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Anestésicos Locais Por José Álvaro Leone Silva Anestesia (do grego: an – sem; aisthesis – sensação) O que são? São substâncias aplicadas localmente capazes de inibir a percepção das sensações (sobretudo a dor) e também de prevenir o movimento, sem causar sedação. Ou seja, são fármacos que provocam bloqueio reversível da condução nervosa, com perda de sensibilidade em área circunscrita, sem alterar o nível de consciência. De onde vieram? Primeiro anestésico local cocaína. As folhas de coca eram mastigadas e produziam um efeito anestésico (propriedades aditivas e tóxicas levaram a pesquisa de substitutos, como a procaína). Qual o mecanismo de ação? Os anestésicos locais exercem seu efeito através do bloqueio dos canais de sódio regulados por voltagem, inibindo, assim, a propagação dos potenciais de ação ao longo dos neurônios. Os anestésicos locais estendem o período refratário do neurônio ao retardar o retorno do canal inativado ao estado de repouso em cerca de 50 a 100 vezes. Através da inibição da propagação do potencial de ação, os anestésicos locais impedem a transmissão da informação para o sistema nervoso central e a partir dele. Seu bloqueio é não seletivo, ou seja, não bloqueiam apenas as fibras para dor, mas outras sensoriais, motoras e autônomas. O que é nocicepção? Ativação de fibras nervosas sensoriais primárias por estímulos nocivos, isto é, estímulos que potencialmente provocam lesão tecidual. Os nociceptores possuem terminações nervosas livres. Seus corpos celulares estão localizados nos gânglios da raiz dorsal, ou no gânglio trigeminal para inervação da face. Como os nociceptores são ativados? Os nociceptores possuem em suas membranas celulares, receptores para substâncias, como a bradicinina e prostaglandinas, que são liberadas quando células adjacentes sofrem lesão. Esses receptores de transdução convertem os estímulos nocivos em correntes geradoras, que despolarizam o neurônio, podendo resultar em potenciais de ação. Tipos de axônios a depender do diâmetro: As mielinizadas conduzem o potencial de ação com maior velocidade por serem isoladas eletricamente, enquanto as não mielinizadas conduzem mais devagar. Quanto maior o diâmetro, maior a velocidade de condução do impulso. Quais as fibras mais importantes para a percepção da dor? As fibras A transmitem a primeira dor (por serem mielinizadas e transportarem o impulso mais rapidamente), de natureza aguda e altamente localizada (dor epicrítica). As fibras C transmitem a segunda dor (por serem não mielinizadas e mais delgadas, tran sportam o impulso mais devagar), de aparecimento mais lento e maior duração. É indistinta (dor protopática). Percepção da dor: Mielinizadas Fibras A Fibras B Não mielinizadas Fibras C Ativação dos Nociceptores Neurônios de 1ª ordem Tranporte por fibras A e fibras C Corno dorsal da medula espinal Interneurônios e neurônios de 2ª ordem Tálamo núcleo ventral póstero- lateral (neurônios de 3ª ordem) Cortex somatossensorial Analgesia x Anestesia Analgésico inibidores específicos das vias de dor. Ações em receptores específicos nos nociceptores primários e no SNC. A transmissão de outras sensações e da informação motora não é afetada. Anestésicos locais inibidores inespecíficos das vias sensoriais periféricas (incluindo a dor), motoras e autônomas. Inibem a condução de potenciais de ação em todas as fibras nervosas aferentes e eferentes, geralmente no sistema nervoso periférico. Química dos anestésicos locais Possuem três domínios estruturais: Grupo aromático responsável pela hidrofobicidade. Grupo amina influencia a velocidade de início e a potência do fármaco. Ligação éster ou amida influencia a duração de ação e os efeitos colaterais do fármaco. Éster dura menos que a amida, pois esta é metabolizada pelo