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1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO A TORTURA E SUAS CONSEQUÊNCIAS , NA PRÁTICA DO CRIME NO DIREITO PENAL BRASILEIRO. ACADEMICO : DANIEL RAMOS DE ALMIRON Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor Eduardo Erivélton Campos ITAJAÍ, SC. Novembro 2009. 2 AGRADECIMENTO A DEUS : “ Bem- aventurados os que têm fome de justiça, porque eles serão fartos”.( Mateus 5:6) Agradeço a Deus pela conquista e realização; por me dar força e coragem para enfrentar cada dificuldade que encontrei durante estes anos que durou o curso. Obrigado Deus pela conquista e realização. Ao companheiro de jornada o Professor Eduardo Erivélton de Campos pela reflexão conjunta, sugestões e revisão crítica, com imensa gratidão pela orientação precisa e confiante, e pela atenção ao trabalho e profundo respeito. AOS AMIGOS E COMPANHEIROS DE TURMA: Compartilhamos momentos fáceis, alegres, tristes e difíceis, mas enfim chegamos ao final deste caminho. Sempre tenham em mente que os campos, as vilas, as cidades; o chão onde pisamos está cheio de trilhos, de ruas, de avenidas: caminhões que vão e vem, levam e trazem nossos passos, mas nós fazemos à direção e inventamos o destino; se encontrarem obstáculos por esse caminho longo, pedregoso, com ramos de espinhos a sua beira, não desanimem e sigam em frente. Espero que vocês não tenham medo do caminho só porque não sabem onde vai chegar, pois a resposta vem a cada passo. 3 DEDICATÓRIA A FAMILIA: As grandes vitórias são a soma das pequenas vitórias do dia-a-dia. Um obrigado especial os meus pais, João e Alda (in memoriam), e minha família que sempre me acompanharam nesta jornada, aconselhando-me a nunca desanimar, confiar em Deus, buscar sempre o meu ideal, ter garra, respeito e compreensão, não se dar por vencido, lutar com humildade; e através da luta e da humildade ultrapassar qualquer barreira e vencer a todos os obstáculos que porventura eu encontrar. A minha esposa Ana Paula, que sempre esteve junto nos momentos mais difíceis e financeiros aonde cheguei a fraquejar pensando em abandonar a faculdade, mas veio com seu ombro amigo e companheiro dando forças para continuar a luta que estou agora vencendo. Para minhas filhas; Julia e Laura, que foi o principal motivo da minha batalha e pensando em dar o melhor pra vocês minhas filhas que as amo, toda vez que pensei em desanimar, busquei em meus pensamentos aquele verdadeiro afeto, para continuar essa árdua e prazerosa luta diária que estou agora concluindo. E aos meus colegas de trabalho, obrigado por terem acreditado em mim, também me apoiaram, incentivando o tempo todo, tirando serviço, e compartilhando com as alegrias e dificuldades que eu encontrei, e assim o meu sonho, esta se realizando, graças à força conjunta de vocês, meus queridos amigos. 4 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. ITAJAÍ, SC, NOVEMBRO DE 2009. DANIEL RAMOS DE ALMIRON Graduando 5 PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando, Daniel Ramos de Almiron, sob o título “A Tortura e suas conseqüências, e a tipificação do crime no Direito Penal ”, foi submetida em 2009 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Eduardo Erivélton de Campos, Professor orientador e Presidente da banca, Professor, Mestre: Emerson de Morais Granado, Examinador, e aprovada com a nota [ ] ([ ]). ITAJAI, 2009. [Professor Eduardo Erivélton de Campos] Orientador e Presidente da Banca 6 SUMÁRIO SUMÁRIO ...........................................................................................7 RESUMO.............................................................................................8 INTRODUÇÃO ..................................................................................10 CAPITULO 1 .....................................................................................17 ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI DE TORTURA...........................17 1.1 FONTES HISTÓRICAS ...............................................................17 1.2 FONTES HISTÓRICAS NO BRASIL...........................................26 1.3 HISTÓRICO DA LEI Nº 9.455/1997 ............................................26 CAPITULO 2 .....................................................................................28 O DELITO DE TORTURA NO DIREITO BRASILEIRO.....................28 2. 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS .....................................................28 2.2 BEM JURÍDICO PROTEGIDO E SUJEITOS DO DELITO ..........33 2.3 A TORTURA E A LEI 9.455/97 ...................................................34 2.4 MÉTODOS DE TORTURAS E SUAS CONSEQÜÊNCIAS .........38 2.4.1 PAU DE ARARA........................................................................42 2.4.2 O CHOQUE ELÉTRICO ...........................................................40 2.4.3 O BANHO CHINÊS OU AFOGAMENTO .................................41 2.4.4 O TELEFONE...........................................................................41 2.4.5 GELADEIRA ............................................................................41 2.4.6 PROCESSO CORCOVADO.....................................................44 2.4.7 SABÃO EM PÓ ........................................................................44 2.4.8 CHURRASQUINHO .................................................................42 2.4.9 ALGEMAS................................................................................44 2.4.10 GINÁSTICA............................................................................44 2.4.11 TENAZES E OUTROS INSTRUMENTOS CORTANTES .......45 2.4.12 INSETOS E ANIMAIS ............................................................45 2.4.13 PRODUTOS QUÍMICOS ........................................................45 2.4.14 LESÕES FÍSICAS..................................................................45 2.4.15 A CADEIRA DO DRAGÃO.....................................................46 2.4.16 PSICOLÓGICA ......................................................................46 2.4.17 SACO PRETO...........................................................................47 7 CAPITULO 3 .....................................................................................44 TIPIFICAÇÃO DOS CRIMES DE TORTURA E SUAS CONSEQÜÊNCIAS................................................................44 3.1 TORTURA PARA OBTER INFORMAÇÃO OU CONFISSÃO....49 3.2 TORTURA PARA A PRÁTICA CRIMINOSA .............................49 3.3 TORTURA EM RAZÃO DE PRECONCEITO RACIAL OU RELIGIOSO .........................................................................47 3.4 TORTURA PRATICADA PELO GARANTE ...............................48 3.5 SUBMISSÃO DE PESSOA PRESA OU SUJEITA A MEDIDA DE SEGURANÇA A SOFRIMENTO ILEGAL ...........................493.6 OMISSÃO CRIMINOSA .............................................................51 3.7 CRIMES COM RESULTADO LESÃO CORPORAL GRAVE, GRAVÍSSIMA OU MORTE .........................................52 3.8 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA...........................................55 3.9 EFEITOS DA CONDENAÇÃO ..................................................56 3.10 VEDAÇÃO DOS BENEFÍCIOS LEGAIS ...................................57 3.11 REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA..................................59 3.12 O PRINCÍPIO DA EXTRATERRITORIALIDADE.......................60 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................61 8 RESUMO O propósito deste estudo foi analisar a tortura e sua evolução histórica, num contexto voltado para os direitos humanos e a sociedade e a relevância do assunto no contexto nacional e internacional. O objetivo foi o de contribuir para a reflexão do tema, a partir de uma nova visão e atitudes pautadas no respeito e na promoção dos direitos humanos. Traçando um paralelo entre a tortura desde o passado até o presente e que ocorre ferindo os direitos e garantias dos povos estabelecidos em acordos internacionais. Para garantir a prevalência da vontade do Estado em preservar o interesse comum e todas as diferenças existentes em sociedade, busca- se a cidadania e respeito à dignidade da pessoa humana, pelos direitos humanos fundamentais e de ordem pública, manifestada no escopo da lei maior; Conseguir mudanças de mentalidade, de modo que o cidadão se sinta protegido, tenha os seus direitos garantidos e seja tratado com a dignidade que merece pela sociedade, norteado pelo ordenamento jurídico brasileiro. O estudo realizado veio a confirmar as hipóteses sendo que, a tortura, mesmo contra a lei, ainda é usada como meio de obter informações e confissões, por isso necessita-se de processo de mudança e revisões políticas, conceituais e de atitudes, para que possa acompanhar a evolução da sociedade; Por fim buscou-se trazer a tona, a doutrina e a Lei, para fazer um paradoxo histórico, visando sempre à obtenção de conhecimento, o que foi de grande valia. É respeitando os tratados internacionais e as garantias constitucionais, que se pode chegar a tão sonhada paz social, aliada ao convívio pacífico entre todos. Palavras-chave: tortura; direitos; consequências . 