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POESIA SUBMERSA VOL 1 CAPÍTULO 1

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13
1. À esquina de um país: 
panorama potiguar entre 1900-1920
 As silent as a mirror is believed
 Realities plunge in silence by…
 Hart Crane, “Legend”
Precedendo a história recente da produção poética moderna/
contemporânea no Rio Grande do Norte, a condição do autor local 
sugere estar a uma longa distância dos grandes centros nacionais 
de produção literária, fato que suscita que a presença da poesia no 
estado surge em um caso à parte, ainda desconhecida pelo restante 
do país, e até no seu próprio território de origem, por assim dizer. Se 
tomarmos as condições oferecidas pela capital potiguar e seus pouco 
mais de 16.000 habitantes no censo do ano de 1900, segundo Itamar 
de Souza (2008), pode-se imaginar, no mínimo, uma produção 
literária insipiente, incluindo o campo da crítica literária. Tanto na 
poesia quanto na prosa e teatro, o que se percebia – e não poderia ser 
de outra forma – era a mimetização de escolas cuja força ultrapassava 
séculos, como o Romantismo, e de outros estilos também vigentes à 
época, a exemplo do Parnasianismo e Simbolismo.
Diante deste contexto notoriamente provinciano, o nome de 
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Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) surge como inevitável para as 
questões culturais da cidade nesse início de século, principalmente 
depois do seu livro de estreia, que é de crítica literária (ou histórico 
literária, mais propriamente dizendo), publicado no ano de 1921. Na 
obra Alma patrícia: crítica literária2, o autor demonstra uma síntese 
da produção de autores potiguares até aquele momento, tanto na 
poesia quanto na prosa e teatro. Como uma situação símbolo dessa 
época, ao tratar do poeta Francisco Palma (1875-1952) – autor da 
obra Santelmos, de 1899 –, o crítico sentencia ficar em evidência “[...] 
que numa cidade como Natal de 1899, sem livraria, sem corrente de 
ideias, sem críticas, sem um vínculo ligando aos centros pensadores 
do país, as produções literárias sejam feitas num ritmo igual de parco 
vocabulário, deslizes de gramática e de lugar [...]” (CASCUDO, 1991, 
p. 59). 
Em suma, os poetas potiguares do início do século XX eram, 
praticamente, “mimetizadores” da escassa literatura que chegava às 
terras norte-rio-grandenses, não escapando aos padrões da época, 
como era de se esperar. No transcorrer de Alma patrícia, a primeira 
obra no estado a dar conta da esporádica produção literária norte-
rio-grandense, há dados biobibliográficos de dezoito autores e entre 
os citados surgem Auta de Souza (1876-1901), Segundo Wanderley 
(1860-1909), Henrique Castriciano (1874-1947), Ferreira Itajubá 
(1876-1912), Gothardo Neto (1881-1911) e Palmyra Wanderley 
(1894-1978). 
Nestes poetas citados por Cascudo, os quais Humberto 
Hermenegildo de Araújo (2004) intitula como “Pós-Românticos” 
– este adotando a denominação de Antonio Candido (2000b) ao 
se referir ao período de 1880 a 1922 no Brasil – , os traços de uma 
2 Pouco informado pelos estudiosos de Câmara Cascudo, nesta mesma obra o 
autor expõe um autoexplicativo prefácio no qual relata que o livro foi uma ideia 
gerada em 1918 junto ao macaibense Murilo Aranha (1890-1919), poeta autor 
de César Bórgia (1918) e Nevroses (1919). Porém, o amigo veio a falecer no ano 
seguinte ao começo do plano da publicação e “[...] creio que [Murilo] não chegou a 
escrever coisa alguma […] e o livro [ficou] dormindo na esterilidade das banquetas 
tipográficas” (CASCUDO, 1998, p. 13).
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tradição relacionada ao Romantismo, Parnasianismo e Simbolismo, 
aparecem com nitidez, revelando um conhecimento sobre as 
tendências literárias vigentes, embora as notícias e repercussões do 
Modernismo na literatura, nas primeiras décadas do século XX, ainda 
fossem uma realidade singularmente distante da cultura potiguar3.
Isto não ocasiona uma situação de demérito em um país que, 
segundo Antonio Candido (2000b), contabilizava um índice de 
75% de analfabetismo em 1920. Logo, as questões culturais eram 
pouco debatidas ou atualizadas, centradas na escassa elite nacional, 
essencialmente a do Rio de Janeiro (então, capital do país), como 
centro de irradiação cultural, que possuía os ímpetos de ler e discutir 
a arte desde o século XIX, o que inclui a literatura, de acordo com 
Ubiratan Machado (2010). Esta espécie de “atraso literário” acontecia 
também em significativa parcela do país, pois, tomando como 
símbolo de situação semelhante, ao contextualizar a produção do 
texto “Poema tirado de uma notícia de jornal”, de Manuel Bandeira 
(1886-1968), presente em sua obra Libertinagem (1930), Davi 
Arrigucci Jr. (1990, p. 102) aponta a seguinte análise:
As noções de poesia que predominavam entre nós eram, sabidamente, 
as da tradição parnasiano-simbolista. A poesia, produto nobre 
do espírito, dependia de uma ideia elevada de inspiração, de um 
vocabulário escolhido e raro, de temas antecipadamente poéticos, de 
um desgarramento idealista de toda referência à realidade imediata, 
aspirando à pureza da linguagem da música, conforme a herança do 
Simbolismo. Por outro lado, a ideia mais clara de poesia era ainda a do 
soneto parnasiano, com suas regras restritas de versificação, […] sua 
retórica altissonante, seu culto do material nobre [...].
3 Segundo Socorro de Fátima P. Barbosa (2009), nessa mesma época foram 
publicados na Paraíba Ensaios de Crítica e Estética (1919), de Alcides Bezerra 
(1891-1938), e Ensaios da Crítica Estética (1920), do paraibano Álvaro Pereira de 
Carvalho (1885-1952), obras que exploram alguns temas correlatos aos de Cascudo 
em Alma patrícia. Em outros estados, como o Ceará, a crítica literária começou 
bem antes, como se pode perceber pela publicação de Carta sobre a literatura 
brasílica (1869), de Araripe Júnior (1848-1911).
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Em resumo, se na poesia publicada em 1930 Arrigucci analisa 
um fato como este, o da permanência de noções ligadas às escolas do 
Parnasianismo e Simbolismo já quase uma década após a Semana de 
Arte Moderna de 1922 – marco divisório para uma fase de ruptura 
de uma “série de recalques históricos, sociais” (CANDIDO, 2000b, p. 
119) –, isto evidentemente denota que a situação da poesia brasileira 
pós-fase heroica ainda passava por um período de expectativa e 
validação dos aspectos modernos agora concernentes à poesia 
nacional, fosse ela a de Manuel Bandeira ou a de desconhecidos 
poetas do Rio Grande do Norte.
Só para comparar tal percepção de Arrigucci com a atitude de 
Luís da Câmara Cascudo diante da produção dos poetas potiguares 
nos anos de 1920, torna-se emblemático citar algumas crônicas do 
autor potiguar publicadas em anos diferentes no jornal natalense A 
República. O primeiro texto se refere ao segundo livro do já citado 
Francisco Palma, poeta bissexto nascido em Pernambuco, porém 
radicado no Rio Grande do Norte desde a adolescência. Apesar de 
ainda bem jovem, mas já como presença inevitável e opinativa da 
cidade, Cascudo trata do segundo livro de Palma, Luz e cinza (1924), 
e aponta em crônica de 04 de maio de 1924, o nítido anacronismo do 
poeta: 
[...] uma sensibilidade poética inexplicavelmente fiel aos seus credos. A 
sua musa, como se escrevia em 1898, é ausente às nossas maneiras de 
sentir. Os nascidos espiritualmente depois de Saint Beuve, com Verlaine e 
Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé, ainda, com muita vontade, perceberão, 
o subtil e vaporoso de seus versos. O Sr. Francisco Palma é o derradeiro 
romântico […] (CASCUDO apud FERREIRA, 2001, p. 77).
 
Somente na citação dos escritores franceses já se percebe o 
conhecimento de Cascudo sobre uma “nova literatura” que vinha 
surgindo entre o final do século XIX e os decênios iniciais do 
século seguinte. Em 24 de abril de 1927, há um texto de Cascudodenominado “O livro de Peregrino Júnior”, publicado no jornal 
potiguar A Imprensa, na verdade, uma resenha indicando clara 
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ironia quanto à obra Jardim da melancolia4, declarando que o tal livro 
“[...] é claro e lindo. E maciamente inútil. É um livro de frases suaves 
e espiraladas. De nervos sensíveis, de quintilharia lírica e adorável. 
Mas, insincero. Homem à 1927 não pensa aquilo [...]” (CASCUDO 
apud FERREIRA, 2001, p. 80). A evidente crítica de Cascudo já 
mostrava plena consciência de outros valores presentes nos anos 
de 1920, como notado anteriormente também no texto referente a 
Francisco Palma, e nesta mesma época o autor de Joio havia iniciado 
contatos – epistolares e físicos – com nomes ligados ao Modernismo 
brasileiro, como Mário de Andrade (1893-1965) e o pernambucano 
Joaquim Inojosa (1901-1987).
1.1. Poesia fugidia: periódicos do início do século XX
Retornando um pouco mais no tempo, houve um fato singular que 
liga o ventre do Modernismo a esta esquina brasileira. No mesmo ano 
em que se inaugurava o primeiro local fixo para a projeção de filmes 
da capital potiguar – o Cinema Natal, símbolo de modernidade, 
funcionando no Teatro Carlos Gomes –, o vanguardístico Manifesto 
do Futurismo, de autoria do italiano F.T. Marinetti (1876-1944), 
impresso no jornal francês Le Figaro em 20 de fevereiro de 1909, foi 
publicado pelo jornalista Manuel Dantas (1867-1924) e editado no 
dia 05 de junho do mesmo ano no periódico potiguar A República. 
