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A TORTURA E SUAS CONSEQUENCIAS Daniel Ramos de Almiron

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1 
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI 
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS 
CURSO DE DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A TORTURA E SUAS CONSEQUÊNCIAS , 
NA PRÁTICA DO CRIME NO DIREITO PENAL BRASILEIRO. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ACADEMICO : DANIEL RAMOS DE ALMIRON 
 
 
Monografia submetida à Universidade do 
Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito 
parcial à obtenção do grau de Bacharel 
em Direito. 
 
 
 
 
Orientador: Professor Eduardo Erivélton Campos 
 
 
 
 
 
 
ITAJAÍ, SC. Novembro 2009. 
 
 2 
 
AGRADECIMENTO 
 
A DEUS : 
“ Bem- aventurados os que têm fome de 
justiça, porque eles serão fartos”.( Mateus 5:6) 
Agradeço a Deus pela conquista e realização; 
por me dar força e coragem para enfrentar cada 
dificuldade que encontrei durante estes anos que 
durou o curso. Obrigado Deus pela conquista e 
realização. 
Ao companheiro de jornada o Professor 
Eduardo Erivélton de Campos pela reflexão 
conjunta, sugestões e revisão crítica, com imensa 
gratidão pela orientação precisa e confiante, e pela 
atenção ao trabalho e profundo respeito. 
 
AOS AMIGOS E COMPANHEIROS DE TURMA: 
 
Compartilhamos momentos fáceis, alegres, 
tristes e difíceis, mas enfim chegamos ao final deste 
caminho. 
Sempre tenham em mente que os campos, as 
vilas, as cidades; o chão onde pisamos está cheio 
de trilhos, de ruas, de avenidas: caminhões que vão 
e vem, levam e trazem nossos passos, mas nós 
fazemos à direção e inventamos o destino; se 
encontrarem obstáculos por esse caminho longo, 
pedregoso, com ramos de espinhos a sua beira, não 
desanimem e sigam em frente. Espero que vocês 
não tenham medo do caminho só porque não sabem 
onde vai chegar, pois a resposta vem a cada passo. 
 
 
 
 
 3 
 
DEDICATÓRIA 
A FAMILIA: 
 
As grandes vitórias são a soma das pequenas 
vitórias do dia-a-dia. 
Um obrigado especial os meus pais, João e Alda (in 
memoriam), e minha família que sempre me 
acompanharam nesta jornada, aconselhando-me a nunca 
desanimar, confiar em Deus, buscar sempre o meu ideal, 
ter garra, respeito e compreensão, não se dar por 
vencido, lutar com humildade; e através da luta e da 
humildade ultrapassar qualquer barreira e vencer a todos 
os obstáculos que porventura eu encontrar. 
A minha esposa Ana Paula, que sempre esteve 
junto nos momentos mais difíceis e financeiros aonde 
cheguei a fraquejar pensando em abandonar a faculdade, 
mas veio com seu ombro amigo e companheiro dando 
forças para continuar a luta que estou agora vencendo. 
Para minhas filhas; Julia e Laura, que foi o principal 
motivo da minha batalha e pensando em dar o melhor pra 
vocês minhas filhas que as amo, toda vez que pensei em 
desanimar, busquei em meus pensamentos aquele 
verdadeiro afeto, para continuar essa árdua e prazerosa 
luta diária que estou agora concluindo. 
E aos meus colegas de trabalho, obrigado por terem 
acreditado em mim, também me apoiaram, incentivando o 
tempo todo, tirando serviço, e compartilhando com as 
alegrias e dificuldades que eu encontrei, e assim o meu 
sonho, esta se realizando, graças à força conjunta de 
vocês, meus queridos amigos. 
 
 
 4 
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE 
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte 
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do 
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de 
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. 
 
ITAJAÍ, SC, NOVEMBRO DE 2009. 
 
 
 
 
 
DANIEL RAMOS DE ALMIRON 
Graduando 
 
 5 
PÁGINA DE APROVAÇÃO 
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do 
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando, Daniel Ramos de Almiron, sob o título 
“A Tortura e suas conseqüências, e a tipificação do crime no Direito Penal ”, foi 
submetida em 2009 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: 
Eduardo Erivélton de Campos, Professor orientador e Presidente da banca, 
Professor, Mestre: Emerson de Morais Granado, Examinador, e aprovada com a 
nota [ ] 
([ ]). 
 
ITAJAI, 2009. 
 
 
 
 
 
 
 
[Professor Eduardo Erivélton de Campos] 
Orientador e Presidente da Banca 
 
 
 
 
 
 
 6 
 
SUMÁRIO 
SUMÁRIO ...........................................................................................7 
RESUMO.............................................................................................8 
INTRODUÇÃO ..................................................................................10 
 
CAPITULO 1 .....................................................................................17 
 
ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI DE TORTURA...........................17 
1.1 FONTES HISTÓRICAS ...............................................................17 
1.2 FONTES HISTÓRICAS NO BRASIL...........................................26 
1.3 HISTÓRICO DA LEI Nº 9.455/1997 ............................................26 
 
CAPITULO 2 .....................................................................................28 
 
O DELITO DE TORTURA NO DIREITO BRASILEIRO.....................28 
2. 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS .....................................................28 
2.2 BEM JURÍDICO PROTEGIDO E SUJEITOS DO DELITO ..........33 
2.3 A TORTURA E A LEI 9.455/97 ...................................................34 
2.4 MÉTODOS DE TORTURAS E SUAS CONSEQÜÊNCIAS .........38 
2.4.1 PAU DE ARARA........................................................................42 
2.4.2 O CHOQUE ELÉTRICO ...........................................................40 
2.4.3 O BANHO CHINÊS OU AFOGAMENTO .................................41 
2.4.4 O TELEFONE...........................................................................41 
2.4.5 GELADEIRA ............................................................................41 
2.4.6 PROCESSO CORCOVADO.....................................................44 
2.4.7 SABÃO EM PÓ ........................................................................44 
2.4.8 CHURRASQUINHO .................................................................42 
2.4.9 ALGEMAS................................................................................44 
2.4.10 GINÁSTICA............................................................................44 
2.4.11 TENAZES E OUTROS INSTRUMENTOS CORTANTES .......45 
2.4.12 INSETOS E ANIMAIS ............................................................45 
2.4.13 PRODUTOS QUÍMICOS ........................................................45 
2.4.14 LESÕES FÍSICAS..................................................................45 
2.4.15 A CADEIRA DO DRAGÃO.....................................................46 
2.4.16 PSICOLÓGICA ......................................................................46 
2.4.17 SACO PRETO...........................................................................47 
 7 
 
 
 
CAPITULO 3 .....................................................................................44 
 
TIPIFICAÇÃO DOS CRIMES DE TORTURA E 
SUAS CONSEQÜÊNCIAS................................................................44 
3.1 TORTURA PARA OBTER INFORMAÇÃO OU CONFISSÃO....49 
3.2 TORTURA PARA A PRÁTICA CRIMINOSA .............................49 
3.3 TORTURA EM RAZÃO DE PRECONCEITO RACIAL 
 OU RELIGIOSO .........................................................................47 
3.4 TORTURA PRATICADA PELO GARANTE ...............................48 
3.5 SUBMISSÃO DE PESSOA PRESA OU SUJEITA A MEDIDA 
 DE SEGURANÇA A SOFRIMENTO ILEGAL ...........................493.6 OMISSÃO CRIMINOSA .............................................................51 
3.7 CRIMES COM RESULTADO LESÃO CORPORAL 
 GRAVE, GRAVÍSSIMA OU MORTE .........................................52 
3.8 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA...........................................55 
3.9 EFEITOS DA CONDENAÇÃO ..................................................56 
3.10 VEDAÇÃO DOS BENEFÍCIOS LEGAIS ...................................57 
3.11 REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA..................................59 
3.12 O PRINCÍPIO DA EXTRATERRITORIALIDADE.......................60 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................61 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 8 
 
RESUMO 
O propósito deste estudo foi analisar a tortura e sua evolução histórica, num 
contexto voltado para os direitos humanos e a sociedade e a relevância do assunto 
no contexto nacional e internacional. O objetivo foi o de contribuir para a reflexão do 
tema, a partir de uma nova visão e atitudes pautadas no respeito e na promoção dos 
direitos humanos. Traçando um paralelo entre a tortura desde o passado até o 
presente e que ocorre ferindo os direitos e garantias dos povos estabelecidos em 
acordos internacionais. Para garantir a prevalência da vontade do Estado em 
preservar o interesse comum e todas as diferenças existentes em sociedade, busca-
se a cidadania e respeito à dignidade da pessoa humana, pelos direitos humanos 
fundamentais e de ordem pública, manifestada no escopo da lei maior; Conseguir 
mudanças de mentalidade, de modo que o cidadão se sinta protegido, tenha os seus 
direitos garantidos e seja tratado com a dignidade que merece pela sociedade, 
norteado pelo ordenamento jurídico brasileiro. O estudo realizado veio a confirmar as 
hipóteses sendo que, a tortura, mesmo contra a lei, ainda é usada como meio de 
obter informações e confissões, por isso necessita-se de processo de mudança e 
revisões políticas, conceituais e de atitudes, para que possa acompanhar a evolução 
da sociedade; Por fim buscou-se trazer a tona, a doutrina e a Lei, para fazer um 
paradoxo histórico, visando sempre à obtenção de conhecimento, o que foi de 
grande valia. É respeitando os tratados internacionais e as garantias constitucionais, 
que se pode chegar a tão sonhada paz social, aliada ao convívio pacífico entre 
todos. 
 
