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Mentores, Médiuns e Amigos Espirituais trabalho completo

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS 
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS ANTROPOLOGIA 
 
 
MENTORES, MÉDIUNS E AMIGOS ESPIRITUAIS, 
OS NOVOS SANTOS E BEATOS DO ESPIRITISMO 
Processos da apropriação do poder divino 
 
ROGÉRIO DIAS DE ANDRADE 
 
 
 
 
SÃO PAULO, NOVEMBRO DE 2013. 
2 
 
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO 
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS 
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS ANTROPOLOGIA 
 
 
 
 
PESQUISA DE CAMPO 
MENTORES, MÉDIUNS E AMIGOS ESPIRITUAIS, 
OS NOVOS SANTOS E BEATOS DO ESPIRITISMO 
Processos da apropriação do poder divino 
Autor: ROGÉRIO DIAS DE ANDRADE 
Professor: JOSÉ GUILHERME C. MAGNANI 
 
 
 
 
 
 
 
3 
 
MENTORES, MÉDIUNS E AMIGOS ESPIRITUAIS: 
OS NOVOS SANTOS E BEATOS DO ESPIRITISMO 
 
 
 
 
Trabalho para apresentação na 
disciplina Pesquisa de Campo em 
Antropologia, curso de graduação em 
Ciências Sociais pela Universidade 
de São Paulo – 2013. 
 
 
4 
 
MENTORES, MÉDIUNS E AMIGOS ESPIRITUAIS 
PROCESSOS DE APROPRIAÇÃO DO PODER DIVINO 
ROGÉRIO DIAS DE ANDRADE 
Resumo 
O Espiritismo é uma doutrina surgida na França durante o século XIX. Seus principais 
postulados são: a imortalidade da alma, a possibilidade de nos comunicarmos com os 
mortos e a reencarnação. Controversa na Europa no seu início, teve campo fértil no 
Brasil, se multiplicando em inúmeros centros, onde se praticam a doutrina, a filosofia e 
sua concepção de contato com os mortos, interação que em muitos casos se transforma 
em alterações no comportamento das pessoas, conforme acreditam, e em outros casos se 
materializa em alterações físicas que resultam em redução ou supressão de males físicos 
(curas). Diferentes da maioria das religiões antigas politeístas ou mesmo das religiões 
monoteístas, onde há um visível distanciamento entre o fiel e a sua divindade, onde as 
ações de cura são eventuais, pontuais e imprevisíveis, no Espiritismo esses processos 
apresentam-se bem mais próximos, constantes e horizontalizados, na medida em que o 
acesso ao contato com o plano divino é menos truncado, a ponto de se poder afirmar 
que nesta religião a manipulação (não no sentido político do termo) e a apropriação dos 
elementos transcendentes é sistemática, regular e pulverizada para os que procuram. A 
tarefa deste trabalho é conhecer de perto o processo, através da descrição de algumas 
atividades muito características no meio espírita, mostrando como esse “controle” dos 
elementos concedidos pela transcendência ocorre. 
 Palavras-chave: Antropologia Urbana; Espiritismo; Espiritismo e Cura; Apropriação 
do poder divino no Espiritismo; Mentores, Médiuns, Amigos Espirituais; Espiritismo e 
seus Santos. 
 
 
 
 
 
5 
 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO:...........................................................................................................06 
 
CAPÍTULO I: Compreendendo o processo................................................................07 
 
CAPÍTULO II: Os Campos de Observação..............................................................08 
 
CAPÍTULO III: Em campo: ação dos Mentores, Médiuns e Amigos Espirituais..09 
 
CAPÍTULO IV: Conclusão.......................................................................................19 
 
BIBLIOGRAFIA:......................................................................................................21 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6 
 
INTRODUÇÃO – Apresentação e problemática 
“Mentores, Médiuns e Amigos Espirituais: os novos santos, beatos e operadores 
de milagres no Espiritismo.” Este trabalho pretende, através de pesquisas etnográficas, 
observar, compreender e identificar processos de atuação dentro dos centros espíritas, 
onde seus seguidores, eventuais ou permanentes, mantém estrito contato com entidades 
denominadas pelos próprios religiosos de mentores e ou amigos espirituais, os quais, 
indiretamente (atuando no ambiente) ou diretamente (através de médiuns), exercem 
sobre os que procuram esses locais, algum tipo de transmissão de energias ou 
comunicação, que podem proporcionar, desde uma simples “limpeza” ou “proteção” até 
reversão de algumas patologias, parciais ou totais, chegando à “cura”. É identificar 
sobremaneira como se constitui e se fundamenta a apropriação desse poder, 
transcendente em sua essência, e em que formas e circunstâncias que se manifesta. 
 Tem-se muitas vezes a impressão de que a sociedade moderna - secular, urbana 
e materialista, características que se não unânimes, são bastante recorrentes no cotidiano 
desses aglomerados humanos - busca apenas e tão somente nas fontes da ciência, da 
racionalidade, da comunicação massiva e das relações políticas a solução para os 
dilemas, enfermidades, dificuldades de ordem material e existencial. Existe abundante 
literatura que de maneira exemplar transita, direta ou indiretamente, no universo das 
ações religiosas e seus efeitos. Embora não se queira dizer, em momento algum, que se 
desconhecem as diferentes vertentes religiosas, que arrogam para si o dom de 
transformar, física, emocional e psiquicamente as pessoas que se submetem aos seus 
ritos, uma corrente religiosa, que vem paulatinamente crescendo em número de adeptos, 
simpatizantes e mesmo usuários eventuais pendulares, o Espiritismo, traz uma peculiar 
forma de utilização e apropriação do poder divino, por assim dizer, e que se concretiza, 
basicamente, em dois tipos de ações: uma de comunicação, que pode ser através de 
correspondências escritas por pessoas previamente preparadas, mas orientadas por entes 
que não se encontram nessa realidade, ou através de obras de arte produzidas nos 
mesmos moldes e, por fim, outra forma que se caracteriza por intervenções “cirúrgicas” 
realizadas também por membros devidamente preparados e orientados também por 
entes que se encontram em outro plano de existência. 
 