9 INTRODUÇÃO Esta Monografia tem como escopo principal, estudar a prática da Tortura, o seu surgimento, as formas mais comuns empregadas no inquérito policial, às s modalidades e o seu objeto na atualidade, verificando a eficácia de aplicação da Lei de Tortura e os Direitos Humanos no ordenamento jurídico brasileiro. Os objetivos estão em elaborar um traçado minucioso do tema, por intermédio da análise doutrinária, dos precedentes históricos, dos instrumentos de tortura em si, do bem jurídico protegido, a dignidade da pessoa humana sob a ótica dos Direitos Humanos fundamentais. Apesar de estar em evidência, o assunto é preocupação reinante em todos os grupamentos sociais, desde o mais simples até os mais complexos, estando em pauta à contenção do poderio estatal; e assim, contribuir para a reflexão sobre o tema, a tortura e suas conseqüências, procurando buscar uma nova visão. Identificar os direitos humanos fundamentais previstos na legislação maior do país e que também são previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e os conhecimentos científicos e padrões éticos fundamentais, inerentes aos Direitos Humanos. Para tanto, principia-se no capitulo 1 com os aspectos históricos da lei e da tortura, onde a tortura era vista como meio meramente processual, de “buscar a verdade”, a qualquer custo. A história da civilização demonstra que, para concretizar a tentativa da humanidade coexistir em sociedade, estabeleceram-se leis e regras de conduta para serem seguidas por todos os seres humanos, as quais possuíam destinatários certos e generalizados: as camadas mais baixas e desprovidas de poder social; tais leis, na realidade, se revelam como instrumento para que as classes dominantes atingissem seus objetivos. De tal modo, observa-se que desde o Código de Hamurabi, passando pela Carta de João Sem Terra, em 1215, as Revoluções Americana e Francesa, até a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia da Organização das Nações Unidas, em 1948, um longo trecho foi percorrido, com o objetivo de dar ao ser humano, amplas condições de viver, garantindo e respeitando direitos e, principalmente, visando a sua dignidade de pessoa humana. Assim, neste 10 estudo será abordado o aspecto histórico, vindo desde a Antigüidade até os nossos dias, traçando um panorama geral dos direitos humanos, mostrando que o assunto não é tão atual como pensam algumas pessoas. No capitulo 2 abordou-se o delito de tortura no direito brasileiro onde através da aplicação da tortura, o indivíduo é ultrajado na sua condição humana, tendo que passar pelos mais diversos tormentos, atentando contra sua sanidade física e mental, subjugando assim a sua condição de pessoa humana de direito; abordando os métodos de tortura e suas conseqüências. O Estado brasileiro reconheceu as dificuldades na erradicação da prática da tortura no Brasil, em face da corrupção policial e o abuso de autoridade, que gravitam nos organismos policiais, os quais aplicam a mesma prática em relação às pessoas que se encontram nos ambientes penitenciários, como forma de castigo como medida disciplinar. O capitulo 3 apresenta a tipificação dos crimes de tortura para obter informação ou confissão; para a prática criminosa; a tortura em razão de preconceito racial ou religioso; a tortura praticada pelo garante; a submissão de pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento ilegal; a omissão criminosa; os crimes com resultado de lesão corporal grave, gravíssima ou morte; as causas de aumento de pena; os efeitos da condenação; a vedação dos benefícios legais; o regime de cumprimento da pena; o principio da extraterritorialidade e as conseqüências de cada tipificação perante a lei. O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a prática da Tortura e os Direitos Humanos no ordenamento jurídico brasileiro. Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: 1. Verificar a possibilidade de traçar um paralelo entre a tortura desde os tempos da antiguidade até os tempos atuais, abordando os Paradigmas, que ocorrem na polícia e sociedade, analisando a aplicabilidade dos Direitos nas instituições policiais e sociedade civil. 11 2. Observar se os direitos e garantias de dignidade da pessoa humana, como direito fundamental comum a todos os povos, que são objeto de texto constitucional, da maioria das constituições dos países que ratificaram o texto de coibição à prática de tortura são observados também no Brasil; 3. Preservar o interesse comum, as diferenças sociais, religiosas, culturais, e raciais, manifestada no escopo da lei maior, com dignidade da pessoa humana e os direitos humanos fundamentais de ordem pública buscando a tipificação dos crimes de tortura e as conseqüências para o ser humano. Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação1 foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de Dados o Método Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva. O estudo procurará situar-se no aspecto conceitual, a classificação, a natureza e eficácia, a relatividade e as características da tortura e dos direitoshumanos, como forma de sintetizar e tornar o entendimento simples de uma matéria complexa, o que se pode observar é uma visão estereotipada do assunto. Uma sociedade que tem a necessidade de mudanças, para acompanhamento da evolução contemporânea, transpor a barreira dos antigos paradigmas é de suma importância. Portanto, um tema de grande significado onde será situada a problemática dos paradigmas, sua influência nas organizações, como quebrá-los e caminhar a passo firme em direção ao crescimento. 1 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101. 2 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa jurídica. p. 104. 3 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22- 26. 12 O presente estudo justifica-se pelo reconhecimento e o respeito à dignidade inerente a todo ser humano e aos seus direitos iguais e inalienáveis que constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz em todo mundo. O desconhecimento e o desrespeito a tais direitos conduziram a atos bárbaros que revoltaram a consciência da humanidade e provocaram o advento de novas leis, com o objetivo de garantir a todos os homens, a liberdade de expressão, de manifestação, de crença, de locomoção e, principalmente, com a miséria, com a tirania e com os extermínios individuais ou em massa. Com esta nova visão, os brasileiros tiveram elencados, em várias legislações, os seus direitos e garantias individuais e coletivas, buscando criar condições que permitissem a cada um gozar a plenitude de seus direitos econômicos, políticos, sociais e culturais. Não obstante as conseqüências do fortalecimento democrático e dos ideais explicitados na Carta Magna, o crescimento da criminalidade mundial, a necessidade do reconhecimento do Brasil como país protetor dos interesses sociais de seu povo e a pressão dos organismos internacionais que tratam de questões humanitárias, também levaram e forçaram o país a adotar uma política de proteção dos direitos e da dignidade da pessoa humana, e, neste contexto, faz-se necessário reforçar e difundir a todos as noções básicas e elementares de proteção e respeito aos seres humanos. A metodologia será conduzida através de pesquisa bibliográfica, tendo por objetivo conhecer as diferentes contribuições científicas disponíveis sobre determinado tema. Buscou-se mediante pesquisa qualitativa, bibliográfica junto com Triviños17 (1995, p. 129) idéia de que: A pesquisa qualitativa parte também da descrição que intenta captar, não só a aparência do fenômeno, como também sua essência. Busca, porém, as causas da existência dele, procurando explicar sua origem, suas relações, suas mudanças e se esforça por instruir as conseqüências que terão para a vida humana. Por ser de natureza teórica, a pesquisa bibliográfica é parte obrigatória de outros tipos de pesquisa e é por meio dela que se toma conhecimento de produção existente e a atualização do pesquisador é constante. O domínio dos autores pode ajudar na sua criatividade, porque, por meio deles, chega-se, a saber, o que se 13 produziu de importante sobre o objeto de estudo e os avanços realizados a respeito dele. É importante saber que a pesquisa bibliográfica abrange toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, entre outros. O suporte à pesquisa bibliográfica está em Gil (1994, p.48), como instrumento cientifico para a prática desenvolvida. Segundo o autor, “a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir do material já elaborado, constituindo-se principalmente por livros e artigos científicos”. Portanto, ela dá suporte a todas as fases de qualquer tipo de pesquisa, uma vez que auxilia na definição do problema, na determinação dos objetivos, na construção de hipóteses, na fundamentação da justificativa da escolha do tema e na elaboração do relatório final. A pesquisa bibliográfica aplica-se a uma busca de novos conhecimentos e de algum conhecimento pré-existente. Sendo um dos instrumentos para levantamento de dados que permite um diagnóstico com maior precisão, realizado através de consulta a todo tipo de material escrito. É basicamente um processo de aprendizagem tanto do indivíduo que a realiza quanto da sociedade na qual esta se desenvolve, onde será mostrado como é a situação da aplicação dos Direitos. A rapidez no trabalho, necessidade de aprimoramento, valoração dos direitos humanos dentro do âmbito social, entre outras exigências desta sociedade pós- industrial e tecnológica, gerou um novo código de valores que permeou e permeia o comportamento social. O estudo em pauta foi desenvolvido seguindo as seguintes etapas: 1ª definição da temática e a busca de materiais científicos que dessem o aporte necessário ao estudo, e o tipo de pesquisa a ser feita. 