4 O natalense João Peregrino da Rocha Fagundes Júnior (1898-1983), ou apenas 
Peregrino Júnior, havia publicado o livro de crônicas Vida fútil (1923). Estudante 
de medicina no Rio de Janeiro no início da década de 1920, escreveu nos periódicos 
cariocas A Notícia e no Rio-Jornal. Neste último, “[...] Colabora intensamente 
com o movimento modernista em uma seção […], além de publicar crônicas [...]” 
(PROENÇA, 1971, XII). Coincidentemente, após o comentário de Cascudo sobre 
a obra poética dele, nunca mais publicou livros no gênero, voltando-se à medicina, 
além de editar contos e crítica literária, como O movimento modernista (1954), obra 
em que faz uma breve análise sobre o Modernismo brasileiro até a Geração de 45. Foi 
presidente da Academia Brasileira de Letras durante alguns anos da década de 1950.
18
Como a cidade de Natal naquela época não possuía praticamente 
nenhuma tradição literária e nem repercutia sua vida cultural fora das 
fronteiras estaduais, é normal que a informação sobre a publicação 
do texto de Marinetti no jornal norte-rio-grandense não tenha 
repercutido na província potiguar e tampouco no centro cultural do 
país em 1909. 
Tal fato confirma esta curiosa ligação, ainda que isolada, de 
pessoas ligadas à cultura em Natal com os valores futuros que viriam 
a formar o Modernismo brasileiro, mesmo que se saiba hoje que foi 
um dos renomados mentores da Semana de Arte Moderna de 1922 
quem realmente fez o vocábulo “Futurismo” se espalhar:
Regressando da Europa, em 1912, Oswald de Andrade fazia-se o primeiro 
importador do “futurismo”, de que tivera apenas notícia no Velho Mundo. O 
Manifesto Futurista, de Marinetti, anunciando o compromisso da literatura 
[...], pregando o combate ao academicismo, guerreando as quinquilharias 
e os museus, […] [tais ideias] buliram com as ideias do jovem brasileiro, 
e, sobretudo, vinham […] abrir-lhe, pessoalmente, possibilidades que até 
então lhe eram inalcançáveis […] (BRITO, 1964, p. 29-30).
 
Quanto às outras figuras preocupadas com a presença da 
literatura no Rio Grande do Norte antes de Câmara Cascudo, o 
nome quase isolado de Antonio Marinho (1876-1902), jovem autor 
de artigos publicados entre o final do século XIX e início do seguinte 
no periódico A Tribuna, surge como notório na embrionária crítica 
local5. Segundo Tarcísio Gurgel (2001), foi a análise feita por Marinho 
ao longo de três edições de julho de 1901 sobre a dramaturgia de 
5 Possivelmente, Antônio Marinho foi o primeiro a tentar sistematizar a literatura 
local. Em sua conferência realizada por ocasião do segundo aniversário da 
agremiação Congresso Literário, ocorrido em 21 de abril de 1899, e intitulada 
“Movimento literário do Rio Grande do Norte”, Marinho traz apreciações entre os 
anos de 1889 e 1899 claramente influenciadas pelo método naturalista do sergipano 
Sylvio Romero (1851-1914), relatando que desde 1899 “[...] a vida literária do 
Rio Grande do Norte há se desdobrado promissoramente […]. É realmente 
considerável o número de grêmios literários […] nesta última fase da vida mental 
do Rio Grande do Norte.” (MARINHO apud SILVA, 2011, p. 71). 
19
Segundo Wanderley que, provavelmente, gerou o primeiro trabalho 
crítico literário norte-rio-grandense. O próximo a seguir o padrão 
de crítico da reduzida literatura local foi Henrique Castriciano, que 
escreveu, por exemplo, sobre o poeta Lourival Açucena (1827-1907) 
em uma sequência de artigos para o jornal natalense A República em 
1907, conforme Cascudo informa na obra Nosso amigo Castriciano 
(1965).
A figura de Armando Seabra (1892-1920) também surge citada 
pelo poeta e crítico literário local Esmeraldo Siqueira (1908-1987) em 
sua obra Do meu reduto provinciano (1969). Seabra seria outro nome 
a ser lembrado na crítica local durante a segunda década do século 
XX, atuando na revista Pax e no periódico O Tempo – que circularam 
na capital potiguar entre 1917 e 1923 – embora sua produção em 
livro tenha sido publicada apenas postumamente (Ensaios de 
crítica e literatura, de 1923). As edições de O Tempo esgotavam 
logo e Armando “[...] recebia dos homens cultos e competentes da 
Natal as mais francas demonstrações de apoio e solidariedade […], 
destronando os falsos ídolos e procurando incutir na consciência 
pública a capacidade de perceber melhor essa questão do mérito 
intelectual [...]” (SIQUEIRA, 1969, p. 120). 
O crítico Seabra abordou tanto nomes mais conhecidos no 
cenário local da época – como Auta de Souza e Ferreira Itajubá – 
quanto poetas relativamente menos conhecidos, como Ponciano 
Barbosa e Abner de Brito, embora ele tivesse uma rígida fama de 
estudioso muito ligado às regras gramaticais, não revelando assim 
quaisquer propensões às futuras rupturas permitidas nos instantes 
iniciais do Modernismo nacional, caso do coloquialismo ou da 
linguagem fragmentada de autores como Oswald de Andrade ou 
Mário de Andrade, para ficar nos nomes mais renomados.
Tratando de aspectos ainda relativos à produção literária no 
estado durante as primeiras décadas do século XX, existiram algumas 
publicações locais que marcaram o período, apesar da efemeridade 
evidente, de acordo com Maria Suely da Costa (2001). Na passagem 
do século XIX para o XX, houve em Natal a publicação de duas 
20
revistas literárias, a já citada A Tribuna – que circulou entre outubro 
de 1897 e outubro de 1904 –, contabilizando cento e quatro números 
publicados, e a Oásis, esta editada pelo grêmio literário Le Monde 
Marche entre 1894 e 1904. 
O primeiro periódico tinha até um sistema de assinaturas e 
possuía correspondentes em várias cidades do Rio Grande do Norte 
– Ceará Mirim, São José de Mipibu, Canguaretama, Pau dos Ferros, 
Mossoró e Açu entre elas –, além de ter representantes em outros 
onze estados, como Pernambuco, Bahia, São Paulo e Rio Grande do 
Sul. No seu conteúdo editorial, a crítica literária e a prosa dividiam 
espaço no periódico com o gênero lírico, que trazia nomes como os 
de Sebastião Fernandes (1880-1941) e Ezequiel Wanderley (1872-
1933), mas também surpreendia com nomes femininos presentes, a 
exemplo da poetisa açuense Anna Lima (1882-1918), ainda que pese 
a repetida estética romântica ou parnasiana sendo o cerne poético 
dos citados. 
Como as produções literárias também giravam em torno 
de associações que desempenhavam o papel de “divulgadoresintelectuais”, registra-se a existência de algumas delas que chegaram a 
lançar periódicos na capital, como os da Agremiação Divisão Branca, 
que lançou vinte números de um jornal intitulado O Torpedo entre 
dezembro de 1908 a julho de 1910, da Oficina Literária Lourival 
Açucena (entre os anos de 1910 e 1911), do Centro Cívico Literário 
Gothardo Neto – este publicando a revista O Sertão em 1912 – e 
da Revista do Centro Polimático, editada pela associação de mesmo 
nome entre os anos de 1920 e 1922. No interior do Rio Grande do 
Norte, houve a Associação Literária Palmério Filho, que lançou na 
cidade de Açu a revista O Alphabeto entre os anos de 1917 e 1919, e o 
Grêmio Literário Augusto Severo, que publicou o periódico O Ensaio 
no ano de 1925, no município de Macaíba. 
Além destes, existiu também o periódico Ninho das Letras, que 
circulou na cidade de Currais Novos entre os anos de 1925 e 1926, 
inclusive com algumas ousadias gráficas à la Mallarmé. O texto “O 
dia dos mortos”, de Manoel Victorino, publicado na primeira edição 
21
da revista (novembro de 1925), surge em uma disposição gráfica 
parcialmente em formato de uma cruz, ou a edição de número 8/9 
(junho/julho de 1926), na qual há uma sequência de textos intitulado 
“Cartas litorâneas”, de autoria de Hortência Flores, graficamente 
exposta em um inusitado formato de um losango. Nesta mesma edição 
de Ninho das Letras, no que diz respeito ao âmbito da produção lírica, 
ao lado do tradicional soneto de Mariano Coelho, há o texto “Poemas 
das serras”6, do primeiro poeta a ter publicado um livro moderno 
– consciente dos versos livres moldados em cenas cotidianas – em 
terras potiguares: o natalense Jorge Fernandes (1887-1953), tudo isto 
observado na recente edição fac-similar da revista (2012).
Entre os periódicos norte-rio-grandenses de início de século, 
alguns deles chamavam a atenção por terem sido produzidos 
exclusivamente por mulheres, fato, no mínimo, inusitado para a 
época7, ocorrendo publicações, segundo Duarte e Macêdo (2003) 
na cidade litorânea de Macau (o jornal Folha Nova, de 1913) e já 
citada revista O Alphabeto no município de Açu, dirigido por Maria 
Antônia de Morais. Em Natal, a revista Via-Láctea – cujo subtítulo 
continha os vocábulos “Religião, Artes, Ciências e Letras”– durou oito 
números publicados entre outubro de 1914 e junho de 1915. Mesmo 
constando na capa de cada edição os nomes das colaboradoras, todas 
as dez mulheres envolvidas usavam, vez por outra, pseudônimos, 
pois é notório hoje que o uso deles “[...] foi um artifício muito 
6 Na verdade, a composição de Jorge Fernandes publicada na revista supracitada é 
apenas a primeira das partes de “Poemas das serras”, tríade de textos publicada no 
Livro de poemas de Jorge Fernandes (1927).