 
7 
 
COMPREENDENDO O PROCESSO 
 Sem a necessidade de se aprofundar sobre o assunto, mas ao se analisar o 
comportamento humano frente às divindades, no decorrer do tempo, observa-se um 
considerável distanciamento entre estes, além de uma relação pouco equilibrada entre si; 
humanos fazem rituais, sacrifícios, vigílias, orações e preces, tudo com a finalidade de 
aplacar ou mesmo alimentar uma ou várias divindades, as quais, quando retribuem, 
fazem pontualmente e de forma imprevisível. As grandes religiões judaico – cristãs, 
monoteístas, como exemplo, colocam inúmeros obstáculos e pré-requisitos para que 
reconheçam uma ação divina realizada por um ser humano e, este por sua vez só é 
reconhecido como tal depois de um longo histórico de ações e comportamento 
anteriores, para que se justifique então a ação da divindade através do indivíduo em 
questão. 
 Diferente de algumas seitas evangélicas, onde esse dom normalmente é quase 
exclusivo do seu líder, e onde a apropriação transcendental é concedida diretamente a 
este, não só nos centros espíritas essa capacidade pode ser realizada por anônimos, bem 
como por qualquer pessoa, desde que devidamente instruída; além da concepção de que, 
ao invés da intervenção direta da divindade, essas ações são feitas por espíritos que se 
predispõem a “guiar” os que executam fisicamente, essas mesmas ações. A lacuna que 
se pretende preencher através deste trabalho está na relação entre fiéis e as forças 
divinas: se na mitologia grega os deuses não assumiam qualquer compromisso formal 
com a humanidade, e suas forças eram provenientes da adoração das pessoas, passandopelas religiões monoteístas, as quais todavia estabeleciam uma relação de significado 
entre homem e divindade, mas ainda era significativo o desequilíbrio entre as trocas 
realizadas entre si, no espiritismo o poder transcendente pode ser encontrado e 
partilhado constantemente, onde o acesso (não necessariamente o sucesso imediato ou 
satisfação plena das demandas) se encontra pulverizado ou, se assim se pode dizer, 
“democratizado”. É a observação desses fenômenos, suas formas de atuação, seus 
critérios e seus princípios que serão analisados neste trabalho. Até que ponto a presença 
de mentores, médiuns e amigos espirituais exercem de forma análoga as mesmas tarefas 
atribuídas aos santos do catolicismo, diferenciando-se destes últimos na maior liberdade 
em manipular o suposto poder divino? Essa trindade espiritual, onde o Mentor constitui-
se daquele espírito inspirador, cuidador, mantenedor espiritual da casa, e não raro, líder 
dos espíritos que incorporam os Médiuns, pessoas comuns que “recebem” os espíritos e 
8 
 
que transmitem as respostas (sejam elas por escrito, artísticas, verbais ou até mesmo 
terapêuticas) aos que procuram, e ao corpo de Amigos Espirituais, que não 
necessariamente incorporam médiuns, mas que formam uma rede de proteção em torno 
da casa, energizando as pessoas que por ali adentram, impedindo a ação de espíritos 
pouco ou não evoluídos de tirarem proveito da fragilidade dos seus frequentadores, 
entre outras ações. 
O propósito deste trabalho é observar, analisar e estudar os procedimentos que 
envolvem, desde a entrada do indivíduo em um centro espírita, seu acolhimento, as 
etapas no processo de contato (indireto e em alguns casos, direto) com os entes 
transcendentes, até aos casos considerados mais graves e urgentes, onde existe um 
aparato preparado para executar ações de intermediação entre mundos e até mesmo a 
cura. Para isso, fazem-se necessários alguns agentes – presentes e transcendentes – 
chamados de médiuns, mentores e amigos espirituais, que viabilizam as referidas ações. 
 Para tanto, esse estudo se propõe explicitar o fluxo e a participação desses 
agentes no atendimento aos indivíduos (fiéis ou não) que procuram as inúmeras “Casas 
Espíritas” (como eles mesmos denominam), com a finalidade de obter alívio para seus 
desconfortos em geral. Estabelecer a relação entre estes mesmos agentes como 
comodatários de frações do poder divino, onde a cura e a comunicação entre planos 
conferem credibilidade e consistência dentro dos propósitos da Organização. 
 