 
 
Palavras-chave: tortura; direitos; consequências . 
 
 9 
 
INTRODUÇÃO 
Esta Monografia tem como escopo principal, estudar a prática da Tortura, o 
seu surgimento, as formas mais comuns empregadas no inquérito policial, às s 
modalidades e o seu objeto na atualidade, verificando a eficácia de aplicação da Lei 
de Tortura e os Direitos Humanos no ordenamento jurídico brasileiro. 
Os objetivos estão em elaborar um traçado minucioso do tema, por intermédio 
da análise doutrinária, dos precedentes históricos, dos instrumentos de tortura em si, 
do bem jurídico protegido, a dignidade da pessoa humana sob a ótica dos Direitos 
Humanos fundamentais. Apesar de estar em evidência, o assunto é preocupação 
reinante em todos os grupamentos sociais, desde o mais simples até os mais 
complexos, estando em pauta à contenção do poderio estatal; e assim, contribuir 
para a reflexão sobre o tema, a tortura e suas conseqüências, procurando buscar 
uma nova visão. Identificar os direitos humanos fundamentais previstos na legislação 
maior do país e que também são previstos na Declaração Universal dos Direitos 
Humanos e os conhecimentos científicos e padrões éticos fundamentais, inerentes 
aos Direitos Humanos. 
Para tanto, principia-se no capitulo 1 com os aspectos históricos da lei e da 
tortura, onde a tortura era vista como meio meramente processual, de “buscar a 
verdade”, a qualquer custo. A história da civilização demonstra que, para concretizar 
a tentativa da humanidade coexistir em sociedade, estabeleceram-se leis e regras 
de conduta para serem seguidas por todos os seres humanos, as quais possuíam 
destinatários certos e generalizados: as camadas mais baixas e desprovidas de 
poder social; tais leis, na realidade, se revelam como instrumento para que as 
classes dominantes atingissem seus objetivos. 
De tal modo, observa-se que desde o Código de Hamurabi, passando pela 
Carta de João Sem Terra, em 1215, as Revoluções Americana e Francesa, até a 
Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia da 
Organização das Nações Unidas, em 1948, um longo trecho foi percorrido, com o 
objetivo de dar ao ser humano, amplas condições de viver, garantindo e respeitando 
direitos e, principalmente, visando a sua dignidade de pessoa humana. Assim, neste 
 10 
estudo será abordado o aspecto histórico, vindo desde a Antigüidade até os nossos 
dias, traçando um panorama geral dos direitos humanos, mostrando que o assunto 
não é tão atual como pensam algumas pessoas. 
No capitulo 2 abordou-se o delito de tortura no direito brasileiro onde através 
da aplicação da tortura, o indivíduo é ultrajado na sua condição humana, tendo que 
passar pelos mais diversos tormentos, atentando contra sua sanidade física e 
mental, subjugando assim a sua condição de pessoa humana de direito; abordando 
os métodos de tortura e suas conseqüências. 
O Estado brasileiro reconheceu as dificuldades na erradicação da prática da 
tortura no Brasil, em face da corrupção policial e o abuso de autoridade, que 
gravitam nos organismos policiais, os quais aplicam a mesma prática em relação às 
pessoas que se encontram nos ambientes penitenciários, como forma de castigo 
como medida disciplinar. 
O capitulo 3 apresenta a tipificação dos crimes de tortura para obter 
informação ou confissão; para a prática criminosa; a tortura em razão de preconceito 
racial ou religioso; a tortura praticada pelo garante; a submissão de pessoa presa ou 
sujeita a medida de segurança a sofrimento ilegal; a omissão criminosa; os crimes 
com resultado de lesão corporal grave, gravíssima ou morte; as causas de aumento 
de pena; os efeitos da condenação; a vedação dos benefícios legais; o regime de 
cumprimento da pena; o principio da extraterritorialidade e as conseqüências de 
cada tipificação perante a lei. 
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais, 
nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da 
estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a prática da 
Tortura e os Direitos Humanos no ordenamento jurídico brasileiro. 
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes hipóteses: 
1. Verificar a possibilidade de traçar um paralelo entre a 
tortura desde os tempos da antiguidade até os tempos atuais, 
abordando os Paradigmas, que ocorrem na polícia e 
sociedade, analisando a aplicabilidade dos Direitos nas 
instituições policiais e sociedade civil. 
 11 
2. Observar se os direitos e garantias de dignidade da 
pessoa humana, como direito fundamental comum a todos os 
povos, que são objeto de texto constitucional, da maioria das 
constituições dos países que ratificaram o texto de coibição à 
prática de tortura são observados também no Brasil; 
3. Preservar o interesse comum, as diferenças sociais, 
religiosas, culturais, e raciais, manifestada no escopo da lei 
maior, com dignidade da pessoa humana e os direitos 
humanos fundamentais de ordem pública buscando a 
tipificação dos crimes de tortura e as conseqüências para o ser 
humano. 
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de Investigação1 
foi utilizado o Método Indutivo2, na Fase de Tratamento de Dados o Método 
Cartesiano3, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia é 
composto na base lógica Indutiva. 
O estudo procurará situar-se no aspecto conceitual, a classificação, a 
natureza e eficácia, a relatividade e as características da tortura e dos direitoshumanos, como forma de sintetizar e tornar o entendimento simples de uma matéria 
complexa, o que se pode observar é uma visão estereotipada do assunto. 
Uma sociedade que tem a necessidade de mudanças, para acompanhamento 
da evolução contemporânea, transpor a barreira dos antigos paradigmas é de suma 
importância. Portanto, um tema de grande significado onde será situada a 
problemática dos paradigmas, sua influência nas organizações, como quebrá-los e 
caminhar a passo firme em direção ao crescimento. 
 
1
 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente 
estabelecido[...]. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da pesquisa 
jurídica. 10 ed. Florianópolis: OAB-SC editora, 2007. p. 101. 
2
 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção 
ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa jurídica e Metodologia da 
pesquisa jurídica. p. 104. 
3
 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, 
Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-
26. 
 12 
O presente estudo justifica-se pelo reconhecimento e o respeito à dignidade 
inerente a todo ser humano e aos seus direitos iguais e inalienáveis que constitui o 
fundamento da liberdade, da justiça e da paz em todo mundo. 
O desconhecimento e o desrespeito a tais direitos conduziram a atos 
bárbaros que revoltaram a consciência da humanidade e provocaram o advento de 
novas leis, com o objetivo de garantir a todos os homens, a liberdade de expressão, 
de manifestação, de crença, de locomoção e, principalmente, com a miséria, com a 
tirania e com os extermínios individuais ou em massa. 
Com esta nova visão, os brasileiros tiveram elencados, em várias legislações, 
os seus direitos e garantias individuais e coletivas, buscando criar condições que 
permitissem a cada um gozar a plenitude de seus direitos econômicos, políticos, 
sociais e culturais. 
Não obstante as conseqüências do fortalecimento democrático e dos ideais 
explicitados na Carta Magna, o crescimento da criminalidade mundial, a necessidade 
do reconhecimento do Brasil como país protetor dos interesses sociais de seu povo 
e a pressão dos organismos internacionais que tratam de questões humanitárias, 
também levaram e forçaram o país a adotar uma política de proteção dos direitos e 
da dignidade da pessoa humana, e, neste contexto, faz-se necessário reforçar e 
difundir a todos as noções básicas e elementares de proteção e respeito aos seres 
humanos. 
 A metodologia será conduzida através de pesquisa bibliográfica, tendo por 
objetivo conhecer as diferentes contribuições científicas disponíveis sobre 
determinado tema. 
Buscou-se mediante pesquisa qualitativa, bibliográfica junto com Triviños17 
(1995, p. 129) idéia de que: 
 
A pesquisa qualitativa parte também da descrição que intenta captar, não 
só a aparência do fenômeno, como também sua essência. Busca, porém, 
as causas da existência dele, procurando explicar sua origem, suas 
relações, suas mudanças e se esforça por instruir as conseqüências que 
terão para a vida humana. 
 
Por ser de natureza teórica, a pesquisa bibliográfica é parte obrigatória de 
outros tipos de pesquisa e é por meio dela que se toma conhecimento de produção 
existente e a atualização do pesquisador é constante. O domínio dos autores pode 
ajudar na sua criatividade, porque, por meio deles, chega-se, a saber, o que se 
 13 
produziu de importante sobre o objeto de estudo e os avanços realizados a respeito 
dele. É importante saber que a pesquisa bibliográfica abrange toda a bibliografia já 
tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, jornais, 
revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, entre outros. 
O suporte à pesquisa bibliográfica está em Gil (1994, p.48), como instrumento 
cientifico para a prática desenvolvida. Segundo o autor, “a pesquisa bibliográfica é 
desenvolvida a partir do material já elaborado, constituindo-se principalmente por 
livros e artigos científicos”. 
 Portanto, ela dá suporte a todas as fases de qualquer tipo de pesquisa, uma 
vez que auxilia na definição do problema, na determinação dos objetivos, na 
construção de hipóteses, na fundamentação da justificativa da escolha do tema e na 
elaboração do relatório final. 
A pesquisa bibliográfica aplica-se a uma busca de novos conhecimentos e de 
algum conhecimento pré-existente. Sendo um dos instrumentos para levantamento 
de dados que permite um diagnóstico com maior precisão, realizado através de 
consulta a todo tipo de material escrito. É basicamente um processo de 
aprendizagem tanto do indivíduo que a realiza quanto da sociedade na qual esta se 
desenvolve, onde será mostrado como é a situação da aplicação dos Direitos. 
A rapidez no trabalho, necessidade de aprimoramento, valoração dos direitos 
humanos dentro do âmbito social, entre outras exigências desta sociedade pós-
industrial e tecnológica, gerou um novo código de valores que permeou e permeia o 
comportamento social. 
O estudo em pauta foi desenvolvido seguindo as seguintes etapas: 1ª 
definição da temática e a busca de materiais científicos que dessem o aporte 
necessário ao estudo, e o tipo de pesquisa a ser feita. 2ª etapa foi à escolha dos 
autores que seriam a base do trabalho, e mediante a visão destes, elaborar a 
embasamento teórico. 3ª etapa fazer as conclusões do trabalho, após o estudo 
realizado através dos autores. 
Portanto, fará um paralelo entre a tortura e suas conseqüências. 
 
