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APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 1 OFERTA Oferta no CDC ≠ Oferta do Direito Privado No regime da legislação consumerista, a oferta está disciplinada nos arts. 30 a 35 do CDC. Já no âmbito do direito privado, a oferta, conhecida como proposta, está prevista no art. 427 e seguintes do CC, em regra não aplicáveis às relações de consumo, por serem incompatíveis com às normas de proteção ao consumidor. Conceito de oferta: A oferta é considerada como “declaração inicial de vontade direcionada à realização de um contrato”1, se mostrando meio suficiente ao estabelecimento de vínculo entre àquele que oferta (fornecedor) e o consumidor. Assim, surge uma relação jurídica pré-contratual, a qual deve ser cumprida pelo fornecedor nos exatos termos anunciados. De acordo com o art. 30 do CDC, “toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado”. Princípio da vinculação contratual: A oferta vincula o fornecedor do produto ou serviço, integrando eventual contrato. Assim, o fornecedor não pode se recusar a cumprir a oferta, apresentação ou publicidade (princípio da vinculação contratual). Relaciona-se com o princípio da boa-fé objetiva, estando o fornecedor obrigado a cumprir os deveres anexos de lealdade, proteção, informação, confiança e cooperação. Em caso de recusa, pode o consumidor exigir o cumprimento forçado da oferta ou escolher dentre outras opões previstas no art. 35 do CDC (“se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos”). Para cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade, pela via judicial, o consumidor pode se valer de execução específica da oferta não adimplida (art. 84 do CDC). 1 GARCIA, Leonardo Medeiros. Direito do consumidor: código comentado e jurisprudência. 11. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 281. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 2 Contudo, no lugar de exigir o cumprimento forçado da obrigação ou aceitar produto ou prestação de serviço diverso, o consumidor pode optar pela rescisão contratual, com a consequente restituição da quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, mais as perdas e danos (considerando que a oferta, apresentação ou publicidade vincula o fornecedor, basta a aquiescência do consumidor para a configuração da relação contratual). ** Em regra, o erro na veiculação da publicidade ou outras informações não exime o fornecedor de cumprir a oferta nos seus exatos termos. Todavia, em se tratando de erro grosseiro (erro latente, equívoco facilmente constatado pelo consumidor, fora do padrão), pode não haver a responsabilização do fornecedor, em respeito ao princípio da boa-fé objetiva (que também deve ser observada pelo consumidor), equilíbrio das relações e vedação ao enriquecimento sem causa. Dever de informação: As informações acerca do produto ou serviço devem ser suficientes, claras e precisas, observando o disposto no art. 31 do CDC. Se a informação ou publicidade não for suficientemente precisa, haverá infração ao art. 31 do CDC. O mencionado dispositivo legal traz rol exemplificativo das características que devem estar contidas na oferta e apresentação: “[...] informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”. Segundo o REsp 586.316 (STJ): Informação correta = verdadeira; Informação clara = de fácil entendimento; Informação precisa = não prolixa nem escassa; Informação ostensiva = de fácil constatação; Informação em língua portuguesa. Em suma, a oferta deve conter todo o necessário para o efetivo uso ou consumo do produto ou serviço, sem nenhum risco à saúde e/ou segurança do consumidor, sendo a responsabilidade por tais informações do fornecedor (esse, sendo detentor do monopólio da informação, tem o dever de informar). Ademais, a informação é um direito básico do consumidor (art. 6º, III, do CDC), essencial para a existência de equilíbrio e harmonia nas relações de consumo. Fundamento: princípios da transparência e informação, boa-fé e confiança. Descumprimento de dever de informar: havendo dano ao consumidor, gera o dever de indenizar; é infração penal, tipificada no art. 66 do CDC. Oferta por telefone, mala-direta e outros: art. 33 do CDC. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 3 Em qualquer tipo de oferta ou venda por telefone, reembolso postal ou outra forma de contratação à distância, deve haver identificação do fabricante (contendo o nome do fabricante e endereço). Ainda, “é proibida a publicidade de bens e serviços por telefone, quando a chamada for onerosa ao consumidor que a origina” (parágrafo único do art. 33 do CDC). Decreto n.