OS CAMPOS DE OBSERVAÇÃO 
Para a execução deste trabalho serão realizadas etnografias em alguns centros 
espíritas em diferentes regiões de São Paulo, com a seguinte finalidade: onde o 
observador se colocará como participante adepto/simpatizante, de modo que os 
procedimentos, rituais como um todo serão integralmente vivenciados pelo mesmo. 
 Duas instituições terão destaque na pesquisa, pelas práticas pós-doutrinárias, 
onde se praticam, de forma mais concreta e visível, eventos rituais de comunicação e 
cura transcendentes, através de procedimentos específicos: o Instituto Perseverança, 
onde se procedem inúmeras práticas de correspondências mediúnicas psicografadas, 
estabelecendo um periódico canal de comunicação entre médiuns e as pessoas (adeptas 
ou não) que procuram o local, e o centro Tarefeiros da Última Hora, onde, de modo 
9 
 
semelhante – em termos de periodicidade e procedimentos – médiuns realizam cirurgias 
espirituais, com praticamente todos os requintes de uma cirurgia física, com a finalidade 
de amenizar, aliviar, prevenir e até – há exibição de diagnósticos médicos expostos no 
local – curar as pessoas que procuram esse tipo de atendimento. Para tanto, entrevistas, 
observações diretas e indiretas e até mesmo a participação desses rituais estão previstas. 
 
EM CAMPO: A AÇÃO DOS AMIGOS ESPIRITUAIS, MÉDIUNS E 
MENTORES NA APROPRIAÇÃO DO PODER DIVINO 
A descrição é praticamente idêntica em quaisquer centros espíritas que se visite. As 
pessoas chegam, vindas de diferentes direções, algumas sozinhas, outras acompanhadas 
de familiares, amigos, cônjuges ou companheiros, filhos, pais, pessoas que se 
conheceram e acabam frequentando o mesmo local; chegam a pé, de carro, de transporte 
coletivo, até de bicicleta. Uma marca bastante evidente é a gentileza e a cordialidade 
com que as pessoas se tratam no momento de se incluírem na fila (sim, sempre há uma): 
uma constante preocupação em não subverter a ordem de chegada, se possível, a fim de 
não ocasionar qualquer embaraço ou constrangimento, atitudes muitas vezes opostas ao 
que se observa nas filas de bancos, casas lotéricas, estacionamentos de shoppings 
centers, cinemas, etc.. A postura de igualdade e reconhecimento da presença e do direito 
do outro começa muitas vezes no entorno do centro, ao se estacionar seus carros, 
evitando guias rebaixadas, locais proibidos, dividindo ou mesmo cedendo espaço para 
outros veículos, auxiliando outros frequentadores a manobrarem nos locais onde há 
alguma dificuldade. 
À distância, torna-se impossível conhecer os motivos que levam todas essas 
pessoas a se dirigirem aos centros, mas a percepção de que cada um dos que chegam 
trazem questões, que no entender delas a solução encontra-se além das suas capacidades 
e compreensão, por si só já as fazem merecedoras de um gesto visível de solidariedade. 
Mesmo de perto, ao me misturar com as pessoas que chegam, ouvindo suas conversas 
ou eventualmente participando de uma ou outra, na maioria das vezes, não ficam claros 
os motivos que fazem essas pessoas buscarem suas respostas nestes espaços; em 
algumas situações é mais evidente identificar a motivação para a presença de algumas 
pessoas, quando o aspecto e condições físicas são marcantes e amplamente visíveis. 
Quando isso acontece, colaboradores do local e os próprios visitantes e frequentadores 
10 
 
se antecipam e amparam essas pessoas, cedendo seus lugares na fila ou mesmo 
adiantando-as para o início da mesma, atitude nem sempre comum no cotidiano dessas 
pessoas quando estão se dirigindo ao trabalho, ou nos transportes coletivos, quando não 
raro vemos pessoas fingindo sono para não ceder os lugares previamente reservados 
para pessoas com condições especiais, seja nos ônibus ou no metrô. Seria leviano 
afirmar que as pessoas que para os centros se dirigem sejam, em parte ou em seu todo, 
deseducadas ou não cordiais nos ambientes diferentes aos que estou descrevendo, mas 
não deixa de ser intrigante a ausência de conflitos de qualquer espécie nestes locais, 
ainda que estejam repletas de pessoas e suas demandas. Organizada e resignadamente, 
as pessoas vão chegando, discreta e pacientemente procurando um lugar para serem 
recepcionados, atendidos e, quem sabe, sair com respostas. 
 Os levantamentos etnográficos foram realizados em três centros espíritas na 
zona Leste de São Paulo, um no bairro da Água Rasa, conhecido como “Tarefeiros da 
Última Hora – Grupo Socorrista de Cura Espiritual”, fundado em 1989; outro também 
no mesmo bairro, conhecido como “Centro Espírita Perseverança”, fundado em 1964, e 
por fim um centro localizado no bairro de Vila Carrão, chamado de “Centro Espírita 
Aprendizes do Evangelho”, fundado em 1976. São relativamente próximos entre si, 
principalmente os dois primeiros, que se encontram no mesmo bairro. A escolha por 
esses estabelecimentos se deveu a dois motivos: o mais evidente, que é pela localização 
geográfica, relativamente próximos e com acesso favorável, permitindo melhor 
deslocamento para a realização das observações, e por características peculiares 
encontradas nos centros Perseverança e Tarefeiros, muito conhecidos por atividades asquais são consideradas “referências” no meio espírita, por assim dizer. O Centro 
Aprendizes do Evangelho foi incluído como modelo de atuação que é praticamente 
padrão entre os centros, uma vez que para se tornar um centro espírita, seus 
mantenedores se comprometem em realizar, de forma a mais fiel possível, suas 
atividades dentro de um conjunto de procedimentos sem os quais se torna inviável a sua 
existência. As próximas descrições, bem como as realizadas no início deste trabalho são 
comuns a todos os centros, e por isso não haveria a real necessidade de se ampliar a 
base de amostragem, se puder dizer desta forma; é sabido que existem diferenças entre 
algumas formas de atuação entre os centros, mas essas mesmas diferenças estão mais 
relacionadas a questões geográficas, de espaço, de perfil da região, da quantidade de 
colaboradores ou mesmo de recursos materiais e humanos à disposição. 
11 
 
