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As provas da existência de Deus A primeira seção do Catecismo: "Eu creio – nós cremos", é dividida em três capítulos, que podem ser resumidos em crença-revelação-fé. Crença é o esforço humano e infrutífero para se chegar a Deus. Fé é a adesão ao Deus que se revelou. Nesse sentido, somente os cristãos têm fé, todas as outras religiões possuem crença, porque são religiões fundadas no esforço humano de buscar a Deus e não no Deus que se revelou, pois a Revelação, no sentido estrito da palavra só existe no cristianismo, quando Deus se fez carne por meio de seu filho, Jesus Cristo. Por estar fora do seu centro, dizemos que o homem é um ser excêntrico. Em seu coração existe um desejo, uma insatisfação que nada consegue suprir ou apaziguar. A respeito desse "vazio", Santo Agostinho nos diz: Vós sois grande, Senhor, e altamente digno de louvor: grande é o vosso poder, e a vossa sabedoria não tem medida. E o homem, pequena parcela de vossa criação, pretende louvar-vos, precisamente o homem que, revestido de sua condição mortal, traz em si o testemunho de seu pecado e de que resistis aos soberbos. A despeito de tudo, o homem, pequena parcela de vossa criação, quer louvar- vos. Vós mesmo o incitais a isto, fazendo com que ele encontre suas delícias no vosso louvor, porque nos fizestes para vós e o nosso coração não descansa enquanto não repousar em vós. (Santo Agostinho, Confissões, I, 1,1) A cosmovisão de Santo Agostinho era completamente diferente da atual. Na época, acreditava-se que tudo o que existia no mundo era formado por quatro elementos essenciais: terra, ar, fogo e água, e que cada elemento, por sua vez, possuía o seu lugar exato. Tais elementos atrairiam seus correspondentes em tudo que há. Por exemplo, quando uma folha de papel era queimada, a parte que cabia ao fogo era consumida, a fumaça subia e se misturava com o seu correspondente (ar) e as cinzas caíam ao chão, atraídas pelo seu elemento: terra. Para eles, cada coisa possui o seu peso, de acordo com o seu elemento. Contudo, o homem não se ajusta a essa definição, uma vez que sua alma é feita de espírito e possui, segundo Agostinho, um outro elemento, a chamada quinta essência. Sendo assim, para onde a alma humana pende? O próprio Santo Agostinho responde a esta crucial pergunta dizendo que o coração (alma) do homem não descansa enquanto não repousar em Deus, conforme citado acima. Ora, uma rápida observação em si mesmo é mais que suficiente para confirmar as belas palavras do Bispo de Hipona: nada é capaz de preencher o coração do homem. É por isso que, embora a visão de mundo de Santo Agostinho tenha sido ultrapassada pelos avanços da ciência, sua antropologia deve ser mantida, posto que verdadeira, ou seja, o homem é um ser inquieto, que somente será pleno quando descansar em Deus. Nesse sentido, nos ensina o Catecismo: O desejo de Deus está inscrito no coração do homem, já que o homem é criado por Deus e para Deus; e Deus não cessa de atrair o homem a Si, e somente em Deus o homem há de encontrar a verdade e a felicidade que não cessa de procurar. (CIC 27) Diante disso, o homem deveria buscar unir-se a Deus, porém, nem sempre isso acontece, embora ele seja, por definição, um ser religioso. O Catecismo continua ensinando: Mas esta união íntima e vital com Deus pode ser esquecida, ignorada e até rejeitada explicitamente pelo homem. Tais atitudes podem ter origens muito diversas: a revolta contra o mal no mundo, a ignorância ou a indiferença religiosas, o mau exemplo dos crentes, as correntes de pensamento hostis à religião, e finalmente essa atitude do homem pecador que, por medo, se esconde diante de Deus e foge diante de seu chamado. (CIC 29) O homem pende para Deus, mas, ao mesmo tempo, existe algo que o impede de chegar até Ele. A lista se encontra na citação acima. Mas, se existem situações que podem afastar o homem de Deus, existem outras que permitem a ele aproximar-se de seu Criador: Criado à imagem de Deus, chamado a conhecer e a amar a Deus, o homem que procura a Deus descobre certas "vias" para aceder ao conhecimento de Deus. Chamamo-las também de "provas da existência de Deus", não no sentido das provas que as ciências naturais buscam, mas no sentido de "argumentos convergentes e convincentes" que permitem chegar a verdadeiras certezas. (CIC 31) Partindo da Criação, as vias para conhecer a Deus são o mundo material e a pessoa humana. Baseado nas cinco vias de Santo Tomás de Aquino tem-se