7 Posteriormente, a figura feminina no Rio Grande do Norte se tornaria símbolo da 
recente democracia no país. No governo de Juvenal Lamartine (1928-1930), Celina 
Guimarães Viana, nascida em Natal e radicada em Mossoró, cidade do meio oeste 
potiguar, se tornou a primeira eleitora da América Latina em 27 de novembro de 
1927, segundo Jane Cortez Firmino (2003). Pouco antes, no dia 12 de setembro 
de 1927 houve a apresentação da peça O Voto de saias, encenada no Teatro 
Carlos Gomes (hoje Alberto Maranhão), em um texto que fazia referência aos 
dois incentivadores norte-rio-grandenses dessa conquista feminina, os políticos 
potiguares Juvenal Lamartine e José Augusto. Em 1929, o município de Lajes (RN) 
também seria pioneiro ao eleger Alzira Soriano como primeira prefeita do Brasil.
22
utilizado pelas mulheres nos séculos passados e primeiras décadas do 
século XX, para proteger e preservar a si mesmas e aos familiares da 
exposição pública […]. E no Rio Grande do Norte não era diferente 
[…]” (DUARTE; MACÊDO, 2003, p. 22). 
Como as mentoras da revista foram as poetisas Palmyra 
Wanderley (1894-1978) e Carolina Wanderley (1891-1975), ambas 
muito jovens, uma significativa parcela dos pseudônimos pode ser 
justamente de autoria de ambas, visto que a publicação teve seu fim 
devido ao fato de que algumas colaboradoras somente escreveram 
uma única vez para o periódico e outras nem sequer chegaram 
a estrear, ainda segundo as informações explicitadas por Duarte e 
Macêdo (2003).
Quanto ao registro poético na revista, e mesmo com a ausência 
de seções fixas, o gênero lírico ganhava destaque desde a capa, na 
qual figurava sempre um soneto à direita da página. Nestas páginas 
frontais, a publicação trazia autores como Olavo Bilac (1865-
1918) e Humberto de Campos (1886-1934), um traço que expõe o 
conhecimento sobre a tradição lírica brasileira e chamando a atenção 
para o conteúdo poético da revista, que era, obviamente, voltada para 
o público feminino. 
Normalmente, a média de poemas em cada edição ficava entre 
quatro e cinco textos, com somente duas seções mais especificamente 
voltadas para a poesia: uma chamada “Caricaturas” e outra 
denominada “Graça infantil”, esta claramente direcionada às crianças. 
Como exemplo de um das composições poéticas presentes na revista, 
há os quartetos de “Contrastando” (DUARTE; MACÊDO, 2003, p. 
48), de autoria de Carolina Wanderley8 :
 
 
8 O poema reproduzido foi extraído retirado da edição Fac-similar das revistas 
lançada em 2003 (Cf. Bibliografia). Aqui atualizamos a ortografia presente no 
poema seguindo os padrões recomendados através do Acordo Ortográfico da 
Língua Portuguesa, de 1990, através do Decreto 6.583, de 29 de setembro de 2008. 
Os demais poemas presentes neste trabalho também seguirão o mesmo padrão de 
atualização, exceto quando for indicada manutenção do texto original por motivos 
estéticos, por exemplo.
23
Desta existência, na estrada infinda
Nos leva juntas o nosso amor;
— Tu, Primavera, risonha e linda,
— Eu, triste Inverno cheio de dor;
Alma dos astros, alma das flores
Tendo nos lábios doces canções,
Vais espargindo risos e olores
E eu vou colhendo desilusões.
Dentro de um sonho de amor e calma
És da Esperança, loura visão;
Tens uma aurora raiando na alma
E eu tenho a noite no coração.
 
Como era de se esperar, as rimas alternadas, assim como a 
simplicidade e repetição temática – a saudade, a noite, o teor 
religioso, o esplendor da natureza, todos de aura inequivocamente 
romântica ou levemente simbolista –, características do texto poético 
citado, refletem a manutenção dos mesmos aspectos formais e líricos 
da época, também presentes em vários poemas de Via-láctea. 
Entretanto, ainda assim servem para “[...] dinamizar e iluminar a 
paisagem cultural do início do século XX em Natal [...]” (DUARTE; 
MACÊDO, 2003, p. 32), principalmente se for levado em consideração 
o provincianismo potiguar em relação à atividade intelectual 
feminina – inclusive a literária –, cujas figuras da macaibense Auta 
de Souza e da açuense Anna Lima parecem surgir isoladas na poesia 
potiguar no primeiro decênio do século XX.
Em outra clara exemplificação do lirismo bem “comedido e 
comportado”, lembrando da expressão usada por Manuel Bandeira 
em um dos poemas de Libertinagem (1930), há a composição poética 
“Lacrimosa”, de autoria de Dulce Avelino e publicada na edição 
de número cinco da Via-Láctea, de janeiro de 1915. Eis o soneto 
(DUARTE; MACÊDO, 2003, p. 78):
24
Ocultas uma dor sem limitivo
Sob o manto violáceo da tristeza,
Num soluçar dolente e convulsivo
Dominada por lúrida incerteza...
Enxuga o pranto amargo e pungitivo
Afasta a mágoa de feral crueza...
Oh! não consintas um pesar tão vivo
Nesse teu rosto de gentil beleza!
É verde o teu olhar como a esperança
Que te pode alentar linda criança,
Sem pensares da vida nos escolhos...
Portanto expulsa a dor que te crucia
Quero ver o fulgir d’uma alegria,
Nesse par de esmeraldas de teus olhos. 
O mais do que evidente traço romântico envolto em expressões 
como “omanto violáceo da tristeza”, “num soluçar dolente” e 
“pranto amargo” – além do cuidado vigoroso nas rimas e imagens 
de uma emotividade explícita – fizeram com que poemas como os 
de Dulce Avelino e os demais publicados na revista atraíssem uma 
antipatia por parte de alguns de seus leitores. Na seção denominada 
“Primeiras nuvens”, presente na edição de número quatro (janeiro de 
1915), houve a presença da discordância entre a colunista chamada 
Dinese e a opinião de um cronista de nome Jacyntho Canela de Ferro, 
publicada pouco antes no jornal natalense A República e dirigida a 
Violante do Céu, uma das articulistas da Via-Láctea. 
Segundo Duarte e Macêdo (2003), o cronista era nada menos 
do que o jornalista macaibense Eloy de Souza, que, usando um 
pseudônimo visivelmente irônico, se rebelou contra a revista como 
um todo. Conforme relata o texto, claramente em tom indignado, de 
autoria de Dinese (apud DUARTE; MACÊDO, 2003, p. 68-69), “[...] 
[Jacyntho] revoltou-se contra a VIA-LÁCTEA desde o título até a 
última página; nada se salvou na sua reprovação. É um desiludido 
[…], que pregou muito bem, mas, qual um Batista moderno, pregou 
25
no deserto”. Isto ocorre depois que Jacyntho teria sugerido que a 
revista Via-Láctea deveria se chamar “Galinheiro” ou “A cozinheira”, 
dada a extrema feminilidade da publicação, o que pode revelar um 
tom irônico por parte do cronista quanto ao papel da mulher na área 
editorial – e por que não dizer social? – da cidade.
Curiosamente, como item simbólico para o entendimento estético 
no que diz respeito à visão sobre o gênero lírico, na capa do terceiro 
número de Via-Láctea, de dezembro de 1914, está o poema “Natal”, 
de Auta de Souza, cujo irmão era o supracitado Eloy de Souza. 
Perdurando até a edição de número oito, lançado em junho de 1915, 
os textos integrantes das edições de Via-Láctea ainda resvalavam 
em um passado recente que não queria deixar de existir nas letras 
potiguares, uma espécie de Romantismo retardatário que também se 
fazia presente em outros recantos do Brasil.
Analisando a produção poética paraibana das primeiras décadas 
do século XX, Hildeberto Barbosa Filho anota um fato muito 
semelhante ao das letras potiguares:
Evidentemente, o grosso desta produção, nesta fase inicial da literatura 
na Paraíba, se caracteriza pela imitação servil dos modelos mais 
ou menos consagrados a nível nacional. Este fato, logicamente, vai 
resultar na prática de uma poética epigônica, onde os componentes 
estéticos das “escolas” romântica, parnasiana e simbolista, já em franco 
processo de desgaste e saturação, são reaproveitados numa espécie 
de maneirismo literário, em que não se economizam os estereótipos 
formais e estilísticos, assim como os lugares-comuns das motivações 
subjetivas (BARBOSA FILHO, 2001, p. 63).
Em suma, as manifestações nas letras potiguares do início do século 
XX seguiam naquilo que se pode chamar de dupla perspectiva: por 
um lado, havia o reconhecimento sobre a tradição poética nacional e, 
por outro lado, esta manutenção lírica sobre temas, formas e objetos 
revelava que a modernidade – assim como a modernização – ainda 
passava distante tanto da realidade quanto do imaginário norte-rio-
grandense. Com isso, Câmara Cascudo afirmou veementemente em 
Alma patrícia que “A literatura por aqui é um mero diletantismo, 
passatempo, distração de espírito” (CASCUDO, 1998, p. 161). 
26
Para outros críticos, como Duarte e Macêdo (2001a), esta fase 
inicial do século XX equivaleria a uma “fase de formação” – por 
sua vez, já pegando emprestado a expressão consagrada de Antonio 
Candido em Formação da literatura brasileira –, o que, de um modo 
geral, configura as manifestações poéticas no Rio Grande do Norte 
como uma contaminação lírica tradicional, vertida sob o verso ainda 
herdado do século XIX, fato comprovado nos periódicos potiguares 
entre 1900 e 1920.
1.2. A melancolia solar dos pós-românticos: Auta de Souza, 
Henrique Castriciano, Ferreira Itajubá, Lourival Açucena
 
 I hear it in the deep heart’s core.