 
 
 
 14 
 
CAPITULO 1 
 ASPECTOS HISTÓRICOS DA LEI DE TORTURA 
 
 1.1 FONTES HISTÓRICAS 
 
Neste caminhar da humanidade, as fontes bibliográficas servem para 
possibilitar a compreensão dos motivos pelos quais determinadas práticas que em 
determinado momento eram lícitas, institucionalizadas, com a evolução das 
sociedades passaram a ser ilícitas e criminalizadas como a tortura. 
“A tortura, forma de violência, parece ter se entranhado no homem ao 
primeiro sinal de inteligência deste. Só o ser humano é capaz de prolongar o 
sofrimento de animal da mesma espécie. Os serem Inferiores ferem ou matam a 
caça.”4 
A tortura acompanha o homem desde os seus primórdios, e não o abandonou 
em momento algum durante sua evolução histórica, poderá perceber que até os dias 
atuais se tem notícia da prática da tortura, quer seja no âmbito do interrogatório no 
interior de nossas delegacias, quer no âmbito do Poder Paralelo criado pelo 
narcotráfico, onde o chefe do bando criminoso instituiu a pratica da tortura tanto 
como forma de punição quanto de coerção para bandos rivais. 
“Assim, longe de ser uma conduta ignóbil de nossos antepassados, a tortura 
continua viva no relacionamento poder político-cidadão, merecendo postura enérgica 
das instituições estatais, no sentido de ao menos atenuá-la, já que o desejo do 
homem de oprimir seu semelhante é um mal que sempre acompanhará a raça 
humana.”5 
 
4
 FERNANDES, Paulo Sérgio Leite. Aspectos jurídicos-penais da tortura/Paulo Sérgio Leite 
Fernandes, Ana Maria Bebette Bajer Fernandes. Belo Horizonte: Nova Alvorada Edições Ltda., 1996. 
5
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura. São Paulo, RT, 2002. p. 9. 
 15 
A tortura, ainda quando não aparente, é sempre uma violência; como os 
tratamentos psiquiátricos, o silêncio, e a tortura não estão presentes só na violência 
física, mas também na violência psíquica, que é a coação. 
 
 “Agregue-se, contudo, que a tortura, por representar um gravíssimo atentado 
à dignidade humana, passou a ter uma dimensão internacional, de forma que o 
interesse nasua repressão atingiu um interesse supranacional, [...]”.6 
 A tortura é um ato repugnante que atenta a dignidade humana que não é 
mais aceito na sociedade e tão pouco por defensores dos direitos fundamentais e 
humanos 
“Soljenitsin observa que, de todas as formas de opressão, a prática da tortura 
é a que mais fundo procura a desintegração da liberdade, marco fundamental do ser 
humano” 7. O assalto à intimidade do indivíduo, desnudando-o até a degradação, ao 
lado dos inventos que acabam por lograr o domínio absoluto sobre a vida. 
 
 
Como querem uma confissão, os torturadores tentam evitar a morte da 
vítima, mas trabalham nos limites. Enquanto houver um sopro de vida no 
corpo do torturado, o pau canta. Descuidos, como o de Fortaleza, são tidos 
como acidentes de trabalho. Um caso horroroso, mas exemplar sobre os 
limites, ocorreu há dois anos com a dona de um salão de beleza do Distrito 
Federal, a cabeleireira Ildecy Pereira dos Santos, de 37 anos. Foi o pior dia 
de sua vida. A tortura a que foi submetida fez com que perdesse a 
vesícula, ainda tem marcas das auto-unhadas que deu no corpo, 
provocadas pelas descargas elétricas, e só dorme à base de Lexotan. 
Acusada de pertencer a uma quadrilha de ladrões de carros, Ildecy foi 
levada para a 13ª delegacia da cidade, onde foi torturada por quatro 
homens. O primeiro soco levou no nariz, depois de negar que integrasse 
qualquer quadrilha. “Confessa logo, sua vagabunda!”, ameaçou outro 
agente da lei, em tom mais ameaçador que o primeiro. Depois de uma 
pancadaria intensa, Ildecy desmaiou pela primeira vez. Voltou a si com um 
balde de água que lhe atiraram sobre o corpo. Obrigada a tirar os sapatos 
a ficar sobre uma poça de água, foi submetida a uma sessão de choques 
que provocou seguidos desmaios. A cada descarga, uma pergunta. O 
sangue, que jorrava até então pelo nariz, passou a escorrer também pelo 
ouvido. A última descarga foi tão forte que seu corpo deixou o chão. 
Quando caiu, vomitava. Ao ser acordada novamente com água, um dos 
torturadores retirou cinco das seis balas de um revólver, encostou o cano 
em sua cabeça e acionou o gatilho pela primeira vez. “E aí, vai falar ou 
prefere morrer?” Ildecy já não falava direito, apenas balbuciava. O policial 
disparou um segunda vez. Como ela nada dizia, levou chute nas costas e 
desmaiou de novo. 
 
6
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 9. 
7
 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análose da Lei nº 9.455/97. Campinas: Romana, 2004. p. 19. 
 16 
Ao acordar,. Foi colocada no pau-de-arara e lá ficou levando chutes e 
pancadas nas costas, até desmaiar mais uma vez. No final da tarde, 
quando acordou pela última vez, estava com a camisa e a calça totalmente 
ensangüentadas, sentia dores horríveis no corpo e tremia de febre. Sentiu 
que algo fora enfiado e retirado de seu ânus, que sangrava. Tentou 
levantar-se, mas não conseguiu. A sala cheirava a urina, pois os choques e 
a dor provocaram a incontinência. Numa última tentativa de faze-la falar, os 
agentes ameaçaram pegar seus três filhos, todos menores. “Vamos 
transformar as meninas em prostitutas e o garoto em v...” Ildecy deu-se por 
vencida. “Faço o que quiserem.” Os policiais apresentaram um depoimento 
por escrito e ela assinou. Trabalho encerrado. Deram-lhe um copo d´água, 
uma Novalgina para a febre e foram embora. Um dos algozes entrou na 
sala e comentou: “É hora de tomar banho, sua imunda!”8 
 
É uma crueldade consagrada pelo uso na maioria dos governos aplicar a 
tortura a um acusado enquanto se faz o processo, quer para arrancar dele a 
confissão do crime, quer para esclarecer as condições em que ocorreram os fatos, 
quer para descobrir os cúmplices ou outros crimes de que não é acusado, mas dos 
quais poderia ser culpado, quer enfim porque sofistas incompreensíveis pretenderam 
que a tortura purgasse a infâmia. 
A tortura com maior freqüência, está ligada a detenção e processos criminais, 
o que estabelece um elo entre a condenação da tortura, a defesa das liberdades 
individuais e o direito a um julgamento justo. Portanto essa barbárie, própria dos 
inquéritos medievais, de submeter o suposto autor de um fato delituoso ao suplício, 
para confessar o crime, ou como forma de expiação, ainda é comum no cotidiano 
policial. 
 ”Desde a pré-história da humanidade, o homem passou a viver em grupos 
e, em decorrência da sua própria evolução natural, regras de condutas foram 
surgindo e sendo impostas por estas sociedades primitivas, visando à própria 
sobrevivência da espécie.” 9 
Relatam as Escrituras Sagradas (Gen, 2,15-17) que Deus, ao criar o homem, 
o colocou no Éden para vigiá-lo e guardá-lo, dando-lhe este preceito: “Podes comer 
do fruto de todas as árvores do jardim, mas não comas do fruto da árvore da ciência 
do bem e do mal, porque no dia em que comeres, morrerás indubitavelmente” 10. 
 
