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1 2 AULA 1: TRABALHO DOCENTE 3 INTRODUÇÃO 3 CONTEÚDO 4 O TRABALHO DOCENTE EM DEBATE 4 NÚMEROS NO BRASIL 5 A NATUREZA DO TRABALHO DOCENTE 5 UM TRABALHO INTERATIVO 6 O TRABALHO DOCENTE E AS NOVAS DEMANDAS SOCIAIS 7 O TRABALHO DOCENTE E AS INSTITUIÇÕES ESCOLARES/UNIVERSITÁRIAS 10 NOVO CONJUNTO DE DEMANDAS SOCIAIS E DESAFIOS 11 O TRABALHO DOCENTE E AS INSTITUIÇÕES ESCOLARES/UNIVERSITÁRIAS 11 ATIVIDADE PROPOSTA 13 APRENDA MAIS 14 REFERÊNCIAS 15 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 17 CHAVES DE RESPOSTA 20 ATIVIDADE PROPOSTA 20 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 22 3 Introdução Cada vez mais nos deparamos com a denúncia de uma educação no âmbito universitário desvinculada da vida, abstrata, passiva. Entre os problemas apontados pela literatura estão a rotina sem inspiração nem objetivos e a improvisação dispersiva, confusa, e sem ordem. É possível que muitos desses fatores estejam, de alguma forma, relacionados com a ideia da ausência de necessidade de formação profissional para a atuação nesse nível de ensino, que é o único para o qual não se exige uma formação pedagógica dos professores. Para superar essa situação, buscaremos provocar reflexões sobre o trabalho docente e, em especial, sobre a prática docente no ensino superior ao abordar questões como a especificidade da função docente e os aspectos que interferem e/ou condicionam a sua profissionalidade; a gênese histórica e a constituição do campo da Didática no Brasil; as diferentes abordagens pedagógicas: fundamentos, características e implicações para o processo de ensino aprendizagem; as relações na sala de aula usada como espaço multidimensional, de circulação de diferentes saberes e conhecimentos, de interação e diálogo, de diferentes práticas, de múltiplas narrativas e linguagens. Nesse sentido, consideramos que é importante começar olhando para o interior da profissão docente, suas especificidades e seus desafios. Dessa forma, abordaremos os seguintes tópicos: (1) O contexto do trabalho docente no ensino superior; (2) A natureza do trabalho docente e sua complexidade; (3) As demandas sociais da contemporaneidade para o trabalho do professor. Objetivo: Refletir sobre o trabalho docente, no contexto do ensino superior, no Brasil, articulando questões relacionadas com as características e a complexidade da função docente, bem como com as implicações das demandas sociais contemporâneas para a sua atuação. 4 Conteúdo O trabalho docente em debate Vamos conhecer a natureza do trabalho docente, suas especificidades e sua complexidade nos dias atuais. No que se refere às exigências normativas, o trabalho docente é um trabalho como muitos outros. Ele é regulamentado, remunerado, inserido em organizações e convenções, os profissionais possuem uma certificação para exercer a profissão etc. Em nossas sociedades, o magistério é visto como uma ocupação secundária em relação tanto ao trabalho material e produtivo, como às atividades de produção do conhecimento. Entretanto, para Tardif e Lessard (2005), longe de ser uma ocupação secundária ou periférica, o trabalho docente constitui uma das chaves para a compreensão das transformações sociais. Para os autores, os professores constituem hoje uma das principais peças da economia das sociedades contemporâneas, tanto por causa do número de agentes vinculados ao sistema educacional, como pela função que desempenham. Atenção Tardif e Lessard (1991) afirmam que “os professores ocupam uma posição estratégica no interior das relações complexas que unem as sociedades contemporâneas aos saberes que elas produzem e mobilizam com diversos fins”. 5 Números no Brasil No Brasil, de acordo com dados do Ministério do Trabalho, levantados por Gatti (2009), havia, em 2006, 2.803.761 professores atuando em todos os níveis de ensino, sendo que desses, 471.032 (16,8%) eram professores do ensino superior. Entretanto, apesar da considerável oferta de trabalho, dados do INEP (2003) mostram que o magistério não é atrativo em termos de mercado e condições de trabalho, sobretudo para os níveis iniciais da escolarização (educação infantil, ensino fundamental e médio). As razões do desinteresse têm sido amplamente tratadas pela literatura especializada e pela mídia. Salários muito baixos, precárias condições de trabalho, formação inadequada são alguns dos muitos fatores apontados de forma recorrente. Atenção O magistério, hoje, além de ser um trabalho desprestigiado perante a sociedade, é apontado como um ofício de grande complexidade, em virtude, tanto das novas demandas sociais que se apresentam, como de sua própria natureza (TEDESCO e FANFANI, 2004, TARDIF e LESSARD, 2005, DUBET, 2002). A natureza do trabalho docente O trabalho docente tem um traço que o distingue de muitos outros e determina sua natureza: seu objeto é o outro – um ser humano como o próprio trabalhador. É um tipo de trabalho que coloca em relação direta o trabalhador e um outro ser humano, caracterizando-se como um trabalho interativo. 6 Segundo Tardif e Lessard (2005, p. 31), “ensinar é trabalhar com seres humanos, sobre seres humanos, para seres humanos” e essa impregnação do trabalho pelo “objeto humano” está no centro do processo ensino- aprendizagem e, portanto, do trabalho do professor. A presença de um “objeto humano” modifica profundamente a própria natureza do trabalho e a atividade do trabalhador. Nesse caso, mais do que em outros tipos de atividades profissionais, o processo do trabalho transforma dialeticamente não apenas o objeto, mas igualmente o trabalhador. Um trabalho interativo Para Tardif e Lessard (2005) e Dubet (2002), a relação face a face com o outro faz com que o tema da profissão docente se torne sempre problemático. Como um trabalho interativo, a docência está centrada, antes de tudo, nas relações entre as pessoas, com todas as sutilezas que caracterizam as relações humanas. O trabalho de docência envolve: Negociações; Controle; Persuasão; Cuidado; De acordo com Tedesco e Fanfani (2004), levanta questões de poder e conflitos de valores, visto que “os valores que circulam na escola, na família e nos meios de comunicação de massa nem sempre são coincidentes ou complementares e, com frequência, podem ser contraditórios”. 7 Suscita, também, questões que se inserem na dimensão da afetividade e da ética, que são inerentes à interação humana, à relação com o outro. Em sua opinião, o que caracteriza um bom professor? Para ser um bom professor não basta o domínio de competências técnico- científicas, nem um compromisso ético genérico, é preciso o compromisso ético-moral com o outro. Por ser um trabalho interativo, a docência comporta diversos elementos “informais”, indeterminados, imprevistos. Ensinar é agir dentro de um ambiente complexo e, por isso, impossível de controlar inteiramente. É ainda um tipo de trabalho no qual as pessoas podem opor resistência aos trabalhadores e às ações que lhes são impostas, implicando fortes mediações linguísticas e simbólicas entre os agentes e exigindo dos trabalhadores competências reflexivas de alto nível e capacidades profissionais para gerir melhor a contingência das interações humanas na medida em que vão se realizando (TARDIF e LESSARD, 2005), o que torna a docência um trabalho de grande complexidade. O trabalho docente e as novas demandassociais Para a complexidade do trabalho docente contribuem ainda elementos que se referem aos desafios postos pelas transformações sociais. Podemos citar como transformações: O impacto dos meios de informação e comunicação; As novas configurações familiares; 8 A incorporação da mulher ao mercado de trabalho; As mudanças nos modelos de autoridade; A banalização da violência; As tensões entre diferença e igualdade e consequente debate acerca da inclusão social. Essas modificações refletem, de forma significativa, no cotidiano das instituições educativas e no trabalho docente. Tedesco e Fanfani (2004) assinalam que as transformações sociais “produziram mudanças profundas no sistema de instituições responsáveis pela socialização infantil e juvenil”, entre as quais se encontram a escola básica e a universidade, que estão submetidas a um novo conjunto de demandas sociais e desafios, tais como: Transferência de atribuições Algumas responsabilidades na educação que antes eram da família foram transferidas para a escola e para os professores. De acordo com Tedesco e Fanfani (2004), “em alguns casos, chega-se a pedir à escola o que as famílias já não estão em condições de dar: contenção afetiva, orientação ético-moral, orientação vocacional...”. Relação com os estudos Os estudantes das novas gerações têm outra maneira de se relacionar com os estudos. Referindo-se a esse “novo aluno”, Dubet (1988) assinala que se trata de um agente confrontado com uma grande diversidade de orientações, isto é, com certos antagonismos, e que é obrigado a construir por si mesmo o sentido da experiência. Para o autor, a grande dificuldade está em se motivar, em conseguir dar sentido aos estudos. 