2ª etapa foi à escolha dos autores que seriam a base do trabalho, e mediante a visão destes, elaborar a embasamento teórico. 3ª etapa fazer as conclusões do trabalho, após o estudo realizado através dos autores. Portanto, fará um paralelo entre a tortura e suas conseqüências. 14 CAPITULO 1 ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI DE TORTURA 1.1 FONTES HISTÓRICAS Neste caminhar da humanidade, as fontes bibliográficas servem para possibilitar a compreensão dos motivos pelos quais determinadas práticas que em determinado momento eram lícitas, institucionalizadas, com a evolução das sociedades passaram a ser ilícitas e criminalizadas como a tortura. “A tortura, forma de violência, parece ter se entranhado no homem ao primeiro sinal de inteligência deste. Só o ser humano é capaz de prolongar o sofrimento de animal da mesma espécie. Os serem Inferiores ferem ou matam a caça.”4 A tortura acompanha o homem desde os seus primórdios, e não o abandonou em momento algum durante sua evolução histórica, poderá perceber que até os dias atuais se tem notícia da prática da tortura, quer seja no âmbito do interrogatório no interior de nossas delegacias, quer no âmbito do Poder Paralelo criado pelo narcotráfico, onde o chefe do bando criminoso instituiu a pratica da tortura tanto como forma de punição quanto de coerção para bandos rivais. “Assim, longe de ser uma conduta ignóbil de nossos antepassados, a tortura continua viva no relacionamento poder político-cidadão, merecendo postura enérgica das instituições estatais, no sentido de ao menos atenuá-la, já que o desejo do homem de oprimir seu semelhante é um mal que sempre acompanhará a raça humana.”5 4 FERNANDES, Paulo Sérgio Leite. Aspectos jurídicos-penais da tortura/Paulo Sérgio Leite Fernandes, Ana Maria Bebette Bajer Fernandes. Belo Horizonte: Nova Alvorada Edições Ltda., 1996. 5 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura. São Paulo, RT, 2002. p. 9. 15 A tortura, ainda quando não aparente, é sempre uma violência; como os tratamentos psiquiátricos, o silêncio, e a tortura não estão presentes só na violência física, mas também na violência psíquica, que é a coação. “Agregue-se, contudo, que a tortura, por representar um gravíssimo atentado à dignidade humana, passou a ter uma dimensão internacional, de forma que o interesse nasua repressão atingiu um interesse supranacional, [...]”.6 A tortura é um ato repugnante que atenta a dignidade humana que não é mais aceito na sociedade e tão pouco por defensores dos direitos fundamentais e humanos “Soljenitsin observa que, de todas as formas de opressão, a prática da tortura é a que mais fundo procura a desintegração da liberdade, marco fundamental do ser humano” 7. O assalto à intimidade do indivíduo, desnudando-o até a degradação, ao lado dos inventos que acabam por lograr o domínio absoluto sobre a vida. Como querem uma confissão, os torturadores tentam evitar a morte da vítima, mas trabalham nos limites. Enquanto houver um sopro de vida no corpo do torturado, o pau canta. Descuidos, como o de Fortaleza, são tidos como acidentes de trabalho. Um caso horroroso, mas exemplar sobre os limites, ocorreu há dois anos com a dona de um salão de beleza do Distrito Federal, a cabeleireira Ildecy Pereira dos Santos, de 37 anos. Foi o pior dia de sua vida. A tortura a que foi submetida fez com que perdesse a vesícula, ainda tem marcas das auto-unhadas que deu no corpo, provocadas pelas descargas elétricas, e só dorme à base de Lexotan. Acusada de pertencer a uma quadrilha de ladrões de carros, Ildecy foi levada para a 13ª delegacia da cidade, onde foi torturada por quatro homens. O primeiro soco levou no nariz, depois de negar que integrasse qualquer quadrilha. “Confessa logo, sua vagabunda!”, ameaçou outro agente da lei, em tom mais ameaçador que o primeiro. Depois de uma pancadaria intensa, Ildecy desmaiou pela primeira vez. Voltou a si com um balde de água que lhe atiraram sobre o corpo. Obrigada a tirar os sapatos a ficar sobre uma poça de água, foi submetida a uma sessão de choques que provocou seguidos desmaios. A cada descarga, uma pergunta. O sangue, que jorrava até então pelo nariz, passou a escorrer também pelo ouvido. A última descarga foi tão forte que seu corpo deixou o chão. Quando caiu, vomitava. Ao ser acordada novamente com água, um dos torturadores retirou cinco das seis balas de um revólver, encostou o cano em sua cabeça e acionou o gatilho pela primeira vez. “E aí, vai falar ou prefere morrer?” Ildecy já não falava direito, apenas balbuciava. O policial disparou um segunda vez. Como ela nada dizia, levou chute nas costas e desmaiou de novo. 6 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 9. 7 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análose da Lei nº 9.455/97. Campinas: Romana, 2004. p. 19. 16 Ao acordar,. Foi colocada no pau-de-arara e lá ficou levando chutes e pancadas nas costas, até desmaiar mais uma vez. No final da tarde, quando acordou pela última vez, estava com a camisa e a calça totalmente ensangüentadas, sentia dores horríveis no corpo e tremia de febre. Sentiu que algo fora enfiado e retirado de seu ânus, que sangrava. Tentou levantar-se, mas não conseguiu. A sala cheirava a urina, pois os choques e a dor provocaram a incontinência. Numa última tentativa de faze-la falar, os agentes ameaçaram pegar seus três filhos, todos menores. “Vamos transformar as meninas em prostitutas e o garoto em v...” Ildecy deu-se por vencida. “Faço o que quiserem.” Os policiais apresentaram um depoimento por escrito e ela assinou. Trabalho encerrado. Deram-lhe um copo d´água, uma Novalgina para a febre e foram embora. Um dos algozes entrou na sala e comentou: “É hora de tomar banho, sua imunda!”8 É uma crueldade consagrada pelo uso na maioria dos governos aplicar a tortura a um acusado enquanto se faz o processo, quer para arrancar dele a confissão do crime, quer para esclarecer as condições em que ocorreram os fatos, quer para descobrir os cúmplices ou outros crimes de que não é acusado, mas dos quais poderia ser culpado, quer enfim porque sofistas incompreensíveis pretenderam que a tortura purgasse a infâmia. A tortura com maior freqüência, está ligada a detenção e processos criminais, o que estabelece um elo entre a condenação da tortura, a defesa das liberdades individuais e o direito a um julgamento justo. Portanto essa barbárie, própria dos inquéritos medievais, de submeter o suposto autor de um fato delituoso ao suplício, para confessar o crime, ou como forma de expiação, ainda é comum no cotidiano policial. ”Desde a pré-história da humanidade, o homem passou a viver em grupos e, em decorrência da sua própria evolução natural, regras de condutas foram surgindo e sendo impostas por estas sociedades primitivas, visando à própria sobrevivência da espécie.” 9 Relatam as Escrituras Sagradas (Gen, 2,15-17) que Deus, ao criar o homem, o colocou no Éden para vigiá-lo e guardá-lo, dando-lhe este preceito: “Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim, mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal, porque no dia em que comeres, morrerás indubitavelmente” 10. 8 Revista Veja. V. 28, nº 44, p. 28-35, 1º nov, 1995. 9 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 13. 10 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura: Comentários a Lei 9455/97. Brasília Jurídica, 1997, p. 15. 