecao-a-
mulher-avalia-conselheira 
31 
 
A Lei Maria da Penha deve ser vista como um início na luta pela igualdade 
de gênero e pela universalização dos direitos humanos, que naturalmente 
incluem o direito à integridade física e o direito à vida. Uma das continuações 
necessárias dessa trajetória é o combate ao feminicídio, visto que os dados 
da violência letal contra mulheres são alarmantes. 
 
Portanto, a Lei Maria da Penha criou mecanismos para coibir a violência 
doméstica e familiar contra a mulher, instituiu a criação de Juizados Especializados 
em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e estabeleceu uma série de 
medidas de proteção e assistência. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
32 
 
2 A TIPIFICAÇÃO DO FEMINICÍDIO 
 
O sucinto panorama do quadro de violência contra o sexo feminino no mundo 
inteiro permite constatar, sem margem de dúvidas, que independentemente da sua 
idade, cor da pele, status social, quer sejam casadas ou solteiras, milhares de 
mulheres em todo o mundo são vítimas de violência de gênero. 
 
Como já fora exposto no presente trabalho, isso implica dizer que, as formas 
patriarcais de pensamento e dominação ainda levam as mulheres a serem vítimas de 
violência apenas pelo fato de serem mulheres. Essa violência, como foi visto, pode 
ser psicológica, física, verbal, econômica, patrimonial e feminicídio; este último como 
resultante fatal da morte violenta de mulheres. 
 
Nesse sentido, esclarecem Oliveira; Santos (2014, p. 3764): 
 
Justificada socioculturalmente por uma história de dominação da mulher pelo 
homem e estimulada pela impunidade e indiferença da sociedade e do 
Estado, a última forma de violência contra a mulher – o homicídio, aparece 
de forma cada vez mais presente na sociedade. O assassinato de mulheres 
pela condição de serem mulheres é chamado de “feminicídio”. É também 
utilizados os termos “femicídio” ou “assassinato relacionado a gênero” para 
se referir a um crime de ódio contra as mulheres. 
 
Flávia Piovesan (2012, p. 301) complementa que: 
 
A realidade brasileira revela um grave padrão de desrespeito aos mais 
elementares direitos humanos de que são titulares as mulheres, mais da 
metade da população nacional. Destacam-se, no quadro das graves 
violações aos direitos humanos das mulheres: a) a violência contra a mulher; 
b) a discriminação contra as mulheres; e c) a violação aos direitos sexuais e 
reprodutivos. Estes são os principais vértices que compõem a agenda 
feminista brasileira no contexto da consolidação democrática. No dizer de 
Jacqueline Pitanguy: “As últimas décadas do século 20 foram caracterizadas 
por um processo de consolidação da nova linguagem dos direitos humanos, 
que passou a contemplar também preocupações com a cidadania feminina e 
as relações de gênero. Paralelamente à ampliação do espaço institucional 
ocupado pela questão dos direitos humanos em todo mundo, verificou-se a 
incorporação de novas dimensões nessa agenda: assuntos como 
reprodução, violência e sexualidade começaram a fazer parte das 
discussões. No Brasil, os debates em torno de uma moderna concepção de 
humanidade, não mais calcada apenas na figura abstrata do homem, 
impulsionaram a adoção de políticas públicas e leis nos campos da saúde 
sexual e reprodutiva, do trabalho, dos direitos políticos e civis e da violência 
de gênero”. 
 
2.1 O FEMINICÍDIO NA AMÉRICA LATINA 
33A penalização do feminicídio na América Latina é um tema recente, e vem 
sendo realizado por diferentes instrumentos, como a tipificação do delito por meio da 
reforma do código penal vigente nos países, ou com o estabelecimento de agravantes 
para o assassinato de mulheres por motivação de gênero – a exemplo do Brasil. 
 