William Butler Yeats, “The Lake Isle of Innisfree”
De acordo com o relato de estudiosos distintos, o primeiro poeta 
potiguar a publicar um livro tem nomes diferentes. Para Tarcísio 
Gurgel (2001), Segundo Wanderley – nascido em Assu em 1860 –
editou Estrelas cadentes em 1883, quando morou na Bahia. Já para 
Manoel Rodrigues de Melo (1994), o pioneiro teria sido José Leão 
com a obra Microscópicos em 1873, mas sem dar detalhes (cidade, 
prefácio, sumário) acerca de uma informação mais completa sobre 
a edição. 
De todo modo, parece ser justamente sobre o semblante trágico 
de Auta de Souza9 que se iniciou alguma repercussão sobre a poesia 
potiguar no despontar do século XX, talvez devido ao fato de um 
9 Nascida em 1876 em Macaíba, cidade próxima à capital potiguar, Auta de 
Souza ficou órfã de pai e mãe antes dos cinco anos de idade e a partir do 
ano de 1890 ficou constatada a tuberculose. Para Câmara Cascudo (2008c), 
a enfermidade a fez sofrer durante mais de dez anos, falecendo vítima do 
mal do século em 1901, pouco após a publicação de Horto, seu único livro.
27
lirismo melancólico (precisamente romântico, detendo nuances 
simbolistas) somada à sua morte precoce, mas também devido a 
importância de autores como o renomado parnasiano carioca Olavo 
Bilac – que assinou o curto prefácio da primeira edição do livro 
em questão, assim como antes havia feito na obra Mãe (1899), de 
Henrique Castriciano, irmão de Auta – e o crítico literário Alceu 
Amoroso Lima, que assinou o prefácio da terceira edição da obra, já 
na década de 1930. 
O livro da poetisa macaibense teve edições constantes, sendo a 
segunda edição da obra editada no ano de 1911 em Paris pelos Editores 
Aillaud, Alves & Cia, e a terceira em 1936 pela Tipografia Baptista de 
Souza, no Rio de Janeiro, o que configurou um nítido interesse pela 
poesia dela10. Obras recentes, como Uma história da poesia brasileira 
(2007), de Alexei Bueno, mantêm o eco causado pelos versos de Auta, 
visto que o autor – em pleno século XXI – afirma que os versos dela 
a fizeram ser “[...] a maior poetisa católica do Brasil após Alphonsus 
de Guimarães. É difícil dar uma definição estilística aos seus poemas, 
que trazem algo de um Romantismo tardio misturado às vezes a uma 
musicalidade quase simbolista [...]” (BUENO, 2007, p. 239).
A única obra da poetisa macaibense – cuja epígrafe com versos de 
Castro Alves já dá pistas do que viria a seguir – apresenta mais de uma 
centena de poemas, nos quais são observados uma junção pendendo 
ora para o Romantismo ora para o Simbolismo, tangenciando a 
opinião de Tarcísio Gurgel como esclarecedora sobre os versos de 
Auta, pois “[...] melhor seria considerá-la romântica com acentuada 
tendência simbolista” (GURGEL, 2001, p. 48). No prefácio da 
segunda edição de Horto, seu irmão Henrique Castriciano informava 
que ela havia lido poetas românticos como Gonçalves Dias, Casimiro 
de Abreu e um dos românticos da última leva, Luiz Murat, levando 
o autor de Ruínas a informar que a irmã “Não teve cultura literária 
vasta” (CASTRICIANO, 2009, p. 34), apesar da leitura supracitada.
10 Outras edições potiguares se seguiram, entre elas uma publicada em 1970 e 
outra mais recente em 2009 (Cf. referências bibliográficas), esta com acréscimos 
de textos poéticos.
28
De todo modo, os poemas de Auta renderam a ela uma espécie de 
“culto” com o passar do tempo e com as seguidas edições que, apesar 
de esparsas, fizeram “[...] com que seu legado poético permanecesse 
vivo [...], além de ser o registro de uma geração de escritoras na 
literatura brasileira que começava a perceber que a produção feminina 
existia e precisava ser lida sem preconceitos e sem desigualdades” 
(ALVES, 2010, p. 11).
Exemplificar as tendências românticasou simbolistas em Auta de 
Souza pode ser uma tarefa direcionada já desde os títulos dos poemas 
(“Desalento”, “Ao luar”, “Místico”, “Meu sonho”, Simbólicas”, “Página 
triste”, “Crepúsculo”), cuja filiação em busca das rimas perfeitas por 
entre um lirismo confessional aparece em textos como “Agonia do 
coração” (SOUZA, 2009, p. 83):
Estrelas fulgem da noite em meio 
Lembrando círios louros a arder... 
E eu tenho a treva dentro do seio... 
Astros! velai-vos, que eu vou morrer! 
 
Ao longe cantam. São almas puras 
Cantando à hora do adormecer... 
E o eco triste sobe às alturas... 
Moças! não cantem, que eu vou morrer!
Pássaros tremem no ninho santo 
Pedindo a graça do alvorecer... 
Enquanto eu parto desfeita em pranto... 
Aves, suspirem, que eu vou morrer! 
 
De lá do campo cheio de rosas 
Vem um perfume de entontecer... 
Meu Deus! que mágoas tão dolorosas... 
Flores! Fechai-vos, que eu vou morrer!
 
Se para Câmara Cascudo (1998, p. 126) “Todas as cenas, figuras 
ou imagens, gravadas no ‘Horto’ são dolorosas, tristes, desiludidas, 
29
infinitamente suaves, infinitamente humanas”, é possível perceber os 
versos de “Agonia do coração” como um exemplar bem definido da 
lírica pessoal de Auta, cujo uso da primeira pessoa nos versos fica 
explícito em significativa parcela dos poemas de sua obra. Além 
destas marcas bem acentuadas, no decorrer de cada estrofe do 
poema citado há um refrão – “que eu vou morrer!” – intensificador 
da atmosfera mórbida de um Eu Lírico ciente de sua efemeridade, 
“[...] mas ao mesmo tempo exibindo toda sua carga de egocentrismo 
e individualidade ao chamar a atenção para si mesmo” (ALVES, 
2010, p. 53). 
Vocábulos espalhados por todo o poema – estrelas, noite, círios, 
astros, pássaros, alvorecer, perfume – resvalam na escolha semântica 
do cruzamento entre Romantismo e Simbolismo, embora este último 
esteja mais presente nos versos sensoriais, caso de “Lembrando círios 
louros a arder” ou “Vem um perfume de entontecer”. Visto de forma 
mais ampla, em “Agonia do coração” a poetisa está sob os auspícios do 
que se convencionou chamar de Ultrarromantismo, termo cunhado 
para definir a segunda geração do Romantismo em Portugal. Segundo 
Massaud Moisés (1983), corresponderia ao período lusitano entre 
1838 e 1860, e cujo semblante passava pelo exagero sentimental e 
uma clara tendência às temáticas melancólicas ou mórbidas.
Raras são as composições de Auta de Souza em Horto – cujo 
título inicial era Dálias – que venham a escapar deste padrão poético 
alicerçado em um lirismo abundantemente emotivo/sentimental, 
pessimista perante os fatos da vida e na qual o amor está ligado a 
elementos da natureza surgidos em profusão nos versos, estes 
preferencialmente decassílabos, hendecassílabos ou alexandrinos. 
Em uma das poucas ocasiões em que a poetisa escapa de sua própria 
redoma poética, pelo menos na temática, está o poema “Manhã no 
campo” (SOUZA, 2009, p. 188):
Estendo os olhos pelo prado afora:
Verdura e flores é o que a vista alcança...
— Bendito oásis onde o olhar descansa
Quando saudades do passado chora.
30
Escuto ao longe uma canção sonora.
Voz de mulher ou, antes, de criança
Entoa o hino branco da esperança,
Hino das aves ao nascer da Aurora.
Por toda parte risos e fulgores
E a natureza desabrochando em flores,
Iluminada pelo Sol risonho,
Recorda um’alma diluída em prece,
Um coração feliz que inda estremece
À luz sagrada do primeiro sonho!
Ainda que mantidos os caracteres referentes à natureza como 
presença indubitável em seus poemas, ao longo de “Manhã no campo” 
está a visão de um cenário do tempo presente (Estendo os olhos pelo 
prado afora / Verdura e flores é o que a vista alcança...) que serve de 
acalanto a um passado diametralmente e sentimentalmente oposto e 
incômodo, mesmo que para tal ela se utilize de símbolos já bastante 
desgastados, praticamente usando clichês semânticos. É o caso do 
vocábulo “oásis”, observado nos primeiros versos como um lugar de 
vida em meio ao deserto, um refúgio diante da dor (– Bendito oásis 
onde o olhar descansa / Quando saudades do passado chora.).
Em seguida, alguns padrões tidos como notórios ao Simbolismo 
passam a surgir como referencial, ocorrendo citações sensoriais 
e musicais (Escuto ao longe uma canção sonora. / Voz de mulher 
ou, antes, de criança) para depois entrar no campo da sinestesia 
envolvendo cor e sonoridade sugestivas (Entoa o hino branco da 
Esperança) e das maiúsculas alegorizantes, normalmente ligadas 
à personificação da natureza (Hino das aves ao nascer da Aurora.) 
como representação para um Eu Lírico que percebe a grandiosidade 
dos elementos naturais.
Nas duas derradeiras estrofes, uma visão otimista, focando a vida 
em uma profusão de elementos humanos e naturais (Por toda parte 
risos e fulgores / E a Natureza desabrochando em flores) se confunde 
com a própria atmosfera de sonho/imaginação, fato expressivo entre 
31
os poetas do Simbolismo cujas intenções dos dados da realidade 
“[...] comparecem no poema não para compor uma paisagem, mas 
para suscitar determinado estado de espírito” (GOMES, 1994, p. 29), 
obviamente relacionado ao Eu Lírico. 
No desfecho do poema, o terceto retoma uma aura cristã bastante 
presente em vários poemas de Auta de Souza (Recorda um’alma 
diluída em prece,) para, em seguida, trazer mais um clichê voltado 
tanto à felicidade – ainda que efêmera em “Um coração feliz que inda 
estremece” – quanto para reforçar o ideal religioso amalgamado à 
evocação onírica (À luz sagrada do primeiro sonho!), uma provável 
alusão ao passado infante presente nos versos iniciais. 