8
 Revista Veja. V. 28, nº 44, p. 28-35, 1º nov, 1995. 
9
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 13. 
10
 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura: Comentários a Lei 9455/97. Brasília Jurídica, 1997, 
 p. 15. 
 17 
Surge daí, sob a visão histórica religiosa, o primeiro preceito a ser observado e a 
primeira sanção cominada: a pena de morte. 
O Jurista Mauro Faria Lima, em sua obra Tratamento do Injusto Penal da 
Tortura, traz que os relatos antropológicos revelam que o homem primitivo vivia em 
pequenos grupos, com laços muito fortes entre os seus componentes, já que era 
impossível a vida fora dele, em face dos perigos reais e imaginários. De entes 
sobrenaturais, que não apenas protegia, como igualmente castigavam o grupo, 
dependendo do comportamento dos seus membros.11 
Nos grupos sociais dessa era, envoltos em ambiente mágico (vedas) e 
religioso, a peste, a seca e todos os fenômenos naturais maléficos eram tidos como 
resultantes de forças divinas (totem) encolerizadas pela prática de fatos que exigiam 
reparação. “Para aplacar a ira dos deuses, criaram-se proibições (religiosas, sociais 
e políticas) conhecidas como “tabu”, que não obedecidas acarretavam castigo”.12 
“Assim, pode-se afirmar que as primeiras proibições e castigos advieram das 
relações totêmicas”.13 
As ofensas ao totem ou as condutas que se consubstanciavam em 
desobediência ao tabu eram severamente punidas, geralmente com a morte, cujos 
castigos eram determinados pelo chefe do grupo, que, também era o chefe religioso. 
“A execução da reprimenda em alguns povos era, de regra, coletiva, sendo que a 
lapidação [...]”14 foi uma das mais antigas formas de execução coletiva. 
Por volta do ano 2.000 a.C. surge a primeira fórmula de justiça penal, a Lei de 
Talião, que penetrou todas as leis antigas, com reflexões até nas leis penais 
contemporâneas. Assim sua fórmula é encontrada no Código de Hamurabi (séc. XVII 
a.C.), no livro do êxodo, Levítico e até no Código Espanhol de 1870. 
Apesar da severidade das reprimendas o Talião de inicio representou grande 
avanço: limitava a reação do ofendido: “alma por alma, olho por olho, dente por 
dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, chaga por chaga, 
equimose por equimose”, criando o critério da proporcionalidade. “Mesmo sendo um 
 
11
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 13. 
12
 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura: Comentários a Lei 9455/97. Brasília Jurídica, 1997, 
 p. 15 
13
 PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na Atualidade. São Paulo: RT, 1993, p. 118. 
14
 A lapidação consistia na execução do condenado, através de pedradas desferidas pelos integrantes 
da comunidade atingida pela conduta ofensiva. Ensina, aliás,Hans Von Henting que a pedra foi a 
primeira arma do homem (La pena, p.390) 
 18 
avanço, ainda que uma barbárie, uma vingança, sendo que esta idéia de vindita 
perdurou durante toda a Antiguidade, Idade Média e Moderna”.15 
Na antiguidade, além do Código de Hamurabi, rei da Babilônia e das Leis 
Mosaicas dos Hebreus, evoluindo-se com o Talmud, que substitui a pena de Talião 
pela multa, prisão e imposição de gravames físicos; merecem atenção especial as 
legislações penais, Grega e Romana. 
Apesar das revelações e estudos dos antropológicos sobre o antigo Egito 
revelar o encontro de pinturas denotando recebedores de impostos agredindo 
camponeses, com golpes desferidos nas plantas dos pés, com o propósito de que 
lhes revelassem onde ocultaram os seus armazéns de grãos, ensina-se que o povo 
grego foi o primeiro a utilizar a tortura sistematicamente na instrução criminal, como 
meio de prova, e se destinava como regra, aos escravos, em face da concepção de 
que a dor por eles sentida substituía o juramento que os seus senhores prestavam 
de dizer a verdade. “Os homens livres não eram submetidos à tortura, salvo se 
fossem estrangeiros ou metecos”.16 
No que tange à tortura perpetrada em relação aos escravos, é de se admirar 
que um povo, onde se sedimentou o berço da filosofia, tratasse o testemunho 
desses com extrema irracionalidade, negando-lhes a fé judicial, salvo se fossem 
submetidos a tormentos. “Afirma Demóstenes que o testemunho do escravo, obtido 
em tal condição, se revestia de maior credibilidade do que aquele prestado pelo 
homem livre, sem nenhuma coação”.17 
No Direito Grego, Platão proclamava para não castigar porque alguém tenha 
delinqüido, senão para que ninguém delinqüa. As penas visavam a intimidação, 
retribuição e expiação. Hisias exortava os juizes a castigar severamente os 
infratores. Demóstenes e Licurgo propunham o castigo a delinqüentes como forma 
de educação da juventude. 
Em Roma nos primeiros tempos, o povo romano também era influenciado por 
dogmas religiosos, portanto quaisquer condutas que atentassem contra os ditames 
religiosos, constituíam num atentado contra os deuses. 
 
15
 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 16. 
16
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 18. 
17
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 19. 
 19 
Com o advento da República em 509 a.C., houve grandes evoluções das 
fases de vingança, por meio de Talião e da composição, bem como da vingança 
divina na época da realeza, direito e religião separaram-se. O direito privado atingiu 
as culminâncias, sendo base do Direito Moderno, contribuindo para a evolução do 
Direito Penal com a criação de princípios penais sobre o erro, culpa, dolo, 
imputabilidade, coação irresistível, agravantes e atenuantes, legitima defesa. 
A sociedade romana era dividida em classes sociais: plebeus, clientes e 
patrícios, e tinham as sanções penais aplicadas de acordo com a classe social do 
agente. Os plebeus recebiam os castigos mais atrozes. Na lex Duodecim Tabularum, 
punia-se a prática de feitiçaria com a morte, a pilhagem das plantações com o 
enforcamento se o autor fosse púbere e flagelo se fosse impúbere, o incêndio era 
punido com a morte, após o autor ser amarrado e açoitado. No furtum manifestum, o 
ladrão podia ser diretamente punido pela vítima, sendo inclusive morto sem qualquer 
formalidade, e quem prestasse juramento falso era precipitado na rocha Torpéia. “A 
penalidade aplicada ao homicídio era rigorosa, sendo o autor morto com varas 
(cogliolo)”.18 
No século II a.C., Roma se dividiu em dois grupos: democratas e aristocratas. 
Foi o início do que, posteriormente, se denominaria Democracia e Ditadura, sendo, 
na última, desenvolvida a tortura política. 
Em um processo lento e gradual, a Igreja tornou-se um poder Incontrastável 
durante a alta Idade Média – séculos X, XI e XII – passando o Direito Canônico a 
reger todas as relações jurídicas então existentes. 
 
A tortura foi amplamente utilizada da Idade das Trevas (1200 a 1800 d.C., 
aproximadamente), nos chamados Tribunais Eclesiásticos da Inquisição, 
para Obtenção da confissão de um herege. 
Nessa época, a confissão do réu era considerada como a rainha das 
provas, a probatio probatissima, e, para alcançar essa prova, recorria-se à 
tortura. Destarte, o réu era transformado em juiz da própria causa, 
resistindo aos tormentos para salvar-se ou a eles cedendo, para perder-
se.19 
 
 
 
18
 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 37. 
19
 SILVA, José Geraldo, Genofre Fabiano, e Lavorenti Wilson da. Leis penais especiais anotadas/. 
Campinas: Millenium, 2002. 
 20 
Ressalte-se que a tortura naquela época era utilizada somente como meio 
processual e não como aplicação da pena, sendo a tortura um mero paliativo 
quando da ausência de provas. 
Ainda no direito canônico, registre-se que a palavra Inquisição era 
denominativa de inquérito judiciário, sendo sua destinação a apuração com rigor dos 
fatos tidos como criminosos. No entanto esta denominação foi perdendo força ao 
seu enfoque originário, tendo como finalidade de definir o Tribunal do Santo Oficio, 
não só porque este auto proclamava-se como Inquisição, mas também pelo fato da 
conotação dada pelos seus opositores, passando a palavra Inquisição a ser 
denotada como: abuso, tirania e investigação arbitrária. 
 
O processo inquisitivo, de maneira geral, adotava o seguinte procedimento: 
inicialmente, o juiz determinava ao seu escrivão que se instaurasse o feito, 
por inquisição, com o propósito de esclarecer a prática delitiva de que se 
tinha conhecimento. A seguir, passava-se à fase de informação sumária, 
onde o juiz procedia às primeiras diligências e, caso tal investigação 
chegasse a algum suspeito, e, via de regra, havia, sempre, um acusado, 
sobre quem recaía a imputação, determinava o seu encarceramento e, com 
freqüência, tornava indisponíveis seus bens, sendo oportuno ressaltar-se 
que, até a presente fase, o procedimento se perfazia de maneira secreta, 
de modo que não de dava ciência ao acusado do motivo que ensejou a sua 
prisão cautelar. Suplantada tal fase, o juiz inquisidor continuava com a 
persecução penal, buscando, agora, provas para a incriminação do réu, 
através da prova oral e da própria confissão do acusado, recebendo os 
nomes das testemunhas, para que, eventualmente, pudesse refuta-las. Na 
fase final, dava-se publicidade do depoimento e das demais provas, 
quando então, se procedia tanto à acusação formal, que, geralmente, era 
feita pelo Promotor fiscal, quanto à defesa elaborada pelo advogado do 
réu. Por último, caso fosse necessário, prolatava-se a sentença de inflição 
de tormento, com o intuito de se alcançar a confissão do acusado, ou se 
pronunciava a sentença definitiva, quase sempre condenatória20. 
 