Em 2014, o relatório da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) 
sobre feminicídio apontava que 88 mulheres haviam sido assassinadas por seus 
parceiros ou ex-parceiros na Colômbia; 83, no Peru; 71, na República Dominicana; 
46, em El Salvador; 25, no Uruguai; 20, no Paraguai; e 17, na Guatemala. As cifras 
demonstram a urgência do tema e o quão distante se está de resolver o problema da 
violência de gênero nesses países: 
 
Países como México, Guatemala, Chile, El Salvador, Peru, Nicarágua e 
Argentina já incorporaram a figura do feminicídio às suas legislações penais. 
No nível internacional, a Organização das Nações Unidas (ONU) indicou que 
seus países membros tomassem ações nesse sentido, para reforçar suas 
legislações e assim, garantir a devida investigação e punição dos agressores 
(OLIVEIRA; SANTOS, 2014, p. 3766). 
 
Colocada a questão, e atentos às condições dos sujeitos envolvidos, importa 
verificar o tratamento que o feminicídio tem recebido nesses países. Tal paralelo 
auxilia na construção de algumas premissas basilares para o reconhecimento desse 
direito, o qual será desenvolvido mais à frente. 
 
Os dados aqui apresentados foram compilados por Damásio de Jesus (2015) 
e Ana Isabel Garita Vílchez (2008), através de estudos realizados pelos autores em 
fontes governamentais oficiais e ONGs relacionadas à causa da violência contra 
mulheres. 
 
Nesse quadro, porém, torna-se importante frisar que as estatísticas oficias 
ainda são rarefeitas, contabilizadas sem rigor, e sobre as quais os sistemas judiciários 
costumam ser lentos, especialmente quando o acusado é homem. Assim, Damásio 
de Jesus (2015, p. 21) esclarece: 
 
Ressalta-se, pois, a dificuldade na comparação desses dados entre os 
países. De modo geral, não há dados recentes disponíveis, o que se atribui à 
34 
 
demora na sua compilação e no tratamento pelos órgãos e autoridades 
competentes de cada país. 
 
 
Argentina 
 
Na Argentina, uma mulher morre a cada 31 horas por feminicídio2. Conforme 
os apontamentos levantados por Damásio de Jesus (2015), uma média anual de 3.500 
casos de violência doméstica tem sido atendida pelo Centro Municipal de la Mujer de 
Vicente López de Buenos Aires e aproximadamente 5.000 pessoas, em sua maioria 
vítimas de violência conjugal e abuso sexual, são atendidas anualmente no Centro de 
Atenção a Vítimas da Cidade de Córdoba. Todavia, as condenações por delitos 
sexuais oscilam entre 500 e 700 anuais, cerca de 10% dos casos denunciados: 
 
Entre os casos mais chocantes, está o assassinato da professora de jardim 
de infância María Eugenia Lanzetti, de 44 anos, separada de um marido 
obsessivo, contra quem pesava uma ordem judicial de afastamento. María 
chegou a instalar um botão antipânico em seu celular. Essas medidas não 
foram suficientes para evitar o pior. Na manhã de 15 de abril passado, o ex-
marido de María Eugenia entrou na sala e cortou o pescoço dela na frente 
das crianças. A tragédia aconteceu na província de Córdoba. Outro crime que 
comoveu o país foi a morte de uma adolescente de 14 anos que teria sido 
assassinada e enterrada pelo namorado, que a obrigou a abortar3. 
 
Com uma Lei promulgada em dezembro de 2012, a qual modificou a redação 
do artigo 80 do Código Penal argentino4, o delito passou a ter pena de reclusão ou 
prisão perpétua (VÍLCHEZ, 2008). 
 
Bolívia 
 
De um total de 7.307 casos de violência doméstica denunciados entre 1994 e 
1998 na Bolívia, 93% correspondem à violência intrafamiliar, entre os quais destacam-
se casos de tortura ou abandono de mulher grávida, prostituição, sequestro, 
 