 Numa outra etapa, se darão as descrições referentes aos diferenciais 
mencionados, os que fazem notórias essas instituições, e que consistem na síntese 
colocada por este pesquisador, que dá nome ao título desta apresentação. Na instituição 
Tarefeiros da Última hora, há um trabalho desenvolvido há anos que consiste na prática 
de cirurgias espirituais, de forma estruturada, com diversos recursos e requintes e 
procedimentos que conferem respaldo aos procedimentos citados; na instituição 
Perseverança, de semelhante modo, desenvolvem também há anos um trabalho que se 
poderia dizer “especializado”, na comunicação entre pessoas que já morreram com as 
pessoas que as procuram, através de cartas escritas por médiuns preparados para tal 
procedimento. Neste último caso, existem outros centros (o Aprendizes do Evangelho 
também oferece esse trabalho) que realizam tais processos, mas a demanda significativa 
foi um dos principais motivos para a escolha desse local, capaz de fornecer uma maior 
quantidade de observações, eventuais entrevistas e depoimentos. 
 Um grupo de gentis, pacientes e serenos colaboradores recepcionam as pessoas 
que chegam, em ordem de chegada, sejam elas conhecidas e assíduas frequentadoras ou 
pessoas que pela primeira vez estejam aportando em um centro espírita; não 
necessariamente nesta ordem, pois cada centro conforme suas condições físicas e de 
pessoal pode apresentar nuances, os visitantes ou frequentadores podem passar por uma 
sala onde recebem um passe de limpeza, cuja finalidade é auxiliar a pessoa a “deixar do 
lado de fora” da casa espírita (é uma das nomenclaturas que os praticantes utilizam) as 
preocupações que porventura estejam tomando conta de seus pensamentos, preparando 
assim para um local onde poderão, mais calmamente, de acordo com as explicações dos 
colaboradores, elevar e abrir seus pensamentos na direção da espiritualidade. Nas casas 
onde o passe de limpeza não ocorre logo no início da entrada, as pessoas são 
encaminhadas para um salão (e isso é comum a todos os centros), onde permanecem por 
cerca de 50 minutos à uma hora, em silêncio, ao som de músicas geralmente clássicas, 
eruditas ou parecidas; eventualmente, voluntários se apresentam ao vivo com voz e 
violão, às vezes outros instrumentos, tais como violino e teclado. Todos os presentes, 
desde a chegada ao centro, recebem paulatinamente energias provenientes do plano 
espiritual, através da presença constante e protetora de amigos espirituais, que cercam 
todo o local, protegendo a todos contra outros espíritos, que ainda não se encontram em 
um estágio evolutivo elevado, e por isso tendem a abordar, incomodar e em alguns 
casos, interferir nas ações e juízo do indivíduo mais fragilizado, fenômeno denominado 
12 
 
pelos espíritas de obsessão. Esses amigos espirituais realizam, em seu plano, o mesmo 
trabalho realizado pelos colaboradores “encarnados”, como uma tarefa necessária para 
seu aprendizado e consequente evolução. “Assim na Terra como no Céu”, neste caso, 
não se constitui de um exagero. Cria-se dentro do centro, um espaço energeticamente 
protegido, para que então os procedimentos seguintes sejam bem sucedidos. 
 Após o período de silêncio e reflexão, aparece a figura de um palestrante, 
membro frequentador do centro ou convidado pertencente a um outro centro, que 
durante um período que pode variar de 15 a 30 minutos (as observações não permitiram 
a definição de uma duração exata), dependendo, na verdade, do tempo disponível até o 
término desta etapa; a questão dos horários, na ótica espírita, é de suma importância, 
pois as pessoas deste plano sincronizam-se com a espiritualidade, que se faz presente 
nos horários pré-estabelecidos. Portanto, atrasos nas atividades prejudicam a atuação 
dos amigos espirituais. Os temas geralmente abordam aspectos do cotidiano da maioria 
das pessoas, e seu teor normalmente tende ao conforto e reflexão para os presentes. 
Separados temporariamente das influências externas, abrigados em uma “aura” de 
energia protetora, e reconfortados física e mentalmente, os visitantes ou frequentadores 
estão preparados para as próximas etapas, as quais podem ter sua sequência diferente 
conforme a casa espírita, pelos motivos já identificados; cabe, neste momento, salientar 
algumas dessas nuances, as quais, embora não alterem o conteúdo, tampouco o 
resultado final das atividades, mereçam alguma atenção, pois expressam diferentes 
formas de atuação de acordo com as diferentes demandas oriundas das pessoas que ali 
se encontram. 
 Voltemos à fila de entrada à casa espírita: ali, se organizam diferentes tipos de 
pessoas; as que já são frequentadoras do local, as que de forma pendular (pessoas que 
transitam entre diferentes religiões conforme estímulos pessoais específicos, pendendo 
de uma para a outra) eventualmente frequentam a casa, e as pessoas que - seja por 
curiosidade, indicação de pessoas do seu relacionamento pessoal, alguma divulgação 
institucional, mas muito provavelmente em busca de respostas às questões que no 
momento não conseguem solução - chegam ao local pela primeira vez. Todas essas 
pessoas passaram ou passarão por uma triagem, com a finalidade de se conhecer, sob o 
ponto de vista do visitante ou frequentador, os motivos que o levam ao centro, suas 
necessidades, sejam elas físicas, emocionais ou de outra origem alegada. Atendidos por 
entrevistadores, os atendidos receberão um diagnóstico, proveniente de um outro 
13 
 