 
Na região da Valáquia, Sul da Romênia, nos idos do século XV, Vlad Tepes, 
consagrado como Drácula, pelo cinema e literatura de ficção, era, 
reconhecidamente, tido como símbolo das forças do mal e da tortura. Tinha como 
método de aplicação o empalamento, que consistia em introduzir um ferro no ânus 
ou no umbigo, até que saísse pela boca da vítima. 
A tortura como meio meramente processual, de “buscar a verdade”, a 
qualquer custo, mesmo que essa verdade fosse meramente um meio de se achar 
um culpado para determinado delito, com a transição histórica da Idade Média para 
a Idade Moderna, nos governos absolutistas, onde a finalidade dos tormentos 
 
20
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 66. 
 21 
passou a ser uma forma de garantia da segurança ao Estado, diminuindo ainda mais 
as garantias ofertadas ao cidadão. 
Desta forma,os atos processuais no processo inquisitivo, eram todos 
realizados de forma secreta, sem que o acusado tomasse conhecimento da 
acusação que lhe era imposta, também não era concedido ao acusado um 
Advogado, para tomar conhecimento da acusação, nem para elaborar sua defesa. 
Aos cidadãos da época, não era assegurado qualquer Princípio Geral de 
Direito, como, por exemplo, o Direito a Vida, ficando a livre vontade do judiciário a 
aplicação da pena de morte, bem como a aquisição das provas no decorrer do 
processo. “Este direito penal, pródigo na cominação da pena de morte, executada 
pelas formas mais cruéis (fogueira, afogamento, soterramento, enforcamento, etc) 
visava especificamente a intimidação. O arbítrio judiciário, todavia, cria em torno da 
justiça penal uma Atmosfera de incerteza, insegurança e verdadeiro terror”21 
“Essa busca da verdade, que consistia, na prática, em obter-se a confissão do 
acusado, desenvolvia-se num cenário propício a inflição dos tormentos, posto que, 
sob o corpo do supliciado, plasmava o cerimonial judiciário, que tinha, por escopo, 
“trazer à luz a verdade do crime”22. 
Por essa razão, ensina-se que, para a Justiça Criminal da época, a culpa não 
começava uma vez que reunidas todas as provas; peça por peça, ela era constituída 
por cada um dos elementos que permitiam reconhecer um culpado. Assim, uma 
meia prova não deixaria inocente o suspeito, enquanto não fosse completada; fazia 
dele um meio culpado. 
Sendo assim, essa insegurança vivida pelos cidadãos da época era reflexo, 
da imperfeição do procedimento criminal, destinado a apuração dos fatos 
relacionados à prática delituosa, vez que a culpa era incidida sobre um acusado, 
mesmo que não se tivessem todas as provas, mas um pequeno indicio de prova já 
era suficiente para manchar uma pessoa com a atribuição de meio culpado. 
Jurista e Filósofo, Cesare Beccaria escreveu a obra “dei delitti e delle pene” 
(Dos delitos e das penas), publicada em 1764, com nítida influência dos iluministas 
franceses Voltaire, Rosseau e Montesquieu. Sua obra assenta-se principalmente do 
 
21
 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. p. 39. 
22
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 75. 
 22 
“Contrato Social” de Rosseau e de início chama a atenção para que as vantagens 
sociais devam ser igualmente distribuídas, ao contrário do que sucedia. 
Em sua obra, Beccaria dedica um capítulo à tortura (Capítulo XV) que é um 
libelo contra as atrocidades da época: 
 
É uma barbárie consagrada pelo uso na maioria dos governos aplicar a 
tortura a um acusado enquanto se faz o processo, quer para arrancar dele 
a confissão do crime, quer para esclarecer as contradições em que caiu, 
quer para descobrir os cúmplices ou outros crimes de que não é acusado, 
mas dos quais poderia ser culpado, que enfim porque sofistas 
incompreensíveis pretenderam que a tortura purgava a infâmia.23 
 
Continua Beccaria: “A tortura é muitas vezes um meio seguro de condenar o 
inocente fraco e de absolver o celerado robusto. De dois homens, igualmente 
inocentes ou igualmente culpados, aquele que for mais corajoso será absolvido”24 
“As idéias de Beccaria deram início ao Direito Penal moderno com as 
concepções penais que seriam as pilastras da chamada Escola Clássica”25. 
A tortura foi oficialmente abolida na Europa entre 1750 e 1830, assim como a 
escravidão, sob a influência humanista e racionalista do iluminismo. 
“Formalmente extinta, a tortura entra no século XX em sua terceira fase, do 
apogeu extra-oficial ou clandestino. A partir da Primeira Guerra Mundial, as 
atrocidades contra prisioneiros políticos assumem proporções epidêmicas, 
eclipsando os maus-tratos rotineiramente dispensados aos presos “comuns”26. 
Não se pode deixar de ressaltar que a tortura foi largamente aplicada, apesar 
de forma semiclandestina, pelos nazistas na Alemanha e pelos Stanilistas na antiga 
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), como instrumento repressivo 
do Estado contra os “inimigos do povo”, ou seja, os opositores do regime por motivos 
políticos, étnicos ou religiosos. Utilizada em massa para obter confissões ou 
denúncias de terceiros, a tortura também se tornou um instrumento de intimidação e 
neutralização dos opositores. 
Das páginas da história, podem-se extrair, ainda, como momentos em que a 
prática da tortura era sistemática, os episódios da independência dos Estados 
 
23
 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Tradução de Paulo M. Oliveira. Biblioteca Clássica. 
Volume XXII. 6ª Ed. Atena. São Paulo. 
24
 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. 
25
 LIMA, Mauro Faria de. Crimes de Tortura, p. 20. 
26
 MATTOSO, Glauco. O que é tortura. São Paulo: Nova Cultura: Brasiliense, 1986. p. 50. 
 23 
Unidos, quando foram redigidas as Declarações do Homem e da Independência 
(1776), por Thomas Jefferson. Vale destacar, também, a queda da Bastilha, na 
Revolução Francesa (1789), símbolo do autoritarismo do governo e, ainda na 
Europa, as revoluções de 1830 e 1848 (contrapondo-se nacionalismo, liberalismo e 
socialismo). Já nos Estados Unidos, podemos apontar a Guerra de Sucessão (1861 
– 1865); no extremo oriente, os conflitos sino-japoneses e, finalmente, na América 
Latina, os processos de suas independências. 
 
O exame da história nos leva a duas conclusões elementares: uma a de 
que ninguém, ou nenhum regime político pode se arrogar a pretensão de 
ter abolido a tortura, mesmo a “oficial” quanto mais a clandestina. A outra 
conclusão é a de que ninguém, ou nenhum país pode se gabar a invenção 
de qualquer método que já não tenha sido experimentado ou aperfeiçoado 
ontem, por outrem, alhures27. 
 
 
Ressalte-se ainda, que a abolição da tortura e dos suplícios inerentes às 
penas atrozes até então existentes, não foi em decorrência de uma filosofia 
meramente humanitária, mas também de uma nova estratégia para o poder de punir, 
passando assim, a não punir menos, mas punir melhor, atenuando talvez a forma de 
punição, para punir com maior universalidade. 
 
 
1.2 FONTES HISTÓRICAS NO BRASIL 
 
Em seu Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT28, o Brasil aponta o fato de 
o processo civilizatório ter se originado a partir da colonização portuguesa como 
sendo a raiz da prática de tratamentos desumanos, degradantes e cruéis, e também 
da prática da tortura. Lembra que as Ordenações do Reino, que tiveram força 
normativa no Brasil Colônia, tinham nas penas corporais seu principal instrumento 
de punição dos mais diversos tipos de delito. 
Certamente isto foi de enorme importância. Mas é preciso acrescentar o 
próprio componente da estrutura econômica, de formação do Estado brasileiro. 
Para se compreender o uso atual da tortura, como forma de aplicação de 
castigo, ou para obter confissões de práticas de delitos muitas vezes de pouco 
 
27
 MATTOSO, Glauco. O que é tortura, p. 52. 
28
 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT. Ministério da Justiça, 2000. 
 24 
potencial ofensivo, e no mais das vezes delitos contra o patrimônio, é importante 
realçar a origem patrimonialista do processo de colonização, quando a Coroa 
Portuguesa confiou a empreendedores privados a exploração de capitanias 
hereditárias, em que os donatários também tinham "direito à designação de capitães 
e governadores". 
Ainda, o rei, no domínio da administração da justiça, isentou "as instituições 
brasileiras de correição e alçada, conferiu ao capitão-governador competência para 
nomear o ouvidor, o meirinho, os escrivães e os tabeliães, bem assim como a 
faculdade de vetar os juízes ordinários eleitos pelos homens bons". Também fora 
delegado aos capitães-governadores "todajurisdição cível e crime, incluindo a alta 
justiça (pena de morte e talhamento de membro), relacionada com os peões, índios 
e escravos".29 
As empresas econômicas, de brancos portugueses, tinham poder de vida e 
de morte sobre os africanos - considerados mercadorias - e os índios - considerados 
selvagens, muitas vezes equiparados às feras, animais sem alma. 
Lembra o Relatório, que a estrutura econômica da colônia foi fundada na 
mão-de-obra escrava, indígena, e principalmente africana. "Os negros foram trazidos 
da África do século XVI ao XIX. A condição de escravos na qual viriam significava 
uma constante possibilidade de um tratamento violento da parte do senhor.”30 
À penúria das condições de vida e trabalho a que eram submetidos juntava-se 
a possibilidade de o senhor, ao seu arbítrio, impor os castigos que quisesse ao 
escravo. “Privações, açoites, mutilações, palmatoadas, humilhações diversas foram 
práticas comuns nas casas e fazendas dos senhores donos de escravos durante 
toda a vida da colônia”. 31 
Extraordinário estudo do historiador Luiz Felipe de Alencastro descreve o 
fenômeno de desenraizamento dos negros africanos, provocando sua 
dessocialização - quando capturados eram apartados de suas comunidades nativas 
-, e despersonalização - quando foram convertidos em mercadoria. E narra como se 
dava a nova 'socialização': "desembarcado nos postos da América portuguesa, mais 
uma vez submetido à venda, o africano costumava ser surrado ao chegar à fazenda. 
 