2 TERRA. Feminicídio: vidas em risco na América Latina. Disponível em: 
<http://noticias.terra.com.br/mundo/america-latina/feminicidio-vidas-em-risco-na-america-latina,fb3ac7 
316af1442cef934f8ba6efabd115u1RCRD.html>. Acesso em 27 fev. 2016. 
3 Idem. 
4 A reforma da Lei acrescentou o inciso 11 ao art. 80. In verbis: “Art, 80: Se impondrá reclusión perpetua 
o prisión perpetua, pudiendo aplicarse lo dispuesto en el artículo 52, al que matare: (...) 11. A una mujer 
cuando el hecho sea perpetrado por un hombre y mediare violencia de género”. Disponível em: 
<http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/15000-19999/16546/texact.htm#15>. Acesso em 27 
fev. 2016. 
35 
 
perseguição sexual ou incesto. Os feminicídios tiveram principalmente adolescentes 
como vítimas, e as tentativas de estupro e casos consumados envolveram, em 80% 
dos casos, mulheres entre 11 e 20 anos de idade (DAMÁSIO DE JESUS, 2015). 
 
Frente a esse quadro, em março de 2013, foi sancionada a Lei Integral para 
Garantir às Mulheres uma vida livre de violência5, a qual incorporou no Código Penal 
boliviano o delito do feminicídio. A pena atual é a de reclusão de 30 anos, sem direito 
a recurso. 
 
Chile 
 
Nos dados apresentados por Damásio de Jesus (2015, p. 24), estima-se que 
metade da população de mulheres chilenas sofram alguma forma de violência, seja 
ela física, sexual ou psicológica. 
 
Entre as vítimas, de 25% a 32% já foram estapeadas, arrastadas ou levaram 
surras. As formas de violência física englobam, ainda, tentativa de queimaduras, 
estrangulamentos e ameaças e agressões com armas de fogo. 
 
Nos crimes sexuais, são registrados anualmente 4.500 abusos, os quais 
envolvem, em cerca de 80% dos casos, crianças e adolescentes. Metade desses 
crimes permanece sem punição. Essa espécie de violência também foi percebida 
entre mulheres casadas ou em regime de união estável, as quais são forçadas à 
prática de atos sexuais pelos próprios companheiros (DAMÁSIO DE JESUS, 2015). 
 
As violências sofridas pelas mulheres chilenas afetam não apenas a suas 
saúdes físicas, como também a sua renda: mulheres que não são vítimas de violência 
física grave ganham em média de US$ 385 por mês, enquanto aquelas que sofrem 
dessa violência só ganham em média US$ 150 (VÍLCHEZ, 2008). 
 
 
5 Disponível em: <http://www.cepal.org/oig/doc/LeyesViolencia/BOL/2013_BOL_Ley348.pdf>. Acesso 
em 27 fev. 2016. 
36 
 
A Lei nº 20.480, de 14 de dezembro de 2010, com vigência desde o dia 18 do 
mesmo mês e ano, reformou o artigo 390 do Código Penal chileno6, estendendo a 
pena de reclusão para 40 anos de prisão efetiva antes da tentativa de redução (prisão 
perpétua qualificada). Contudo, a legislação nacional ainda deixou lacunas 
prejudiciais às mulheres, pois apesar de haver previsão legal de que as denúncias 
sejam realizadas por terceiros, estas devem ser ratificadas pela mulher que foi vítima, 
a qual – por motivos diversos, como o medo e a vergonha –, nem sempre está disposta 
a enfrentar o seu agressor e a sociedade. (DAMÁSIO, 2015). 
 
Colômbia 
 
Na Colômbia, o número de denúncias de violência doméstica em todo o país, 
entre 1996 e 2000, aumentou em 17.134 casos. Desse total, 79% foram mulheres 
entre 25 e 34 anos. 
 
Ademais, a situação colombiana envolvendo o tráfico de drogas e a 
dominação de grupos de guerrilhas e paramilitares, como a Forças Armadas 
Revolucionárias da Colômbia (FARC), tem agravado a questão do feminicídio 
(VÍLCHEZ, 2008). 
 
Segundo Damásio de Jesus (2005, p. 28), nos últimos 10 anos, milhares de 
colombianos fugiram de ameaças e assassinatos cometidos por guerrilheiros,massacres paramilitares e violência generalizada que levaram ao tráfico de drogas: 
 
Na maioria dos casos, as mulheres que suportam todo o peso da 
situação decorrente da violência. Muitas delas são viúvas com filhos 
pequenos, analfabetos ou com pouca educação, que têm de assumir a 
responsabilidade de cuidar das crianças e preservar a unidade familiar. 
 