9 Assim, de acordo com Tedesco e Fanfani (2000), impõe-se aos “novos professores” a exigência de que, além das competências e habilidades que tradicionalmente davam conta dos processos de aprendizagem, sejam eles mesmos experts na cultura das novas gerações, na medida em que a transmissão da cultura escolar deverá levar em conta não só as etapas biopsicológicas do desenvolvimento do estudante, mas também as diversas culturas e relações com a cultura que caracteriza os destinatários da ação pedagógica. Velocidade de transformações A aceleração das mudanças sociais na ciência, na tecnologia e na produção social obriga os docentes a buscar uma atualização permanente, para que a formação que oferecem esteja à altura das novas exigências. A mídia eletrônica de massa está centralmente implicada como contexto socializador para as novas gerações e coloca a necessidade de se analisar pedagogias exteriores à instituição escolar. Green e Bigum (1995) defendem a necessidade de se pensar o novo estudante à luz dessa aceleração das mudanças tecnológicas, o que implica desconstruir certezas e, especialmente, considerar um complexo de forças que atuam sobre a construção da identidade dos jovens nos dias de hoje. A disseminação do acesso à internet traz o desafio do plágio nos trabalhos acadêmicos. Não que ele já não existisse anteriormente, mas é recorrente na fala dos professores do ensino superior a constatação do aumento dessa estratégia estudantil, o que obriga professores a desenvolver estratégias de enfrentamento do problema. 10 Todas essas razões nos levam a reafirmar que o trabalho docente é hoje, mais que antes, um trabalho de grande complexidade e necessita ser estudado no contexto das demandas sociais a ele impostas, nos dias atuais. O trabalho docente e as instituições escolares/universitárias É preciso estudar o trabalho do professor no contexto onde ele se realiza, ou seja, nas instituições de ensino, dada a importância dessas instituições para o processo de socialização dos indivíduos e para a constituição dos sujeitos. Nessa perspectiva, consideramos que as instituições educativas constituem espaços privilegiados onde a docência se realiza e onde professores e estudantes vão construindo suas subjetividades, seus modos de ser e sentir o mundo ou, no dizer de Linhares (2000), vão construindo a “experiência de si”. A esse respeito, Bourdieu (2004) assinala que indivíduos submetidos a determinados tipos de escolas, em uma mesma época, partilham gostos, modelos, imagens, regras, linguagens, questões, frutos da interiorização dos esquemas de pensamento a que foram submetidos no processo de escolarização. Atenção Para Bourdieu (2004), “pode-se supor que cada sujeito deve ao tipo de aprendizagem escolar que recebeu um conjunto de esquemas fundamentais, profundamente interiorizados, que servem de princípio de seleção no tocante às aquisições ulteriores de esquemas, de modo que o sistema dos esquemas segundo os quais se organiza o pensamento deste sujeito deriva sua especificidade não apenas da natureza dos esquemas constitutivos e do nível de consciência com que estes são utilizados e do nível de consciência em que operam”. 11 Dessa forma, nas instituições escolares, o estudante aprende: Os conhecimentos que ali são trabalhados; Os métodos de trabalho; Os processos de pensamento; Os valores; O modos de ser, de agir e de pensar Novo conjunto de demandas sociais e desafios A fim de compreender melhor a importância do trabalho do professor para que ocorra o processo de socialização dos indivíduos e a constituição dos sujeitos. Galeria de vídeos Vejamos um trecho do filme Escritores da Liberdade. Percebeu como estudantes e professores constroem suas subjetividades juntos? O trabalho docente e as instituições escolares/universitárias Para que o estudante internalize o que é aprendido por ele nas instituições escolares, é necessária a articulação entre o cognitivo, o social e o afetivo. Nesse sentido, vamos conhecer os conceitos de dois autores: Libâneo (2002) Destaca que o professor é alguém que precisa “conhecer e compreender motivações, interesses, necessidades de alunos diferentes entre si, ajudá-los na capacidade de comunicação com o mundo do outro, ter sensibilidade para situar a relação docente no 12 contexto físico, social e cultural do aluno”, o que se torna mais difícil num contexto de extrema diversidade. Para o autor, ajudar as pessoas a constituir suas subjetividades, nesse contexto, é enfrentar a diferença e a diversidade cultural. “Como lidar didaticamente com a diversidade cultural e com a diferença na escola e na sala de aula?” Para ele, esse não é um desafio novo, mas uma tarefa que se tornou mais complexa nos tempos atuais. “Trata-se de enfrentar uma poderosa contradição. Por um lado, o justo é uma educação igual para todos. Por outro lado, também é justo um ensino que contemple a diversidade dos alunos”. Linhares (2000) Em que pese a importância das instituições escolares para a constituição das formas de ser dos agentes que aí se inserem, o autor aponta que “temos estudado muito pouco como subjetividades e sujeitos de estudantes e professores vão sendo fabricados e, por sua vez, vão fabricando escolas (e podemos acrescentar: universidades) e contribuindo para conservar ou modificar seus entornos, suas comunidades, suas cidades e, conjugando-se com outras relações sociais, ir intervindo nas sociedades e na história.” Considerando todo esse contexto de complexidade e desafios e no qual o trabalho docente está inserido é que, a partir das próximas aulas, vamos propor reflexões e colocar em discussãoo que estamos entendendo por Didática, suas diferentes dimensões e seus diversos estruturantes no âmbito do ensino superior. 13 Atenção Antes de você seguir em frente, procure realizar as tarefas que sugerimos nos itens APRENDA MAIS e ATIVIDADES. São tarefas que, certamente, lhe ajudarão não só a compreender muitas das ideias aqui colocadas, como também oferecerão novos subsídios para que você construa conhecimentos sobre as temáticas em pauta. Atividade proposta Vamos fazer uma atividade! Leia e analise de forma crítica o artigo Precisamos formar sábios e, durante a leitura, faça suas anotações para facilitar suas respostas aos itens formulados a seguir. Faça um breve registro acerca das principais ideias apontadas pela entrevistada, indicando aquelas com as quais você concorda e aquelas das quais você discorda. Justifique sua resposta. Responda a seguinte questão: que desafios e/ou que demandas estariam sendo colocados/as para o professor, tendo presente o comentário feito pela entrevistada e que reproduzimos a seguir: Um debate frequente de nossos dias é acerca de como as universidades podem contribuir com as necessidades mais imediatas da sociedade. Algumas delas são necessidades econômicas, e os estudantes vão às universidades de forma a serem treinados e qualificados para futuros empregos. Outras são descobertas e inovações e outros tipos de intervenções que podem ter 14 um efeito imediato no mundo, como a cura de uma doença. Mas as universidades têm outros propósitos, que são de longo prazo e que são mais difíceis de mensurar, mas que são extremamente importantes para todos nós. No encontro que tive com os reitores brasileiros, ouvi uma frase que resume esse pensamento: “a sociedade nos pede soluções para problemas práticos”. Mas a universidade não deve se preocupar apenas com o bem estar imediato dos seres humanos, precisa fazer também com que eles sejam sábios. As universidades têm esse propósito humano, histórico, antropológico, que nos faz transcender o momento presente. Não nos preocupamos apenas se nossos alunos terão emprego amanhã. Precisamos garantir que eles tenham conhecimento. (Drew Gilpin Faust, reitora da Harvard University, Em reportagem publicada em 25/03/2011). Aprenda mais Para ampliar sua compreensão a respeito do que estudamos nesta aula, você pode ler os seguintes artigos, todos disponíveis em http://www.scielo.br BOSI, Antônio de Pádua. A precarização do trabalho docente nas instituições de ensino superior do Brasil nesses últimos 25 anos. Educação e Sociedade. Dez 2007, vol. 28, n. 101, p.1503-1523. ISSN 0101-7330. CHIROQUE CHUNG, Sigfredo. Desafíos y perspectivas en la investigación sobre el magisterio. Em Educação e Sociedade. Ago 2007, vol. 28, n. 99, p.483-498. ISSN 0101-7330. OLIVEIRA, Dalila Andrade. Política educacional e a re-estruturação do trabalho docente: reflexões sobre o contexto Latino-americano. Em 15 Educação e Sociedade. Ago 2007, vol. 28, n. 99, p.355-375. ISSN 0101-7330. TARDIF, Maurice and RAYMOND, Danielle. Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério. Em Educação e Sociedade. Dez. 2000, vol. 21, n. 73, p.209-244. ISSN 0101-7330. TENTI FANFANI, Emilio. Consideraciones sociologicas sobre profesionalización docente. Em Educação e Sociedade. Ago 2007, vol. 28, n. 99, p.335-353. ISSN 0101-7330. Referências BOURDIEU, P. Sistemas de ensino e sistemas de pensamento. In: BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2004. BRASIL, INEP. Estatística dos professores no Brasil. Brasília, out. 2003. Disponível em:<www.sbfisica.org.br/arquivos/estatísticas_professores_INEP_2003> DUBET, F. Le Déclin de L’institution. Paris: Éditions du Seuil, 2002. GATTI, B. A.; BARRETO, E. S. S. (coord.). Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009. GREEN, B. e BIGUN, C. Alienígenas na Sala de Aula. In: Silva, T.T. da (org.) Alienígenas na sala de aula. Rio de Janeiro: Vozes, 1995, pp. 208 - 243. LIBÂNEO, J. C. Didática: velhos e novos temas. Edição do autor, maio de 2002. 16 Disponível em: http://gtdidatica.sites.uol.com.br/textos/libaneo.pdf LINHARES, C. F. Múltiplos sujeitos da educação: a produção de sujeitos e subjetividades de professores e estudantes. In: CANDAU, V. M. (org.). Ensinar e aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino (ENDIPE). Rio de Janeiro: DP&A, 2000. TARDIF, M.; LESSARD, C. O trabalho docente hoje: elementos para um quadro de análise. Rio de Janeiro: Vozes, 2005. TEDESCO, Juan Carlos e FANFANI, Emílio Tenti. Nuevos maestros para nuevos estudiantes. In: PREAL. Maestros en América Latina: nuevas perspectivas sobre su formación y desempeño. Santiago: Editorial San Marino, 2004. 17 Exercícios de fixação Questão 1 Marque a resposta correta, a partir da seguinte afirmativa: “Para ser professor universitário basta dominar os conteúdo específicos de sua disciplina e ter carisma”. Podemos dizer que tal afirmativa, pelo menos no Brasil, é bastante comum e que ocupa o imaginário social com muita frequência. Por sua vez, é possível dizer que tal afirmativa é: a) Verdadeira, porque o domínio dos conteúdos específicos de sua(s) disciplina(s) é o requisito mais importante para ser professor universitário. b) Falsa, porque o domínio dos saberes didático-pedagógicos é o requisito mais importante para ser professor universitário. c) Verdadeira, porque o professor universitário pode dispensar os saberes didático-pedagógicos e pautar seu trabalho pelas relações afetivas que estabelece. d) Falsa, porque saber um conteúdo específico não é a mesma coisa de saber promover o processo de ensino-aprendizagem desse conteúdo. 18 Questão 2 Para os autores com os quais trabalhamos nesta aula, a principal característica do trabalho docente é a relação face a face com o outro. O objeto do trabalho docente é outro ser humano, tal qual o trabalhador. Entre as consequências dessa particularidade, podemos afirmar que esse trabalho: a) Envolve questões de poder, conflitos e valores, o que torna o exercício da profissão docente mais complexo. b) Levanta questões que se inserem principalmente na dimensão afetiva, o que facilita e simplifica o trabalho. c) Lida com um objeto passivo, que não oferece resistência aos trabalhadores, facilitando o clima para a realização do trabalho. d) Está centrado na relação entre as pessoas, o que torna o trabalho sempre agradável, facilitando a mediação entre os estudantes e o conhecimento. Questão 3 Marque V (verdadeiro) ou F (falso), de acordo com a afirmativa “com relação às transformações sociais na contemporaneidade podemos afirmar que”. ( ) Elas produzem mudanças e desafiam as instituições de ensino e o trabalho do professor porque exigem que se dê conta de tarefas que outrora eram das famílias. ( ) Elas não afetam o trabalho das instituições de ensino, visto que essas são instituições singulares e preservadas do meio social. ( ) Elas afetam o trabalho do professor, exigindo deles uma formação permanente no que se refere à cultura das novas gerações e aos avanços tecnológicos. 19 Questão 4 Para Bourdieu, a escola é importante porque: a) O professor é naturalmente uma figura modelar, estruturando a subjetividadedo estudante. b) Os estudantes entram em contato com diferentes culturas. c) O estudante aprende não só os conhecimentos trabalhados, mas também métodos de trabalho, processos de pensamento, valores, modos de ser, de agir e de pensar. d) É um espaço de circulação de diferentes culturas. Questão 5 O professor Libâneo (2008) afirma que o professor precisa “conhecer e compreender motivações, interesses, necessidades de alunos diferentes entre si, ajudá-los na capacidade de comunicação com o mundo do outro, ter sensibilidade para situar a relação docente no contexto físico, social e cultural do aluno”. Nesse sentido, para este autor é necessário que o professor saiba: a) Superar a ideia de que o mais importante é uma educação igual para todos, reforçando a centralidade das diferenças culturais. b) Enfrentar e lidar com as a diferenças culturais, sem deixar de lado a busca por uma educação igual para todos. c) Reconhecer as diferenças culturais para propor mecanismos que permitam superá-las em direção a uma educação igual para todos. d) Dar prioridade às diferenças culturais, minimizando a ideia de avançar no sentido de uma educação igual para todos. 20 Atividade proposta Em relação às principais ideias contidas no artigo/na entrevista é possível destacar que a entrevistada valoriza: A parceria entre Harvard e as instituições universitárias brasileiras, afirmando que elas têm muito o que aprender com essa troca; O nível dos pesquisadores e dos estudantes universitários brasileiros; O fato de Harvard ir ao encontro (durante o processo seletivo) dos estudantes (dentro e fora dos Estados Unidos) que manifestam interesse de lá ingressar para que eles conheçam bem tudo o que a instituição pode lhes oferecer; O fato do processo seletivo para ingresso na Universidade de Harvard estar baseado (1) em exames de qualificação, como o SAT; (2) na avaliação de ensaios que os candidatos enviam (os ensaios servem para avaliar a escrita e as ideias de cada jovem); (3) na análise do histórico escolar do aluno, para verificar como ele evoluiu ao longo do ensino médio; e (4) na análise das atividades extracurriculares desses alunos; O fato de Harvard entender que é importante ter alunos que expressem capacidade liderança, caráter e diversidade de interesses. A Universidade ressalta que “a convivência no campus é algo muito valorizado e saber que cada estudante vai contribuir de forma enriquecedora é uma força que nos motiva na hora de selecionar nossos estudantes”; 21 Harvard ter uma longa tradição de excelência, uma vez que se preocupa em atrair os melhores talentos. E que isso seja parte de seu sucesso e excelência; O sucesso de Harvard estar relacionado à “ajuda generosa de famílias, apoiadores e ex-alunos, pessoas que continuam a contribuir com Harvard mesmo depois de terem deixado a universidade”; A relevância do caráter multinacional do campus, com pessoas de diversos países e culturas, contribuindo para a inovação e a excelência. Isso ajudaria no processo de descoberta e aprendizagem; O fato de que para Harvard, “a universidade não deve se preocupar apenas com o bem estar imediato dos seres humanos, precisa fazer também com que eles sejam sábios. As universidades têm esse propósito humano, histórico, antropológico, que nos faz transcender o momento presente. Não nos preocupamos apenas se nossos alunos terão emprego amanhã. Precisamos garantir que eles tenham conhecimento”; A necessidade das universidades poderem dar respostas aos grandes problemas das sociedades e do planeta – as pesquisas e a educação (o conhecimento) que as universidades oferecem podem causar impactos no tange a essas respostas; O simbolismo e o significado de uma reitora mulher contribuindo para a valorização do papel da mulher na sociedade. Uma vez que foi sugerido que você também se posicione quanto às principais ideias, apontando aquelas com as quais concorda e/ou aquelas das quais discorda, é importante que você construa suas próprias argumentações. 22 Nesse caso, não há certo ou errado, nem mesmo um gabarito fixo. Aqui o importante que você utilize sua capacidade de análise crítica. Ou seja, você deverá dizer por que concorda ou porque discorda das ideias apresentadas pela entrevistada e que foram aqui sistematizadas. Exercícios de fixação Questão 1 – D Justificativa: O professor universitário precisa enfrentar vários desafios: desde a constante desmotivação dos alunos, que muitas vezes não se interessam pelos chamados conteúdos específicos até novas demandas, como por exemplo, saber articular tais conteúdos específicos com a complexidade do contexto que marca a nossa contemporaneidade. O domínio de um determinado conteúdo e o do respectivo saber fazer (saberes profissionais diversos) não se transformam automaticamente em saber didático que permita ao professor exercer bem o seu papel no ensino. Isso significa dizer que aqueles que escolhem exercer a atividade docente precisam adquirir, desenvolver e construir esses conhecimentos e habilidades específicas. Diante dessas considerações a afirmativa apresentada do enunciado dessa questão é falsa pela própria justificativa apresentada na quarta alternativa. Questão 2 – A Justificativa: Ter o outro e, consequentemente, a relação com esse outro no centro de seu trabalho e de sua prática vai exigir do professor lidar com questões de poder em função dos papéis e lugares que cada um dos sujeitos envolvidos nessa relação ocupa: trabalhar construindo relações mais democráticas e simétricas é algo que vai exigir muito preparo por parte do professor. Lidar com questões de poder e complexo e exige complexas habilidades. Além disso, saber lidar com as diferenças é outro desafio relevante. As diferenças podem gerar conflitos de diferentes dimensões inclusive no que se refere aos valores. Administrar isso impõe desafios e exige conhecimentos plurais. 