29
 COUTO, Jorge [1998]: A Construção do Brasil. Lisboa: Edição Cosmos. Pág. 223. 
30
 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT. Ministério da Justiça, 2000, p. 13/14. 
31
 Primeiro Relatório ao Comitê Contra a Tortura CAT, p. 13/14. 
 25 
"A primeira hospedagem que [os senhores] lhes fazem [aos escravos], logo que 
comprados aparecem na sua presença, é mandá-los açoitar rigorosamente, sem 
mais causa que a vontade própria de o fazer assim, e disso mesmo se jactam [...] 
como inculcando-lhes, que só eles [os senhores] nasceram para competentemente 
dominar escravos, e serem eles temidos e respeitados". Tal é o testemunho do 
padre e jurista Ribeiro Rocha, morador da Bahia, no seu tratado sobre a escravatura 
no Brasil, publicado em meados do século XVIII. Cem anos mais tarde, o viajante 
francês Adolphe d'Assier confirmava a prática de espancar os escravos logo de 
entrada, para ressocializá-los no contexto da opressão nas fazendas e engenhos do 
Império. 
 
Acrescente-se que, mesmo no Brasil Império, com a elaboração da 
Constituição Política do Império, de 1824, onde se aboliram “os açoites, a 
tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas cruéis” (art. 179, 
XIX), se continuou a supliciar os escravos. Assim, o código Criminal do 
Império de 1830, esculpido sob o espírito liberal, dispunha, no seu artigo 
60, que, quando se tratasse de acusado escravo e que incorresse em pena 
que não fosse a de morte ou galés, deveria receber a reprimenda de 
açoites e, após entregue ao seu proprietário, para que este inserisse um 
ferro em seu pescoço pelo tempo que o juiz determinasse.32 
 
Método de terror luso-brasílico, e mais tarde autenticamente nacional, 
brasileiro, o choque do bárbaro arbítrio do senhor - visando demonstrar ao recém-
chegado seu novo estatuto subumano - voltou a ser praticado durante a ditadura de 
1964-1985. Instruídos pela longa experiência escravocrata, os torturadores do DOI-
CODI e da Operação Bandeirantes também faziam uso repentino da surra, à entrada 
das delegacias e das casernas, para desumanizar e aterrorizar os suspeitos de 
'subversão'. 33 
O dado histórico, portanto, é que os detentores do poder econômico, e 
também os detentores do poder político, utilizavam-se da violência contra os 
despossuídos: índios, negros, pobres em geral, como modo de garantir controle 
social, como intimidação, castigo, ou mero capricho. 
“[...] com o advento do Estado Novo, o denominado período Getuliano, 
iniciado em 1937, o Brasil vivenciou um ditadura que espargiu o terror e edificou a 
barbárie em todo o seu território, suprimindo todas as garantias individuais, fechando 
 
32
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 151/152. 
33
 Alencastro, Luiz Felipe de: O Trato dos Viventes. São Paulo: Cia. Das Letras. 2000. pág. 148. 
 26 
o parlamento federal, estadual e municipal. [...]”34 Estabelecendo ainda, acentuada 
censura contra os órgãos de imprensa, fortalecendo acentuadamente os órgãos de 
polícias, destinados a repressão política e social. 
O Brasil vivenciou de Março de 1964 a Março de 1985 o regime militar, 
grande parte do qual caracterizado por ser um "regime de exceção". Instalado pela 
força das armas, o regime militar derrubou um presidente civil e interveio na 
sociedade civil. Usou de instrumentos jurídicos intitulados "atos institucionais", 
através dos quais procurou-se legalizar e legitimar o novo regime. 
 A sombra mais negra veio com a prática disseminada da tortura, utilizada 
como instrumento político para arrancar informações e confissões de estudantes, 
jornalistas, políticos, advogados, cidadãos, enfim, todos que ousavam discordar do 
regime de força então vigente. 
A praga a ser vencida, na ótica dos militares, era o comunismo, e subversivos 
seriam todos os que ousassem discordar. Foi mais intensamente aplicada de 1968 a 
1973 sem, contudo, deixar de estar presente em outros momentos. 
A ditadura não inventou a tortura, mas exacerbou-a. E adotou essa prática de 
modo intenso, "aprimorando" os mecanismos já utilizados nos períodos anteriores à 
sua instalação. 
Com a redemocratização, consagrada na Constituição de 1988, como seu 
documento político, o povo brasileiro cuidou de explicitar como desejaria se ver 
organizado em um Estado Democrático de Direito. Por isso se tem uma Constituição 
onde os direitos e garantias fundamentais principiam o texto constitucional, e são 
detalhados e extensos: para serem conhecidos; para serem garantidos; para serem 
respeitados. 
 
1.3 HISTÓRICO DA LEI Nº 9.455/1997 
 
O elo que faltava para punição doméstica da tortura completou-se quando, 
finalmente o Congresso Nacional votou projeto de lei, criminalizando a tortura. O 
projeto foi sancionado pelo Presidente da República, e converteu-se na lei 9.455, de 
7 de Abril de 1997. 
 
34
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 155. 
 27 
Como uma resposta específica ao regime militar instituído a partir de 1964 até 
1985, a Constituição de 1988 é a que reintroduz a proibição expressa à tortura, 
fazendo-o nos seguintes termos: 
Artigo 5o - III "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano 
ou degradante". 
Na mesma ótica, a Constituição Federal no seu artigo 5º, XLIII, previu como: 
“[...] inafiançáveis e insuscetíveis de graça e anistia a prática de tortura, o tráfico 
ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes 
hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo 
evitá-los, se omitirem.” 35 
 
[...] A tortura, assim, como os demais crimes especificamente 
mencionados, não são considerados hediondos pelo legislador 
constitucional, mas apenas ilícitos a eles equiparados, quando mais certo 
teria andando o legislador constituinte se denominasse a tortura, tráfico 
ilícito de entorpecentes e o terrorismo como crimes hediondos, deixando ao 
legislador ordinário a criação de outras modalidades de crimes a serem 
também considerados hediondos. Essa falha não passou despercebida a 
Júlio Fabrini Mirabete.36 
 
 
“Além do mais, prevista na Constituição ao lado dos crimes hediondos, a 
tortura não era crime previsto na nossa legislaçãocom esse nomen júris. Nem em 
seguida, se sucedeu qualquer lei ordinária criando o tipo penal. [...]” 37 Sendo que a 
Lei nº 8.072/90 define os crimes hediondos, aplicando por equiparação a estes o 
crime de tortura. 
[...] Além disso, a Mensagem nº 783, de 19/07/1995, encaminhou ao 
Congresso Projeto de Lei pretendendo introduzir alterações no Código 
Penal e disciplinar os “crimes de especial gravidade”, entre eles incluindo a 
tortura (art. 33, § 5º, f). A pretexto de revogar a Lei dos Crimes Hediondos, 
esse projeto seguiu a mesma linha da Lei do Crime Organizado (Lei nº 
9.034/95), sob a inspiração do chamado Movimento da lei e da Ordem. 
Mas o crime de tortura continuava padecendo da falta de tipificação.38 
Por força de pressões oriundas dos acontecimentos policiais ocorridos em 
Diadema, na Grande São Paulo, em que, policiais militares agrediram e 
cometeram arbitrariedades contra civis, causando grande comoção na 
coletividade, principalmente porque os fatos foram filmados e transmitidos 
 
35
 Constituição da República Federativa de 1998. 
36
 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 169. 
37
 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 171. 
38
 BORGES, José Ribeiro, Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 170. 
 28 
em profusão pelos meios de comunicação, notadamente pela televisão, o 
crime de tortura se viu finalmente e com celeridade tipificado pela Lei nº 
9.455, de 7 de abril de 1997.39 
 
 
Antes da Lei 9.455/97, a tortura era crime apenas quando praticada contra 
crianças e adolescentes, em razão de lei especial disciplinando a matéria. O 
Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 233 tipificava como crime "submeter 
criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância, a tortura". Mas não 
definia o que vinha a ser tortura. 
Assim a Lei 9.455/97 foi instituída, para prevenir e punir a tortura, quer no 
âmbito dos distritos policiais, quer no presidiário, não deixando impunes aqueles que 
mesmo despidos do poder institucional, praticam a tortura. 
 
 
CAPITULO 2 
O DELITO DE TORTURA NO DIREITO BRASILEIRO 
 
 2. 1 CONSIDERAÇÕES GERAIS 
 
A Carta Magna de 1988 elevou a dignidade da pessoa humana como um dos 
princípios constitucionais do Estado Democrático de Direito, “o que vale dizer que 
qualquer ser nascido de mulher é digno, não podendo o Estado negar-lhe esta 
condição: de ser humano.”40 
O sistema de culpabilidade baseada na exigibilidade de conduta diversa, 
daquela assegurada na lei, nega a condição humana ao acusado, transformando-o 
em um objeto do processo, em um ser ético e moral, “sendo que a moral e a ética 
 
39
 BORGES, José Ribeiro, Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97. p. 170. 
40SERRANO, Sergio Abingem. O ministério público: ônus da prova e a dignidade humana . 
Disponível em http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5189. Acesso em 28/09/2004. 
 29 
são incompatíveis com o Direito em um Estado Democrático, que não nega a 
existência de valores conflitivos na sociedade.”41 
A prática da tortura tem sido denunciada por organizações nacionais de 
direitos humanos, governamentais e não governamentais, e também por entidades 
internacionais de direitos humanos, as quais têm realizado acompanhamento da 
situação de respeito ou violação aos direitos fundamentais no Brasil. 
A tortura praticada principalmente pelas instituições encarregadas da 
repressão penal constitui-se em algo “absolutamente inadmissível num Estado 
Democrático de Direito, além de configurar uma verdadeira contradição interna do 
sistema, pois os órgãos encarregados do cumprimento das leis agiriam de forma 
ilícita.”42 
 
 
Suplantada a fase do governo militar e transição para o poder civil, o 
Parlamento brasileiro, em 1987, constituiu a Assembléia Nacional 
Constituinte, que brindou a Nação, em 05.10.1988, com a denominada 
Constituição Cidadã, merecendo destaque, para o presente trabalho, o art. 
1º, inciso III, que estabelece, como um dos fundamentos da República 
Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa Humana; o art. 4º que 
estabelece a prevalência dos direitos humanos, como um dos princípios 
nas relações internacionais estabelecidas pelo Brasil; o art. 5º, inciso III, 
que dispõe, textualmente, que “ninguém será submetido à tortura nem a 
tratamento desumano ou degradante”; o inciso XLIII do mesmo artigo, que 
estabelece que “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de 
graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e 
drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles 
respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se 
omitirem”; e o § 2º do mencionado artigo, cuja norma dispõe que: “Os 
direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros 
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados 
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.43 
 
 
Em 1989, o Estado brasileiro ratificou tanto a convenção contra a tortura e 
outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes de 1984 como a 
convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura de 1985. 
 