A fim de combater o problema, o Parlamento da Colômbia aprovou uma lei – 
conhecida como Lei Rosa Elvira Cely em homenagem póstuma a uma vítima de 
violência de gênero – que reformou o Código e Procedimento Penal colombiano, com 
 
6 A reforma acrescentou o seguinte trecho no art. 390, in verbis: “(...) Si la víctima del delito descrito en 
el inciso precedente es o ha sido la cónyuge o la conviviente de su autor, el delito tendrá el nombre de 
femicidio”. Disponível em: <http://www.leychile.cl/Navegar?idNorma=1984>. Acesso em 28 fev. 2016. 
37 
 
a modificação do artigo 104 do diploma legal7, que culmina penas de até 50 anos de 
prisão a quem comete um feminicídio. 
 
 Costa Rica 
 
Cerca de 67% das costarriquenhas maiores de 15 anos já sofreram ao menos 
um incidente de violência física ou sexual em algum momento da sua vida. A maioria 
das agressões é de homens conhecidos pelas mulheres, incluindo parceiros e 
familiares (DAMÁSIO DE JESUS, 2015). 
 
Entre os anos de 1998 e 1999 foram registrados mais de 46.074 pedidos de 
medidas de proteção para a violência doméstica, e em 2000, a linha Quebre o Silêncio, 
do Instituto Nacional das Mulheres, recebeu 12.183 chamadas, das quais 94% foram 
para solicitar apoio às mulheres afetadas pela violência (DAMÁSIO DE JESUS, 2015). 
 
Em um estudo realizado entre 5.000 mulheres costarriquenhas pelo Woman 
Are Not Alone, apontado por Damásio de Jesus (2015), verificou-se ainda que a 
gravidade das agressões sofridas pelas mulheres resulta em perigo de morte: elas 
são atacadas ou ameaçadas com armas de fogo, com facas, com vidros e até com 
queimaduras. Mais da metade relataram ter sentindo perigo de morrer nas mãos do 
agressor, enquanto 47% pensaram ou tentaram o suicídio, como resultado da 
violência sofrida. Por fim, 48% dessas mulheres afirmaram que nunca saíam de casa 
por medo de morrer. 
 
A Lei nº 8.589, de 25 de abril de 2007, vigente desde 30 de maio do mesmo 
ano, sancionou pena de prisão de 20 a 35 anos nos crimes de feminicídio, e 
desqualificação de 1 a 12 anos (VÍLCHEZ, 2008). 
 
 
7 In verbis: “Artículo 104. Circunstancias de agravación. [Penas aumentadas por el artículo 14 de la ley 
890 de 2004] La pena será de cuatrocientos (400) a seiscientos (600) meses de prisión, si la conducta 
descrita en el artículo anterior se cometiere: 1. [Modificado por el artículo 26 de la Ley 1257 de 2008] 
En los cónyuges o compañeros permanentes; en el padre y la madre de familia, aunque no convivan 
en un mismo hogar, en los ascendientes o descendientes de los anteriores y los hijos adoptivos; y en 
todas las demás personas que de manera permanente se hallaren integradas a la unidad doméstica”. 
Disponível em: <http://perso.unifr.ch/derechopenal/assets/files/legislacion/l_20130808_01.pdf>. 
Acesso em 28 fev. 2016. 
38 
 
El Salvador 
 
Os dados apresentados em El Salvador também são alarmantes. Entre 1995 
e 1998, o Programa de Saneamento das Relações Familiares atendeu 11.313 casos 
de violência doméstica, 11.691 de abusos contra menores, 14.798 de aconselhamento 
e atenção emocional e 1.134 de crimes sexuais. As autoridades não descartam a 
possibilidade de que os assassinatos de mulheres aconteçam no marco de uma 
campanha de extermínio (DAMÁSIO DE JESUS, 2015, p. 32). 
 
Entre os delitos, destacam-se os crimes contra a vida e contra a integridade 
pessoal, contra os costumes e contra a liberdade sexual, contra a liberdade pessoal e 
moral, contra a inviolabilidade do domicílio, contra a propriedade e contra os 
interesses jurídicos da família. 
 