a definição do mundo material: "a partir do movimento e do devir, da contingência, da ordem e da beleza do mundo, pode-se conhecer a Deus como origem e fim do universo" (CIC 31). Desta forma, é possível utilizar o raciocínio humano para se chegar ao conhecimento de Deus. Olhando para a Criação, para as criaturas percebem-se sinais claros da existência de Deus. A segunda via de acesso a Deus é o homem, que percebe a sua própria alma espiritual, sua alma não pode ter origem senão em Deus (CIC 33). O homem seria um animal defeituoso se Deus não existisse, uma vez que para cada desejo do animal existe uma correspondência real, palatável. O homem, porém, tem em seu íntimo – retomando a ideia de Santo Agostinho – o desejo de algo que não está à sua disposição. Esse desejo não encontra correspondência no mundo real, pois o que ele anseia é pelo próprio Deus: o coração do homem permanecerá inquieto até que repouse n´Ele. O homem busca um sentido para a própria vida. Por definição, esse sentido deve estar fora dele mesmo, pois não existe a possibilidade de o sentido da coisa estar dentro dessa mesma coisa. O sentido deve estar além da coisa. Portanto, se existe um sentido para esta vida, deve haver uma além- vida. Só pode estar em Deus, no céu. A busca por esse sentido e, ao mesmo tempo, o fato de que nada nessa vida preenche o vazio existente no coração de todos os homens é sinal também da existência de Deus. O mundo e o homem atestam que não têm em si mesmos nem seu princípio primeiro nem seu fim último, mas que participam do Ser em si, que é sem origem e sem fim. Assim, por estas vias, o homem pode aceder ao conhecimento da existência de uma realidade que é a causa primeira e o fim último de tudo, e que todos chamam Deus. (CIC 34) O homem foi feito para Deus, porém, não terá que encontrar o caminho até Ele sozinho. Deus mesmo quis ajudar o homem a encontrá-Lo e manifestou-Se. O homem, por sua vez, deve responder com a fé, o que será visto com mais profundidade no decorrer das próximas aulas. Fé e razão Existe um equilíbrio bastante grande por parte da Igreja quando se refere à teologia racional, pois, ela não prega o otimismo racionalista e nem o pessimismo fideísta, pelo contrário, encontra o meio-termo entre elas, dizendo que ambas devem caminhar juntas em direção ao Pai. [Para a Igreja a fé e a razão devem andar juntas, esses dois extremos o Concílio Vaticana I rejeita] O Concílio Vaticano I que em 24 de abril de 1870 promulgou a Constituição dogmática Dei Filius sobre a fé católica, ensina: A mesma santa mãe Igreja sustenta e ensina que Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana, a partir das coisas criadas; “pois o invisível dele é divisado, sendo compreendido desde a criação do mundo, por meio dele tudo foi feito”; mas ensina que aprouve à sua misericórdia e bondade revela-se à humanidade a si mesmo e os eternos decretos da sua vontade, por outra via, e esta sobrenatural, conforme diz o Apóstolo: ‘Havendo Deus outrora em muitas ocasiões e de muitos modos faladoaos pais pelos profetas, ultimamente, nestes dias, falou-nos pelo Filho. (DH 3004) A mente humana, portanto, é capaz de conhecer a Deus por meio da criação. Os racionalistas e os fideístas não creem nisso. Foi contra eles que o CVI se manifestou. Os primeiros são aqueles que creem que a razão basta. Os fideístas, ao contrário, creem que somente a fé basta e que a razão não é necessária. A Igreja, por sua vez, crê que fé e razão andam juntas. Mais ainda, crê que uma ilumina a outra. Para os protestantes não é possível conhecer a Deus por meio da criação. O famoso teólogo protestante Karl Barth concluiu em seus estudos que a analogia entis é a razão fundamental pela qual não é possível ser católico. Ele afirmava que quando homem usa a sua racionalidade para conhecer Deus por meio da criação a única coisa que ele é capaz de produzir é um ídolo. Para ele, o único caminho é a analogia fidei, ou seja, a analogia da fé, baseada no fato de que o homem deve ater-se à revelação produzida por Jesus. O Cardeal Ratzinger empenhou-se a vida toda em mostrar que a Igreja não aceita essa oposição entre a fé e a razão, pelo contrário, existe coerência no fato de que ambas conviverem pacificamente. “A fé a razão são como duas asas que nos conduzem no voo em direção a Deus. Se você tem a fé, mas não tem a razão, a fé é cega, mas se tem a razão e não tem a fé, a razão enlouquece”, disse João Paulo II, na Carta Encíclica Fides et Ratio. O pensamento protestante