23 Questão 3 – V, F, V Justificativa: Várias observações feitas no próprio texto desta aula sustentam e justificam as alternativas verdadeiras, como por exemplo: [...] Tedesco e Fanfani (2004) assinalam que “esses processos produziram mudanças profundas no sistema de instituições responsáveis pela socialização infantil e juvenil”, entre as quais se encontram a escola básica e a universidade, que estão submetidas a um novo conjunto de demandas sociais. “Em alguns casos, chega-se a pedir à escola o que as famílias já não estão em condições de dar: contenção afetiva, orientação ético-moral, orientação vocacional...” (TEDESCO e FANFANI, 2004, p. 70). [...] Referindo-se a esse “novo aluno”, Dubet (1988) assinala que se trata de um agente confrontado com uma grande diversidade de orientações, isto é, com certos antagonismos, e que é obrigado a construir por si mesmo o sentido da experiência. Para o autor, a grande dificuldade está em se motivar, em conseguir dar sentido aos estudos. Assim, de acordo com Tedesco e Fanfani (2000), impõe-se aos “novos professores” a exigência de que, além das competências e habilidades que tradicionalmente davam conta dos processos de aprendizagem, sejam eles mesmos experts na cultura das novas gerações, na medida em que a transmissão da cultura escolar deverá levar em conta não só as etapas biopsicológicas do desenvolvimento do estudante, mas também as diversas culturas e relações com a cultura que caracteriza os destinatários da ação pedagógica.24 Questão 4 – C Justificativa: Embora a demais afirmativas estejam corretas, a terceira alternativa é a correta porque está diretamente relacionada ao pensamento de Bourdieu (o enunciado faz referência a autor) expresso nesta aula. Questão 5 – B Justificativa: a segunda alternativa está correta, pois se fundamenta no trecho extraído da própria aula a saber: Para o autor, ajudar as pessoas a constituir suas subjetividades, nesse contexto, é enfrentar a diferença e a diversidade cultural. “Como lidar didaticamente com a diversidade cultural e com a diferença na escola e na sala de aula?” Para ele, esse não é um desafio novo, mas uma tarefa que se tornou mais complexa nos tempos atuais. “Trata-se de enfrentar uma poderosa contradição. Por um lado, o justo é uma educação igual para todos. Por outro lado, também é justo um ensino que contemple a diversidade dos alunos”. Atualizado em 16 mai. 2014 1 2 AULA 2: CONSTRUÇÃO DO SABER EM DIDÁTICA 3 INTRODUÇÃO 3 CONTEÚDO 4 A DIDÁTICA EM SUAS ORIGENS 4 DIDÁTICA: ASPECTOS HISTÓRICOS NO CONTEXTO DO PENSAMENTO BRASILEIRO 4 1º MOMENTO: O SONHO TECNICISTA 5 2º MOMENTO: UM CAMPO EM CRISE 9 3º MOMENTO: O MOVIMENTO DE RECONSTRUÇÃO DA DIDÁTICA 10 INVESTIGAÇÃO E ANÁLISE CONTÍNUA NO CAMPO DA DIDÁTICA 15 POR UMA DIDÁTICA CRÍTICA E INTERCULTURAL 16 UMA AGENDA PARA A DIDÁTICA HOJE 19 DESCONSTRUINDO FÓRMULAS ANTIGAS 22 ATIVIDADE PROPOSTA 23 APRENDA MAIS 24 REFERÊNCIAS 25 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 27 CHAVES DE RESPOSTA 32 ATIVIDADE PROPOSTA 32 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 32 3 Introdução Como vimos na primeira aula, os desafios que estão postos para o trabalho docente parecem cada dia maiores, ou seja, as novas demandas sociais, as novas formas de os jovens se relacionarem com o conhecimento e as instituições de ensino, os avanços tecnológicos e científicos estão exigindo do professor mais do que o domínio do conhecimento de sua disciplina para que ele possa dar conta do trabalho que deseja e precisa realizar. As questões relativas à Didática fazem parte do cotidiano de qualquer professor e, por isso, mesmo têm sido objeto de uma ampla reflexão no Brasil nos últimos trinta anos. Nesta aula, vamos procurar refletir por que a Didática – desde sua gênese – envolve uma polissemia de conceitos e/ou concepções, desde uma perspectiva mais instrumental e tecnicista até uma perspectiva fundamental ou crítica. Essa reflexão vai nos remeter para uma das tensões que está posta, hoje, no campo da Didática por diferentes especialistas da área e que pode ser assim resumida: dispersão ou diversificação? Em seguida, pretendemos fazer avançar a análise em torno da Didática Crítica, mas agora iluminada pela perspectiva intercultural. A ideia é aprofundar as discussões sobre princípios e/ou características do que estamos considerando uma Didática Crítica e Intercultural. E coerente com tal perspectiva, vamos propor uma agenda para a Didática concebida e praticada no âmbito da universidade hoje. Objetivos 1. Compreender a constituição do campo da Didática no Brasil, em uma perspectiva histórica, e as implicações desse movimento no que tange à polissemia de conceitos, objetos e tensões. 2. Compreender os conceitos e/ou concepções do que estamos chamando de uma Didática Crítica e Intercultural, buscando identificar aspectos e/ou princípios configuradores de uma agenda, possível, para a Didática concebida e praticada no âmbito da universidade hoje. 4 Conteúdo A Didática em suas origens Para compreendermos como ocorre a construção do saber, precisamos, antes de tudo, entender a gênese do conceito de Didática para Comenius, o primeiro educador do Ocidente a se interessar pela relação ensino- aprendizagem. Vejamos, a seguir, o que Narodowski (2004) assinala na apresentação de seu livro “Comenius e a educação”: “À medida que estudamos com mais profundidade os dispositivos das instituições escolares modernas e da Pedagogia, mais perto chegamos de Comenius: essa fonte, esse início, esse grau zero, essa caixa de ferramentas insubstituível para compreender o que somos e o que poderíamos ter sido, mas jamais seremos”. Essa perspectiva confirma a importância de conhecermos a gênese do conceito de Didática presente na obra desse intelectual que viveu no século XVII e teve que lutar contra os dogmas que caracterizavam a sociedade de seu tempo. Veja aqui um breve histórico de Comenius e a Didática. Didática: aspectos históricos no contexto do pensamento brasileiro Podemos afirmar que o campo da Didática é um espaço social de lutas e disputas que ocorrem em torno da autoridade científica, tal como os demais campos científicos (BOURDIEU, 1983). 5 Nesse sentido, é possível compreender que o próprio conceito de Didática e a definição de seu objeto de estudo são resultados de disputas, social e historicamente situadas. Com esse pressuposto e visando compreender melhor o que tem orientado as nossas práticas didático-pedagógicas, também no ensino superior, vamos analisar a constituição do campo da Didática no Brasil, segundo suas diferentes perspectivas e/ou concepções, dividida em três momentos: 1º momento: o sonho tecnicista A partir dos anos 1920 e até os primeiros anos da década de 1960, o Brasil viveu um período de grande efervescência social e política, com reflexos significativos no campo da educação. Nesse período, por exemplo, foram criados: Ministério da Educação e Saúde Pública; O primeiro curso de Pedagogia do Brasil; O INEP (Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos). Também nesse período foi divulgado o “Manifesto dos pioneiros da educação nova”, que propunha a reconstrução educacional do país e que influenciou diversas reformas educacionais com vistas à estruturação/reestruturação do ensino brasileiro. O período de efervescência no campo educativo resultou na elaboração da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, promulgada em 20 de dezembro de 1961. Candau (1991) afirma que “nesse contexto, a Didática faz o discurso escolanovista”. 6 Reconhecemos que, dentre as características do movimento escolanovista, estava a de buscar, na contribuição das ciências, meios para dotar de racionalidade os serviços educacionais (Saviani, 1999). Nessa perspectiva, destaca-se a Psicologia evolutiva e da aprendizagem como fundamentos da Didática. Podemos afirmar que o discurso escolanovista, que predominou na educação brasileira e no discurso da Didática entre os anos de 1945 e 1960, tinha como características: Buscar a superação da escola tradicional, afirmando a necessidade de se partir dos interesses das crianças para uma efetiva aprendizagem; Privilegiar o caráter metodológico como conjunto de procedimentos e técnicas de ensino ou recursos vários que buscavam garantir ou facilitar a aprendizagem do aluno; Defender os princípios de atividade, de individualização e de liberdade e afirmar a necessidade de “aprender fazendo” e de “aprender a aprender” (CANDAU, 1991). No final da década de 1960 e, portanto, já no período de ditadura militar, “buscou-se ajustar a educação à nova situação por intermédio de novas reformas de ensino” (Saviani, 1999, p. 29). Nesse momento, destacam-se: O parecer 252 de 1969, que reformulou os cursos de Pedagogia, dividindo-o em habilitações; A lei 5692/71, que fixava as novas Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus. Essas regulações ocorreram no âmbito da pedagogia tecnicista que, a partir de 1969, foi assumida oficialmente pelo estado brasileiro. 