fígado antes de ser excretada pelos rins. Um anestésico local efetivo deve distribuir-se e difundir-se na membrana e, por fim, dissociar-se dela; as substâncias que têm mais tendência a sofrer esses processos possuem hidrofobicidade moderada. Ou seja, se um anestésico local for muito hidrofóbico, ele ficará preso à membrana e não terá seu efeito. O grupo amina pode estar protonado ou não-protonado (neutro). Em pH fisiológico a maior parte está não-protonada e consegue passar mais facilmente pelas membranas, daí sua maior ou menor velocidade conforme o pH extracelular. Quanto mais ácido for o meio, mais protonadas estarão as aminas e, por conseguinte, mais dificilmente passarão pelas membranas. Por isso que em locais de inflamação, os anestésicos locais não atuam bem. Classificação dos anestésicos locais Anestésico local com ligação éster o Procaína o Tetracaína o Cocaína Anestésico local com ligação amida o Lidocaína o Prilocaína o Bupivacaína o Articaína o EMLA (Mistura Eutética de Anestésico Local): lidocaína + prilocaína administrada topicamente como creme ou emplastro. Considerações anatômicas: Os anestésicos locais são aplicados fora da bainha do nervo para não lesioná- lo com a agulha. A partir daí devem penetrar as bainhas que envolvem o nervo (epineuro, perineuro e endoneuro), das quais a mais difícil de ultrapassar é o perineuro. Nas regiões proximais ao corpo, os axônios seguem um trajeto mais superficial no nervo periférico, enquanto em regiões distais, seguem um trajeto mais próximo ao centro do nervo. Consequentemente, a progressão anatômica do bloqueio funcional mostra que as áreas proximais são bloqueadas antes das áreas distais. Por exemplo, se for aplicado um bloqueio nervoso ao plexo braquial, o ombro e o braço são bloqueados antes do antebraço, da mão e dos dedos. Bloqueio funcional diferencial: Durante o início da anestesia local, os diferentes tipos de fibras dentro de um nervo periférico também são bloqueados em diferentes momentos. A sequência geral de déficits funcionais é a seguinte: 1. Primeira dor (dor epicrítica) 2. Segunda dor (dor protopática) 3. Temperatura 4. Tato 5. Propriocepção (pressão, posição ou estiramento) 6. Tônus da muscular esquelética e tensão voluntária. Hipótese do receptor modulado: Os anestésicos locais possuem maior afinidade pelos estados fechado, aberto e inativado dos canais de sódio do que pelo estado em repouso. Inibição tônica e fásica: A afinidade diferencial dos anestésicos locais pelos diferentes estados do canal de sódio regulado por voltagem possui uma importante consequência farmacológica: o grau de inibição da corrente de sódio pelo AL depende da INTERESSANTE! Como a função motora é, com frequência, a última habilidade a ser perdida, é possível que alguns AL bloqueiem a nocicepção com relativamente pouco efeito sobre a transmissão motora. A concentração de anestésico local necessária para bloquear impulsos sensoriais sem induzir grande bloqueio motor varia para os diferentes agentes. Por exemplo, com a lidocaína, é difícil bloquear as fibras A sem também bloquear as fibras motoras Aγ; em contrapartida, a bupivacaína epidural pode produzir bloqueio sensorial em baixas concentrações, sem bloqueio motor significativo. Por esse motivo, a bupivacaína epidural diluída é freqüentemente utilizada durante o trabalho de parto, visto que alivia a dor, enquanto ainda permite a deambulação da parturiente. frequência de impulsos no nervo. Quando existe um longo intervalo entre os potenciais de ação, o nível de inibição de cada impulso é igual, e a inibição é denominada tônica. Entretanto, quando o intervalo entre os potenciaisde ação é curto, o nível de inibição aumenta a cada impulso sucessivo, e a inibição é denominada fásica ou dependente de uso. Farmacocinética Absorção sistêmica: são removidos do