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PROCESSO INFLAMATÓRIO SUCESSÃO DOS MOMENTOS Há fenômenos básicos, comuns a qualquer tipo de inflamação e que independem do agente inflamatório. A divisão em momentos é meramente didática, pois os momentos acontecem como um evento único e concomitante, o que caracteriza a inflamação como um PROCESSO DINÂMICO. 1. FASE IRRITATIVA A agressão a um órgão ou tecido resulta em alterações progressivas na área lesada. A capacidade de irritar-se é intrínseca à matéria viva, que desenvolveu a propriedade de, através de receptores, sentir estímulos e de produzir respostas a estes estímulos. Os tecidos possuem inervação, microcirculação, células parenquimatosas e estroma, que podem ser agredidos direta ou indiretamente. Agentes lesivos atingem um ou mais desses componentes, os quais produzem uma resposta local para adaptar os tecidos à nova situação, favorecendo a eliminação da agressão e/ou de seus efeitos (PEREIRA, 2004). Se o agente lesivo é um invasor vivo, é preciso que ocorram sua morte e eliminação; se da agressão por agentes químicos, físicos ou biológicos resulta morte celular, há necessidade de remoção das células mortas para se iniciarem os processos de regeneração ou de reparação. Após a ação do agente flogógeno sobre os tecidos há a liberação de mediadores químicos, que serão responsáveis pelos fenômenos vasculares e exsudativos. 2. FASE VASCULAR Caracterizada por alterações hemodinâmicas da circulação e de permeabilidade vascular no local da agressão. A resposta vascular à agressão é um processo reativo que inicia o “sistema de entrega” da inflamação. Já que os dois principais mecanismos da defesa do hospedeiro - anticorpos e leucócitos - se encontram normalmente na corrente sanguínea, não é de surpreender que os fenômenos vasculares desempenhem um papel muito importante na inflamação aguda. Assim, os vasos sanguíneos sofrem várias alterações que visam a facilitar o movimento de proteínas plasmáticas e células sanguíneas da circulação para o local da lesão ou infecção. As alterações vasculares são as responsáveis, clinicamente, pelo edema (↑ da permeabilidade vascular) e pelo rubor e calor (vasodilatação). Os vasos sanguíneos envolvidos na resposta à agressão são os da microcirculação. Revise os aspectos anatômicos, histológicos e fisiológicos da microcirculação... _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 Nos capilares, o plasma e as células do sangue são separadas dos tecidos que irrigam por uma fina camada de células endoteliais e pela membrana basal. O transporte de fluidos e metabólitos ocorre através das paredes, alcançando os tecidos por difusão ? lei de Starling (rege o movimento do líquido entre os meios intravascular e intersticial). A difusão é controlada por ? pressão hidrostática: tende a forçar a saída do fluido para fora dos vasos. ? pressão oncótica (ou coloidosmótica, exercida pelas proteínas plasmáticas): tende a reter o fluido dentro dos vasos. Durante a resposta inflamatória, há edema, que resulta de: - aumento da pressão hidrostática na microcirculação (força a saída de fluido dos vasos). - aumento da permeabilidade vascular (facilita saída de líquido) - extravasamento de proteínas plasmáticas em função do aumento da permeabilidade vascular ? ↑ da pressão oncótica do tecido. 2.1. Modificações locais na circulação 2.1.1. Dilatação arteriolar A vasodilatação é uma das primeiras manifestações da inflamação aguda; às vezes, ocorre após uma constrição transitória das arteríolas, que dura alguns segundos. Produzida na maioria das vezes pela ação da histamina e do reflexo axônico (por ação da substância P das terminações nervosas e da histamina). 2.1.2. Aumento do fluxo sanguíneo (arteríolas, capilares e vênulas) Em conseqüência da dilatação arteriolar ? hiperemia ativa e fluxo sanguíneo rápido. 2.1.3. Expansão dos leitos capilares na região Aumento da quantidade de sangue que passa pelo local. 2.1.4. Hiperemia ativa A hiperemia inicial com fluxo rápido é transitória, sendo seguida por um período em que a vasodilatação é mantida, mas a velocidade da circulação diminui. As vênulas menores tornam-se dilatadas, mas as maiores sofrem pequena constrição, aumentando a pressão hidrostática na microcirculação. 