17 Surge daí, sob a visão histórica religiosa, o primeiro preceito a ser observado e a primeira sanção cominada: a pena de morte. O Jurista Mauro Faria Lima, em sua obra Tratamento do Injusto Penal da Tortura, traz que os relatos antropológicos revelam que o homem primitivo vivia em pequenos grupos, com laços muito fortes entre os seus componentes, já que era impossível a vida fora dele, em face dos perigos reais e imaginários. De entes sobrenaturais, que não apenas protegia, como igualmente castigavam o grupo, dependendo do comportamento dos seus membros.11 Nos grupos sociais dessa era, envoltos em ambiente mágico (vedas) e religioso, a peste, a seca e todos os fenômenos naturais maléficos eram tidos como resultantes de forças divinas (totem) encolerizadas pela prática de fatos que exigiam reparação. “Para aplacar a ira dos deuses, criaram-se proibições (religiosas, sociais e políticas) conhecidas como “tabu”, que não obedecidas acarretavam castigo”.12 “Assim, pode-se afirmar que as primeiras proibições e castigos advieram das relações totêmicas”.13 As ofensas ao totem ou as condutas que se consubstanciavam em desobediência ao tabu eram severamente punidas, geralmente com a morte, cujos castigos eram determinados pelo chefe do grupo, que, também era o chefe religioso. “A execução da reprimenda em alguns povos era, de regra, coletiva, sendo que a lapidação [...]”14 foi uma das mais antigas formas de execução coletiva. Por volta do ano 2.000 a.C. surge a primeira fórmula de justiça penal, a Lei de Talião, que penetrou todas as leis antigas, com reflexões até nas leis penais contemporâneas. Assim sua fórmula é encontrada no Código de Hamurabi (séc. XVII a.C.), no livro do êxodo, Levítico e até no Código Espanhol de 1870. Apesar da severidade das reprimendas o Talião de inicio representou grande avanço: limitava a reação do ofendido: “alma por alma, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, chaga por chaga, equimose por equimose”, criando o critério da proporcionalidade. “Mesmo sendo um 11 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 13. 12 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura: Comentários a Lei 9455/97. Brasília Jurídica, 1997, p. 15 13 PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na Atualidade. São Paulo: RT, 1993, p. 118. 14 A lapidação consistia na execução do condenado, através de pedradas desferidas pelos integrantes da comunidade atingida pela conduta ofensiva. Ensina, aliás,Hans Von Henting que a pedra foi a primeira arma do homem (La pena, p.390) 18 avanço, ainda que uma barbárie, uma vingança, sendo que esta idéia de vindita perdurou durante toda a Antiguidade, Idade Média e Moderna”.15 Na antiguidade, além do Código de Hamurabi, rei da Babilônia e das Leis Mosaicas dos Hebreus, evoluindo-se com o Talmud, que substitui a pena de Talião pela multa, prisão e imposição de gravames físicos; merecem atenção especial as legislações penais, Grega e Romana. Apesar das revelações e estudos dos antropológicos sobre o antigo Egito revelar o encontro de pinturas denotando recebedores de impostos agredindo camponeses, com golpes desferidos nas plantas dos pés, com o propósito de que lhes revelassem onde ocultaram os seus armazéns de grãos, ensina-se que o povo grego foi o primeiro a utilizar a tortura sistematicamente na instrução criminal, como meio de prova, e se destinava como regra, aos escravos, em face da concepção de que a dor por eles sentida substituía o juramento que os seus senhores prestavam de dizer a verdade. “Os homens livres não eram submetidos à tortura, salvo se fossem estrangeiros ou metecos”.16 No que tange à tortura perpetrada em relação aos escravos, é de se admirar que um povo, onde se sedimentou o berço da filosofia, tratasse o testemunho desses com extrema irracionalidade, negando-lhes a fé judicial, salvo se fossem submetidos a tormentos. “Afirma Demóstenes que o testemunho do escravo, obtido em tal condição, se revestia de maior credibilidade do que aquele prestado pelo homem livre, sem nenhuma coação”.17 No Direito Grego, Platão proclamava para não castigar porque alguém tenha delinqüido, senão para que ninguém delinqüa. As penas visavam a intimidação, retribuição e expiação. Hisias exortava os juizes a castigar severamente os infratores. Demóstenes e Licurgo propunham o castigo a delinqüentes como forma de educação da juventude. Em Roma nos primeiros tempos, o povo romano também era influenciado por dogmas religiosos, portanto quaisquer condutas que atentassem contra os ditames religiosos, constituíam num atentado contra os deuses. 15 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 16. 16 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 18. 17 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 19. 19 Com o advento da República em 509 a.C., houve grandes evoluções das fases de vingança, por meio de Talião e da composição, bem como da vingança divina na época da realeza, direito e religião separaram-se. O direito privado atingiu as culminâncias, sendo base do Direito Moderno, contribuindo para a evolução do Direito Penal com a criação de princípios penais sobre o erro, culpa, dolo, imputabilidade, coação irresistível, agravantes e atenuantes, legitima defesa. A sociedade romana era dividida em classes sociais: plebeus, clientes e patrícios, e tinham as sanções penais aplicadas de acordo com a classe social do agente. Os plebeus recebiam os castigos mais atrozes. Na lex Duodecim Tabularum, punia-se a prática de feitiçaria com a morte, a pilhagem das plantações com o enforcamento se o autor fosse púbere e flagelo se fosse impúbere, o incêndio era punido com a morte, após o autor ser amarrado e açoitado. No furtum manifestum, o ladrão podia ser diretamente punido pela vítima, sendo inclusive morto sem qualquer formalidade, e quem prestasse juramento falso era precipitado na rocha Torpéia. “A penalidade aplicada ao homicídio era rigorosa, sendo o autor morto com varas (cogliolo)”.18 No século II a.C., Roma se dividiu em dois grupos: democratas e aristocratas. Foi o início do que, posteriormente, se denominaria Democracia e Ditadura, sendo, na última, desenvolvida a tortura política. Em um processo lento e gradual, a Igreja tornou-se um poder Incontrastável durante a alta Idade Média – séculos X, XI e XII – passando o Direito Canônico a reger todas as relações jurídicas então existentes. A tortura foi amplamente utilizada da Idade das Trevas (1200 a 1800 d.C., aproximadamente), nos chamados Tribunais Eclesiásticos da Inquisição, para Obtenção da confissão de um herege. Nessa época, a confissão do réu era considerada como a rainha das provas, a probatio probatissima, e, para alcançar essa prova, recorria-se à tortura. Destarte, o réu era transformado em juiz da própria causa, resistindo aos tormentos para salvar-se ou a eles cedendo, para perder- se.19 18 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 37. 19 SILVA, José Geraldo, Genofre Fabiano, e Lavorenti Wilson da. Leis penais especiais anotadas/. Campinas: Millenium, 2002. 20 Ressalte-se que a tortura naquela época era utilizada somente como meio processual e não como aplicação da pena, sendo a tortura um mero paliativo quando da ausência de provas. Ainda no direito canônico, registre-se que a palavra Inquisição era denominativa de inquérito judiciário, sendo sua destinação a apuração com rigor dos fatos tidos como criminosos. No entanto esta denominação foi perdendo força ao seu enfoque originário, tendo como finalidade de definir o Tribunal do Santo Oficio, não só porque este auto proclamava-se como Inquisição, mas também pelo fato da conotação dada pelos seus opositores, passando a palavra Inquisição a ser denotada como: abuso, tirania e investigação arbitrária. O processo inquisitivo, de maneira geral, adotava o seguinte procedimento: inicialmente, o juiz determinava ao seu escrivão que se instaurasse o feito, por inquisição, com o propósito de esclarecer a prática delitiva de que se tinha conhecimento. A seguir, passava-se à fase de informação sumária, onde o juiz procedia às primeiras diligências e, caso tal investigação chegasse a algum suspeito, e, via de regra, havia, sempre, um acusado, sobre quem recaía a imputação, determinava o seu encarceramento e, com freqüência, tornava indisponíveis seus bens, sendo oportuno ressaltar-se que, até a presente fase, o procedimento se perfazia de maneira secreta, de modo que não de dava ciência ao acusado do motivo que ensejou a sua prisão cautelar. Suplantada tal fase, o juiz inquisidor continuava com a persecução penal, buscando, agora, provas para a incriminação do réu, através da prova oral e da própria confissão do acusado, recebendo os nomes das testemunhas, para que, eventualmente, pudesse refuta-las. Na fase final, dava-se publicidade do depoimento e das demais provas, quando então, se procedia tanto à acusação formal, que, geralmente, era feita pelo Promotor fiscal, quanto à defesa elaborada pelo advogado do réu. Por último, caso fosse necessário, prolatava-se a sentença de inflição de tormento, com o intuito de se alcançar a confissão do acusado, ou se pronunciava a sentença definitiva, quase sempre condenatória20. Na região da Valáquia, Sul da Romênia, nos idos do século XV, Vlad Tepes, consagrado como Drácula, pelo cinema e literatura de ficção, era, reconhecidamente, tido como símbolo das forças do mal e da tortura. Tinha como método de aplicação o empalamento, que consistia em introduzir um ferro no ânus ou no umbigo, até que saísse pela boca da vítima. A tortura como meio meramente processual, de “buscar a verdade”, a qualquer custo, mesmo que essa verdade fosse meramente um meio de se achar um culpado para determinado delito, com a transição histórica da Idade Média para a Idade Moderna, nos governos absolutistas, onde a finalidade dos tormentos 20 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 66. 