 
 
41SERRANO, Sergio Abingem. O ministério público: ônus da prova e a dignidade humana. 
Acesso em 28/09/2004. 
42
 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97. Campinas: Romana, 2004. p. 245. 
43
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 158. 
 30 
Tais aparatos jurídicos e a ascensão ao poder de um governo democrático, 
apesar de terem contribuído para a não utilização da tortura nos delitos de 
opinião, não evitaram que ela continuasse a ser utilizada quase que 
impunemente, quer nos distritos policiais, quer nos estabelecimentos 
penitenciários, em relação aos criminosos comuns ou até mesmo em 
relação aos suspeitos da prática de tais delitos.44 
 
 
O próprio Estado brasileiro, em relatório encaminhado ao Comitê Contra a 
Tortura da ONU, reconheceu as dificuldades na erradicação da prática da tortura no 
Brasil, em face da corrupção policial e o abuso de autoridade, que gravitam nos 
organismos policiais. 
Essa técnica, preferencial de investigação empregada pela polícia brasileira: a 
tortura. “Usada em delegacias de norte a sul, a tortura é hoje o método número 1 da 
polícia para esclarecer crimes. Em vez de investigar – seguir pistas, raciocinar, 
campanar, deduzir, interrogar, reunir provas -, opta-se pelo caminho fácil, rápido, 
injusto, ineficiente e burro [...]45 
 
Pode ser acrescida ao diagnóstico elaborado pelo Governo Federal a total 
falta de preparo técnico da polícia judiciária brasileira, que dispõe de uma 
estrutura mínima para o desencadeamento da persecução penal, sendo 
que a contribuição da política científica, para o deslinde da materialidade e 
autoria delitiva, é ínfima, encontrando-se sedimentada, na maioria das 
vezes, mais no heroísmo e dedicação de médicos legistas e peritos 
criminais do que em aparatos tecnológicos, já que poucos são os 
investimentos estatais em tal área.46 
 
As técnicas de investigação para a elucidação de crimes, encontram-se 
obsoletas, segundo Mario Coimbra, isso se dá “porque a polícia não dispõe de 
recursos para o seu aperfeiçoamento, até porque lhe faltam, muitas vezes,equipamentos básicos para o trabalho, como combustível para as viaturas.”47 
 
Assim a herança do autoritarismo fortemente impregnada na polícia, a 
cobrança social, em relação ao acentuado índice de criminalidade, 
fomentada, diuturnamente, pela imprensa, aliada à inércia governamental, 
quanto `a necessidade de se realizar uma reestruturação acentuada na 
polícia, com destaque para a polícia judiciária, inclusive com investimentos 
na aquisição de aparatos modernos para a investigação policial, faz com 
que a tortura continue a ser aplicada impunemente nas unidades policiais. 
 
 
44
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 159. 
45
 Revista Veja. V. 28, nº 44, p. 28-35, 1º nov, 1995. 
46
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 159. 
47
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 160. 
 31 
Também as raras punições penais aplicadas aos torturadores constituem 
fortíssimo estímulo, para a perpetração de tão nefando instrumento, 
que, indubitavelmente, atinge somente a camada pobre da população 
brasileira.48 
 
Nota-se que muitas vezes nós mesmos somos fator considerável para a 
disseminação da tortura, cobrando de forma acentuada e desproporcional muitas 
vezes, ações enérgicas por parte da polícia para resolver e punir aqueles “culpados” 
de terem praticados determinados delitos, o sensacionalismo por parte da imprensa, 
que transforma a opinião pública, tudo isso aliada à falta de preparo por parte da 
polícia, e a impunidade gerada pela não punição dos torturadores, fazem com que o 
delito de tortura no direito brasileiro leve tão poucos acusados ao banco dos Réus. 
Tem-se também a caótica situação em relação às pessoas que se encontram 
nos ambientes penitenciários, que não raras vezes sofreram com os tormentos da 
tortura na fase da persecução penal; sofrem novos tormentos na fase da execução 
penal, como forma de castigo como medida de disciplina. 
 
O relato, a seguir registrado, elaborado por um interno da ala Céu Azul da 
penitenciária masculina de Manaus, constitui um exemplo típico de tortura 
perpetrada nos presídios brasileiros: “No dia 24 de dezembro de 
1997....nós fomos levados todos para o campo de futebol aqui do presídio 
e obrigados a ficar nus.Depois fomos obrigados a nos arrastar por uma 
lama de esgoto sanitário. Neste período de rastejo nós éramos espancados 
com cacetadas e chutes nas costelas e no final obrigados a beber tal lama. 
Logo depois fomos obrigados a andar de joelhos desde o final do campo 
até o ‘Céu Azul’, e neste período nós não podíamos para pois quem 
parasse era brutalmente espancado. Quando finalmente nós chegamos no 
Céu Azul, os nossos joelhos já estavam em carne viva, Nós fomos jogados 
nas celas quase que desmaiados. Nós já estamos aqui há mais de 3 
meses e durante vários dias o diretor nos deixou sem comer. Por quase um 
mês e meio nós fomos torturados pela equipe de choque da polícia que 
vinha um”. dia”. sim , um dia não. Eles nos tiravam nus das celas e nos 
colocavam de joelhos no lado de fora do Céu e nos obrigava a nos 
espancar um ao outro e depois enfiar o dedo um no ânus do outro. Teve 
uma certa vez que nossa família mandou comida pra nós, a choque nos 
tirou pra espancarmos. Quando nós voltamos para as celas nossas 
comidas estavam todas misturadas com fezes. (Anistia Internacional. 
Brasil: aqui ninguém dorme sossegado – Violações dos direitos humanos 
contra detentos, p. 19)49 
 
No relatório ao Comitê Contra a Tortura da ONU, o Estado brasileiro registra 
que são freqüentes as práticas de espancamentos contra presos, nas tentativas de 
 
48
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 160/161. 
49
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura p. 161/162. 
 32 
fuga ou rebeliões, não sendo incomum, a prática de tortura contra os presos 
investidos de rebeldia.50 
Diante de tão notória violação da dignidade da pessoa humana, o Legislador 
Pátrio limitou-se a tão somente inserir na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do 
Adolescente) o tipo penal da tortura no artigo 233, porém deixa de definir o 
comportamento delituoso, gerando inclusive uma aguerrida discussão entre os 
Ministros do Supremo Tribunal Federal, culminando a nossa Corte Suprema em 
declarar a constitucionalidade do referido artigo, por maioria de votos. “Tal discussão 
perdeu sua importância doutrinária, porque a norma em exame foi revogada pela Lei 
9.455/97.”51 
Notoriamente, o Parlamento brasileiro somente despertou para a análise da 
questão da tortura, devido aos acontecimentos na Favela Naval na cidade de 
Diadema, Estado de São Paulo, em março de 1997. Devido a grande projeção 
nacional dos acontecimentos, o Senado Federal aprovou, abruptamente, o projeto 
de lei, disciplinando o crime de tortura. Em sua obra Tratamento do Injusto Penal da 
Tortura, o Jurista Mario Coimbra, citando o também Jurista e renomado João José 
Leal em seu artigo à Revista Jurídica, nº 265, p. 41-42, tendo como nome Tortura 
como crime hediondo especial, ensina que “a respeito do aludido projeto de lei, não 
se pode deixar de assinalar que tais infrações e as medidas de maior rigor têm sido 
promulgadas através de leis de ocasião, ou leis de paixão, que são discutidas e 
aprovadas de afogadilho.” [...]52 
“Saliente-se que apesar dos vícios que maculam a aludida lei, merece 
encômio o legislador, pela adoção do art. 2º dos princípios da personalidade passiva 
da universalidade, permitindo, dessa forma, melhor proteção aos bens jurídicos por 
ela tutelados e pelas convenções já analisadas.”53 
Com o estudo da Lei nº9.455/97, pode-se verificar, que o legislador 
preocupou-se em observar os tratados internacionais ao qual o Brasil é signatário, 
observando na Lei a proteção dos direitos ao homem inerentes. 
 