local de administração pela circulação sistêmica. A absorção sistêmica é minimizada para evitar uma toxicidade desnecessária. Fatores que influenciam a velocidade e a extensão da absorção sistêmica dos anestésicos locais são: Vascularidade do local de injeção Concentração do fármaco Adição de um vasoconstritor (ex. epinefrina) Propriedades da solução injetada (como sua viscosidade) Qual a utilidade dos vasoconstritores? Esses agentes adjuvantes reduzem o fluxo sanguíneo para o local de injeção, produzindo contração dos músculos lisos dos vasos e, dessa maneira, diminuindo a taxa de remoção do AL. Através desse efeito, os vasoconstritores aumentam a concentração de anestésico ao redor do nervo e diminuem a concentração máxima alcançada na circulação sistêmica. O primeiro efeito aumenta a duração de ação do AL, enquanto o segundo efeito diminui a toxicidade sistêmica do AL. Qual o cuidado que se deve ter com os anestésicos locais com vasoconstritor? A vasoconstrição também pode levar a hipoxia e lesão teciduais se o suprimento de oxigênio para a área for excessivamente reduzido. Por conseguinte, os vasoconstritores não são utilizados quando os AL são administrados nas extremidades, devido à circulação limitada nessas áreas. Distribuição: ligam-se reversivelmente a proteínas plasmáticas (albumina e glicoproteína ácida α-1). Quanto mais hidrofóbico, maior o volume de distribuição, ou seja, maior o volume distribuído pelos tecidos e menor a quantidade ligada a proteínas plasmáticas. Metabolismo e excreção: Os AL com ligação éster são metabolizados por esterases teciduais e plasmáticas. Esse processo é rápido (da ordem de minutos) e os produtos resultantes são excretados pelos rins. Os AL com ligação amida são primariamente metabolizados no fígado pelas enzimas do citocromo P450. Os metabólitos retornam a circulação e são eliminados pelos rins. Qual a importância disso? A ocorrência de alterações na perfusão hepática ou na velocidade máxima das enzimas hepáticas pode modificar a taxa de metabolismo desses agentes. O metabolismo torna-se mais lento em pacientes com cirrose ou outras doenças hepáticas, e, nesse tipo de paciente, a administração de uma dose padrão de um AL com ligação amida pode resultar em toxicidade. Vias de administração: Anestesia Tópica: em pele e mucosas. Anestesia Infiltrativa: em pele ou mucosas através de injeção por via intradérmica ou subcutânea. Produz efeito mais rápido que a anterior, pois não tem que atravessar a epiderme. Bloqueio de nervos periféricos (ex. bloquio de plexo cervical, de plexo braquial, bloqueio nervoso digital, etc). Bloqueio nervoso central: o fármaco é injetado próximo à medula espinal (anestesia epidural e intratecal) Anestesia regional intravenosa (bloqueio de Bier): um torniquete e uma faixa elástica colocada distalmente são aplicados a um membro elevado, resultando em exsangüinação parcial do membro. A seguir, o torniquete é insuflado e a faixa, removida. Injeta-se então o AL numa veia da extremidade, para produzir anestesia local, e o torniquete impede a sua toxicidade sistêmica ao limitar o fluxo sangüíneo pela extremidade. A anestesia regional intravenosa é algumas vezes utilizada para cirurgia de braço e de mão. Principais toxicidades: Irritação local (músculos estriados) Nos vasos provocam vasoconstrição inicial seguida de vasodilatação tardia. Nos brônquios causam broncocontrição inicial seguida de broncodilatação tardia. No coração provoca bradicardia, podendo ser usado como antiarrítmico de classe I. No SNC, inicialmente excita, produzindo tremores, zumbido, calafrios, espasmos musculares e, algumas vezes convulções generalizadas; seguida de depressão. Pode ocorrer morte por insuficiência respiratória. Hipersensibilidade (é rara). Bons Estudos!
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