2.1.5. Aumento da permeabilidade do sistema microvascular A vasodilatação é rapidamente seguida de um aumento da permeabilidade da microcirculação, com o extravasamento de um fluido rico em proteínas para o tecido extravascular. Há diferentes proposições para explicar os mecanismos que provocam o aumento da permeabilidade vascular: • Formação de fendas no endotélio vascular: mecanismo mais comum de extravasamento, sendo desencadeado por mediadores químicos como a histamina, a bradicinina, os leucotrienos e outros. A ligação desses mediadores a seus receptores nas células endoteliais (predominantemente das vênulas) ativa vias de sinalização que levam à contração dessas células e à separação das junções intercelulares. • Lesão endotelial direta, resultando em necrose e separação das células endoteliais: efeito geralmente visto em lesões necrotizantes, ocorrendo devido ao dano direto ao endotélio pelo estímulo nocivo (p.ex., queimaduras graves, infecções bacterianas líticas). Todos os níveis da microcirculação são afetados, incluindo vênulas, capilares e arteríolas. • Lesão endotelial mediada por leucócitos: os leucócitos aderem ao endotélio no início do processo inflamatório, podendo ser ativados durante o processo, liberando espécies tóxicas de oxigênio e enzimas proteolíticas que causam lesão e descolamento do endotélio, levando ao aumento da permeabilidade. Essa forma de lesão está geralmente restrita a vênulas e capilares pulmonares e glomerulares, onde os leucócitos ficam aderidos ao encotélio por um período prolongado. • Transcitose aumentada através do citoplasma das células endoteliais: ocorre por canais compostos de grupos de vesículas e vacúolos interconectados. Determinados fatores (p. ex., o fator de crescimento do endotélio vascular - VEGF) parecem causar extravasamento aumentando o número e talvez o tamanho desses canais. • Extravasamento de vasos sanguíneos recém-criados: responsável pelo edema característico das fases iniciais da cicatrização que ocorre após a inflamação, quando as células endoteliais proliferam e formam novos vasos sanguíneos (angiogênese). Os novos brotos vasculares ficam vazando até que as células endoteliais amadureçam e formem junções intercelulares. Apesar de poderem ocorrer independentemente, todos esses mecanismos podem ser desencadeados em resposta a um mesmo estímulo. Por exemplo, nos diferentes estágios das queimaduras térmicas, o extravasamento resulta da contração endotelial causada pelos mediadores químicos, lesão endotelial direta e dependente de leucócitos; além disso, quando começa o processo de cicatrização, pode ocorrer extravasamento pelos capilares em regeneração. O extravasamento vascular causado por todos esses mecanismos é responsável pela perda líquida potencialmente fatal que ocorre em pacientes gravemente queimados. 2.1.6. Hemoconcentração (capilares e vênulas) Com a saída de plasma, há hemoconcentração local, e as hemácias tendem a se empilhar e a formar aglomerados, tornando o sangue mais viscoso. 2.1.7. Estase Com o sangue mais viscoso, a circulação fica mais lenta ? estase. A hiperemia ativa de fluxo rápido vaise tornando progressivamente hiperemia passiva de fluxo lento. 2.1.8. Alteração do fluxo dos leucócitos Quando se inicia a fase de fluxo mais lento, os leucócitos deixam a região central da corrente sanguínea e começam a se deslocar para a margem do fluxo. 2.2. Duração da permeabilidade vascular aumentada A resposta vascular à agressão é muito variável, e parte dessa variabilidade depende do grau de agressão ocorrido (leve, moderada ou grave). A duração da resposta vascular também é variável e associada à gravidade da lesão. Esta duração é controlada por mediadores químicos que serão mencionados posteriormente. 2.2.1. Resposta imediata transitória - Ocorre logo após a agressão leve. - Dura cerca de 15 a 30 minutos. - Envolve principalmente vênulas pós-capilares de tamanho pequeno e médio. - Parece ser mediada pela histamina, e pode com freqüência ser suprimida por anti- histamínicos. - Ex.: picada de inseto, agulha, “raspão”. 