21 passou a ser uma forma de garantia da segurança ao Estado, diminuindo ainda mais as garantias ofertadas ao cidadão. Desta forma,os atos processuais no processo inquisitivo, eram todos realizados de forma secreta, sem que o acusado tomasse conhecimento da acusação que lhe era imposta, também não era concedido ao acusado um Advogado, para tomar conhecimento da acusação, nem para elaborar sua defesa. Aos cidadãos da época, não era assegurado qualquer Princípio Geral de Direito, como, por exemplo, o Direito a Vida, ficando a livre vontade do judiciário a aplicação da pena de morte, bem como a aquisição das provas no decorrer do processo. “Este direito penal, pródigo na cominação da pena de morte, executada pelas formas mais cruéis (fogueira, afogamento, soterramento, enforcamento, etc) visava especificamente a intimidação. O arbítrio judiciário, todavia, cria em torno da justiça penal uma Atmosfera de incerteza, insegurança e verdadeiro terror”21 “Essa busca da verdade, que consistia, na prática, em obter-se a confissão do acusado, desenvolvia-se num cenário propício a inflição dos tormentos, posto que, sob o corpo do supliciado, plasmava o cerimonial judiciário, que tinha, por escopo, “trazer à luz a verdade do crime”22. Por essa razão, ensina-se que, para a Justiça Criminal da época, a culpa não começava uma vez que reunidas todas as provas; peça por peça, ela era constituída por cada um dos elementos que permitiam reconhecer um culpado. Assim, uma meia prova não deixaria inocente o suspeito, enquanto não fosse completada; fazia dele um meio culpado. Sendo assim, essa insegurança vivida pelos cidadãos da época era reflexo, da imperfeição do procedimento criminal, destinado a apuração dos fatos relacionados à prática delituosa, vez que a culpa era incidida sobre um acusado, mesmo que não se tivessem todas as provas, mas um pequeno indicio de prova já era suficiente para manchar uma pessoa com a atribuição de meio culpado. Jurista e Filósofo, Cesare Beccaria escreveu a obra “dei delitti e delle pene” (Dos delitos e das penas), publicada em 1764, com nítida influência dos iluministas franceses Voltaire, Rosseau e Montesquieu. Sua obra assenta-se principalmente do 21 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. p. 39. 22 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 75. 22 “Contrato Social” de Rosseau e de início chama a atenção para que as vantagens sociais devam ser igualmente distribuídas, ao contrário do que sucedia. Em sua obra, Beccaria dedica um capítulo à tortura (Capítulo XV) que é um libelo contra as atrocidades da época: É uma barbárie consagrada pelo uso na maioria dos governos aplicar a tortura a um acusado enquanto se faz o processo, quer para arrancar dele a confissão do crime, quer para esclarecer as contradições em que caiu, quer para descobrir os cúmplices ou outros crimes de que não é acusado, mas dos quais poderia ser culpado, que enfim porque sofistas incompreensíveis pretenderam que a tortura purgava a infâmia.23 Continua Beccaria: “A tortura é muitas vezes um meio seguro de condenar o inocente fraco e de absolver o celerado robusto. De dois homens, igualmente inocentes ou igualmente culpados, aquele que for mais corajoso será absolvido”24 “As idéias de Beccaria deram início ao Direito Penal moderno com as concepções penais que seriam as pilastras da chamada Escola Clássica”25. A tortura foi oficialmente abolida na Europa entre 1750 e 1830, assim como a escravidão, sob a influência humanista e racionalista do iluminismo. “Formalmente extinta, a tortura entra no século XX em sua terceira fase, do apogeu extra-oficial ou clandestino. A partir da Primeira Guerra Mundial, as atrocidades contra prisioneiros políticos assumem proporções epidêmicas, eclipsando os maus-tratos rotineiramente dispensados aos presos “comuns”26. Não se pode deixar de ressaltar que a tortura foi largamente aplicada, apesar de forma semiclandestina, pelos nazistas na Alemanha e pelos Stanilistas na antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), como instrumento repressivo do Estado contra os “inimigos do povo”, ou seja, os opositores do regime por motivos políticos, étnicos ou religiosos. Utilizada em massa para obter confissões ou denúncias de terceiros, a tortura também se tornou um instrumento de intimidação e neutralização dos opositores. Das páginas da história, podem-se extrair, ainda, como momentos em que a prática da tortura era sistemática, os episódios da independência dos Estados 23 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. Biblioteca Clássica. Volume XXII. 6ª Ed. Atena. São Paulo. 24 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. 25 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 20. 26 MATTOSO, Glauco. O que é tortura. São Paulo: Nova Cultura: Brasiliense, 1986. p. 50. 23 Unidos, quando foram redigidas as Declarações do Homem e da Independência (1776), por Thomas Jefferson. Vale destacar, também, a queda da Bastilha, na Revolução Francesa (1789), símbolo do autoritarismo do governo e, ainda na Europa, as revoluções de 1830 e 1848 (contrapondo-se nacionalismo, liberalismo e socialismo). Já nos Estados Unidos, podemos apontar a Guerra de Sucessão (1861 – 1865); no extremo oriente, os conflitos sino-japoneses e, finalmente, na América Latina, os processos de suas independências. O exame da história nos leva a duas conclusões elementares: uma a de que ninguém, ou nenhum regime político pode se arrogar a pretensão de ter abolido a tortura, mesmo a “oficial” quanto mais a clandestina. A outra conclusão é a de que ninguém, ou nenhum país pode se gabar a invenção de qualquer método que já não tenha sido experimentado ou aperfeiçoado ontem, por outrem, alhures27. Ressalte-se ainda, que a abolição da tortura e dos suplícios inerentes às penas atrozes até então existentes, não foi em decorrência de uma filosofia meramente humanitária, mas também de uma nova estratégia para o poder de punir, passando assim, a não punir menos, mas punir melhor, atenuando talvez a forma de punição, para punir com maior universalidade. 1.2 FONTES HISTÓRICAS NO BRASIL Em seu Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT28, o Brasil aponta o fato de o processo civilizatório ter se originado a partir da colonização portuguesa como sendo a raiz da prática de tratamentos desumanos, degradantes e cruéis, e também da prática da tortura. Lembra que as Ordenações do Reino, que tiveram força normativa no Brasil Colônia, tinham nas penas corporais seu principal instrumento de punição dos mais diversos tipos de delito. Certamente isto foi de enorme importância. Mas é preciso acrescentar o próprio componente da estrutura econômica, de formação do Estado brasileiro. Para se compreender o uso atual da tortura, como forma de aplicação de castigo, ou para obter confissões de práticas de delitos muitas vezes de pouco 27 MATTOSO, Glauco. O que é tortura, p. 52. 28 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT. Ministério da Justiça, 2000. 24 potencial ofensivo, e no mais das vezes delitos contra o patrimônio, é importante realçar a origem patrimonialista do processo de colonização, quando a Coroa Portuguesa confiou a empreendedores privados a exploração de capitanias hereditárias, em que os donatários também tinham "direito à designação de capitães e governadores". Ainda, o rei, no domínio da administração da justiça, isentou "as instituições brasileiras de correição e alçada, conferiu ao capitão-governador competência para nomear o ouvidor, o meirinho, os escrivães e os tabeliães, bem assim como a faculdade de vetar os juízes ordinários eleitos pelos homens bons". Também fora delegado aos capitães-governadores "todajurisdição cível e crime, incluindo a alta justiça (pena de morte e talhamento de membro), relacionada com os peões, índios e escravos".29 As empresas econômicas, de brancos portugueses, tinham poder de vida e de morte sobre os africanos - considerados mercadorias - e os índios - considerados selvagens, muitas vezes equiparados às feras, animais sem alma. Lembra o Relatório, que a estrutura econômica da colônia foi fundada na mão-de-obra escrava, indígena, e principalmente africana. "Os negros foram trazidos da África do século XVI ao XIX. A condição de escravos na qual viriam significava uma constante possibilidade de um tratamento violento da parte do senhor.”30 À penúria das condições de vida e trabalho a que eram submetidos juntava-se a possibilidade de o senhor, ao seu arbítrio, impor os castigos que quisesse ao escravo. “Privações, açoites, mutilações, palmatoadas, humilhações diversas foram práticas comuns nas casas e fazendas dos senhores donos de escravos durante toda a vida da colônia”. 31 Extraordinário estudo do historiador Luiz Felipe de Alencastro descreve o fenômeno de desenraizamento dos negros africanos, provocando sua dessocialização - quando capturados eram apartados de suas comunidades nativas -, e despersonalização - quando foram convertidos em mercadoria. E narra como se dava a nova 'socialização': "desembarcado nos postos da América portuguesa, mais uma vez submetido à venda, o africano costumava ser surrado ao chegar à fazenda. 29 COUTO, Jorge [1998]: A Construção do Brasil. Lisboa: Edição Cosmos. Pág. 223. 30 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT. Ministério da Justiça, 2000, p. 13/14. 