7 Você sabe quais são as características dessa pedagogia e o que ela buscava? Na pedagogia tecnicista, buscava-se, por meio do uso adequado de técnicas de ensino, garantir a eficiência e a produtividade do processo educativo. Segundo Saviani (1999), isso seria obtido “por meio da racionalização que envolvia o planejamento do processo sob o controle de técnicos supostamente habilitados”, que acompanhariam, controlariam, avaliariam e direcionariam as atividades da escola, evitando desvios na direção do seu sucesso (RANGEL, 1999). Vejamos: De acordo com Candau (1991), “a visão industrial penetra o campo educacional e a Didática é concebida como estratégia para o alcance dos “produtos” previstos para o processo ensino-aprendizagem”. A Didática assumiu, assim, uma perspectiva idealista e centrada na dimensão técnica do processo de ensino aprendizagem. Essa perspectiva foi 8 denominada por Rangel (1999) como “sonho tecnicista”, entendendo-se o tecnicismo como o uso descontextualizado da técnica. Há, assim, uma crença na neutralidade política da educação. Nesse sentido, a escola era vista como fator de mudança social, capaz de resolver, por meio das técnicas neutras, os problemas econômicos e sociais. Atenção Considerando o “sonho tecnicista”, Candau (1991) assinala que “os condicionantes socioeconômicos e estruturais da educação não são levados em consideração. A prática pedagógica depende exclusivamente da vontade e dos conhecimentos dos professores que, uma vez dominando os métodos e técnicas desenvolvidos pelas diferentes experiências escolanovistas, poderão aplicá-los às diferentes realidades em que se encontrem”. Em síntese, pode-se afirmar que do final dos anos 1940, quando a Didática foi transformada em disciplina nos cursos de formação de professores, até os anos 1970, seu discurso oscilou entre as perspectivas escolanovista e tecnicista. Embora as duas abordagens se diferenciem muito em razão dos contextos sociais e políticos nos quais se inseriam, ambas se caracterizam pela afirmação da dimensão técnica do processo de ensino-aprendizagem e o silenciar da dimensão política. (CANDAU, 1991). 9 Segundo Candau (1991), trata-se de partir do pressuposto da neutralidade do técnico, que significa “ver a prática pedagógica exclusivamente em função das variáveis internas do processo de ensino-aprendizagem, sem articulação com o contexto social em que esta prática se dá”. 2º momento: um campo em crise A partir da metade da década de 1970, acentuou-se, no Brasil, a crítica às perspectivas anteriores, baseada na denúncia da falsa neutralidade do técnico e na afirmação da impossibilidade de uma prática pedagógica que fosse social e politicamente orientada (CANDAU, 1991). No bojo dessa crítica, a Didática foi fortemente contestada e negada, a partir da acusação de que seu conhecimento era inócuo. No contexto dessa crítica estão: O aprofundamento de problemas sociais reprimidos que se avolumavam; A consequente derrocada do regime militar; A chegada ao Brasil de uma literatura, sobretudo europeia, que fazia um forte questionamento à escola, como aparelho ideológico do Estado, que contribuía para a reprodução social. Atenção Nesse período, buscava-se o desvelamento dos reais compromissos político-sociais das afirmações aparentemente neutras, sempre comprometidas com o status quo. Segundo Rangel (1999), “transformar é, então, revolver, revolucionar o sistema educacional e sociopolítico”. 10 Nessa revolução de ideias era preciso revolver a base da estrutura escolar, arrancando-se do terreno que a sustentava os vestígios de uma educação tecnicista, incluindo-se aí a própria Didática. “Em terreno limpo e fértil, seriam, então lançadas as sementes de uma educação geral, crítica e política” (RANGEL, 1999). Desse modo, nos anos 1980, alguns autores negavam a dimensão técnica da prática docente e a própria Didática. Alguns cursos de formação de professores chegaram a retirar de seus currículos a disciplina Didática, substituindo-a pela História ou a Filosofia da Educação. “Nesse momento, mais do que uma Didática, o que se postula é uma antididática” (CANDAU, 1991). Atenção Em síntese, esse foi um momento caracterizado pela “afirmação do político e a negação do técnico”. O que se pode constatar, mais uma vez, é que as diferentes dimensões do processo ensino-aprendizagem apareciam sempre em contraposição umas às outras: “a afirmação de uma, levando à negação das demais” (CANDAU, 1991). 3º momento: O movimento de reconstrução da Didática A partir do final dos anos 1970, em resposta ao movimento de negação da Didática, teve origem, no Brasil, um movimento de reconstrução desse campo. Candau (1991) afirma que esse movimento teve como principal marco o encontro chamado “A Didática em questão”, realizado em novembro de 1982, 11 na PUC-Rio, e que teve como objetivo central promover uma revisão crítica do ensino e da pesquisa em Didática. Para os professores/pesquisadores que integraram esse movimento, competência técnica e competência política não eram aspectos contrapostos. “As dimensões política, técnica e humana da prática pedagógica se exigem reciprocamente” (CANDAU, 1991). A partir do período de reconstrução, a Didática de caráter exclusivamente instrumental foi alterada para uma “Didática Fundamental”, que assumisse a multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem e colocasse a articulação entre as dimensões técnica, humana e política, no centro configurador de sua temática. Nessa perspectiva, o movimento propunha uma reflexão didática a partir da análise das experiências concretas, explicitando seus pressupostos, seu contexto e as visões de homem, de sociedade, de conhecimento e de educação que veiculavam (CANDAU, 1991). A “Didática Fundamental” assumia, assim, um compromisso com a transformação social, buscando práticas pedagógicas que garantissem um ensino de fato eficiente para a maioria da população, sobretudo para aqueles das camadas sociais menos favorecidas. Em síntese, é possível afirmar que esse momento “pode ser considerado como o momento de uma verdadeira ‘refundação’ da reflexão e pesquisa da Didática no país” (CANDAU, 2008). 12 Vamos ver como dois autores se posicionam sobre esse período: Oliveira (2000) Pode-se afirmar que, ao longo dos anos 1980, esse movimento de reconstrução do campo da Didática ocorreu em torno da “luta em defesa da legitimidade do saber didático-pedagógico, enquanto constituindo um campo de conhecimento e enquanto conteúdo do currículo da formação do educador, no contexto da luta pela especificidade e importância do papel dos processos da educação e do ensino, no movimento de recuperação e democratização da escola pública e na transformação social”. Soares (2000) Nesse momento, “os agentes que ocupavam posições dominantes no campo da Didática reconheceram a necessidade de (re)estruturar esse campo, ameaçado pelas críticas que lhe eram então feitas, rever sua natureza, reconstruir seu conteúdo”. Essa pode ser considerada como tendo sido uma estratégia de defesa do campo, ou seja, os agentes, ultrapassando as lutasque os opunham internamente (sobretudo em torno dos objetos de estudo e conteúdos da disciplina), organizaram-se para enfrentar a ameaça ao campo que vinha do desequilíbrio das relações de força e dos antagonismos entre agentes que defendiam e agentes que questionavam a própria existência de um campo didático. A partir dos anos 1990, com o campo mais consolidado e com um cenário social que incluía a hegemonia neoliberal, as transformações dos processos produtivos, o desemprego, o aumento da violência urbana, o avanço das tecnologias de informação e comunicação e muitas outras questões, outros temas, perspectivas, agentes e posições passaram a constituir objetos e conteúdos da Didática. 13 Passaram a ser objetos das pesquisas nesse campo do conhecimento temas como: O trabalho docente; A formação de professores; As tensões entre diferença e igualdade; A diversidade cultural; O professor reflexivo; O professor pesquisador; A identidade docente. Atenção Essa diversificação de objetos contribuiu, segundo Oliveira (2000), para a permanência e o aprofundamento dos conflitos internos ao próprio campo e foi um momento em que os dissensos foram expressados e consolidados, houve a busca de um novo consenso. Percebeu o impacto causado pelo professor reflexivo em sua classe? Por isso a importância desse e outros fatores se tornarem objetos de pesquisa no campo da didática. Galeria de vídeos A fim de compreendermos melhor o conteúdo tratado nesta seção, vejamos uma cena do filme Sociedade dos Poetas Mortos. O campo da Didática está, assim, sendo desafiado por novas problemáticas, em virtude de novos contextos e demandas sociais. 