Fica-se, então, o registro de que a poesia de Auta transita entre os 
polos do Romantismo e do Simbolismo, gerando interesse que ainda 
deve ser mantido sob o viés teórico, uma vez que sua única obra pode 
ser tida não como uma mera transição e sim como uma confluência 
da própria criação poética alavancada diante das influências poéticas 
no final do século XIX. 
Neste sentido, o do referencial classicizante oriundo das escolas 
anteriores ao Modernismo, o lirismo de Auta de Souza guarda 
algumas semelhanças com o de Henrique Castriciano. O irmão da 
poetisa autora de Horto publicava seus livros de poesia já aos dezoito 
anos, com Iriações (1892), obra esta que, segundo o relato de Câmara 
Cascudo (1965) na biografia intitulada Meu amigo Castriciano, o 
macaibense queimava todos os exemplares que encontrasse pela 
frente, em nítida rejeição ao seu feito poético de estreia. 
Nas obras seguintes, Ruínas (1898), Mãe (1899) – este com o 
prefácio assinado por Olavo Bilac – e Vibrações (1903), o que se nota é 
uma poesia cujos temas e formas não escapam aos padrões líricos do 
período. Castriciano seguiria com um pouco mais de ênfase a linha 
simbolista, entretanto sem a ela se filiar com vigor, talvez por saber 
de certa impropriedade quanto ao uso, no Brasil, do Simbolismo 
de origem europeia, como assim afirmam sobre tal escola críticos a 
exemplo de Álvaro Cardoso Gomes (1994, p. 47):
32
Acontece que o Simbolismo foi uma estética altamente refinada, 
oriunda dos países industrializados e frios. […] seus membros mais 
ilustres […] elegeram o Outono (de preferência) e o Inverno como 
as estações preferidas para expressar os estados de alma lânguidos, 
melancólicos. Como é então que o Simbolismo havia de se fixar num 
país agrícola e tropical?
Por exemplo, em seu livro Mãe, Castriciano ergue uma obra 
poética em torno de um conceito acerca da vida humana desde os 
versos de abertura. A figura maternal – que está presente no longo 
poema “Introdução” – e uma criança chamada Branca na parte 
denominada “Mãe, livro de Berta” perpassam as demais composições 
da obra. Indo do nascimento à morte de Branca, a presença desta 
personagem diante de um Eu Lírico paterno – que prefere os quartetose quintetos como estrofes constantes – demonstra a procura pelas 
tonalidades simbolistas em inúmeros trechos, como os presentes em 
algumas estrofes de “Acordada” (CASTRICIANO, 1989, p. 39-41):
Música etérea, inefável,
Mais que a voz do rouxinol,
Canção que traz, impalpável,
Ao sonho, o clarão do sol.
Gorgeio vago e sem notas,
Que às aves causa ciúme,
Vindo de plagas remotas,
Envolto em luz e perfume...
[…]
E cismo, contrita, cismo,
Vendo Branca despertar,
Como quem vem de um abismo
Cheio da luz do luar.
Como se pode perceber, os indícios do uso da natureza e seus 
símbolos (rouxinol, sol, aves, luz, perfume, luar) revelam uma 
herança advinda do Romantismo, só que agora sob “[...] o misto 
de suave misticismo e forte esperança que se estende até o infinito” 
(CASCUDO, 1998, p. 21). A percepção humana se horizonta nos 
caracteres simbolistas que envolvem os sons harmônicos – “Música 
33
etérea, inefável / […] / Gorgeio vago e sem notas” – enquanto a 
sequência poética focaliza os sentidos (Envolto em luz e perfume) 
plenos de contraste (Como quem vem de um abismo / Cheio da luz 
do luar), enfatizando a aura de Simbolismo presente nos versos.
Os demais vinte e três poemas integrantes de Mãe sugerem 
seguir um percurso similar e que culminam no possível diálogo 
dos derradeiros textos, cuja subdivisão em duas partes se intitula 
“Berta (louca, à beira-mar)” e “O mar”, precedido por um pequeno 
texto em ritmo de prosa e sem título, colocado entre parênteses 
(CASTRICIANO, 1989, p. 78): “(Branca, diz a lenda, atraída por um 
Gênio mau das águas, desapareceu numa tarde aziaga de Agosto. 
[…] Longos anos vagueou Berta pela praia, até que um dia cuidou 
ouvir o Pego, num fim de madrugada tempestuosa.)”.
Na evidência da temática da loucura e as imagens surreais da 
conversa entre a figura materna e o Mar (com inicial maiúscula, 
caracterizando sua personificação, outro referencial simbolista), os 
versos de Castriciano terminam sob uma reminiscência romântica 
dramática, trágica, na voz do Eu Lírico marítimo – “Parti uma 
concha e fiz-lhe um berço, / Cinzento e claro, da cor da bruma: / 
Quanta alegria pelo Universo, / Se ela dormita, no frio imerso, / O seu 
vestido feito de espuma!” (CASTRICIANO, 1989, p. 84). A resposta 
humana de Berta parece ser a confirmação do estado de loucura que 
chegou o ser humano, em um delírio febril dos derradeiros versos da 
obra: “Branca, voltemos da vida aos laços! / Para aquecer-te dos frios 
gelos, / Eu tenho a febre de meus abraços, / Tu tens a aurora de teus 
cabelos!” (CASTRICIANO, 1989, p. 84).
Se ao longo da obra Mãe os versos de Castriciano envolviam 
as tintas do Simbolismo, tanto que Muricy Andrade (1987) o 
coloca como representante no Panorama do movimento simbolista 
brasileiro, Câmara Cascudo observa na última obra de Castriciano 
um outro semblante poético sobre o potiguar, uma vez que “[...] já 
na última parte de Vibrações, se nota a grande influência parnasiana” 
(CASCUDO, 1998, p. 23), dando como exemplo o soneto “Monólogo 
de um bisturi” (CASTRICIANO apud CASCUDO, 1998, p. 23-24):
34
Primeiro o coração. Rasguemo-lo. Suponho
Que esta mulher amou: tudo está indicando
Que morreu por alguém, este ser miserando
Misto de Treva e Sol, de Maldade e de Sonho...
Isto não me comove: adiante! Risonho
Fere, nevado gume! E, ferindo e cortando,
Aço, mostra que tudo é lama e nada, quando
Sobre os homens desaba o Destino medonho...
Fere este braço grego! E as pomas cor de neve!
E as linhas senhoris que a pena não descreve!
E as delicadas mãos que o pó vai dissolver!
Mas poupa o ventre nu, onde repousa um feto:
Por que hás de macular o sono fundo e quieto
Desse verme feliz que morreu sem nascer?...
Apesar de ter já criado um poema de teor semelhante 
(“Tuberculosas”, presente em Ruínas, o livro anterior), “Monólogo 
de um bisturi” está muito mais próximo da poética aparentemente 
inclassificável de Augusto dos Anjos – cujo título faz lembrar do 
poema inicial (“Monólogo de uma sombra”) da obra única do jovem 
paraibano – do que do Parnasianismo ortodoxo pregado por Olavo 
Bilac e Raimundo Correia, para ficar na citação dos mais renomados. 
Cascudo talvez tenha visto no poema de Castriciano as rimas e 
métrica parnasianas como primordiais – ou seja, o aspecto estrutural 
– e sendo assim, o autor de Alma patrícia estaria relegando a um 
segundo plano a temática mórbida de herança do Ultrarromantismo 
e as imagens de teor naturalista que gradativamente vão tomando 
espaço nos versos.
O título não apenas sugere o ato do uso do bisturi, como 
também se liga à segunda estrofe de modo até explícito, porém os 
versos iniciais expõem a mesma simbologia romântica reutilizada 
como introito (Primeiro o coração. Rasguemo-lo. Suponho / Que 
esta mulher amou: tudo está indicando) e assim, sob a técnica do 
enjambement, produzir um efeito cuja morbidez passa a ocupar o 
centro lírico (Que morreu por alguém, este ser miserando / Misto 
35
de Treva e Sol, de Maldade e de Sonho...), enquanto as maiúsculas 
alegorizantes se tornam antagônicas diante da situação anunciada, a 
da presença da morte.
Com um Eu Lírico cuja frieza tem muito do objetivismo parnasiano 
de retenção emotiva – uma característica frequente entre os poetas 
do período, mas não uma unanimidade –, o objeto bisturi se torna o 
foco entre os versos da segunda e terceira estrofes, cuja negatividade 
em torno dele assume um tom irrevogavelmente pessimista (Isto 
não me comove: adiante! Risonho / Fere, nevado gume! E, ferindo e 
cortando, / Aço, mostra que tudo é lama e nada, quando / Sobre os 
homens desaba o Destino medonho...), o que resvala no espírito do 
chamado Decadentismo – outra nuance do Simbolismo –, em que 
“[...] um pessimismo agudo assomava por toda a parte” (MOISÉS, 
2004, p. 420), relata o autor ao se referir aos poetas franceses do fim 
do século XIX.
Na sequência do poema aparece o impulso da morte derrotando 
a vida (E as delicadas mãos que o pó vai dissolver!), assemelhando-se 
ao processo de muitos dos poemas de Auta de Souza sob influência 
ultrarromântica. Entretanto, no terceto final, o lirismo ocorre entre a 
piedade e a ironia quanto à existência, com a imagem de uma mulher 
e um recém-nascido sem vida (Mas poupa o ventre nu, onde repousa 
em feto:), com a interrogação servindo como meio paradoxal da 
relação invertida de felicidade – aqui sendo a morte – e tristeza, que 
seria a projeção da vida humana a partir de uma criança (Por que hás 
de macular o sono fundo e quieto / Desse verme feliz que morreu 
sem nascer?...).