31 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT, p. 13/14. 25 "A primeira hospedagem que [os senhores] lhes fazem [aos escravos], logo que comprados aparecem na sua presença, é mandá-los açoitar rigorosamente, sem mais causa que a vontade própria de o fazer assim, e disso mesmo se jactam [...] como inculcando-lhes, que só eles [os senhores] nasceram para competentemente dominar escravos, e serem eles temidos e respeitados". Tal é o testemunho do padre e jurista Ribeiro Rocha, morador da Bahia, no seu tratado sobre a escravatura no Brasil, publicado em meados do século XVIII. Cem anos mais tarde, o viajante francês Adolphe d'Assier confirmava a prática de espancar os escravos logo de entrada, para ressocializá-los no contexto da opressão nas fazendas e engenhos do Império. Acrescente-se que, mesmo no Brasil Império, com a elaboração da Constituição Política do Império, de 1824, onde se aboliram “os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas cruéis” (art. 179, XIX), se continuou a supliciar os escravos. Assim, o código Criminal do Império de 1830, esculpido sob o espírito liberal, dispunha, no seu artigo 60, que, quando se tratasse de acusado escravo e que incorresse em pena que não fosse a de morte ou galés, deveria receber a reprimenda de açoites e, após entregue ao seu proprietário, para que este inserisse um ferro em seu pescoço pelo tempo que o juiz determinasse.32 Método de terror luso-brasílico, e mais tarde autenticamente nacional, brasileiro, o choque do bárbaro arbítrio do senhor - visando demonstrar ao recém- chegado seu novo estatuto subumano - voltou a ser praticado durante a ditadura de 1964-1985. Instruídos pela longa experiência escravocrata, os torturadores do DOI- CODI e da Operação Bandeirantes também faziam uso repentino da surra, à entrada das delegacias e das casernas, para desumanizar e aterrorizar os suspeitos de 'subversão'. 33 O dado histórico, portanto, é que os detentores do poder econômico, e também os detentores do poder político, utilizavam-se da violência contra os despossuídos: índios, negros, pobres em geral, como modo de garantir controle social, como intimidação, castigo, ou mero capricho. “[...] com o advento do Estado Novo, o denominado período Getuliano, iniciado em 1937, o Brasil vivenciou um ditadura que espargiu o terror e edificou a barbárie em todo o seu território, suprimindo todas as garantias individuais, fechando 32 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 151/152. 33 Alencastro, Luiz Felipe de: O Trato dos Viventes. São Paulo: Cia. Das Letras. 2000. pág. 148. 26 o parlamento federal, estadual e municipal. [...]”34 Estabelecendo ainda, acentuada censura contra os órgãos de imprensa, fortalecendo acentuadamente os órgãos de polícias, destinados a repressão política e social. O Brasil vivenciou de Março de 1964 a Março de 1985 o regime militar, grande parte do qual caracterizado por ser um "regime de exceção". Instalado pela força das armas, o regime militar derrubou um presidente civil e interveio na sociedade civil. Usou de instrumentos jurídicos intitulados "atos institucionais", através dos quais procurou-se legalizar e legitimar o novo regime. A sombra mais negra veio com a prática disseminada da tortura, utilizada como instrumento político para arrancar informações e confissões de estudantes, jornalistas, políticos, advogados, cidadãos, enfim, todos que ousavam discordar do regime de força então vigente. A praga a ser vencida, na ótica dos militares, era o comunismo, e subversivos seriam todos os que ousassem discordar. Foi mais intensamente aplicada de 1968 a 1973 sem, contudo, deixar de estar presente em outros momentos. A ditadura não inventou a tortura, mas exacerbou-a. E adotou essa prática de modo intenso, "aprimorando" os mecanismos já utilizados nos períodos anteriores à sua instalação. Com a redemocratização, consagrada na Constituição de 1988, como seu documento político, o povo brasileiro cuidou de explicitar como desejaria se ver organizado em um Estado Democrático de Direito. Por isso se tem uma Constituição onde os direitos e garantias fundamentais principiam o texto constitucional, e são detalhados e extensos: para serem conhecidos; para serem garantidos; para serem respeitados. 1.3 HISTÓRICO DA LEI Nº 9.455/1997 O elo que faltava para punição doméstica da tortura completou-se quando, finalmente o Congresso Nacional votou projeto de lei, criminalizando a tortura. O projeto foi sancionado pelo Presidente da República, e converteu-se na lei 9.455, de 7 de Abril de 1997. 34 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 155. 27 Como uma resposta específica ao regime militar instituído a partir de 1964 até 1985, a Constituição de 1988 é a que reintroduz a proibição expressa à tortura, fazendo-o nos seguintes termos: Artigo 5o - III "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Na mesma ótica, a Constituição Federal no seu artigo 5º, XLIII, previu como: “[...] inafiançáveis e insuscetíveis de graça e anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.” 35 [...] A tortura, assim, como os demais crimes especificamente mencionados, não são considerados hediondos pelo legislador constitucional, mas apenas ilícitos a eles equiparados, quando mais certo teria andando o legislador constituinte se denominasse a tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e o terrorismo como crimes hediondos, deixando ao legislador ordinário a criação de outras modalidades de crimes a serem também considerados hediondos. Essa falha não passou despercebida a Júlio Fabrini Mirabete.36 “Além do mais, prevista na Constituição ao lado dos crimes hediondos, a tortura não era crime previsto na nossa legislaçãocom esse nomen júris. Nem em seguida, se sucedeu qualquer lei ordinária criando o tipo penal. [...]” 37 Sendo que a Lei nº 8.072/90 define os crimes hediondos, aplicando por equiparação a estes o crime de tortura. [...] Além disso, a Mensagem nº 783, de 19/07/1995, encaminhou ao Congresso Projeto de Lei pretendendo introduzir alterações no Código Penal e disciplinar os “crimes de especial gravidade”, entre eles incluindo a tortura (art. 33, § 5º, f). A pretexto de revogar a Lei dos Crimes Hediondos, esse projeto seguiu a mesma linha da Lei do Crime Organizado (Lei nº 9.034/95), sob a inspiração do chamado Movimento da lei e da Ordem. Mas o crime de tortura continuava padecendo da falta de tipificação.38 Por força de pressões oriundas dos acontecimentos policiais ocorridos em Diadema, na Grande São Paulo, em que, policiais militares agrediram e cometeram arbitrariedades contra civis, causando grande comoção na coletividade, principalmente porque os fatos foram filmados e transmitidos 35 Constituição da República Federativa de 1998. 36 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 169. 37 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 171. 38 BORGES, José Ribeiro, Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 170. 28 em profusão pelos meios de comunicação, notadamente pela televisão, o crime de tortura se viu finalmente e com celeridade tipificado pela Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997.39 Antes da Lei 9.455/97, a tortura era crime apenas quando praticada contra crianças e adolescentes, em razão de lei especial disciplinando a matéria. O Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 233 tipificava como crime "submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância, a tortura". Mas não definia o que vinha a ser tortura. Assim a Lei 9.455/97 foi instituída, para prevenir e punir a tortura, quer no âmbito dos distritos policiais, quer no presidiário, não deixando impunes aqueles que mesmo despidos do poder institucional, praticam a tortura. CAPITULO 2 O DELITO DE TORTURA NO DIREITO BRASILEIRO 2. 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS A Carta Magna de 1988 elevou a dignidade da pessoa humana como um dos princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito, “o que vale dizer que qualquer ser nascido de mulher é digno, não podendo o Estado negar-lhe esta condição: de ser humano.”40 O sistema de culpabilidade baseada na exigibilidade de conduta diversa, daquela assegurada na lei, nega a condição humana ao acusado, transformando-o em um objeto do processo, em um ser ético e moral, “sendo que a moral e a ética 39 BORGES, José Ribeiro, Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97. p. 170. 40SERRANO, Sergio Abingem. O ministério público: ônus da prova e a dignidade humana . Disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5189. Acesso em 28/09/2004. 