º 6.523/2008: Serviços de atendimento ao consumidor (SAC) de serviços regulados pelo poder público federal (energia elétrica, telefonia, planos de saúde, bancos, cartões de crédito fiscalizados pelo Banco Central etc) – as ligações serão gratuitas e o atendimento às solicitações não deverá gerar ônus para o consumidor. Além disso, não poderão ser veiculadas mensagens publicitárias durante o tempo de espera para o atendimento, salvo se houver prévio consentimento do consumidor. Componentes e peças de reposição: Fabricantes e importadores devem assegurar o fornecimento de componentes e peças de reposição durante o período de fabricação ou importação do produto, e mesmo depois, por período razoável (art. 32 do CDC). Essa regra não se aplica a todos os fornecedores, mas apenas aos fabricantes e importadores. Assim, concessionárias de veículos (comerciantes), por exemplo, estão excluídas dessa responsabilidade. Trata-se de responsabilidade pós-contratual, fundado na boa-fé objetiva. “Período razoável” = não inferior ao tempo de vida útil do produto ou serviço (Decreto n.º 2.181/1997, art. 13, XXI). PUBLICIDADE CONCEITO: “Meio de aproximação do produto e do serviço ao consumidor”2. É instrumento de propagação de informações acerca dos produtos e serviços, com o intuito de torná-los públicos, conhecidos do povo, de seus possíveis consumidores. ATENÇÃO! A publicidade deve corresponder à verdade, importante valor ético protegido pela Constituição: não se admite que a publicidade falte com a verdade, seja por afirmação, seja por omissão, ou mesmo por confusão e ambiguidade. Tanto é assim que o CDC determina, em seu art. 36, parágrafo único, que “o fornecedor, na publicidade de seus produtos ou serviços, manterá, em seu poder, para 2 NUNES, Rizzatto. Curso de direitodo consumidor. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 497. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 4 informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem”. Assim, a publicidade não goza de ampla liberdade de criação e expressão. Por ter existência fundada no produto e/ou serviço que pretende apresentar e/ou vender, está precisamente balizada pelas limitações impostas a seu objeto e, por conseguinte, pela lei e pela ética fundamentadora da norma. Em regra, a publicidade é uma prerrogativa do fornecedor, havendo, contudo, duas hipóteses em que será obrigatória: a) em caso de recall (art. 10, § 1º, do CDC); b) contrapropaganda (art. 56, XII, e 60, § 1º, do CDC). ** Controle privado da publicidade: feito pelo CONAR (Conselho de Autorregulamentação Publicitária, formado por anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação), responsável pela edição do CBAP (Código Brasileiro de Autorregulação Publicitária). PRINCÍPIOS: Deve observar todos os princípios constitucionais, sendo limitada pela Carta Magna: - Art. 37, § 1º, da CF/88: disciplina a publicidade do serviço público, que deve observar, dentre outros, os princípios que regem a administração pública. - Art. 220, § 3º, II, da CF/88; - Art. 220, § 4º, da CF/88: trata da publicidade de tabaco, bebidas alcóolicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias. Em atenção ao citado dispositivo constitucional, foi editada a Lei n.º 9.294/1996, restringindo o uso e a publicidade de tais produtos. Alguns princípios que devem ser observados, além daqueles já estudados: - Princípio da identificação da mensagem publicitária (art. 36 do CDC); Proíbe a publicidade clandestina. - Princípio da vinculação contratual da publicidade (art. 30 do CDC); - Princípio da veracidade da publicidade (art. 37, § 1º, do CDC); A publicidade deve corresponder à verdade. Veda a propaganda enganosa. - Princípio da não abusividade da publicidade (art. 37, § 2º, do CDC); Veda a propaganda abusiva. - Princípio do ônus da prova a cargo do fornecedor (art. 38 do CDC); “O ônus da prova da veracidade e da correção da informação cabe a quem as patrocina”. - Princípio da transparência da fundamentação da publicidade (art. 36, parágrafo único, do CDC); - Princípio da correção do desvio publicitário (art. 56, XII, do CDC). APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 5 PUBLICIDADE CLANDESTINA A publicidade clandestina é prática proibida pelo CDC, em seu art. 36, caput, segundo o qual “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”. A publicidade deve ser ostensiva, clara e passível de identificação imediata pelo consumidor. Deve-se permitir ao consumidor ter consciência de ser destinatário da publicidade, bem como identificar o fornecedor e conhecer o produto ou serviço. Desde que seja evidente se tratar de publicidade, essa pode ser indireta. ** Em razão do princípio da identificação da mensagem publicitária, entende-se proibida a publicidade subliminar (aquela que atinge apenas o inconsciente humano, induzindo a pessoa à determinadas condutas sem que se aperceba). ** Merchandising (veiculação de produtos e serviços camufladamente, inserido em contexto não publicitário): não há proibição expressa no CDC. Todavia, para que não se configura como publicidade clandestina, o telespectador deve ser informado, antes do filme, novela, peça ou outro programa, que será submetido a essa prática. PUBLICIDADE ENGANOSA A publicidade enganosa também é proibida pelo CDC (art. 37, caput, do CDC). CONCEITO: Art. 37, §§ 1º e 3º, do CDC. Publicidade inteira ou parcialmente falsa (sem correspondência com a realidade), por informação ou omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados a respeito dos produtos e serviços oferecidos. Exagero, confusão e ambiguidade, por exemplo, podem tornar a publicidade enganosa, caso sejam capazes de confundir o consumidor, levando-o a uma falsa compreensão da realidade. A enganosidade se verifica a partir do momento da veiculação da publicidade, antes mesmo de atingir qualquer consumidor em concreto, podendo ser constatada, muitas vezes, a partir de simples análise do próprio anúncio. Ainda que não viole expressamente o CDC, a publicidade pode se verificar enganosa, se contrariar as determinações normativas estabelecidas pelo próprio setor (Código Brasileiro de Autorregulação Publicitária – CBAP), por ferir o princípio da boa-fé (art. 4º, III, do CDC). A publicidade pode ser enganosa por informação ou por omissão. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 6 A publicidade enganosa por omissão está disciplinada no art. 37, § 3º, do CDC, sendo aquela que “deixa de informar sobre dado essencial do produto ou serviço”. “Dado essencial” = aquele cuja ausência possa influenciar a decisão de comprar do consumidor, bem como não gere conhecimento adequado e real acerca do uso e consumo do produto ou serviço. Também é dado essencial tudo aquilo que a lei determinar que o anúncio publicitário deve conter. ** Não configura publicidade enganosa por omissão deixar de informar dados que, apesar de essenciais, integram o conhecimento regular do consumidor acerca do produto ou serviço e seu real uso e consumo. Por outro lado, se o dado essencial não for conhecido do consumidor, por ser novo ou divergir do que se tem como uso normal, deve ser informado na publicidade, sob pena de se configurar a enganosidade por omissão. RESPONSABILIDADE PELA PROPAGANDA ENGANOSA: = Responsabilidade objetiva. Fornecedor-anunciante, agência publicitária (produtora do anúncio) e veículo de informação possuem responsabilidade solidária (art. 7º, parágrafo único, do CDC). Exceções: - Desresponsabilização da agência: a) A enganosidade não está objetivamente colocada no anúncio; E b) A enganosidade depende da ação real, concreta e posterior do fornecedor- anunciante, de maneira que a agência tenha participado como mera produtora de uma informação encomendada. - Desresponsabilização do veículo: a) Anúncios que, objetivamente considerados em si, não são ilegais e dos quais não se extraia a enganosidade; E b) Por cuja veiculação não é possível ao veículo, por falta de condições reais, saber se eles são enganosos. CONSEQUÊNCIAS: Uma vez verificada a enganosidade da propaganda, podem ser determinadas as seguintes consequências: - Supressão do anúncio veiculado, da campanha inteira do anunciante ou de parte dela. - Impedir a publicação e/ou transmissão do anúncio. - Contrapropaganda (art. 56, XII, do CDC). A publicidade enganosa é crime, tipificado no art. 67 do CDC. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 7 PUBLICIDADE ABUSIVA: Art. 37, § 2º, do CDC: “é abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança”. A abusividade se verificaem razão dos efeitos da propaganda, aptos a causarem algum mal ou constrangimento ao consumidor. Não é necessária a existência de dano real, ofensa concreta ao consumidor, bastando o perigo, a possibilidade de ocorrência do dano, violação ou ofensa (potencialidade lesiva da publicidade). A publicidade pode, ao mesmo tempo, ser abusiva e enganosa. A publicidade deve respeitar: - Dignidade da pessoa humana; - Intimidade; - Interesse social; - Instituições e símbolos nacionais; - Autoridades instituídas; - Núcleo familiar; - Diferenças raciais, sociais, políticas, religiosas ou de nacionalidade (não se admite a publicidade discriminatória); - Padrões de decência prevalecentes no meio social. Não pode, ainda, induzir a atividades ilegais e/ou criminosas, nem enaltecê-las ou estimulá-las. A abusividade da propaganda, assim como a enganosidade, independe da correspondência entre o anúncio e o produto ou serviço real, podendo ser verificada a partir de análise objetiva da própria publicidade em si, importando o seu impacto potencial sobre a população. RESPONSABILIDADE PELA PUBLICIDADE ABUSIVA: = Responsabilidade objetiva e solidária de todos os participantes da produção e veiculação do anúncio. CONSEQUÊNCIAS: - Supressão parcial ou integral do anúncio abusivo; - Impedimento parcial ou integral do anúncio abusivo; - Contrapropaganda. APONTAMENTOS DIREITO DO CONSUMIDOR – 2016.1 PROFESSORA ANA CARLA BERENGUER 8 A publicidade abusiva é crime (arts. 67 e 68 do CDC). PROVA DA VERDADE E CORREÇÃO DA PUBLICIDADE: Ônus da prova da veracidade e correção da informação e/ou comunicação publicitária = fornecedor-anunciante (art. 38, c/c art. 36, parágrafo único, ambos do CDC). O descumprimento do art. 36, parágrafo único, do CDC é tipificado como crime (art. 69 do CDC). Agência e veículo também possuem o ônus da prova da veracidade e correção da publicidade, nas hipóteses em que forem solidariamente responsáveis do anunciante (art. art. 37, §§ 1º e 2º, do CDC).
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