elemento importante no conjunto das atividades desenvolvidas pela casa: a figura do 
médium. Aquele que estabelece a comunicação entre alguém do meio espiritual e que 
através do seu próprio corpo físico permite que o espírito identifique as verdadeiras 
causas dos males que afligem o paciente (convenientemente passarei a chamar os 
visitantes e frequentadores assim, por conta de serem também tratados desta forma), 
indicando a forma como este deve ser submetido ao que os colaboradores das casas 
chamam de tratamento. Entendem que todos os males humanos se iniciam no espírito, 
para depois se manifestarem no corpo e ou na mente, e é através de procedimentos 
muito parecidos entre si que o paciente pode então alcançar o equilíbrio. Nos centros 
estudados e visitados, cada paciente recebe um cartão de controle de frequência, onde 
são anotadas as sessões restauradoras; ao final de cada sequência de atendimentos, o 
paciente retorna a um entrevistador (não necessariamente o mesmo que indicou o 
tratamento, uma vez que quem diagnosticou foi uma entidade e não a pessoa 
propriamente dita). Os resultados desse ou daquele tratamento podem indicar tanto uma 
“alta”, como a prescrição de um novo tipo de tratamento; vi e ouvi pessoas recebendo 
liberação logo após o primeiro conjunto de atendimentos, como pessoas que obedecem 
umalonga sequência de tratamentos antes de receberem a liberação dos mesmos. Os 
critérios e as causas para uma maior ou menor duração das sessões de tratamento são 
prerrogativas dos médiuns, de acordo com sua visão no mundo espiritual das reais 
condições e circunstâncias que cercam cada paciente; pessoas entrevistadas que 
manifestavam uma percepção de que estavam se sentindo equilibradas e satisfeitas, 
continuavam seguindo por tempo indeterminado diferentes tipos de tratamentos, bem 
como outras que recebiam alta, mas se queixavam da sensação de que ainda não se 
sentiam satisfeitas, ainda careciam de maior atenção, ou mesmo não tinham ainda se 
recuperado dos problemas que os fizeram chegar ao centro. Aprofundar o estudo sobre 
as percepções e sensações dos pacientes e as prescrições/diagnósticos dados pelos 
médiuns poderia render uma maior compreensão da dinâmica assistencial dentro de uma 
casa espírita, mas fugiria do foco deste estudo; talvez oportunamente uma análise destas 
dinâmicas possa revelar aspectos relevantes. Mas o que se está tentando buscar é o 
processo no qual essa grande religião brasileira vem se utilizando, e obtendo, por conta 
disso, a adesão crescente de novos adeptos, cujas doutrinas (também não é o foco) e 
seus desdobramentos vêm repercutindo na sociedade em geral, inclusive em 
determinadas manifestações artísticas (cinema, por exemplo, aonde essa comunicação 
entre planos vem sendo exaustivamente explorada); em uma casa espírita, o visitante ou 
14 
 
frequentador pode, cada um a seu tempo, ou seja, obedecendo a um gradual processo de 
preparação, entrar em contato com as forças transcendentes, que ao interagirem, podem 
proporcionar diversas formas de benefícios, sejam eles emocionais ou psicológicos, ou 
até mesmo físicos. Em outras religiões, essas manifestações também são recorrentes, 
mas sua dinâmica e suas relações com a transcendência se mostram mais pontuais, 
esparsas e praticamente independem do empenho ou preparação daquele que ministra 
ou do fiel mais assíduo. Aqui, nestas observações realizadas nos centros espíritas, a 
relação homem – plano espiritual não só é mais frequente, como pode se dizer 
sistemática. Os relatos adiante auxiliarão o entendimento. 
 Esperançosa (nome obviamente fictício) é uma mulher dentre dezenas de 
pessoas que, da mesma forma que o relatado anteriormente, cumpre organizada e 
disciplinadamente todos os procedimentos de espera - a inscrição, o preenchimento de 
uma ficha onde menciona o motivo da visita, com quem deseja obter uma mensagem 
psicografada, quando o ente querido “desencarnou” (os espíritas evitam ao máximo 
utilizar o termo morte porque defendem a ideia de que o espírito não morre, mas reside 
no corpo físico e dele deixa quando o mesmo falece), entre outras informações. A 
excessiva demanda de pessoas que procuram esse tipo de serviço (termo aceito e 
utilizado no local) na instituição Perseverança, faz com que esta restrinja a data do 
desencarne para até cinco anos antes do presente; no CEAE da Vila Carrão, ocorre a 
mesma demanda, não tão intensa, mas crescente, conforme relatos dos visitantes. 
Esperançosa busca contato com o filho que partiu de forma trágica, por conta de um 
acidente de moto. É de se esperar que os presentes, de uma forma geral, ainda enfrentem 
dificuldades em lidar com a perda de entes queridos, o que é compreensível, levando-se 
em conta a forma com que nossa cultura ocidental valoriza determinados laços afetivos 
nas relações humanas; o mesmo vale para alguns pressupostos esperados no decorrer da 
existência das pessoas em sociedade, como por exemplo, esperar a partida de alguém 
em idade avançada como algo doloroso, mas inexorável, e não considerar a 
possibilidade de se perder entes queridos mais jovens, como filhos, netos, irmãos, etc., 
como se essas perdas desobedecessem a uma “ordem natural das coisas”, frase ouvida 
durante este trabalho algumas vezes. Uma observação atenta no local onde se 
concentram as pessoas que buscam uma mensagem psicográfica mostra uma 
distribuição equilibrada entre perdas de entes mais idosos e entes que perderam suas 
vidas em idades supostamente prematuras. É nesse ambiente que se desenrola uma das 
15 
 
