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Curso de Direito de Família, 1ªedição. MALUF, Carlos Alberto Dabus - DO PARENTESCO SOCIOAFETIVO E DA MULTIPARENTALIDADE

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DO PARENTESCO SOCIOAFETIVO
Configura-se o parentesco socioafetivo quando existe afetividade nas relações paterno/materno-filiais mas não há parentesco biológico. Podemos exemplificar com o caso em que o padrasto ou a madrasta, cujo casamento que deu origem ao vínculo de afinidade com o enteado se desfaz, sendo que foi justamente aquele ou aquela quem criou e educou o menor; não obstan- te não se desfaça esse vínculo de afinidade, conforme o art. 1.595, § 2o, do CC, o que já dispunha o art. 335 do Código Civil de 1916, o elo de afetivi- dade se mantém, dando ensejo ao direito à visitação ao menor, bem como ao dever de alimentá-lo. Essas previsões não constavam do nosso ordena- mento jurídico anterior.
Outra hipótese de paternidade socioafetiva é aquela em que o homem registra, como seu, filho de outro homem, casa-se com a mãe da criança ou vive em união estável com ela, criando e educando o filho alheio como se fosse seu. É a chamada adoção à brasileira. Os problemas de ordem técnicavão surgir no momento da dissolução da relação marital ou convivencial, ou mesmo pela morte do homem, quando aquele registro torna-se falso, surgindo a questão de sua anulabilidade, pois um dos requisitos da paternidade socioafetiva é a inexistência de vício de consentimento — erro ou dolo. Em outras palavras, o homem que registra o filho como seu deve ter consciência de que se trata de filho alheio.
Outro requisito é que o pai trate o filho como seu, de modo a assim ser havido em sociedade. São utilizadas as seguintes expressões latinas: tractatus e reputatio, que se configuram na posse do estado de filho. Certamente caberá à jurisprudência firmar o alcance do dispositivo em análise, que, em face da sua abrangência, poderá ser interpretado como fundamento daque- le direito e do referido dever.
Na atualidade, no campo da socioafetividade, tendo em vista que, no caso concreto, muitas vezes não se pode determinar a supremacia da parentalidade – se biológica ou afetiva –, instituiu-se a chamada multiparentalidade, em que coexistiram a paternidade ou maternidade de mais de um genitor.
A FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA
Inegável é, hoje, o reconhecimento de que o afeto, além de ser um sentimento inerente à vida psíquica e moral do ser humano, apresenta também um valor ético e jurídico, ligado intrinsecamente aos princípios constitucionais, notadamente o princípio da dignidade da pessoa humana, presente no art. 1o, III, da CF.
Assim, a filiação vem, na pós-modernidade, fundada no afeto e na vontade, acima dos vínculos biológicos, ou legais.
Desta forma, veio o afeto penetrar definitivamente nas relações familiares.
Aduz Rolf Madaleno que “a filiação socioafetiva é a real paternidade do afeto e da solidariedade: são gestos de amor que registram a colidência de interesses entre o filho registral e o seu pai de afeto”.
A paternidade socioafetiva pode manifestar-se na adoção – também pela adoção homoafetiva e nos estados intersexuais –, na reprodução assis- tida heteróloga, na posse do estado de filho oriundo da adoção à brasileira e pela adoção informal ou de fato, gênese do chamado filho de criação.
No que tange à paternidade e maternidade socioafetivas, dispõe o art. 1.593 do CC que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.
Entende-se que a expressão “outra origem” foi utilizada de maneira inovadora e ampla pelo Código Civil vigente, de modo a abranger outras espécies de parentesco, além do consanguíneo e do civil ou por adoção, antes previstos no Código Civil de 1916 (arts. 330 e 336); pois se a expressão “outra origem” significasse apenas a adoção, o legislador teria repetido a regra do Código revogado.
Dada a pluralidade de formações familiares, esse conceito passou também a compreender a paternidade e a maternidade socioafetivas, cujo vínculo não advém de laço de sangue ou de adoção, mas, sim, de reconhecimento social e afetivo da parentalidade.
No mesmo sentido dispõe o Enunciado n. 256 do CJF, art. 1.593: “A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil”.
Não é incomum depararmo-nos com situação em que um homem registre, como seu, filho que sua esposa ou companheira teve de relacionamento anterior com outro homem, criando e educando o filho alheio como se fosse seu, formando-se assim fortes elos familiares. Pode ocorrer também que esse homem venha a separar-se da mulher, daí, arrependido de ter registrado, como pai, filho que não era seu, já que o afeto terminou pela mãe desse filho, queira também deixar de ser pai.
DA MULTIPARENTALIDADE
A pós-modernidade trouxe consignada a possibilidade da multiparentalidade, tendo em vista a parentalidade socioafetiva.
Entende-se por multiparentalidade a possibilidade de o filho possuir dois pais ou duas mães reconhecidos pelo direito, o biológico e o socioafetivo, tendo em vista a valorização da filiação socioafetiva nos casos especiais já apresentados.
A doutrina vem admitindo, nesse sentido, a possibilidade da multiparentalidade, ou seja, uma pessoa possuir mais de um pai e/ou mais de uma mãe simultaneamente, produzindo efeitos jurídicos em relação a todos eles, ou seja, incide a obrigação alimentar e sucessória entre as partes.
A jurisprudência pátria, no entanto, manifesta-se em face da prevalência, dependendo do caso concreto, de uma forma determinada de filiação: a socioafetiva ou a biológica. Nesse sentido, uma vez reconhecida a filiação socioafetiva, são rompidos os vínculos com o pai biológico, que não é mais ungido à prestação alimentar, à transmissão hereditária frente ao filho biológico, uma vez que este estabeleceu vínculo socioafetivo com outrem, o pai socioafetivo.
Para bem ilustrar a multiparentalidade, citamos o seguinte exemplo: determinada pessoa é registrada por um pai e convive com ele, por anos, como filho biológico, até que, certo dia, a mãe confessa que este não era o seu verdadeiro pai biológico.
O filho em questão tem o direito personalíssimo do conhecimento de sua origem biológica; logo, tem o direito de buscar o reconhecimento legal de seu pai biológico. Por outro lado, não se pode negar o papel assumido pelo pai socioafetivo, uma vez que se estabeleceu um liame de afetividade entre as partes, fruto da convivência paternofilial.
O tema exige acurado exame e muita ponderação, pois traz consignado o inconveniente de abrir sério precedente para o estabelecimento da filiação com o fim único de atender preponderantemente a interesses patrimoniais (muitas vezes escusos).
Nesse sentido, a aplicação regular da norma inspira cuidados, visto que, na prática, a multiparentalidade pode não ser assim tão benéfica, seja à pessoa do filho, seja à própria sociedade, dado que, através desta, poderia o filho pleitear pensão alimentícia de dois pais ou duas mães aumentando os recursos de sua sobrevivência, e também poderia pleitear direitos sucessórios aumentados, tendo em vista a duplicação de genitores. Entretanto, intentando a bilateralidade das ações de família, o filho também teria dever de sustento de um maior número de genitores, os quais poderiam requerer a guarda do filho e ainda teriam direitos sucessórios quando de sua premorte. Além disso, da relação multiparental defluiriam direitos e deveres oriundos da relação parental, como guarda, amparo, administração de bens e demais decisões de ordem pessoal.

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