2.2.2. Resposta imediata prolongada - Agressão grave, com necrose endotelial. - Afeta vênulas, capilares e arteríolas. - Inicia imediatamente após a agressão, e é sustentada em patamar elevado por várias horas. - Ex.: queimaduras graves, lesões por bactérias líticas. _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 2.2.3. Resposta prolongada tardia - Lesão leve a moderada. - Neste caso, a agressão não solicita uma resposta imediata. - Tem início 2 a 12 horas após a agressão. Pode durar horas ou dias. - Ex.: queimadura solar, irradiação por raios X, toxinas bacterianas que afetam vênulas e capilares. 3. FASE EXSUDATIVA O extravasamento de líquido, proteínas e de células sanguíneas do sistema vascular para o tecido intersticial ou cavidades corporais é chamado de exsudação. A exsudação divide-se em plasmática e celular. Exsudato: fluido inflamatório extravascular contendo leucócitos, fragmentos celulares e elevada concentração protéica (densidade acima de 1.020). Isto implica uma alteração significativa da permeabilidade normal dos pequenos vasos sanguíneos na área danificada, sendo presença clássica no processo inflamatório agudo. Qual o papel do exsudato? O fluido dilui as toxinas bacterianas. O depósito de fibrina pode atuar como obstrução à disseminação ou ajudar na fagocitose (fornece superfície de apoio para a movimentação dos leucócitos). Além das células inflamatórias, contém anticorpos e moléculas do complemento (abordados posteriormente). A quantidade de proteínas, células e líquido em um exsudato inflamatório é variável, e dependendo dessa variação, este pode ser classificado como: • Exsudato seroso: associado à inflamação leve, é um fluido claro, com muito líquido, baixo conteúdo de proteínas e poucas células. • Exsudato fibrinoso: rico em proteínas (particularmente fibrinogênio), quando entra no tecido coagula-se devido à formação de fibrina. • Exsudato supurativo: rico em neutrófilos (leucócitos polimorfonucleares - PMNs), é reconhecido clinicamente como pus. O pus, portanto, é um exsudato inflamatório supurativo, rico em leucócitos (especialmente neutrófilos) e restos celulares. 3.1. Exsudação plasmática Caracterizada pela saída de plasma para fora da luz vascular, com quantidades diversas de água, eletrólitos e proteínas. Ocorre principalmente nas vênulas (estrutura histológica leva a menor aderência intercelular na sua parede em relação às arteríolas ? facilita o aumento da permeabilidade). A exsudação plasmática é a responsável pela formação do edema inflamatório. Começa geralmente nas fases iniciais da hiperemia, mantendo-se durante o processo. Nas agressões pouco intensas, a exsudação imediata decorre principalmente da ação da histamina; nas agressões mais graves, é provocada por lesão direta ao endotélio. As proteínas plasmáticas exsudadas aumentam a pressão oncótica intersticial, favorecendo a retenção de água fora dos vasos. 3.2. Exsudação celular Passagem de células pela parede vascular em direção ao interstício, para o local onde está atuando o agente inflamatório, em função de: - aumento da permeabilidade vascular; - liberação de mediadores químicos ? quimiotaxia. Colaboram com esses fatores: - a diminuição da velocidade sanguínea; - a adesividade dos leucócitos aos endoteliócitos. _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 A marginação dessas células e seus movimentos em direção às fendas previamente formadas é que caracterizam a exsudação celular. O principal fenômeno é a saída de leucócitos da luz vascular e sua migração para o local agredido. 3.3. Fases da exsudação celular 3.3.1. Marginação e rolamento A estase favorece a marginação leucocitária, processo em que os leucócitos deixam o centro da coluna sanguínea (fluxo laminar) e passam a ocupar a periferia do vaso. Isto faz com que haja aderência frouxa ao endotélio, e eles passam a deslocar-se sobre a superfície endotelial num processo chamado de rolamento. http://www.seas.virginia.edu/news/acton.php 3.3.2. Pavimentação e adesão Com o rolamento, o endotélio fica virtualmente coberto de leucócitos, o que é chamado pavimentação. Então, mediadores químicos agem sobre as células endoteliais e leucócitos ? ativação ? exposição de moléculas de adesão ? adesão firme ao endotélio. A adesão dos leucócitos, portanto, é mediada por moléculas de adesão na superfície do endotélio e dos leucócitos, naturalmente expressas na membrana ou com expressão aumentada após ativação do endotélio ou do leucócito. As duas famílias de proteínas de adesão especialmente importantes na inflamação são as selectinas e as integrinas. 