apresenta um erro básico: se é somente por meio da revelação que se chega até Deus, como é que se dá o reconhecimento dessa revelação, uma vez que ela deve obrigatoriamente passar pela mente, deturpada pelo pecado original e é capaz somente de produzir ídolos? De que adianta Deus se revelar em Jesus Cristo de forma extraordinária se não existe uma racionalidade capaz de acolher essa revelação? Portanto, a fé necessita da razão. Por outro lado, é necessário também que a fé esteja ao lado da razão, pois somente a razão enlouquece, pois há de procurar um fundamento para si em si mesma. Impossível. Ainda sobre o conhecimento de Deus, a encíclica "Humanis generis", diz que: Se, portanto, o homem é capaz de chegar a Deus, ele é também capaz de falar de Deus a todos os homens e com todos os homens. "Esta convicção está na base de seu diálogo com as outras religiões, com a filosofia e com as ciências, como também com os não-crentes e os ateus." De fato, as verdades que se referem a Deus e às relações entre os homens e Deus são verdades que transcendem por completo a ordem das coisas sensíveis e, quando entram na prática da vida e a enformam, exigem sacrifício e abnegação própria. Ora, o entendimento humano encontra dificuldades na aquisição de tais verdades, quer pela ação dos sentidos e da imaginação, quer pelas más inclinações nascidas do pecado original. Isso faz com que os homens, em semelhantes questões, facilmente se persuadam de ser falso e duvidoso o que não querem que seja verdadeiro. Por isso deve-se defender que a “revelação” divina é moralmente necessária, para que, no estado atual do gênero humano, todos possam conhecer com facilidade, com firme certeza e sem nenhum erro, as verdades religiosas e morais que não são por si inacessíveis à razão. Ademais, por vezes, pode a mente humana encontrar dificuldades mesmo para formar juízo certo sobre a “credibilidade” da fé católica, não obstantes os múltiplos e admiráveis indícios externos propiciados por Deus para se poder provar certamente, por meio deles, a origem divina da religião cristã, exclusivamente com a luz da razão. Com efeito, o homem, levado por preconceitos ou instigado pelas paixões e pela má vontade, não só pode negar a óbvia existência desses sinais externos, mas também resistir às inspirações sobrenaturais que Deus infunde em nossas almas.” (DH 3875, 3876) Conforme se vê no trecho acima, a Igreja defende o diálogo com religiões não-cristãs, por meio da racionalidade, mas não esconde que há um problema de ordem linguística, pois a linguagem não é capaz de dizer Deus adequadamente, apenas de apontar para Ele. As criaturas apresentam uma certa semelhança com Deus. O homem, por sua vez, é imagem e semelhança de Deus, embora por causa do pecado original, de alguma forma, tenha se tornado somente imagem Dele. A semelhança é readquirida quando aos poucos, por meio da santidade, ele se aproxima do modelo ideal de ser humano criado por Deus, que é o seu filho Jesus. A grandiosidade de Deus é tamanha que o homem precisa constantemente recordar-se de que tem limites por causa do pecado original. Assim, é preciso uma ascese permanente para que o homem possa aproximar-se de Deus, cultivando a virtude da prudência, que é a capacidade de enxergar as coisas sem distorcê-las por causa do desejo ou da repulsa. Por fim, é preciso lembrar que, se existe uma semelhança entre Deus e o homem, maior ainda é a dessemelhança entre ambos: Quando a Verdade reza ao Pai em prol dos seus fieis, dizendo: “Quero, Pai, que eles sejam um em nós, como também nós somos um”, o termo “um” referido aos fieis se deve entender no sentido de união de caridade na graça, enquanto, referido às pessoas divinas, indica a unidade de identidade na natureza, como diz a Verdade em outra passagem: “Sede vós portanto perfeitos como é perfeito o vosso Pai celeste”, como se dissesse mais claramente: “Sede perfeitos” com a perfeição da graça, “como o vosso Pai celeste é perfeito” com a perfeição da natureza, isto é, cada um a seu modo. Pois entre o criador e a criatura não se pode observar tamanha semelhança que não se deva observar diferença maior ainda. (DH 806) Existe, portanto, um equilíbrio bastante grande por parte da Igreja quando se refere à teologia racional, pois, ela não prega o otimismo racionalista e nem o pessimismo fideísta, pelo contrário, encontra o meio-termo entre elas, dizendo que ambas devem caminhar juntas em direção ao Pai.
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