Nos versos repletos de morbidez de “Monólogo de um bisturi”, 
a mulher não estaria mais no plano da idealização – como ocorre 
em Mãe – e, sim, “[...] em situação rigorosamente degradante […], 
inerte e nua, não passa de um cadáver às vésperas de uma dissecação” 
(GURGEL, 2009, p. 223). Também está certamente no poema uma 
ligação com aquilo que Álvaro Gomes Cardoso (1994) anotou 
como sendo o “espírito de decadência”. Seria uma visão do final 
do século XIX e que entrava em visível contraste com o espírito da 
36
belle époque do começo do século XX. Na percepção decadentista, o 
ser humano “[...] que acreditava ter acesso aos segredos do universo 
[pós-Revolução Industrial], via razão e via progresso, vê de repente 
que tudo não passa de ilusão, que o universo é regido por forças 
incontroláveis que ele desconhece completamente” (GOMES, 1994, 
p. 11), como é o caso da morte.
Ou seja, o pessimismo no poema de Castriciano é uma de suas 
facetas poéticas e que destoa da normalidade lírica de sua obra, 
chegando a existir em outros poemas de Vibrações, como no poema 
“Nada”, “[...] uma pitada de cinismo, postura adotada certamente 
a partir da leitura de filósofos como Nietzsche e Schopenhauer” 
(GURGEL, 2001, p. 44). Indo além do campo restritamente poético ou 
filosófico, CâmaraCascudo (1965) considera o autor de Ruínas como 
uma de suas influências – se não no estilo, pelo menos no âmbito das 
ideias – e um dos agitadores culturais da então provinciana capital 
potiguar do começo do século XX. 
Além de ser criador de uma lei estadual no ano de 1900 e cuja 
principal ação era lançar livros que fossem de importância para o Rio 
Grande do Norte – isto é, publicando autores locais –, Castriciano 
ainda buscou divulgar o único livro de Auta de Souza e organizou 
a obra poética do romântico Ferreira Itajubá (1877-1912) em 1914, 
publicando Terra Natal, posteriormente reeditada em 1927 na edição 
Terra Natal/Harmonias do norte.
Ao contrário da poetisa macaibense, cujo interesse pela sua 
poesia começou já bem perto de sua morte, o interesse crítico 
literário sobre Ferreira Itajubá foi ocorrendo com o passar das 
décadas. Há diversos ensaios em periódicos potiguares do século 
XX e também um primeiro trabalho mais cuidadoso de Câmara 
Cascudo em Alma patrícia (1921), seguindo-se mais um texto em 
Joio (1924). Vieram outras obras, a exemplo de José Bezerra Gomes, 
publicando Retrato de Ferreira Itajubá; Othoniel Menezes publica 
em 1947 o ensaio Ferreira Itajubá – o drama da vida de província. 
Mais recentemente, entre outros, foram editados Itajubá esquecido 
(1981), de Nilson Patriota; Ferreira Itajubá: poesia (1981), obra de 
37
Francisco das Chagas Pereira; Gracioso ramalhete (1993), publicação 
de Cláudio Galvão; Revendo Itajubá (2007), de João Batista de Morais 
Neto; a compilação Dispersos: poemas e prosas (2009), organizado 
por Humberto Hermenegildo de Aráujo e Mayara Costa Pinheiro; 
e a dissertação de mestrado (ainda inédita em livro) Terra Natal, de 
Ferreira Itajubá, e a permanência do Romantismo (2012), de Mayara 
da Costa Pinheiro.
Os versos de Ferreira Itajubá, hoje dono de uma fortuna 
crítica que rivaliza com a de Auta de Souza no interesse literário, 
confluem, segundo seus leitores críticos, para a exacerbação de uma 
originalidade comparando-se aos poetas próximos, de acordo com 
Cascudo (1998, p. 122-123):
Auta de Souza, suava e mística, donzela hipersensível, não nos podia 
dar uma livro regional, H. Castriciano não é um poeta local, isto não 
tem escola genuinamente nossa, que o caracterize. Não possui um 
cenário que seja nosso. É um influenciado de Baudelaire, Mallarmé, 
Verlaine, Hugo […]. Só Itajubá é nosso. É a própria terra que canta pela 
sua boca rude.
Todavia, Câmara Cascudo (1998) denuncia na mesma ocasião 
que Itajubá havia lido Luiz Murat, Olavo Bilac, Castro Alves e tinha 
preferências pessoais por Casimiro de Abreu, ou seja, o poeta travava 
contatos com a poesia brasileira das mais representativas do século 
XIX e que mantinha forte presença no século seguinte. Enquanto 
homem de biografia estranha, quando não misteriosa11, como poeta 
11 Segundo Nilson Patriota (2007), Itajubá veio de família humilde e trabalhou como 
balconista de loja de tecidos, dono e artista de circo, fundador do semanário Echo 
e professor primário em sua própria residência. Câmara Cascudo (Alma patrícia, 
1921) e Ezequiel Wanderley (Poetas do Rio Grande do Norte, 1922) tem o ano de 
1876 como do nascimento do poeta. No texto “Como tenho vivido”, de autoria do 
próprio Itajubá e originalmente publicado no periódico natalense A Capital – de 
06 de março de 1910 e republicado no jornal potiguar O Canguleiro, em setembro 
de 1997 –, o poeta afirma: “Nasci à margem do Potengi” (ITAJUBÁ, 2009, p. 167). 
Quanto ao ano de nascimento, José Bezerra Gomes, em 1944, conseguiu localizar 
o termo de nomeação de Itajubá para escrevente da Associação de Praticagem 
em 1896, data em que está escrito com a letra do próprio poeta: “Manoel Ferreira 
Itajubá, […] nasceu a 21 de agosto de 1877” (GOMES, 2002, p. 24).
38
sua obra está também ligada, por um lado, à sua atividade de músico 
“seresteiro”, de acordo com Nilson Patriota (2007, p. 41), “[…] divino 
ofício diletante de cantar noite adentro, violão em punho, a embalar 
saudades e estimular românticas fantasias. […] até os anos trinta, 
o seresteiro, o boêmio, o menestrel, […] era sempre bem acolhido 
às festas familiares e aos folguedos populares. […]”. Em um estudo 
específico sobre a música e os seresteiros no estado, Gumercindo 
Saraiva (2010) aponta em Trovadores potiguares que vários poetas 
locais tiveram seus versos musicados, a exemplo de Auta de Souza, 
Segundo Wanderley e Othoniel Menezes, além de Ferreira Itajubá, 
obviamente.
A esta visão de caráter popular sobre a figura de Itajubá soma-se 
a opinião de Câmara Cascudo, relatando que o longo poema “Terra 
Natal”, formado por trinta e quatro partes e mais uma composição 
introdutória, foi escrito “[...] aos pedaços, aos trancos, no intervalo 
de uma serenata a uma peixada, quase sempre ditados, quase sempre 
interrompidos por novos planos de festas novas” (CASCUDO, 1998, 
p. 112). Para estudiosos mais recentes do poeta, como Mayara Costa 
Pinheiro (2012), os versos de “Terra Natal” teriam uma relação com 
o poema “Camões”, do lusitano Almeida Garrett (1799-1854), obra 
inaugural do Romantismo em Portugal no ano de 1825, considerando 
que as estrofes de Garrett configuram um percurso similar ao versado 
por Itajubá (a exemplo do sentimento de exílio e das constantes 
lembranças de infância). 
Outros leitores críticos, como José Bezerra Gomes (2002), este 
citando Armando Seabra e a obra Ensaios de crítica e literatura, de 
1923, ligam os versos de “Terra Natal” ao francês Frédéric Mistral 
(1830-1914), autor de Mireia, obra de 1859 e que fixa seus versos 
no amor de Vincent e Mireia, assim como no poema de Itajubá está 
exposto o amor do Eu Lírico por Branca, coincidentemente o mesmo 
nome utilizado por Henrique Castriciano nos poemas de Mãe. Para 
Esmeraldo Siqueira (2012, p. 14), “No poema de Itajubá [Terra 
Natal], o largo sopro lírico assume facetas sugestivas e variadas. É 
romântico, amoroso, saudosista, filial, regionalista, patriótico”.
39
Apesar de apontadas tais virtudes, a figura humana de Ferreira 
Itajubá parece se ressentir de um descaso – certamente causado por 
suas condições econômicas sofríveis – quanto à sua produção poética. 
Embora participando com poemas e textos em vários periódicos 
potiguares (entre eles, o Oásis e A Tribuna), Itajubá parece não ter 
sido levado a sério na cidade em que vivia, uma vez que “Olhavam-
no como quem olha um animal bonito e mau” (CASCUDO, 1998, p. 
113), talvez uma referência à visão da “elite lírica” da capital potiguar 
frente a um caso de “injustiça cabocla”– a expressão é de Esmeraldo 
Siqueira (2012) – quanto ao poeta Ferreira Itajubá.
De todo modo, voltando à poesia, a sua intenção maior era 
tratar da temática amorosa, ou melhor de sua impossibilidade: “Ao 
sublimar o amor em poesia (e dando-lhe uma estrutura onírica ao 
fazê-lo platônico), Itajubá se faz romântico” (PATRIOTA, 2007, p. 
19). Este aspecto se diz presente além do tom definitivamente trágico 
– e por isto mesmo romântico – dos mais de trinta cantos de “Terra 
Natal”, pois aquilo que se vê nos demais poemas de Itajubá em 
Harmonias do norte são um aceno à tradição, só que incorporados à 
verve idiossincrática do versos do poeta:
[...] na maioria, sonetos, muitos deles alexandrinos, tipo de verso 
predileto de Itajubá. Apesar das incorreções métricas, da pobreza das 
rimas e de pequeno vocabulário, pois o Poeta era inculto e o pouco 
que sabia aprendera de ouvido, lemos com prazer esses poemas 
transbordantes de riqueza lírica […] (SIQUEIRA, 2012, p. 14).