3.3.3. Transmigração (diapedese) Processo pelo qual os leucócitos saem dos vasos sanguíneos para atingir o tecido perivascular. A saída dos leucócitos do leito vascular depende das moléculas de adesão expressas na sua membrana e na superfície endotelial. A grande diversidade de moléculas de adesão e as variações na sua expressão criam um grande número de combinações que resultam na seletividade da exsudação dos diferentes tipos de leucócitos em diferentes situações. Os leucócitos emitem pseudópodos entre as células endoteliais, na direção do gradiente quimiotático, ou seja, na direção do local da lesão ou infecção. O processo de passagem entre as células endoteliais também é mediado por moléculas de adesão específicas (ex.: PECAM-1 e CD31). A diapedese dos leucócitos, semelhante ao aumento da permeabilidade vascular, ocorre predominantemente nas vênulas (exceto nos pulmões, onde ocorre nos capilares). Após atravessar o endotélio, os leucócitos são transitoriamente retardados na sua jornada pela membrana basal, mas finalmente a perfuram, provavelmente pela secreção de colagenases. Após atravessar a membrana basal, os leucócitos caem _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 no interstício, onde se deslocam com facilidade porque se aderem a moléculas de fibronectina e, por meio destas, a moléculas de fibrina exsudada que servem como verdadeiros trilhos de orientação. http://www.chronicprostatitis.com/images/f3.jpg Para ver uma animação desse processo, acesse: http://www.youtube.com/watch?v=I9zSe0qmXGw&mode=related&search= ou busque no You Tube (www.youtube.com): Neutrophilmoving to the site of infection Ou ainda: http://cosmocyte.com/animation.html Baixe a animação Neutrophil Diapedesis During Free Radical Release O tipo de leucócito que migra varia com a duração da resposta inflamatória e com o tipo de neutrófilo. Na maioria dos tipos de inflamação aguda, os neutrófilos predominam no infiltrado inflamatório durante as primeiras 6 a 24 horas, sendo substituídos pelos monócitos depois de 24 a 48 horas. Existem várias razões para essa seqüência: os neutrófilos são mais numerosos no sangue, respondem mais rapidamente às quimocinas e podem-se ligar mais firmemente às moléculas de adesão que são rapidamente induzidas nas células endoteliais. Além disso, após entrarem nos tecidos, os neutrófilos têm uma sobrevida curta (sofrem apoptose e desaparecem depois de 24 a 48 horas) enquanto os monócitos sobrevivem por mais tempo. Existem exceções para este padrão de exsudação celular. Em determinadas infecções (p. ex., por Pseudomonas), os neutrófilos predominam durante 2 a 4 dias; nas infecções viróticas, os linfócitos podem ser as primeiras células a chegar ao local; em algumas reações de hipersensibilidade, os eosinófilos podem ser as células predominantes. As hemácias podem também sair, mas por processo passivo, impulsionadas pelo aumento da pressão hidrostática intravascular. 4. FASE DEGENERATIVA / NECRÓTICA Uma função crítica da inflamação é o encaminhamento de leucócitos à lesão e a ativação para que desempenhem suas funções normais de defesa do hospedeiro. Os leucócitos ingerem os agentes agressores, destroem bactérias e outros microorganismos e eliminam tecido necrótico e substâncias estranhas. O preço que se paga pela força defensiva dos leucócitos é que eles podem causar lesão tissular e prolongar a inflamação, já _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 _________________________________________________________________________________ Universidade Federal de Santa Catarina- Departamento de Patologia Disciplina de Patologia Geral - Profa. Maria Inês Meurer - 2007 que as substâncias que eles produzem para destruir os microorganismos e tecidos necróticos também podem causar lesão nos tecidos do hospedeiro. A fase degenerativa / necrótica é caracterizada por: - células com alterações degenerativas reversíveis ou não (neste caso, originando um material necrótico), derivadas da ação direta do agente agressor; - modificações funcionais e anatômicas conseqüentes das três fases anteriores. 5. FASE PRODUTIVA - REPARATIVA Fase de reparação dos danos. Esta fase será discutida posteriormente, quando falarmos especificamente do reparo.
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