14 De acordo com Candau (2008), novos elementos afetam o campo da Didática: A tentativa da retomada de uma visão tecnicista, em consonância com as atuais políticas de caráter neoliberal; A necessidade de busca de novos referencias para lidar com novos contextos, novos sujeitos e novas problemáticas; Os impactos provocados pelas tecnologias da informação e comunicação no processo de ensino-aprendizagem. Entre os desafios atuais para o campo está o que alguns pesquisadores entendem ser uma certa dispersão de temáticas e objetos de pesquisa, identificada na produção da área. Está também a tensão e/ou confronto entre o campo da Didática e outros campos como o do Currículo e o da Formação de Professores. Nesse sentido, Libâneo e Candau têm visões diferentes: Libâneo (2008) Chama a atenção sobre os “riscos” de uma descaracterização da Didática, que muitas vezes afasta da formação de professores o estudo das questões mais concretas e relevantes da escola: A aprendizagem dos alunos; As formas de organização e gestão da escola; Os formatos curriculares; A didática e a prática de ensino, necessárias para ajudar os professores a enfrentar demandas da prática. Candau (2008) Essa dispersão pode ser interpretada como um momento de desestabilização e diversificação, em que emergem uma pluralidade de 15 enfoques, temáticas e problemáticas. “O desafio atual da Didática pode ser sintetizado em como trabalhar com a diferença, ou melhor, com as diferenças culturais de seus próprios sujeitos/atores e protagonistas, favorecendo espaços de interlocução e diálogo entre, inclusive, os grupos de pesquisa presentes neste campo”. Investigação e análise contínua no campo da Didática Diante dessas e de outras tensões, entendemos que é necessário e fundamental que se continue a investigar e a analisar o campo da Didática – um campo sempre em movimento, sempre diante de novos desafios –, em busca de novos consensos, mesmo que sejam provisórios. Incorporação de novas preocupações no campo da didática Antes de continuarmos nossa aula, vejamos a charge a seguir: Adaptado de: www.mundogaturro.com A partir da leitura da charge, podemos perceber que a incorporação de novas preocupações no campo da didática fizeram-se necessárias. Dessa forma, é preciso sublinhar que a Didática se enriquece ao incorporar uma série de novas preocupações que ampliam o foco de suas atenções para 16 além das questões relacionadas ao “como fazer” ou, em outras palavras, para além dos seus temas “clássicos” como, por exemplo: Planejamento; Métodos; Técnicas; Recursos didático-pedagógicos; Avaliação. A incorporação de novos temas é até mesmo uma exigência, para que a Didática possa contribuir de modo mais efetivo para o desenvolvimento de um processo de ensino-aprendizagem mais significativo, relevante e comprometido com a formação de sujeitos que possam responder às demandas do mundo atual e, mais do que isso, possam transformá-lo no sentido da construção de sociedades mais justas e dignas para todos e todas. Por uma Didática crítica e intercultural Para responder aos desafios que, na contemporaneidade, estão sendo enfrentados pela Educação em geral e de modo mais particular pela Educação formal em seus diferentes níveis e/ou segmentos, a Didática precisa estar antenada com os princípios do que estamos chamando de uma Didática crítica e intercultural. Você sabe o que essas duas perspectivas significam? Perspectiva crítica No que se refere à perspectiva crítica e mesmo reconhecendo que não há uma só configuração que a defina, Candau (2003) afirma que existem características comuns e relevantes para orientar nossas concepções e práticas didáticas: 17 Conceber os processos educacionais como historicamente situados; Articular a educação com outros processos sociais; Trabalhar sistematicamente a relação teoria-prática; Favorecer processos de construção de sujeitos autônomos, competentes, solidários capazes de ser sujeitos de direito no plano pessoal e coletivo, capazes de construir histórias e apostar em um mundo e em uma sociedade diferentes, de utilizar metodologias ativas, participativas, personalizadas e multidimensionais, articuladoras das dimensões cognitiva, afetiva, lúdica, cultural, social, econômica e política da educação. Perspectiva intercultural Segundo Candau (2009), essas características se complementam e são enriquecidas quando as articulamos com as características de uma Didática na perspectiva intercultural, ou seja, uma Didática que “quer promover uma educação para o reconhecimento do “outro”, para o diálogo entre diferentes grupos sociais e culturais. Uma educação para a negociação cultural, que enfrenta os conflitos provocados pela assimetria de poder entre os diferentes grupos socioculturais em nossa sociedade, e é capaz de favorecer a construção de um projeto comum, pelo qual as diferenças são dialeticamente integradas”. Nesse contexto, Koff (2011) afirma que “estar comprometido/a com a construção de uma teoria e prática didático-pedagógica crítica e intercultural significa conceber e realizar processos de ensino-aprendizagem orientados no sentido de: 18 Valorizar a construção da autonomia do/a aluno/a, reconhecendo-o/a sujeito da construção de sua história particular e da história em geral; Ter a emancipação do/a aluno/a como horizonte; Ampliar e/ou reforçar os mecanismos para o seu autoconhecimento, valorizando processos de construção de identidade(s); Reconhecer, valorizar e fazer dialogar os diferentes grupos culturais; Empoderar esses diferentes grupos culturais, pondo em questão o etnocentrismo; Trabalhar os conflitos que emergem das e/ou nas relações interpessoais, principalmente aqueles que são fruto de preconceitos e de discriminações, apostando, inclusive, no potencial dos mecanismos de negociação e na construção coletiva de normas/regras e/ou códigos de convivência; Reconhecer, valorizar, fazer circular e/ou articular diferentes saberes, conhecimentos e culturas, incorporando diferentes narrativas e linguagens; Valorizar e empregar procedimentos metodológicos diversificados, dando ênfase à produção coletiva e/ou colaborativa, sem deixar de valorizar a experiência e a produção de cada um”. Atenção Koff (2011) garante que “estar comprometido/a, com a construção de uma teoria e prática didático-pedagógica critica e intercultural significa conceber e realizar processos de ensino- aprendizagem contextualizados, tendo presente que os contextos são multiculturais e/ou marcados pela diversidade. Processos de ensino-aprendizagem que, portanto, afirmam, incorporam e se enriquecem com as diferenças culturais, sem negar a busca pela igualdade de direitos. E que também buscam promover o diálogo entre as práticas vividas na escola e as demais práticas sociais”. 19 Galeria de vídeos Na aula anterior, vimos um trecho do filme Escritores da Liberdade, você está lembrado? Veremos, agora, um novo trecho desse mesmo filme a fim de expor um exemplo prático do que estamos estudando. Uma agenda para a Didática hoje Inspirados por outras agendas já construídas, tendo presente principalmente a escola (Candau, 2000 e Koff, 2011), vamos apresentar uma proposta de uma agenda para a Didática hoje, relacionada à concepção e à prática Didática vividas no âmbito universitário. É importante ressaltar que não pretendemos esgotar todos os aspectos que podem fazer parte de uma agenda para a Didática hoje e cujo objeto é o processo de ensino-aprendizagem que acontece nos espaços da universidade. Ao contrário, nossa intenção é apresentar apenas alguns princípios e/ou aspectos básicos integrantes dessa agenda e que, certamente merecem ser complementados, segundo as características de cada contexto. E mais: são princípios e/ou aspectos que devem ser analisados e problematizados, sempre com vistas a uma reelaboração crítica e em diálogo com outras propostas. Para pensar, conceber e viver a Didática no âmbito universitário hoje, consideramos que são necessários e prioritários os seguintes pontos: Compreender e dialogar com o cenário e/ou o contexto atual; Compromisso com a teoria e prática da Didática crítica e intercultural; Saber lidar com as diferença culturais; 20 Ressignificar os temas “clássicos” da Didática; Rever/reorientar a formação/a atualização dos professores. Compreender e dialogar com o cenário e/ou o contexto atual Reconhecer a complexidade e desafios da Didática. Vivemos em tempos de crise (ética, ambiental, econômica, entre outras) e difíceis (tempos de exclusão, de lutas contra o preconceito e a discriminação, de intolerância, entre outras questões). No entanto, são, também, tempos de avanços, como por exemplo, no campo das tecnologias e das ciências de uma forma geral. Além disso, são contextos plurais, constituídos por diferentes grupos culturais. Cenário que não pode ser ignorado. Ao contrário, precisa ser analisado e problematizado, buscando-se identificar quais seus impactos e/ou demandas quando o tema é pensar, conceber e viver as práticas educativas nos espaços de ensino-aprendizagem da universidade. Compromisso com a teoria e prática da Didática crítica e intercultural Considerar, portanto, as possibilidades de articulação entre os princípios e as características das perspectivas crítica e intercultural da Didática, apresentados, mesmo que de forma breve, no início da nossa aula, adotando- os como norteadores e/ou configuradores da reinvenção da universidade e/ou dos processos de ensino-aprendizagem a ela vinculados, reconhecendo, inclusive, a importância desses princípios “tomarem” e/ou “invadirem” toda a universidade/processos, de modo a afetar todas as suas dimensões e ações. Saber lidar com as diferenças culturais Acreditar que a universidade precisa romper com sua tendência, tal como a escola, de se manter “cristalizada” em uma perspectiva monocultural. 