Visto que “Terra Natal” seria uma espécie de canto de louvor à 
beleza feminina – muitas vezes alicerçada na relação com a natureza 
de esplendor tropical – e ao amor tornado “o poema da tristura”, 
como o Eu Lírico de Itajubá assim o define logo no terceiro verso da 
composição citada, os demais poemas do potiguar foram coletadossob a denominação de “Harmonias do norte”. São quarenta e dois 
textos poéticos cujos títulos – “Dor secreta”, “Cansado de sofrer”, 
“Recordação amarga”, “Desterro”, “Abençoado exílio” – denunciam, 
em boa parte, sua tendência literária, uma vez que “Amor, religião, 
40
sentimento da natureza e da sociedade são as grandes constantes do 
lirismo romântico” (CANDIDO; CASTELLO, 2003, p. 159).
Os poemas de Itajubá, por vezes, fazem realmente ecoar as vozes 
de poetas predecessores dele – por exemplo, intitulando um de seus 
poemas como “Aves de arribação”, mesmo nome dado por Castro 
Alves a um dos textos de Espumas flutuantes (1870) – e assim marca 
a sua consciência, ainda que rudimentar em seu campo semântico, 
sobre a tradição literária. Prova disto são os versos cuja temática 
não somente escapa aos arquétipos românticos como também se 
aproxima de uma tonalidade levemente simbolista de “Lua de maio” 
(ITAJUBÁ, 2012, p. 175):
Acordo. Já ventila a madrugada!
Sobe a parede escura úmida réstia...
É a lua! Como está desfigurada!
Parece que se ergueu de uma moléstia!
Muda como as tristezas tumulares,
Lembra uma monja pálida, sidérea,
Uma bola de neve pelos ares,
Fria, cobrindo tudo de matéria!...
E desce. Desce. E o brilho declinando
Imita o de uma veia esmorecendo...
É que as dores de maio vão chegando
Enquanto as alegrias vão morrendo!
Verte pranto invernoso! Orvalha a grade
Da solidão do meu viver incerto.
Como sangra o punhal desta saudade!
Que mal me trouxe este postigo aberto!
Na qualidade de escritor vivente entre séculos distintos, a partir de 
uma simbologia romântica – a lua e a atmosfera noturna como fontes 
líricas – surge uma espécie de estranhamento poético no terceiro e 
quarto versos (É a lua! Como está desfigurada! / Parece que se ergueu 
de uma moléstia!). Em seguida, um certo grau de misticismo circunda 
a imagem do satélite natural e a de uma figura humana (Muda como as 
tristezas tumulares, / Lembra uma monja pálida, sidérea, / Um bola de 
41
neve pelos ares, / Fria, cobrindo tudo de matéria!...), lembrando uma 
das marcas do Simbolismo, o da “[...] via das associações de ideias que 
permite a evocação de outra realidade” (CADERMATORI, 2004, p. 54). 
Na estrofe inicial, a lua estava aparentando uma enfermidade e 
agora se torna uma figura religiosa – a monja – sob a insígnia de 
uma das cores prediletas dos simbolistas, o branco. A aura onírica 
persegue o começo da terceira estrofe, cujo centro é mais uma 
aproximação entre o abstrato e o concreto (E desce. E desce. E o 
brilho declinando / Imita o de uma vela esmorecendo...), tudo isso 
preparando a antítese sentimental dos versos seguintes (É que as 
dores de maio vão chegando / Enquanto as alegrias vão morrendo!).
Ainda que a derradeira estrofe traga um dos estandartes do 
Simbolismo – a chegada do inverno (e logo em um poeta dos 
trópicos!) –, o poema em seu desfecho promove uma ligação direta 
com o Romantismo. A sensação de ausência e isolamento estão 
dispostos como figurações do ser humano – “Da solidão do meu 
viver incerto. / Como sangra o punhal desta saudade! / Que mal me 
trouxe este postigo aberto!” –, com o Eu Lírico tomando o controle 
no final da composição, que se torna uma visão da lua enquanto 
índice de sofrimento e resignação.
Em outro exemplar da poesia de Itajubá, as cores locais transitam 
de forma atenuada, o que denota por conseguinte um cenário mais 
“tropical” e menos idealizado pela lírica do poeta. Entretanto, ainda 
assim no soneto “A jangada” (ITAJUBÁ, 2012, p. 149), a natureza 
é personagem grandioso, fato tipicamente presente entre os poetas 
românticos, em meio à aventura/desventura humana:
Dia pleno. Céu claro. A atrevida jangada
Corta ao vento marinho a água salsuginosa...
Que coisa simboliza? Uma asa tremulosa
De garça, a palpitar sobre a esteira anilada.
Marés não perde, até que um dia naufragada
Rola no bolo azul da vaga procelosa...
É o mistério da vida efêmera, enganosa,
Tudo vindo do pó, tudo voltando ao nada...
42
Assim, da alma que suga o mel das utopias,
A jangada veloz parte aos ventos de janeiro,
Em busca de ilusões no mar das fantasias...
E tanto às ondas vai que, sem bolina e pano,
Voa com o temporal, deixando ao jangadeiro
Se escapa, uma saudade... um tédio... um desengano...
Do começo ao fim, a jangada é personagem, às vezes 
personificada – como na expressão “atrevida jangada”, presente na 
abertura ou na “busca de ilusões” do décimo primeiro verso – ou até 
metaforizada (Que coisa simboliza? Um asa tremulosa / De garça, 
a palpitar sobre a esteira anilada.). Entretanto, é no conflito entre a 
invenção humana e as forças da natureza que reside a simbologia 
da fragilidade e pequenez perante às intempéries. A derrota do lado 
humano é uma resposta do Eu Lírico para a própria transitoriedade 
dos fatos – “Marés não perde, até que um dia naufragada / Rola no 
bojo azul da vaga procelosa...” – e de uma vida cuja ação se aproxima 
de uma constatação niilista, tendo antes como referência conhecidas 
passagens dos livros bíblicos de Gênesis e Eclesiastes acerca da origem 
do homem (É o mistério da vida efêmera, enganosa, / Tudo vindo do 
pó, tudo voltando ao nada...).
A penúltima estrofe mantém a prática romântica, com a escrita 
do Eu Lírico de Itajubá se centrando na idealização da natureza em 
uma sequência de metáforas que guardam o mesmo traçado do 
Romantismo tradicional (Assim da alma que suga o mel das utopias, 
/ A jangada veloz parte aos ventos de janeiro, / Em busca de ilusões 
no mar das fantasias...). A tríade nominativa de utopias-ilusões-
fantasias, que serviria como índice onírico e de desejo, acaba se 
confrontando com a força da natureza que se volta contra o homem, 
uma figura frágil em meio às intempéries (E tanto às ondas vai que, 
sem bolina e pano, / Voa com o temporal, deixando ao jangadeiro / 
Se escapa, uma saudade... um tédio... um desengano...).
Nos dois últimos versos, ao jangadeiro somente restou a aventura 
terminada em desventura, em desilusão, novamente reforçado 
por outro trio de vocábulos insistentemente de órbita romântica: 
43
saudade-tédio-desengano. Em suma, o poema reforça um ideário 
trágico entre a figura humana e a natureza, com esta provando sua 
hegemonia e com o homem voltado à recorrente imagem de angústia 
de prática inerente ao escritor romântico.
Ainda assim, os versos de Itajubá foram menosprezados pela 
imprensa local, único escape para a publicação de um poeta pobre 
como ele, “[...] porque seus poemas, quando não eram recusados 
pelos redatores d’A República, órgão oficial e folha mais importante 
da época, saíam estampados nos recantos menos lidos do jornal [...]” 
(SIQUEIRA, 2012, p. 12). Em opinião mais recente, João Batista de 
Morais Neto (2012) chega a usar as expressões de “censura” e “recusa” 
no trato dos contemporâneos de Itajubá para com a poesia do autor 
de “Terra Natal”. 
Mais contundente e menos agravante, Luís da Câmara 
Cascudo (1998) cita a expressão “verbo tosco e bravio” e a relação 
aparentemente paradoxal entre “sua pouca cultura e muito talento” 
ao se referir aos versos de Itajubá. Isto revelava uma admiração sobre 
a produção poética dele, que diante dos percalços sociais vividos por 
Itajubá, este ainda escreveu de forma a criar uma obra cuja lírica que 
estaria um pouco além da homogeneidade dos contemporâneos do 
poeta.
No entanto, a denominação de “genialidade” imputada por 
nomes como Nilson Patriota (2007) e Armando Seabra (apud 
GOMES, 2002), além da opinião de que o poeta possui uma “marca 
inclassificável” em seus versos – de acordo com a afirmativa de João 
Batista de Morais Neto (2012) –, podem revelar um exagero crítico 
sobre o lirismo pós-romântico de Ferreira Itajubá. Pelo analisado 
até aqui, ainda que sendo uma pequena amostragem, confirmam-
se os laços que unem Itajubá em uma tradiçãodo poeta idealista, 
romântico fiel ao caráter lírico amoroso do verso, criando talvez mais 
um retrato de um escritor subestimado em sua época e superestimado 
nas que lhe seguiram.
Assim como Itajubá – e em se tratando de edições póstumas –, 
além do exemplo do autor de “Terra Natal”, outro nome aparece como 
44
vulto poético do fim do século XIX e início do seguinte, incluindo 
contatos de ordem pessoal entre o poeta de “Terra Natal” e ele, apesar 
da diferença de idade entre os escritores, conforme Tarcísio Gurgel 
(2001). O natalense Lourival Açucena (1827-1907) só obteve sua obra 
publicada graças ao esforço de Luís da Câmara Cascudo, que editou o 
volume intitulado Versos em 1927, ano que marca coincidentemente 
o começo do Modernismo no Rio Grande do Norte com o Livro de 
poemas de Jorge Fernandes.