 
50
 Vide p. 40 do aludido relatório 
51
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 163. 
52
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 164. 
53
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 164. 
 33 
2.2 PROTEGIDO E SUJEITOS DO DELITO 
 
Além dos já mencionados instrumentos internacionais com a destinação da 
reprimenda ao uso da tortura, sobrelevarem a dignidade da pessoa humana, a 
Constituição da República Federativa do Brasil, além de ter elevado, como uma das 
garantias fundamentais do cidadão, a não inflição da tortura, de tratamento 
desumano ou degradante (artigo 5º, III), traz a dignidade da pessoa humana como 
um dos fundamentos da República (artigo 1º, III). 
A liberdade e a dignidade, bem jurídico protegido na situação de tortura, 
pertencem à essência do ser humano, que constitui indubitavelmente a pilastra mor 
na promoção dos direitos humanos, sendo que o legislador constitucional pátrio, 
teve o cuidado em observar esses fundamentos no ordenamento constitucional 
brasileiro. 
Assim, na tortura está sedimentado um atentado à dignidade humana, à 
medida que se nega ao torturado a condição de pessoa, transformando-o em mero 
objeto, não possuindo qualquer personalidade, sendo despido do seu bem maior, 
ainda assim, quando fraqueja diante dos tormentos, é atemorizado com insultos e 
palavras que só fazem em denegrir ainda mais a imagem já maculada da vítima. 
A tortura transcende as situações corriqueiras de agressões entre as 
pessoas, para representar o mais completo desprezo a integridade do indivíduo, “na 
culminância consciente de todo um procedimento que já o fez humilhado, vencido e 
inerte, ante os que dele dispõem, na fragilidade do físico depauperado, e da mente 
que já não controla mais.”54 
Apesar de que na incriminação da tortura sejam tutelados outros valores como:a integridade física e mental do indivíduo, além da sua própria vida, pode-se verificar 
que esses valores já estão contidos no próprio contexto de dignidade humana. 
A tortura na sua evolução histórica, como colocado anteriormente, inicialmente 
era um meio pelo qual o estado aplicava os tormentos como forma de punição, mais 
adiante na história, usada como meio inquisitivo, e nos momentos atuais a tortura é 
vista como crime que causa repudia na sociedade, portanto sendo amplamente 
aplicada de forma escondida, sendo sujeitos dessa relação, primeiramente como 
 
54
 DOURADO, Denisart. Tortura, p. 179 . 
 34 
sujeito ativo, o Estado, através de seus governantes (ou governadores), dos juízes 
que tinham seus poderes não suscetíveis de qualquer controle, atualmente com o 
advento da Lei 9.455/97, o sujeito ativo é todo aquele que investido de poder, 
autoridade, guarda, etc, pratica atos enquadrados no art. 1º da Lei nº 9.455/97. 
 
 
Quanto ao sujeito ativo, impõe-se a observação de que a tortura sempre se 
constituiu num aparato utilizado pelo poder estatal, para obter confissão ou 
informação relevante de algum indivíduo suspeito da prática de algum 
delito ou que se supunha que saiba quem foi o autor do crime investigado. 
A única diferença é que, outrora, tal instrumento era utilizado pelo próprio 
Estado-juiz, enquanto, atualmente, embora usado na ilegalidade, conta 
como beneplácito de autoridades estatais, podendo ser denominada, 
portanto de oficiosa.55 
 
 
Não se pode deixar de colocar que, a tortura sempre expressou atos 
denotativos de abuso de poder, que seja por abuso de autoridade, quer seja por 
agentes públicos. 
O crime de tortura é crime próprio, exigindo que o sujeito ativo seja revestido 
de uma qualidade ou condição em relação à vitima de subordinação ou 
dependência, porém não há necessidade de ser o sujeito ativo funcionário público. 
 
 
2.3 A TORTURA E A LEI 9.455/97 
 
 
De início tem-se, como leciona Alberto Silva Franco (1997), que admitida a 
tortura agora como crime comum, tanto nesta modalidade de submissão (submeter), 
como na de constrangimento (constranger do inciso I), para sua compreensão típica 
integral, depende-se de uma valoração judicial de amplo espectro, pois o diploma 
legal omitiu uma definição indispensável, qual seja, “os limites conceituais do 
‘sofrimento físico’ ou do ‘sofrimento mental’ provocados, um ou outro, pela conduta 
de constrangimento ou submissão. Ainda que se admita, para argumentar, que é 
possível, através de perícia médico-legal, detectar o sofrimento físico de alguém, 
não se pode ignorar que vários sofrimentos físicos podem ser infligidos sem que 
deles decorram vestígios. 
 
55
 COIMBRA, Mario. Tratamento do Injusto Penal da Tortura, p. 167. 
 35 
Por outro lado, o ‘sofrimento mental’ de uma pessoa constitui um conceito 
extremamente poroso, que por isso, flutua no ar, sem nenhum ponto de engate da 
realidade. O sofrimento mental, dimensionado em termos não concretos, mostra-se 
de extrema variabilidade, podendo ser diverso conforme a maior ou menor 
sensibilidade ou capacidade reativa de qualquer pessoa. “Uma ação criminosa é, no 
entanto, um acontecimento empírico que deve ser taxativamente descrito e não um 
acontecimento cujo preenchimento decorra de uma avaliação pessoal do juiz.”56 
E prossegue o grande mestre hodierno: “A locução ‘sofrimento mental’ 
constitui, portanto, uma cláusula típica de caráter tão genérico que põe em risco o 
princípio da legalidade”. Nessa linha de consideração, Schecaira (op. Cit., p. 2) 
chama a atenção para o caráter indeterminado do tipo de tortura “que pode conduzir 
a uma negação do próprio princípio da legalidade, pelo emprego de elementos do 
tipo sem precisão semântica.” 
E arremata: “O que se dizer então, quando se exige qye esse ‘sofrimento 
mental’ seja intenso (§ 1º, do art. 1º da Lei 9.455/97)? (sic)”.57 
A crítica é acompanhada por Luiz Flávio Gomes58, que afirma depender o 
“sofrimento físico” de cada vítima, de cada caso concreto, asseverando em nota de 
rodapé, para tanto; “O legislador, ao utilizar a expressão ‘intenso sofrimento’, 
colocou na lei um conceito poroso (Hassemer), de difícil compreensão. É um tipo 
aberto, que exige complemento valorativo do juiz.” 59 
“[...] Sofrimento físico importa a contração muscular decorrente do uso de 
meios físicos, mecânicos, elétricos etc., provocando sensações desconfortáveis 
como a de mal-estar e de dor, alterando muitas vezes o funcionamento regular do 
organismo e mesmo do psiquismo; [...]” 60 
Para determinarmos o que é “intenso” e, então, resultar não mais na 
tipificação de maus tratos, mas de tortura, tenho ser necessário analisar, 
primeiramente, alguns outros aspectos do referido texto legal (inciso II). 
 
56
 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97. Revista Brasileira de 
Ciências Criminais, v. 19, São Paulo. RT, 1997, p. 62. 
57
 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97, p. 62. 
58
 FRANCO, Alberto Silva, Breves Anotações sobre a Lei nº 9.455/97, p. 62. 
59
 GOMES, Luiz Flávio. Tortura (Lei 9.455/97). Estudos de Direito Penal e Processo Penal. São 
Paulo: RT, 1999, p. 123, nota 17. 
60
 BORGES, José Ribeiro. Tortura: Aspectos Históricos e Jurídicos; O Crime da Tortura da 
Legislação Brasileira Análise da Lei nº 9.455/97, p. 171. 
 36 
Assim como no inciso I (do art. 1º da Lei 9.455/97), a conduta tipificada no 
inciso II divide-se em dois elementos, um objetivo e outro subjetivo. O elemento 
objetivo consiste em “submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com 
emprego de violência ou grave ameaça a intenso sofrimento físico ou mental”. Nele 
observa-se o dolo genérico do agente de violentar ou ameaçar a vítima, que deve 
encontra-se em seu poder, ou que esteja sob sua guarda ou autoridade. 
O elemento subjetivo se faz presente na finalidade do agente, ou seu dolo 
específico, de infligir tal intenso sofrimento físico ou mental como forma de aplicar 
castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. 
Dessa forma, é necessário que o sofrimento físico ou mental, de acordo com 
cada vítima, decorrente da violência ou grave ameaça seja praticado com vistas à 
punição ou prevenção de uma ação da vítima, como é o caso de pai que bate no 
filho para castigá-lo por uma má ação, ou até mesmo do carcereiro que priva o 
detento sob sua guarda da refeição para manter a disciplina. 
A partir desta análise, podemos entender o “intenso sofrimento”, como aquele 
sofrimento excessivo, extremamente rude e que excede os limites do suportável 
tendo em vista o fim perseguido pelo agente e as condições pessoais de cada 
vítima. 
Não há dúvida que o adjetivo “intenso” é vago e impreciso, incidindo na crítica 
de ser tipo aberto e dependente do subjetivo de cada aplicador, com o que deixou 
ao intérprete a tarefa de considerar a ação do agente como típica, ou não, em 
relação à Lei de Tortura, resultando em caso negativo, que pode se tratar do crime 
de maus tratos antes analisado. 
Da mesma forma, se não estiver presente o elemento subjetivo, no caso em 
tela o fim correcional ou disciplinar, a conduta do agente poderá ser atípica, como no 
inciso anterior. 
A propósito da vítima da “submissão” (e não podemos esquecer que nosso 
objeto são crianças e adolescentes), o texto simplesmente a relaciona como 
“alguém”, pretendendo abranger qualquer pessoa, independentemente de idade, 
sexo, ou condição social, bastando que esteja naquelas condições de subordinação 
descritas, vale dizer, além da criança e do adolescente. 
Quanto à guarda, poder ou autoridade são aquelas relações analisadas 
quando o crime de maus tratos. 
 
 37

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