sessões emblemáticas da atuação transcendente no espiritismo, pois a proximidade 
proporcionada pelos médiuns, ao transmitirem as mensagens dos desencarnados aos 
encarnados saudosos presentes, constrói uma ponte que prolonga relações sócio afetivas 
entre os envolvidos. Não é o caso aqui entender os mecanismos causais que trazem as 
pessoas para as sessões de psicografias, se por assuntos inacabados, remorsos, saudades, 
desamparo emocional e até material; nem tampouco se para as pessoas que saem do 
local com as cartas psicografadas, as respostas serão ou não suficientes para aliviar seu 
sofrimento. A comunicação mediúnica constitui-se, entre outras coisas, de uma 
demonstração da capacidade e do credenciamento concedido pelo outro plano para 
utilizar recursos transcendentes a serviço de quem procura. 
 Ansioso, um senhor de 67 anos, de voz imperativa e afirmativa, busca contato 
com a esposa, com a qual conviveu por mais de 40 anos, e que o deixou (palavras dele) 
por conta de um fulminante AVC; sozinha em sua casa, não teve tempo para pedir ajuda 
a vizinhos ou para as filhas; tanto elas como ele não tiveram tempo para socorrer, de 
ouvi-la por mais uma vez, não tiveram oportunidade para dizer o quanto ela era querida, 
estimada, amada e respeitada. Buscar a comunicação psicografada seria então uma 
forma de ao menos arrematar e concluir um doloroso e inesperado fim. 
 Viúva, uma mulher de 37 anos, há um ano e sete meses sem o marido, 
carinhosamente chamado de Nininho (diminutivo de Menininho), paciente renal 
crônico, que não resistiu ao longo tratamento de hemodiálise; Viúva acompanhou 
diariamente o processo de agonia do esposo, até o final. Nesse sentido, não houve 
surpresas, sustos ou imprevistos: ambos vivenciaram conscientemente o processo, nem 
por isso menos doloroso. Hoje, ela busca o que poderia se chamar de “autorização”, ou 
“permissão” ou mesmo “licença” para recomeçar a vida. Recomeçar a vida pode 
permitir diferentes significados, mas é certo que para ela, que disse ainda se sentir 
casada com Nininho, a resposta dele interferirá nas suas futuras decisões. 
 Nem todas as pessoas que procuram o serviço de psicografia no Perseverança, 
como nos outros centros que disponibilizam o expediente, tem garantida a resposta; 
algumas levam meses para obterem alguma resposta, outras, e esse foi o caso de 
Ansioso, que recebeu uma resposta já na primeira sessão que participou – por conta 
disso, ele e suas filhas passaram a frequentar um centro espírita, participando das 
atividades e dos estudos ministrados, como uma forma de retribuição e de se manterem, 
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por assim dizer, “próximos”. Os dois outros exemplos, em comum o sentimento de que 
ainda não era para ser o momento, e que continuarão buscando respostas, alívio e 
consolo, para que consigam seguir com suas vidas adiante. 
 Os pacientes, da mesma forma que já se relatou nas descrições anteriores, 
cumpridas as etapas de limpeza, palestras, passes, triagens, entre outros procedimentos, 
se prepara para um procedimento que não é tão comum entre os centros espíritas; entra-
se em um salão de consideráveis dimensões, repleto de macas hospitalares, cada uma 
com aquela escadinha de dois degraus para apoio aos pacientes ao acesso às mesmas; ao 
lado de cada maca, previamente revestida com proteção usada em consultórios médicos, 
encontra-se álcool, gaze, bandagens, esparadrapo, entre outros apetrechos também 
comumente encontrados em farmácias, clínicas, hospitais, etc.. Não háqualquer 
instrumento cirúrgico, ampolas, torres para soro, mas a visão encontrada é mais do que 
suficiente para qualquer leigo concluir que se está em uma ampla sala de atendimentos 
médicos. Colabora para essa convicção o conjunto de pessoas, trajadas com aventais, 
máscaras de rosto, toucas, entre outros paramentos, que caracterizam essas mesmas 
pessoas como médicos. 
 Na verdade, sob o ponto de vista dos colaboradores da casa espírita “Tarefeiros 
da Última Hora”, são médicos mesmo; integrantes do centro, iniciados, treinados e 
preparados para uma atividade mediúnica, tal qual os que executam a psicografia, estes 
incorporam diversos médicos que se encontram no plano espiritual, que se reúnem no 
local, sob a coordenação da terceira personalidade-título desta pesquisa, a figura do 
mentor, espírito inspirador, precursor, líder e primeiro protetor do local. Os demais 
centros também possuem seus respectivos mentores, que podem se repetir em diversas 
casas; o mentor enquanto encarnado também realizava ações visando o bem para as 
pessoas com as quais convivia ou encontrava, independentemente de serem ações físicas 
ou mediúnicas; seu conhecimento neste plano, ainda que desencarnado, continua a 
serviço das pessoas deste plano, agora com o recurso de poder “enxergar” os 
necessitados não só sob o ponto de vista material, mas na origem dos seus problemas, 
que se encontra no espírito. 
No caso das cirurgias espirituais realizadas nos Tarefeiros, após um breve 