21 Sabemos que não é fácil, nem para a escola, nem para a universidade, lidar com a pluralidade e com as diferenças culturais. Todavia, é um desafio a ser vencido, principalmente nesse momento em que a abrangência e o acesso às universidades se ampliam e diferentes grupos culturais são por elas acolhidos. Segundo Koff (2011) “o tema da diferença não é novo na Educação e que, ao longo do tempo, seu conceito tem variado – desde associado à ideia de diferentes capacidades para aprender, chegando à importância de incorporar no processo de ensino-aprendizagem o que é próprio e/ou específico do indivíduo (conceitos fortemente marcados por referenciais psicológicos e que permanecem até hoje no imaginário de muitos/as educadores/as), atingindo uma concepção mais centrada na diversidade das classes sociais e na desigualdade de oportunidades para então avançar no sentido de um conceito que privilegia a dimensão cultural, ou seja, as diferenças culturais”. No entanto, devemos reconhecemos que lidar com as diferenças culturais, seja na escola, seja nos espaços universitários será sempre um desafio e um desafio para o qual, certamente, não vamos encontrar uma única resposta, uma vez que, coerente com os próprios princípios e características de uma Didática Crítica e Intercultural, acreditamos que existirão muitas possibilidades a serem construídas no próprio contexto, tempo e espaço aonde essas diferenças se situam. Ressignificar os temas “clássicos” da Didática Candau (2000) afirma que temas como: planejamento, métodos, técnicas, disciplina na sala de aula e avaliação também precisariam ser retrabalhados no âmbito da universidade, levando em conta os novos contextos, os sujeitos que dela participam, bem como os novos desafios com os quais a universidade tem se confrontado. 22 Mais do que isso, esses temas precisam ser ressignificados, tendo presente a abordagem crítica e intercultural da Didática, bem como a explicita preocupação de superar uma tendência meramente instrumental no trato dessas questões. Rever/reorientar a formação/a atualização dos professores Diante da pluralidade dos contextos, da complexidade dos desafios presentes no cotidiano da vida universitária e da crença de que a Didática crítica e intercultural precisa tomar nossas concepções e práticas educativas como um todo, entendemos que, tanto os cursos de licenciatura, como os espaços de formação e/ou atualização em serviço também precisam ser ressignificados. Caso contrário, correremos o risco de “cristalizar” os processos de ensino- aprendizagem, comprometendo nosso projeto maior de edificar uma universidade capaz de formar cidadãos, sujeitos de direitos, construtores de uma sociedade mais solidária e justa. Nesse sentido, os processos de formação e/ou atualização dos docentes precisam estar marcados – em todas as suas dimensões – pelos mesmos pressupostos enunciados ao longo desta nossa aula. Desconstruindo fórmulas antigas É preciso sublinhar que propor uma agenda para a Didática concebida e vivida no âmbito universitário tem a intenção de desconstruir as fórmulas prontas e cristalizadas, bem como provocar o debate, no sentidoda reinvenção da Didática, de seu próprio objeto – o processo de ensino- aprendizagem – e, consequentemente, da própria universidade. No entanto, não desejamos ser prescritivos. Segundo Koff (2011), “existem inúmeras possibilidades e/ou opções para se construir uma agenda, principalmente quando o tema envolve refletir acerca da Didática que 23 desejamos construir hoje para dar conta da escola (no caso da universidade) na contemporaneidade com todos os seus limites e possibilidades”. Isso é coerente com a ideia de que não há como apontar uma única direção ou caminho para a concepção/realização dos processos de ensino- aprendizagem e, consequentemente dos processos didáticos no âmbito universitário. O desafio está, exatamente, em ter que reinventar e/ou reorientar esses processos, levando em conta a especificidade das situações em que estão inseridos. Trata-se de uma questão em aberto e sem fórmulas prontas ou acabadas, ou seja, é uma questão em constante movimento. Diante da ausência de sem fórmulas prontas ou acabadas para a concepção/realização dos processos de ensino-aprendizagem, convidamos você a refletir sobre a proposta de atualização. Busque ampliar essa agenda incorporando novas ideias. Converse com outros professores universitários. Procure descobrir o que eles pensam acerca das ideias que veiculamos ao longo dessa nossa aula. Veja se eles têm algo a acrescentar ou, até mesmo, para modificar. O debate está aberto! Atividade proposta Agora que terminamos nossa aula, vamos realizar uma atividade a fim de testar o conhecimento aprendido? 24 Leia e analise de forma crítica o texto: Conversas com... Sobre a Didática e a perspectiva multi/intercultural. In: CANDAU, Vera Maria (org.). Educação Intercultural e Cotidiano Escolar. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006, p. 99 a 113). Durante a leitura, faça suas anotações para facilitar suas respostas ao item formulado a seguir. a) Depois de ler atenta e criticamente o texto sugerido, confronte as reflexões ali apresentadas por Candau e Koff com as ideias desenvolvidas no texto desta aula. A partir daí, crie e registre suas próprias conclusões acerca da temática abordada. Aprenda mais Para saber mais sobre o assunto estudado nesta aula, leia os seguintes artigos: CANDAU, V. M.; LEITE, M. S. A didática na perspectiva multi/intercultural em ação: construindo uma proposta. Cadernos de Pesquisa. Dez 2007, vol. 37, n.132, p.731-758. Disponível em: <http://www.scielo.br> CANDAU, V. M. Memória(s), Diálogos e Buscas: aprendendo e ensinando Didática. Revista Educação Unisinos, vol. 12, n. 3, setembro/dezembro 2008. 174-181. Disponível em: http://www.unisinos.br/publicacoes_cientificas/images/stories/pdfs_ed ucacao/vol12n3/174a181_art02_candau.pdf CASTRO, A. D. A trajetória histórica da didática. 25 Disponível em: <http://www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_11_p015-025_c.pdf> Referências BOURDIEU, P. O campo científico. Em ORTIZ, Renato (org.). Pierre Bourdieu: sociologia. São Paulo: Ática, 1983. CANDAU, V. M. A Didática e a formação de educadores: da exaltação à negação: a busca da relevância. In: CANDAU, V. M. (org.). A Didática em questão. 10ª edição. Rio de Janeiro: Vozes, 1991. CANDAU, V. M. A Didática hoje: uma agenda de trabalho. In: Didática, Currículo e Saberes Escolares. Rio de Janeiro: DP&A, 2000, p.149 a 160. _________________. Pedagogias Críticas: ontem e hoje. In: Revista Novamerica. Rio de Janeiro, n. 97, março, 2003, p.58 a 61. _________________. Memória(s), Diálogos e Buscas: aprendendo e ensinando Didática. In: Revista Educação Unisinos, vol. 12, n. 3, setembro/dezembro 2008. 174-181. Disponível em: <http://www.unisinos.br/publicacoes_cientificas/images/stories/pdfs_educaca o/vol12n3/174a181_art02_candau.pdf> ________________. Memória(s), Diálogos e Buscas: aprendendo e ensinando Didática. In: Didática. Questões Contemporâneas. Rio de Janeiro: Forma & Ação, 2009, p. 29 a 45. 26 _________________. Educação Escolar e Culturas: Multiculturalismo, Universalismo e Currículo. Em CANDAU, V. M. (org.). Didática. Questões Contemporâneas. Rio de Janeiro: Forma & Ação, 2009, p. 47 a 60. CANDAU, V. M.; KOFF, A. M. N. S. Conversas com... Sobre a Didática e a perspectiva multi/intercultural. In: CANDAU, V. M. F. (org.). Educação Intercultural e Cotidiano Escolar. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006, p. 99 a 113. COMENIUS, J. A. Didática Magna. Trad. Ivone Castilho Benedetti. 3ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 2006. KOFF, A. M. N. S. Uma Agenda para a Didática Hoje: atualizando possíveis prioridades. In: LIBÂNEO, J. C.; SUANNO, M. V. R. (orgs.). Didática e Escola em uma Sociedade Complexa. Goiânia: CEPED, 2011, p.133 a 153. LIBÂNEO, J. C. O campo teórico e profissional da didática hoje: entre Ítaca e o canto das sereias. In: Trajetórias e processos de ensinar e aprender: didática e formação de professores. XIV ENDIPE. Porto alegre, 2008. NARODOWSKI, M. Comenius & a Educação. Tradução de Alfredo Veiga- neto. 2ª edição. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. OLIVEIRA, M. R. N. S. 20 Anos de ENDIPE. 2000. Disponível em: <http://boletimef.org/biblioteca/44/Oliveira-Artigo> RANGEL, M. Supervisão do sonho à ação – uma prática em transformação. In: FERREIRA, N. S. C. Supervisão Educacional para uma escola de qualidade. São Paulo: Cortez, 1999. 