29 são incompatíveis com o Direito em um Estado Democrático, que não nega a existência de valores conflitivos na sociedade.”41 A prática da tortura tem sido denunciada por organizações nacionais de direitos humanos, governamentais e não governamentais, e também por entidades internacionais de direitos humanos, as quais têm realizado acompanhamento da situação de respeito ou violação aos direitos fundamentais no Brasil. A tortura praticada principalmente pelas instituições encarregadas da repressão penal constitui-se em algo “absolutamente inadmissível num Estado Democrático de Direito, além de configurar uma verdadeira contradição interna do sistema, pois os órgãos encarregados do cumprimento das leis agiriam de forma ilícita.”42 Suplantada a fase do governo militar e transição para o poder civil, o Parlamento brasileiro, em 1987, constituiu a Assembléia Nacional Constituinte, que brindou a Nação, em 05.10.1988, com a denominada Constituição Cidadã, merecendo destaque, para o presente trabalho, o art. 1º, inciso III, que estabelece, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa Humana; o art. 4º que estabelece a prevalência dos direitos humanos, como um dos princípios nas relações internacionais estabelecidas pelo Brasil; o art. 5º, inciso III, que dispõe, textualmente, que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”; o inciso XLIII do mesmo artigo, que estabelece que “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”; e o § 2º do mencionado artigo, cuja norma dispõe que: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.43 Em 1989, o Estado brasileiro ratificou tanto a convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes de 1984 como a convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura de 1985. 41SERRANO, Sergio Abingem. O ministério público: ônus da prova e a dignidade humana. Acesso em 28/09/2004. 42 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97. Campinas: Romana, 2004. p. 245. 43 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 158. 30 Tais aparatos jurídicos e a ascensão ao poder de um governo democrático, apesar de terem contribuído para a não utilização da tortura nos delitos de opinião, não evitaram que ela continuasse a ser utilizada quase que impunemente, quer nos distritos policiais, quer nos estabelecimentos penitenciários, em relação aos criminosos comuns ou até mesmo em relação aos suspeitos da prática de tais delitos.44 O próprio Estado brasileiro, em relatório encaminhado ao Comitê Contra a Tortura da ONU, reconheceu as dificuldades na erradicação da prática da tortura no Brasil, em face da corrupção policial e o abuso de autoridade, que gravitam nos organismos policiais. Essa técnica, preferencial de investigação empregada pela polícia brasileira: a tortura. “Usada em delegacias de norte a sul, a tortura é hoje o método número 1 da polícia para esclarecer crimes. Em vez de investigar – seguir pistas, raciocinar, campanar, deduzir, interrogar, reunir provas -, opta-se pelo caminho fácil, rápido, injusto, ineficiente e burro [...]45 Pode ser acrescida ao diagnóstico elaborado pelo Governo Federal a total falta de preparo técnico da polícia judiciária brasileira, que dispõe de uma estrutura mínima para o desencadeamento da persecução penal, sendo que a contribuição da política científica, para o deslinde da materialidade e autoria delitiva, é ínfima, encontrando-se sedimentada, na maioria das vezes, mais no heroísmo e dedicação de médicos legistas e peritos criminais do que em aparatos tecnológicos, já que poucos são os investimentos estatais em tal área.46 As técnicas de investigação para a elucidação de crimes, encontram-se obsoletas, segundo Mario Coimbra, isso se dá “porque a polícia não dispõe de recursos para o seu aperfeiçoamento, até porque lhe faltam, muitas vezes,equipamentos básicos para o trabalho, como combustível para as viaturas.”47 Assim a herança do autoritarismo fortemente impregnada na polícia, a cobrança social, em relação ao acentuado índice de criminalidade, fomentada, diuturnamente, pela imprensa, aliada à inércia governamental, quanto `a necessidade de se realizar uma reestruturação acentuada na polícia, com destaque para a polícia judiciária, inclusive com investimentos na aquisição de aparatos modernos para a investigação policial, faz com que a tortura continue a ser aplicada impunemente nas unidades policiais. 44 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 159. 45 Revista Veja. V. 28, nº 44, p. 28-35, 1º nov, 1995. 46 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 159. 47 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 160. 31 Também as raras punições penais aplicadas aos torturadores constituem fortíssimo estímulo, para a perpetração de tão nefando instrumento, que, indubitavelmente, atinge somente a camada pobre da população brasileira.48 Nota-se que muitas vezes nós mesmos somos fator considerável para a disseminação da tortura, cobrando de forma acentuada e desproporcional muitas vezes, ações enérgicas por parte da polícia para resolver e punir aqueles “culpados” de terem praticados determinados delitos, o sensacionalismo por parte da imprensa, que transforma a opinião pública, tudo isso aliada à falta de preparo por parte da polícia, e a impunidade gerada pela não punição dos torturadores, fazem com que o delito de tortura no direito brasileiro leve tão poucos acusados ao banco dos Réus. Tem-se também a caótica situação em relação às pessoas que se encontram nos ambientes penitenciários, que não raras vezes sofreram com os tormentos da tortura na fase da persecução penal; sofrem novos tormentos na fase da execução penal, como forma de castigo como medida de disciplina. O relato, a seguir registrado, elaborado por um interno da ala Céu Azul da penitenciária masculina de Manaus, constitui um exemplo típico de tortura perpetrada nos presídios brasileiros: “No dia 24 de dezembro de 1997....nós fomos levados todos para o campo de futebol aqui do presídio e obrigados a ficar nus.Depois fomos obrigados a nos arrastar por uma lama de esgoto sanitário. Neste período de rastejo nós éramos espancados com cacetadas e chutes nas costelas e no final obrigados a beber tal lama. Logo depois fomos obrigados a andar de joelhos desde o final do campo até o ‘Céu Azul’, e neste período nós não podíamos para pois quem parasse era brutalmente espancado. Quando finalmente nós chegamos no Céu Azul, os nossos joelhos já estavam em carne viva, Nós fomos jogados nas celas quase que desmaiados. Nós já estamos aqui há mais de 3 meses e durante vários dias o diretor nos deixou sem comer. Por quase um mês e meio nós fomos torturados pela equipe de choque da polícia que vinha um”. dia”. sim , um dia não. Eles nos tiravam nus das celas e nos colocavam de joelhos no lado de fora do Céu e nos obrigava a nos espancar um ao outro e depois enfiar o dedo um no ânus do outro. Teve uma certa vez que nossa família mandou comida pra nós, a choque nos tirou pra espancarmos. Quando nós voltamos para as celas nossas comidas estavam todas misturadas com fezes. (Anistia Internacional. Brasil: aqui ninguém dorme sossegado – Violações dos direitos humanos contra detentos, p. 19)49 No relatório ao Comitê Contra a Tortura da ONU, o Estado brasileiro registra que são freqüentes as práticas de espancamentos contra presos, nas tentativas de 48 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 160/161. 49 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura p. 161/162. 32 fuga ou rebeliões, não sendo incomum, a prática de tortura contra os presos investidos de rebeldia.50 Diante de tão notória violação da dignidade da pessoa humana, o Legislador Pátrio limitou-se a tão somente inserir na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) o tipo penal da tortura no artigo 233, porém deixa de definir o comportamento delituoso, gerando inclusive uma aguerrida discussão entre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, culminando a nossa Corte Suprema em declarar a constitucionalidade do referido artigo, por maioria de votos. “Tal discussão perdeu sua importância doutrinária, porque a norma em exame foi revogada pela Lei 9.455/97.”51 Notoriamente, o Parlamento brasileiro somente despertou para a análise da questão da tortura, devido aos acontecimentos na Favela Naval na cidade de Diadema, Estado de São Paulo, em março de 1997. Devido a grande projeção nacional dos acontecimentos, o Senado Federal aprovou, abruptamente, o projeto de lei, disciplinando o crime de tortura. Em sua obra Tratamento do Injusto Penal da Tortura, o Jurista Mario Coimbra, citando o também Jurista e renomado João José Leal em seu artigo à Revista Jurídica, nº 265, p. 41-42, tendo como nome Tortura como crime hediondo especial, ensina que “a respeito do aludido projeto de lei, não se pode deixar de assinalar que tais infrações e as medidas de maior rigor têm sido promulgadas através de leis de ocasião, ou leis de paixão, que são discutidas e aprovadas de afogadilho.” [...]52 “Saliente-se que apesar dos vícios que maculam a aludida lei, merece encômio o legislador, pela adoção do art. 2º dos princípios da personalidade passiva da universalidade, permitindo, dessa forma, melhor proteção aos bens jurídicos por ela tutelados e pelas convenções já analisadas.”53 Com o estudo da Lei nº9.455/97, pode-se verificar, que o legislador preocupou-se em observar os tratados internacionais ao qual o Brasil é signatário, observando na Lei a proteção dos direitos ao homem inerentes. 50 Vide p. 40 do aludido relatório 51 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 163. 