momento de concentração para que os médicos possam ser recebidos pelos médiuns, 
sob a coordenação do mentor, os mesmos iniciam, em duplas ou trios, dependendo da 
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quantidade de médiuns presentes, as intervenções nos pacientes, a esta hora, já 
devidamente deitados nas macas; os médicos passam algodão com álcool, usam luvas 
de látex, procedem à assepsia como se realmente fossem realizar um procedimento 
cirúrgico tradicional; ouvem-se, durante o processo, dois sons bem característicos, 
simultâneos entre si e durante a “cirurgia”: preces e sibilos, estes últimos sempre que os 
médicos estão manipulando o corpo do paciente, como se estivessem realizando 
incisões nos locais onde julgam necessário. Esses sibilos aumentam à medida em que a 
região tocada seja o foco do mal (não necessariamente o local da enfermidade) ou a 
região a ser tratada. As preces, que acontecem ao mesmo tempo dos sibilos, parecem 
ações que retiram do corpo a causa espiritual da enfermidade. As cirurgias não são 
demoradas, e uma vez concluídas, os médicos passam aos pacientes as recomendações 
físicas típicas de um pós-operatório – repousos, abstenção de hábitos como fumo e 
bebida por determinado tempo, dietas específicas – porque apesar da cirurgia ter sido 
feita no plano espiritual, seus efeitos serão sentidos no plano físico, que como qualquer 
corpo submetido a um procedimento invasivo, faz-se necessário um conjunto de 
cuidados para preservar os resultados positivos de uma operação. São ministrados 
medicamentos – fornecidos pela própria instituição – e recomendações 
comportamentais, dentre as quais a participação em atividades desenvolvidas na casa, 
para consolidar os benefícios da cirurgia recém - aplicada, bem como para a prevenção 
de novos males. 
Aflita, mãe de um casal de adolescentes, está acometida por câncer nas duas 
mamas, diagnosticada com quadro grave pelos médicos tradicionais, realizou a cirurgia 
espiritual não esperando cura, mas um diagnóstico do seu futuro, em virtude dos 
compromissos em vida que a mesma possui, enquanto esposa e mãe, por exemplo. 
Escolarizada, culta e consciente de sua condição, Aflita recebeu a intervenção cirúrgica 
dos médicos espirituais, e recebeu a informação destes que seu câncer, apesar de grave, 
ficará contido no local já instalado, não será revertido por eles, mas os mesmos 
garantiram que não haverá metástase, pois eles realizaram procedimentos que 
impediriam o acontecimento deste fenômeno, tão recorrente ente esse tipo de paciente e 
diagnóstico. 
Renascida, também acometida do mesmo mal, mas em estágio menos avançado, 
depôs que está em sua terceira intervenção espiritual, e que os procedimentos tinham a 
finalidade de proceder à reversão do quadro, o que, de acordo com ela, estava obtendo 
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sucesso, a ponto de gerar incômodo ao profissional que a acompanha neste plano, na 
medida em que os exames comprovariam o retrocesso sem metástases, do tumor 
encontrado. Contudo, as cirurgias mediúnicas exigiram dela, como terapias pós-
cirúrgicas, não só procedimentos alimentares ou corporais diversos, mas uma reforma 
pessoal, uma vez que, dentro da concepção de que as doenças físicas são reflexos das 
causas originadas por comportamentos que afetam primeiro o espírito, seu 
comportamento, a forma como lida com seu círculo de convívio, seus valores e hábitos 
cotidianos, deveriam ser reformulados, para que tanto o câncer de mama motivo de sua 
presença no local, mas a possibilidade iminente de novos tumores, na garganta e no 
pulmão fossem evitados. Renascida não deu maiores detalhes sobre sua forma de levar a 
vida, embora reconheça que vem dando todos os motivos para chegar no estágio físico 
em que se encontrava. 
Com uma ou outra nuance que pode dar um aspecto mais pessoal aos relatos 
citados, de uma maneira geral as pessoas que procuram os centros espíritas trazem as 
mesmas agruras que fazem outras pessoas optarem pelo catolicismo, protestantismo, 
pentecostalismo, entre outras: a busca de soluções “mágicas” (menos no sentido literal 
da palavra, mas no sentido de alternativa aos processos socialmente vigentes e que em 
muitos casos estão mais inacessíveis a estas pessoas do que as instituições 
governamentais afirmam) para questões que, embora enquanto cidadãos estes possuam 
por direito de respostas mas nem sempre de fato, e para alívio emocional diante de 
crescentes ocorrências que as vitimam e aos seus entes queridos, presentes ou não, e a 
consequente dificuldade de superar esses sentimentos; analisar os procedimentos 
adotados nas casas espíritas e fazer uma comparação pura e simples com as formas 
pelas quais as outras instituições religiosas fatalmente fará o observador incauto chegar 
à conclusão de que estas todas se assemelham, não em relação às suas formas, é claro, 
mas em relação às práticas, principalmente se a observação concentrar-se na relação 
com os representantes da instituição com o divino. 
 
