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Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 1/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. Cuidados com a NP no doente desnutrido – Síndrome de realimentação Melina G. Castro 1.0 Introdução A Síndrome de realimentação é complicação que ocorre com a reintrodução da oferta energética após um período de jejum. Caracteriza-se por uma série de mudanças metabólicas e bioquímicas ocasionadas pela reintrodução da oferta energética. Essa resposta metabólica é maléfica ao organismo e pode apresentar- se em grau leve até grave que finaliza com o óbito. Embora a fisiologia e a patofisiologia sejam bem conhecidas, as circunstâncias desencadeantes, as manifestações clínicas e o tratamento são incertos. 2.0 Fisiologia Durante a nutrição em abundância os carboidratos consistem no principal combustível do organismo. A glicose, principal combustível da digestão dos carboidratos é transportada juntamente com o sódio contra o gradiente de concentração. Após este transporte a glicose entra na circulação portal por difusão facilitada e ocasiona um aumento da glicemia plasmática. Este processo leva à liberação da insulina pelas células beta pancreáticas o que fará com que a glicose seja armazenada (glicogênese), a degradação de gordura (lipólise) seja inibida e haja aumento da entrada de potássio no meio intracelular. Quando a capacidade de estoque de glicogênio é excedida, ocorre lipogênese e a glicose é convertida em gordura e estocada no tecido adiposo na forma de triglicerídeo. No jejum, os níveis de glicose começam a cair após 24 a 72 horas. Isto resulta na liberação de glucagon e na redução da secreção de insulina. Os níveis glicêmicos serão mantidos pela degradação do glicogênio (glicogenólise) cujos estoques duram não mais de 72 horas. A homeostasia da glicose é essencial, visto que cérebro, eritrócitos e rins utilizam-na como única fonte energética. Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 2/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. Após o término dos estoques de glicogênio, a demanda por glicose passa a ser suprida pelo processo de neoglicogênese, processo que usa outras fontes, que não carboidratos, para serem metabolizados em glicose. A principal fonte para este processo é a alanina (aminoácido) muscular. Outra fonte que será utilizada será proveniente da oxidação dos ácidos graxos. Resumindo, haverá uma adaptação metabólica do organismo com o intuito de assegurar a sobrevivência diante da escassez de nutrientes, resultando em perda de gordura, proteína e redução dos estoques de potássio, fósforo e magnésio. Os mecanismos de homeostasia manterão os níveis séricos dos eletrólitos (potássio, fósforo e magnésio) em detrimento da reserva intracelular. A reintrodução da dieta após esse período de jejum prolongado resultará numa queda abrupta dos mecanismos de neoglicogenese, mediado pelo aumento da insulina. A insulina promoverá ainda o retorno do potássio, fósforo e magnésio do extra para o intracelular. Como os estoques intracelulares destes eletrólitos encontram-se reduzidos pelo período de privação haverá uma rápida queda dos níveis extracelulares com importante diminuição das suas concentrações séricas. A reativação do metabolismo dos carboidratos necessitará de grande quantidade de tiamina, cofator da glicose nas reações enzimáticas celulares. Assim, as deficiências de potássio, fósforo, magnésio e tiamina poderão ocorrer em vários graus de intensidade dependendo de cada paciente e da sua condição clínica e nutricional. 3.0 População de Risco Os pacientes desnutridos de maneira geral se constituem a principal população de risco para desenvolvimento da Síndrome de Realimentação. A tabela 1 mostra as principais entidades clínicas relacionadas à desnutrição e a síndrome de realimentação. Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 3/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. Tabela1: População de Risco para Síndrome de Realimentação Anorexia nervosa Jejum > 7 dias Pacientes oncológicos Pós-operatório de grandes cirurgias Desnutrição marasmática ou Kwashiokor Pacientes institucionalizados Acidente vascular cerebral Greve de fome Doença inflamatória intestinal Doenças disabsortivas Pancreatite crônica Pós-operatório de cirurgia bariátrica SIDA Diabetes Melito 4.0 Manifestações Clínicas Os sintomas são variáveis e sua aparição imprevisível, podendo aparecer tardiamente ao inicio da realimentação. Os sintomas ocorrem em decorrência da mudança dos níveis séricos dos eletrólitos que contribuem para funções neurológicas, cardíacas e músculo esqueléticas. A variabilidade da clínica depende do tipo e da severidade da alteração bioquímica. Os sintomas mais comuns serão: náuseas, vômitos, letargia, insuficiência respiratória, falência cardíaca, hipotensão, arritimia, delirium, coma e morte. A deterioração clínica pode ocorrer rapidamente se a causa não for diagnosticada e medidas não forem tomadas. A tabela 2 descreve as principais manifestações clínicas e a deficiência à ela associada. Tabela 2: Manifestações Clínicas Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 4/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. Fósforo Cardiovasculares: falência cardíaca, arritimia, hipotensão, choque cardiogênico e morte Renais: necrose tubular aguda e acidose metabólica Músculo-esqueléticas: rabdomiolise, fraqueza, mialgia e fraqueza diafragmática Neurológico: delirium, coma, convulsões e tetania Endócrino: hiperglicemia, resistência insulínica e osteomalácia Hematológico: hemólise, trombocitopenia e disfunção leucocitária Potássio Cardiovascular: hipotensão, arritimias ventriculres, bradicardia e taquicardia Respiratória: hipoventilação, falência respiratória Músculo-esqueléticas: fraqueza, fadiga, caimbras Gastrintestinais: diarréia, náuseas, vômitos, íleo paralítico e constipação Metabólicas: alcalose metabólica Magnésio Cardiovascular: arritimias paroxísticas atriais ou ventriculares Respiratória: hipoventilação, falência respiratória Neuromusculares: fraqueza, fadiga, ataxia, vertigem, parestesia, alucinações, depressão e convulsões Gastrintestinais:diarréia, náuseas, vômitos, dor abdominal, anorexia e constipação Outras: anemia e hipocalcemia Sódio Cardiovascular: falência cardíaca e arritimias Respiratória: edema pulmonar, falência respiratória Renal: falência renal Esqueléticas: edema, fadiga Vitaminas (tiamina) Neurológicas: Síndrome de wernicke-Korsakoff, psicose Cardiovasculares: Insuficiência cardíaca congestiva, beriberi Esqueléticas: fraqueza muscular Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 5/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. 5.0 Tratamento O principio do tratamento está na correção das anormalidades bioquímicas. O tempo ótimo para início das medidas é incerto. Alguns trabalhos defendem que a correção eletrolítica seja feita antes do início da terapia nutricional. Não existem trabalhos randomizados disponíveis que sustem este tipo de recomendação. O sucesso da terapia está na prevenção. Três fatores mostram-se fundamentais: rápida identificação dos pacientes em risco, monitorização bioquímica durante a terapia nutricional e oferta energético protéica adequada e não excessiva. O sucesso da terapia nutricional dos pacientes com risco de desenvolver síndrome de realimentação está na abordagem multidisciplinar incluindo nutricionistas, enfermeiras e médicos. A tabela 3 exemplifica um regime de realimentação para pacientes em risco. Tabela 3: Exemplo de um regime de realimentação parenteral para pacientes em risco de desenvolverem a síndrome da realimentação Dia Ingestão Calórica Suplementação Dia 1 10Kcal/Kg/dia CHO 50 a 60% Gordura 30-40% Proteina 15-20% PO4: 0,5-0,8mmol/Kg/dia K:1-3mmol/Kg/dia Mg: 0,3-0,4mmol/Kg/dia Balanço hídrico zerado Tiamina endovenosa 30 minutos antes de inicio da TN Dias 2-4 Aumento de 5Kcal/Kg/dia Monitorização bioquímica e correção das anormalidades Tiamina endovenosa até o terceiro dia Curso “Princípios da Terapia Nutricional Parenteral no Adulto Hospitalizado” Versão 1.0 6/6 © Ao aluno é permitido fazer uma cópia do material didático disponibilizado para uso próprio. De acordo com a Lei n o . 9.610 de 19/02/1998, que trata de direitos autorais, todo aluno fica proibido de propagar, distribuir e vender o material de qualquer forma, sob pena de responder civil e criminalmente por violação da propriedade material e intelectual. Dias 5-7 20-30Kcal/Kg Monitorização bioquímica e correção das anormalidades Dias 8-10 30Kcal/dia ou alvo calculado Monitorização bioquímica e correção das anormalidades 6.0 Referências Bibliográficas 1. L.U.R Khan, J. Ahmed, S. Khan, J. Macfie, “ Refeeding Syndrome: aliterature review”, Gastroenterology research and practice, vol 2011;2011. pii: 410971 2. Berg JM, Tymoczko JL, Stryer L. Biochemistry. New York, NY, USA: W. H. Freeman; 2002. 3. Mehanna H, Nankivell PC, Moledina J, Travis J. Refeeding syndrome— awareness, prevention and management. Head and Neck Oncology. 2009;1(1):p. 4. 4. Kraft MD, Btaiche IF, Sacks GS. Review of the refeeding syndrome. Nutrition in Clinical Practice.2005;20(6):625–633 5. Holroyde CP, Myers RN, Smink RD. Metabolic response to total parenteral nutrition in cancer patients. Cancer Research. 1977;37(9):3109–3114. 6. Tresley J, Sheean PM. Refeeding syndrome: recognition is the key to prevention and management. Journal of the American Dietetic Association. 2008;108(12):2105–2108.
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