Estranhamente esquecido por Câmara Cascudo em sua Alma 
patrícia, o nome de Lourival Açucena foi ainda lembrado no ano de 
sua morte por Henrique Castriciano em uma série de vários ensaios 
– de nítida tendência biográfica e histórica – publicados no periódico 
A República entre julho e agosto de 1907. Sobre Lourival Açucena, 
Castriciano afirma: 
Não acompanhou a evolução da intelectualidade brasileira; seguiu, passo 
a passo, o retardado sentir natalense. […] Fazia amiudadas leituras das 
obras de Magalhães, de Macedo […] e de Bocage, o seu autor favorito. 
[…] não raro afinava o violão, e saía para a rua onde, às dezenas, os 
boêmios da época divagavam ao clarão do luar” (CASTRICIANO apud 
CASCUDO, 2008a, p. 241-242).
A opinião de Cascudo reforça a de Castriciano, salientando o fato 
de que a produção poética de Lourival Açucena atravessa o século 
XIX quase inteiro e, ao chegar ao seguinte, a constatação é a de um 
homem preso ainda mais ao passado:
Lourival Açucena foi, cerebralmente, do século XVIII. Possuía a 
ingenuidade inspirativa, a malícia ligeira, a mania mitológica, a 
superstição do talento improvisador. Seus versos se destinavam ao 
violão ou ao pedido oficial de alguma coisa. Poetava sobre tema, batia 
a lira no outeiro, aceitava sugestões banalíssimas. […] De sua cultura 
e fórmulas arcádicas, bastarão as provas de alguns versos (CASCUDO, 
1986, p. 24).
Observadas tais declarações, os quarenta e seis textos poéticos de 
Lourival Açucena coletados em 1927 percorrem produções distintas, 
45
uma vez que segundo Cascudo (1986) havia poemas de formulação 
arcádica – “Pirraças de amor”, “Uma prece”, “Deus” – e os demais 
seriam uma referência à predileção de Açucena pela música popular, 
entre elas modinhas tradicionais (entre elas “Eu não sei pintar amor, 
“Porangaba” e “Eulina”) e lundus (“Política” e “Sabiá”).
Atendo-se ao livro em si, as composições de Versos estão 
relacionadas a esta aura árcade citada por Cascudo e também “[...] 
alguns poemas de forma mais livre que tentam traduzir a busca de 
uma dicção própria e adaptada à terra natal, à maneira romântica, 
com exaltação à natureza e ao amor” (DUARTE; MACÊDO, 2001a, 
p. 52). A coletânea entrega uma amostragem das diferentes criações 
poéticas de Açucena – alguns poemas aparecem com as datas de 
1854 e 1906 –, que passam pelo acróstico, pelas glosas, pelos sonetos 
e por composições moldadas em quartetos, a exemplo de “Eheu, 
fame pereo”, “À Senhora da Apresentação”, “Marília” e “Eulina” 
(AÇUCENA, 1986, p. 53):
Ave noturna, agoureira,
Não me apavora o teu canto,
Mais desastres não receia
Quem de amor desfaz-se em pranto.
Se a natureza fadou-te
Para males empregares,
Não assustam teus pregões
A quem sofre agros pesares.
Ervada seta de amor
Meu triste peito feriu.
Ao acúleo da saudade
Minh’alma já sucumbiu.
Ave tristonha e sinistra:
Carpe tua negra sina
Chora, que eu choro também,
A longa ausência de Eulina.
46
Nota-se a atmosfera noctâmbula já desde o início, além da 
presença de um personagem símbolo de canto lamurioso – uma 
possível referência a aves comuns no Brasil, como a coruja, ou 
de fama mais abrangente na literatura, que é o corvo, título de 
renomado poema de 1845 do estadunidense Edgar Allan Poe –, 
mas que também pode ser uma alusão à pessoa que é portadora 
de más notícias. O clima dramático criado pelo sofrimento (Mais 
desastres não receia / Quem de amor desfaz-se em prantos) e pela 
aura negativa (Se a natureza fadou-te / Para males empregares, / 
Não assustam teus pregões / A quem sofre agros pesares.) segue 
padrões estabelecidos de forma geral pelo Romantismo, aliás 
seguidos “[...] por poetas que levaram ao extremo a exacerbação 
da sentimentalidade […]. E do que se concebe, aspira-se fazer a 
medida da existência [...]” (CANDIDO; CASTELLO, 2003, p. 161).
Várias outras expressões e vocábulos na terceira estrofe do poema 
(Ervada seta de amor / Meu triste peito feriu. / Ao acúleo da saudade 
/ Minh’alma já sucumbiu.) intensificam o âmbito melancólico de 
“Eulina”, que termina assimilando as características mais tradicionais 
pelo fato de Açucena finalizar seus versos com uma espécie de 
retomada dos versos iniciais (Ave tristonha e sinistra: / Carpe tua 
negra sina / Chora, que eu choro também, / A longa ausência de 
Eulina.). 
Tudo estaria em prol de um lirismo cuja marca mais evidente 
é de manutenção de um ethos no que diz respeito à explicitação 
convencional da égide emotiva presente nos versos de Lourival 
Açucena, o que Henrique Castriciano (apud CASCUDO, 2008a, p. 
241) chamou de “[...] pensamento de gerações que se sucederam sem 
grandes sustos”, marcando assim a permanência de uma tradição 
lírica emotivamente explícita.
Além destes nomes aqui citados diretamente – Auta de Souza, 
Henrique Castriciano, Ferreira Itajubá, Lourival Açucena – há 
diversos outros autores que merecem uma pesquisa mais abrangente 
e relacionada às obras de cada um e que por motivos já explanados de 
seleção (entre eles a delimitação de apreciação, a produção sequencial 
47
e a fortuna crítica) ficaram como pontos a permanecer como análise 
no período assinalado entre 1900 e 1920. 
Entre muitos deles, por exemplo, podem figurar nomes como o 
da açuense Anna Lima, poetisa de Verbenas, volume único publicado 
em 1901 e cuja segunda edição só ocorreu em 2012; Segundo 
Wanderley, poeta açuense de Gôndolas (1903); os macaibenses 
Cícero Moura (1882-1906), com Alvoradas (1905), e Murilo Aranha 
(1890-1919), com Nevroses (1919); Sebastião Fernandes e sua Alma 
deserta, obra de 1906 (há uma edição de 1994 sob o título de Poesia 
inédita, organizada por Cláudio Galvão); Francisco Ivo Cavalcanti 
– mais conhecido como Ivo Filho –, autor de Crisântemos (1906), 
editado novamente em 2012; os natalenses Gothardo Neto (autor de 
Folhas mortas, de 1913, nunca reeditado), Ponciano Barbosa (1889-
1919), com duas obras (Dúvida, de 1915, e Livro humilde, de 1916), e 
Amaro Barreto Sobrinho (1891-1961) com Mármores (1913).
A amostragem analítica de alguns poetas pós-românticos no Rio 
Grande do Norte serve para exibir que a vida literária nesta esquina 
atlântica não só era evidente, como também estava alicerçada no 
mesmo âmbito poético nacional em que as escolas do século XIX 
guardavam sua hegemonia enquanto as forças do Modernismo ainda 
estavam por chegar. O que acontece é que o contexto literário da 
provinciana capital de pouco mais de 30.000 habitantes nos anos 
iniciais de 1920, segundo Itamar de Souza (2008), é de alcance 
extremamente reduzido ao seu próprio território e, tratando das 
manifestações poéticas no Rio Grande do Norte, o foco parecia ser 
unilateral, de acordo com as palavras de Moacy Cirne (1979, p. 15-
16):
A poesia em tela, mesmo a de Auta de Souza, […] refletia o clima 
provinciano às margens do Potengi e do Seridó do Açu e do Mossoró. 
[…] Os voos mais altos da imaginação e do lirismo não encontravam 
solo propício para que pudessem ser fecundados. […] Os arroubos 
literários, então, faziam-se notar nosversos ora simbolistas, ora 
parnasianos, ora românticos de poetas e seresteiros. […] Sem indústrias, 
sem uma produção econômica desenvolvida, sem maior arejamento na 
circulação de ideias, sem tipografias mais sofisticadas e educandários 
48
renovadores, o Rio Grande do Norte, no começo do século [XX], não 
estava intelectualmente preparado para as grandes novidades literárias 
e artísticas engendradas no resto do mundo desde o grande salto 
mallarmaico (Un coup de dés) de 1897. 
Diante deste breve panorama aqui realizado sobre uma parcela 
dos poetas mais significativos com publicações entre 1900 e 1920, o 
ajustamento deles na já citada denominação de pós-românticos por 
Humberto Hermenegildo de Araújo (2004), impõe uma leitura da 
produção poética norte-rio-grandense que forma um conjunto de 
poemas “[...] que, se reunidos, permitem uma visão sobre o modo 
como o processo literário brasileiro aconteceu em uma comunidade 
situada na região nordeste […], estado praticamente sem tradição 
constituída [...]” (ARAÚJO, 2004, p. 93-94).
Por sobre estes poetas de uma melancolia solar – adjetivo este 
designado perante a geografia ensolarada desta esquina dos trópicos, 
criando um paradoxo entre criação e realidade observada –, tratados 
como pós-românticos, reside um fato essencial à literatura e às artes em 
geral, justamente um sinal de que “Se a arte é uma noção transcultural, 
os objetos aos quais ela remete devem necessariamente compartilhar 
certo número de traços” (JOUVE, 2012, p. 20). Nos poemas e poetas 
aqui expostos – concretizando o que Vincent Jouve há pouco chamou 
de “objetos” –, os traços em comum entre eles formam a ideia de 
que a poesia potiguar do despontar do século XX nomeiam sua 
inserção no quadro da literatura nacional do mesmo período, ainda 
tão afeita às influências europeizadas do século XIX. 
 Tal fator não gera um descrédito, apenas uma constatação de 
que o Rio Grande do Norte e seus poetas se resguardam na mesma 
admiração dos demais escritores dentro de um país periférico, 
cujo convencionalismo lírico é mantido sob os aspectos formais e 
estilísticos em que a maturidade crítica ainda demorará até que o 
Modernismo polemize sua chegada nos anos de 1920.

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