A Lei especial integral para uma vida livre de violência para as mulheres, nº 
520, de 25 de novembro de 2010, vigente a partir de 1º de janeiro de 2012, culminou 
pena de prisão de 20 a 35 anos, estendendo até 50 anos, na modalidade agravada 
do crime. 
 
Equador 
 
De cada 10 equatorianas, 6 são vítimas de algum de tipo de violência. 
Atualmente, frente a gravida de situação, foram criadas delegacias especializadas em 
denúncias de maus-tratos no ambiente familiar. Estas recebem cerca de 500 
acusações diárias por violência de algum tipo, nas quais 97% das vítimas são 
mulheres e meninas (DAMÁSIO DE JESUS, 2015, p. 33). 
 
A reforma do Código Orgânico Integral Penal do Equador, em vigor desde 10 
de agosto de 2014, modificou a redação do artigo 141 do diploma8, impondo penas de 
reclusão mais severas, de 22 a 26 anos (VÍLCHEZ, 2008). 
 
8 In verbis: “Artículo 141.- Femicidio.- La persona que, como resultado de relaciones de poder 
manifestadas en cualquier tipo de violencia, dé muerte a una mujer por el hecho de serlo o por su 
condición de género, será sancionada con pena privativa de libertad de veintidós a veintiséis años.”. 
Disponível em: http://www.justicia.gob.ec/wp- content/uploads/2014/05/c%C3%B3digo_org%C3%A1n 
ico_integral_penal_-_coip_ed._sdn-jdhc.pdf>. Acesso em 28 fev. 2016. 
39 
 
Venezuela 
 
Estudos realizados em 1997 apontavam que, diariamente, 11.9 mulheres 
foram violentadas na Venezuela. Os casos de violência sexual em todo o país 
chegavam a cerca de 75.530, durante o mesmo período (DAMÁSIO DE JESUS, 2015, 
p. 44). 
 
Os números demonstram ainda o alto grau de impunidade e reincidência nos 
crimes de violência doméstica: dos 40% dos casos de incidentes atendidos em centros 
de saúde em toda a área metropolitana da Venezuela, 89% eram de mulheres que já 
haviam sido atendidas uma vez pelas mesmas razões. Os índices são explicados pela 
impunidade judicial que existe para os infratores, os quais são postos em liberdade 
sem qualquer tipo de penalização. 
 
Sobre a violência contra adolescentes venezuelanas, Damásio de Jesus 
(2015, p. 45) reproduz trechos do relatório nacional de saúde sexual e reprodutiva do 
adolescente, de 1997: 
 
(...) a violência contra adolescentes se qualifica como uma forma de "morte 
lenta": "A violência que recai sobre a menina adolescente não é tanto a morte 
física, mas sim uma violência invisível privada, secreta, causando uma morte 
lenta, prejudicando a autoestima e o autoconceito com uma pessoa de 
direitos. Especialmente em matéria de sexualidade, ele caiu para o 
estereótipo do jovem 'sexo frágil', e é geralmente vítima de coerção, sedução, 
até várias formas de abuso sexual e violência". 
 
Com a reforma da Lei Orgânica pelo Direito das Mulheres a uma vida livre de 
violência, promulgada em 25 de novembro de 2014, o artigo 57 adquiriu nova redação 
legal, que culmina penas de reclusão de 15 a 30 anos. 
 
2.2 O PROJETO DE LEI Nº 292/2013 OU LEI DO FEMINICÍDIO 
 
2.2.1 Antecedentes: 1992, 2003 e 2013 
 
Desde 1992, o Congresso Nacional tem dedicado espaço em sua pauta para 
a investigação da violência contra mulheres. Em 14 de março desse mesmo ano, fora 
instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para “investigar a questão da 
40 
 
violência contra mulher”. Entre as conclusões do Inquérito, destacava-se o descaso 
por das autoridades governamentais que não supriram as comarcas e as delegacias 
de recursos humanos e tecnológicos para fazer o levantamento necessário, conforme 
solicitado à época pela CPI: 
 
No que se refere aos

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