52 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 164. 53 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 164. 33 2.2 PROTEGIDO E SUJEITOS DO DELITO Além dos já mencionados instrumentos internacionais com a destinação da reprimenda ao uso da tortura, sobrelevarem a dignidade da pessoa humana, a Constituição da República Federativa do Brasil, além de ter elevado, como uma das garantias fundamentais do cidadão, a não inflição da tortura, de tratamento desumano ou degradante (artigo 5º, III), traz a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República (artigo 1º, III). A liberdade e a dignidade, bem jurídico protegido na situação de tortura, pertencem à essência do ser humano, que constitui indubitavelmente a pilastra mor na promoção dos direitos humanos, sendo que o legislador constitucional pátrio, teve o cuidado em observar esses fundamentos no ordenamento constitucional brasileiro. Assim, na tortura está sedimentado um atentado à dignidade humana, à medida que se nega ao torturado a condição de pessoa, transformando-o em mero objeto, não possuindo qualquer personalidade, sendo despido do seu bem maior, ainda assim, quando fraqueja diante dos tormentos, é atemorizado com insultos e palavras que só fazem em denegrir ainda mais a imagem já maculada da vítima. A tortura transcende as situações corriqueiras de agressões entre as pessoas, para representar o mais completo desprezo a integridade do indivíduo, “na culminância consciente de todo um procedimento que já o fez humilhado, vencido e inerte, ante os que dele dispõem, na fragilidade do físico depauperado, e da mente que já não controla mais.”54 Apesar de que na incriminação da tortura sejam tutelados outros valores como:a integridade física e mental do indivíduo, além da sua própria vida, pode-se verificar que esses valores já estão contidos no próprio contexto de dignidade humana. A tortura na sua evolução histórica, como colocado anteriormente, inicialmente era um meio pelo qual o estado aplicava os tormentos como forma de punição, mais adiante na história, usada como meio inquisitivo, e nos momentos atuais a tortura é vista como crime que causa repudia na sociedade, portanto sendo amplamente aplicada de forma escondida, sendo sujeitos dessa relação, primeiramente como 54 DOURADO, Denisart. Tortura, p. 179 . 34 sujeito ativo, o Estado, através de seus governantes (ou governadores), dos juízes que tinham seus poderes não suscetíveis de qualquer controle, atualmente com o advento da Lei 9.455/97, o sujeito ativo é todo aquele que investido de poder, autoridade, guarda, etc, pratica atos enquadrados no art. 1º da Lei nº 9.455/97. Quanto ao sujeito ativo, impõe-se a observação de que a tortura sempre se constituiu num aparato utilizado pelo poder estatal, para obter confissão ou informação relevante de algum indivíduo suspeito da prática de algum delito ou que se supunha que saiba quem foi o autor do crime investigado. A única diferença é que, outrora, tal instrumento era utilizado pelo próprio Estado-juiz, enquanto, atualmente, embora usado na ilegalidade, conta como beneplácito de autoridades estatais, podendo ser denominada, portanto de oficiosa.55 Não se pode deixar de colocar que, a tortura sempre expressou atos denotativos de abuso de poder, que seja por abuso de autoridade, quer seja por agentes públicos. O crime de tortura é crime próprio, exigindo que o sujeito ativo seja revestido de uma qualidade ou condição em relação à vitima de subordinação ou dependência, porém não há necessidade de ser o sujeito ativo funcionário público. 2.3 A TORTURA E A LEI 9.455/97 De início tem-se, como leciona Alberto Silva Franco (1997), que admitida a tortura agora como crime comum, tanto nesta modalidade de submissão (submeter), como na de constrangimento (constranger do inciso I), para sua compreensão típica integral, depende-se de uma valoração judicial de amplo espectro, pois o diploma legal omitiu uma definição indispensável, qual seja, “os limites conceituais do ‘sofrimento físico’ ou do ‘sofrimento mental’ provocados, um ou outro, pela conduta de constrangimento ou submissão. Ainda que se admita, para argumentar, que é possível, através de perícia médico-legal, detectar o sofrimento físico de alguém, não se pode ignorar que vários sofrimentos físicos podem ser infligidos sem que deles decorram vestígios. 55 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 167. 35 Por outro lado, o ‘sofrimento mental’ de uma pessoa constitui um conceito extremamente poroso, que por isso, flutua no ar, sem nenhum ponto de engate da realidade. O sofrimento mental, dimensionado em termos não concretos, mostra-se de extrema variabilidade, podendo ser diverso conforme a maior ou menor sensibilidade ou capacidade reativa de qualquer pessoa. “Uma ação criminosa é, no entanto, um acontecimento empírico que deve ser taxativamente descrito e não um acontecimento cujo preenchimento decorra de uma avaliação pessoal do juiz.”56 E prossegue o grande mestre hodierno: “A locução ‘sofrimento mental’ constitui, portanto, uma cláusula típica de caráter tão genérico que põe em risco o princípio da legalidade”. Nessa linha de consideração, Schecaira (op. Cit., p. 2) chama a atenção para o caráter indeterminado do tipo de tortura “que pode conduzir a uma negação do próprio princípio da legalidade, pelo emprego de elementos do tipo sem precisão semântica.” E arremata: “O que se dizer então, quando se exige qye esse ‘sofrimento mental’ seja intenso (§ 1º, do art. 1º da Lei 9.455/97)? (sic)”.57 A crítica é acompanhada por Luiz Flávio Gomes58, que afirma depender o “sofrimento físico” de cada vítima, de cada caso concreto, asseverando em nota de rodapé, para tanto; “O legislador, ao utilizar a expressão ‘intenso sofrimento’, colocou na lei um conceito poroso (Hassemer), de difícil compreensão. É um tipo aberto, que exige complemento valorativo do juiz.” 59 “[...] Sofrimento físico importa a contração muscular decorrente do uso de meios físicos, mecânicos, elétricos etc., provocando sensações desconfortáveis como a de mal-estar e de dor, alterando muitas vezes o funcionamento regular do organismo e mesmo do psiquismo; [...]” 60 Para determinarmos o que é “intenso” e, então, resultar não mais na tipificação de maus tratos, mas de tortura, tenho ser necessário analisar, primeiramente, alguns outros aspectos do referido texto legal (inciso II). 56 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 19, São Paulo. RT, 1997, p. 62. 57 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97, p. 62. 58 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97, p. 62. 59 GOMES, Luiz Flávio. Tortura (Lei 9.455/97). Estudos de Direito Penal e Processo Penal. São Paulo: RT, 1999, p. 123, nota 17. 60 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 171. 36 Assim como no inciso I (do art. 1º da Lei 9.455/97), a conduta tipificada no inciso II divide-se em dois elementos, um objetivo e outro subjetivo. O elemento objetivo consiste em “submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça a intenso sofrimento físico ou mental”. Nele observa-se o dolo genérico do agente de violentar ou ameaçar a vítima, que deve encontra-se em seu poder, ou que esteja sob sua guarda ou autoridade. O elemento subjetivo se faz presente na finalidade do agente, ou seu dolo específico, de infligir tal intenso sofrimento físico ou mental como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. Dessa forma, é necessário que o sofrimento físico ou mental, de acordo com cada vítima, decorrente da violência ou grave ameaça seja praticado com vistas à punição ou prevenção de uma ação da vítima, como é o caso de pai que bate no filho para castigá-lo por uma má ação, ou até mesmo do carcereiro que priva o detento sob sua guarda da refeição para manter a disciplina. A partir desta análise, podemos entender o “intenso sofrimento”, como aquele sofrimento excessivo, extremamente rude e que excede os limites do suportável tendo em vista o fim perseguido pelo agente e as condições pessoais de cada vítima. Não há dúvida que o adjetivo “intenso” é vago e impreciso, incidindo na crítica de ser tipo aberto e dependente do subjetivo de cada aplicador, com o que deixou ao intérprete a tarefa de considerar a ação do agente como típica, ou não, em relação à Lei de Tortura, resultando em caso negativo, que pode se tratar do crime de maus tratos antes analisado. Da mesma forma, se não estiver presente o elemento subjetivo, no caso em tela o fim correcional ou disciplinar, a conduta do agente poderá ser atípica, como no inciso anterior. A propósito da vítima da “submissão” (e não podemos esquecer que nosso objeto são crianças e adolescentes), o texto simplesmente a relaciona como “alguém”, pretendendo abranger qualquer pessoa, independentemente de idade, sexo, ou condição social, bastando que esteja naquelas condições de subordinação descritas, vale dizer, além da criança e do adolescente. Quanto à guarda, poder ou autoridade são aquelas relações analisadas quando o crime de maus tratos. 37
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