27 SAVIANI, D. A supervisão educacional em perspectiva histórica: da função à profissão pela mediação da idéia. In: FERREIRA, N. S. C. Supervisão Educacional para uma escola de qualidade. São Paulo: Cortez, 1999. SOARES, M. 20 anos de ENDIPE: uma tentativa de compreensão do campo. In: CANDAU (org.). Didática, currículo e saberes escolares. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. Exercícios de fixação Questão 1 Para Comenius, considerado o pai da Didática, a educação era condição para o processo de humanização. Por isso, ela: a) Deveria ser universal, baseada no conhecimento científico e ordenada. b) Deveria ser oferecida, sobretudo às mulheres e aos pobres. c) Deveria atender às necessidades de cada classe social. d) Deveria se preocupar com os conteúdos a serem ensinados e não com os métodos. Questão 2 O movimento escolanovista no Brasil teve origem a partir dos anos 1920. Qual das alternativas abaixo NÃO caracteriza esse movimento? a) A centralidade nos interesses naturais das crianças. b) A preocupação com a racionalização dos processos educativos, a partir da contribuição das ciências. c) A fundamentação teórica, principalmente, na sociologia. d) A ênfase nos métodos e técnicas de ensino. 28 Questão 3 Dizer que a Didática nos anos 1970 fazia o discurso tecnicista significa dizer que: I. Tinha por finalidade garantir a eficiência e a produtividade do processo educativo. II. Compreendia e utilizava a técnica de forma descontextualizada. III. Tinha por finalidade utilizar corretamente as novas tecnologias da educação. IV. Destacava a dimensão técnica do ato de ensinar, calando as outras dimensões, sobretudo a política. Estão corretas: a) Todas as afirmativas. b) As afirmativas I, II e IV. c) As afirmativas II, III e IV. d) As afirmativas I, II e III. Questão 4 Nos anos 1980, no contexto de “redemocratização brasileira” e da crença na possibilidade de se articular os processos educacionais com asdinâmicas de transformação da sociedade e recuperação do estado de direito no País, tem origem uma proposta de superação das perspectivas anteriores, denominada didática crítica ou didática fundamental (Candau, 1991). Qual das características abaixo, NÃO corresponde a essa perspectiva crítica? a) O entendimento da ação pedagógica como prática social. b) A percepção da multidimensionalidade do processo do ensino- aprendizagem. 29 c) A colocação da competência técnica a serviço do compromisso político com uma sociedade democrática. d) A ênfase na competência técnica. Questão 5 De acordo com Oliveira (2000), pode-se afirmar que ao longo dos anos 1980, o movimento de reconstrução do campo da Didática ocorre em torno da luta em defesa: a) Da legitimidade do saber didático-pedagógico. b) Dos direitos do professor. c) Da legitimidade do saber da experiência. d) Dos interesses dos alunos. Questão 6 Ao longo desta aula, assumimos como nossa própria posição uma Didática centrada nas perspectivas: a) Crítica e intercultural. b) Crítica e instrumental. c) Instrumental e intercultural. d) Tradicional e intercultural. 30 Questão 7 “Conceber os processos educacionais como historicamente situados, articular a educação com outros processos sociais, trabalhar sistematicamente a relação teoria-prática, favorecer processos de construção de sujeitos autônomos, competentes, solidários capazes de ser sujeitos de direito no plano pessoal e coletivo, capazes de construir histórias e apostar em um mundo e em uma sociedade diferentes, de utilizar metodologias ativas, participativas, personalizadas e multidimensionais, articuladoras das dimensões cognitiva, afetiva, lúdica, cultural, social, econômica e política da educação”, são, segundo a professora Vera Candau, princípios e características da perspectiva da Didática. a) Tradicional b) Instrumental c) Crítica d) Social Questão 8 Pensar a Didática na perspectiva intercultural implica, principalmente, em promover uma educação para: a) A formação geral de cidadãos e cidadãs que pertencem a uma mesma cultura. b) O pleno desenvolvimento social e cultural das diversas gerações. c) O reconhecimento do outro e o diálogo entre diferentes grupos socioculturais. d) A formação filosófica e moral dos grupos culturais integrantes dos diversos segmentos sociais. 31 Questão 9 Tendo presente a proposta que apresentamos nesta aula acerca da construção de uma agenda para a Didática no âmbito universitário hoje, podemos dizer que os seus temas considerados “clássicos” devem ser: a) Nomeados b) Identificados c) Desprezados d) Ressignificados Questão 10 Saber lidar com as diferença culturais na universidade significa, entre outras possibilidades, utilizar procedimentos e/ou estratégias para: I. Enfatizar o conhecimento científico, reforçando o caráter monocultural das práticas educativas. II. Romper com as dinâmicas homogeneizadoras presentes nas práticas educativas. III. Questionar preconceitos, discriminações e estereótipos presentes nas práticas educativas. IV. Incentivar, nas práticas educativas, o diálogo entre diferentes saberes e conhecimentos. Estão corretas as afirmativas: a) I, II e III b) II, III e IV c) I, II e IV d) I, III e IV 32 Atividade proposta O texto “focaliza como a perspectiva multi/intercultural está sendo incorporada pelos profissionais do campo da didática e a partir da análise de 20 depoimentos”. A proposta foi discutir “como esses profissionais estão percebendo as contribuições e os temas que emergem quando se analisam as relações entre didática e multiculturalismo e também os riscos e os desafios inerentes a essa temática”. No início do texto, as autoras apresentam uma breve síntese dos principais eixos (seus referencias teóricos) sobre os quais estão trabalhando. “São eles: (a) globalização e multiculturalismo; (b) relação entre igualdade e diferença; (c) tensão universalismo – relativismo cultural; (d) didática e perspectiva multi/intercultural”, deixando clara a polissemia desses conceitos e/ou dimensões e explicitando com que versões trabalharam para analisar os depoimentos dos profissionais entrevistados. Para ler a resposta completa desta atividade, veja aqui. Exercícios de fixação Questão 1 – A Justificativa: o texto, a seguir, justifica a escolha da primeira alternativa como a correta. [Comenius] Postulava que a formação a ser oferecida nas escolas deveria ser universal, ou seja, que os conteúdos a serem trabalhados eram todos os conhecimentos de todas as ciências e artes. Considerava o conhecimento científico como o conhecimento socialmente válido e constitutivo da condição humana. Buscava um método mais apropriado, racional e ordenado com o qual pudesse fazer um ensino extensivo e homogêneo. 33 Questão 2 – C Justificativa: Como analisamos nesta aula, foram as pesquisas na área de Psicologia que deram maior suporte teórico para fundamentar a abordagem escolanovista e não a Sociologia. Desse modo, a terceira alternativa é a correta, pois não corresponde às características de tal abordagem. Questão 3 – B Justificativa: A segunda alternativa está correta, uma vez que o único item que não corresponde ao que aqui denominamos de abordagem tecnicista é o item III (Tinha por finalidade utilizar corretamente as novas tecnologias da educação) e que está presente nas demais alternativas. Em outras palavras, o item III só não aparece na segunda alternativa, por isso ela está correta. Por sua vez, ao usar a expressão tecnicista estamos ressaltando mais as críticas feitas à abordagem, do que os seus princípios. Críticas que estão presentes nos itens II e IV, enquanto um dos seus princípios está expresso no item I. Questão 4 – D Justificativa: A questão da ênfase na competência técnica e que aparece na quarta alternativa foi exatamente um dos focos que a abordagem crítica ou fundamental buscou superar, sublinhando que o processo de ensino- aprendizagem era multidimensional e, portanto implicava articular diferentes dimensões tal como a dimensão cognitiva, política, social e humana. Logo, a ênfase na competência técnica NÃO corresponde à essa perspectiva crítica. Questão 5 – A Justificativa: Em síntese, é possível afirmar que esse momento “pode ser considerado como o momento de uma verdadeira ‘refundação’ da reflexão e pesquisa da Didática no país” (CANDAU, 2008). E, de acordo com Oliveira (2000), pode-se afirmar que ao longo dos anos 1980 esse movimento de reconstrução do campo da Didática ocorre em torno da “luta em defesa da legitimidade do saber didático-pedagógico, enquanto constituindo um campo de conhecimento e enquanto conteúdo do currículo da formação do 34 educador, no contexto da luta pela especificidade e importância do papel dos processos da educação e do ensino, no movimento de recuperação e democratização da escola pública e na transformação social”. Questão 6 – A Justificativa: A primeira alternativa é a correta porque ao longo de nossa reflexão afirmamos: entendemos que a Didática, para responder aos desafios que, na contemporaneidade, estão sendo enfrentados pela Educação em geral e de modo mais particular pela Educação formal em seus diferentes níveis e/ou segmentos, precisa estar “antenada” com os princípios do que estamos chamando
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