 
 
 
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CONCLUSÃO 
Apropriar-se de um poder é, talvez, um desejo humano; seja em sociedades 
ocidentais complexas, onde as relações de poder permeiam quase todas as atividades 
humanas, seja em culturas onde aparentemente suas relações sociais sejam mais 
simples, ainda que com finalidades e situações bem definidas, faz do indivíduo que 
arroga para si essa capacidade alguém diferenciado, fazendo deste uma referência entre 
seus pares. Diversas são as organizações humanas onde o corredor que une o divino e o 
humano é estreito, geralmente ocupado quase sempre por uma ou poucas pessoas. A 
figura do “Deus na Terra”, a personificação do divino em um ser escolhido para 
representá-lo, e julgar, sob critérios subjetivos, a legitimidade, justeza, necessidade ou 
pertinência dos pedidos dos seus “cordeiros”, estabelece para esses não só um conjunto 
de rituais, sacrifícios (não necessariamente iguais aos realizados antigamente, mas 
simbolicamente semelhantes), penitências, romarias, etc., toda a sorte de ações com a 
finalidade de indulgenciar o humano comum, e permitir que tenha a oportunidade de, 
um dia, ultrapassar o corredor estreito e se transferir para o além do qual acredita. Tal 
forma de atuação religiosa nem é e nunca foi novidade; também não passapor esse 
aspecto o diferencial demonstrado nas atividades descritas. As diferentes culturas 
apresentam, sob o ponto de vista religioso algumas semelhanças não só entre si, mas 
apresentam uma conduta muitas vezes paralela à forma de poder político instituído, 
onde a distribuição vertical de poder e de mando conferem mutuamente respaldo. É aí 
que se enxerga a mudança de eixo nos centros espíritas. Cabe dizer que as semelhanças 
nas práticas religiosas com as demais estruturas em uma sociedade fazem e possuem seu 
sentido, na medida em que uma religião que não se desenvolva dentro de uma lógica 
que possa ser reconhecida pelo frequentador, tende ao esvaziamento; as instituições 
como família, representações políticas, organizações empresariais, entre outras, 
costumam ser verticalizadas e afuniladas (cada vez um número menor de pessoas 
próximas do “topo”, do “alto”). As práticas religiosas são pródigas em exemplos onde a 
figura do seu representante concentra senão totalmente, mas em grande parte, o 
monopólio do uso do poder divino, e a manifestação de seu poder tende a passar, 
necessariamente, pela figura deste representante. E dessa forma é que inúmeras seitas 
tem crescido dentro e fora do Brasil, atraídas normalmente por uma ou poucas pessoas, 
trazendo para dentro de seus templos um sem número de fiéis. Na contramão dessas 
práticas, sem descartar elementos presentes em nossa cultura (não é gratuita a 
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associação entre Mentor e Padroeiro, Médiuns e Profetas ou Santos, e na mesma 
sintonia os Amigos Espirituais), o espiritismo aproxima da pessoa leiga ou comum o 
acesso ao que se pode chamar de contato com o divino, alargando o então estreito 
corredor, diluindo a figura do redentor, do provedor, nas figuras já citadas acima, 
horizontalizando as relações e as propaladas benesses oferecidas. Trata-se de uma 
apropriação do poder divino em larga escala, democratizada, de baixíssima “tributação”, 
trazendo de forma silenciosa, mas crescente, uma mudança nos paradigmas da relação 
entre o Humano e o Divino. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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 BIBLIOGRAFIA FONTE DE CONSULTA: 
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 Damazio, Sylvia: “Da Elite ao Povo” – Bertrand Brasil – 1994 
 Giumbelli, Emerson: “O Cuidado dos Mortos” – Ministério da Justiça, Arquivo 
Nacional, 1997 
 Stoll, Sandra Jacqueline: “Entre dois Mundos: O Espiritismo na França e no 
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 Santos, José Luís dos: “Espiritismo, uma religião Brasileira” – Moderna – 1997 
 Magnani, José Guilherme - “Etnografia como prática e experiência” in 
Horizontes Antropológicos vol. 15 nº 32 
 Sahlins, Masrshall – “O ‘Pessimismo Sentimental’ e a experiência etnográfica: 
porque a cultura não é um ‘objeto’ em via de extinção”, in Mana, vol. 3, nos. 1 e 
2, 1997. 
 Turner, Victor – “Um Curandeiro Ndembu e sua Prática”, in Floresta dos 
Símbolos. Niterói: Editora UFF, 2005. 
 Turner, Victor – “Liminaridade e ‘Communitas’” – cap. 3 in O Processo Ritual: 
Estrutura e Antiestrutura. Petrópolis, RJ: Vozes, 1974.

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