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CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Didatismo e Conhecimento 1 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social QUESTÃO SOCIAL, POBREZA E DESIGUALDADE SOCIAL; O SIGNIFICADO SOCIAL DA PROFISSÃO NA REPRODUÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS CAPITALISTAS REALIDADE SOCIAL: desilusão e perversidade Os direitos humanos, protegidos e garantidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e na Constituição do Brasil de 1988, mostram-se antagônicos em relação à realidade social, estruturada pela extrema perversidade e banalização aos di- reitos imprescindíveis ao ser humano. De um lado, uma minoria de ricos cada vez mais ricos, en- quanto que a grande maioria, uma verdadeira massa cada vez mais pobre, sofrendo com a crueldade da indiferença do sofrimento humano e com as péssimas condições de vida. Nessa perspectiva aduz Dallari (2004, p. 63): [...] que alguns vivam ostentando riqueza, gastando muito di- nheiro com coisas supérfluas, desperdiçando bens valiosos para a humanidade, como os alimentos, com absoluto desprezo pelas necessidades alheias, visando apenas à satisfação de sua vaidade ou de seus caprichos. Enquanto isso, outros lutam desesperada- mente para conseguir o mínimo indispensável para não morrer de fome, de frio ou de doenças conseqüentes da falta de um mínimo de bem-estar material. Quanto a alguns dados da realidade perversa no mundo e a constante violação dos direitos humanos, afirma Müller (2002, p. 575) que cerca de Dois bilhões de pessoas estão desempregados ou subempre- gados, mais de um bilhão vive na pobreza, mais de 800 milhões experimentam a fome aguda. O número de analfabetos chega ao limite de um bilhão, o exército dos desabrigados aumenta pratica- mente em todos os países. Para expressar isso na média nacional, quase quatro bilhões de pessoas vivem em países com uma renda anual per capita inferior a U$$ 1,500. A desilusão maior encontra-se quando os dispositivos cons- titucionais nacionais ou internacionais não se mostram concreti- zados e eficazes frente à esta realidade, ou seja, o papel prega e ordena uma norma ou princípio que é contrariado pela realidade. ”De nada servirá o que se escrever numa folha de papel, se não se justifica pelos fatos reais e efetivos do poder.” (LASSALLE, 2001, p. 37). Ou seja, é necessário eficácia! E a eficácia jurídica consiste “[...] na possibilidade de aplicação da norma aos casos concretos, como conseqüente geração dos efeitos jurídicos que lhe são ine- rentes.” (SARLET, 2003, p. 222). A Constituição Brasileira de 1988 traz expressa em seu art. 3º as seguintes ordenações: Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Fe- derativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a margina- lização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promo- ver o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Conforme os dispositivos constitucionais é dever do país, or- ganizado em seus três poderes, buscar efetivar os princípios fun- damentais, visando o bem comum. A responsabilidade pela con- cretização de tais direitos é tarefa do Estado. “O sujeito passivo desses direitos é o Estado. É este é posto como o responsável pelo atendimento aos direitos sociais”. (FERREIRA FILHO, 2000, p. 50). Assim, sabendo que constitui como tarefa do Estado a prote- ção aos direitos sociais e outros direitos, também deve haver uma conscientização da sociedade que não deve eximir-se de sua res- ponsabilidade. Entretanto, contestado as prescrições constitucionais, justifi- cadas pelas dimensões cada vez maiores das mazelas sociais no país, sabe-se muito bem, que tais princípios constituem uma ver- dadeira falácia, pois apesar de estarem elencados na lei maior do país, seu fundamento maior “realizam-se” apenas no papel. As normas (constitucionais) lhes aparecem quase que só “nos seus efeitos limitadores da liberdade”; mas o acesso à proteção jurídica e às vias legais existe para eles, assim, como os direitos de participação política, praticamente só no papel. A Constituição não integra mais eficazmente a economia e a sociedade, a políti- ca e o direito; serve somente aos superintegrados. Ela não impõe mais o código direito/não-direito ao metacódigo inclusão/exclu- são; o Estado está sujeito à economia, o direito aos imperativos da economia. O cúmulo do cinismo objetivo consiste então no fato de que “se identifica constantemente com subversão” a vontade de subintegrados, (sub)cidadãos, (sub)pessoas, excluídas, de pre- tender os direitos de cidadania que lhes cabem segundo a lei e a Constituição. (MÜLLER, 2002, p. 574). Apesar da realidade social ser perversa e desoladora, infeliz- mente, a realidade jurídica, no que concerne, a todo sistema jurí- dico constitucional e as normas de tratados e declarações interna- cionais, também é cruel, uma vez que sofre com graves problemas de violações e ineficácia. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo sexto que se refere aos direitos sociais expressa que, “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Consti- tuição.” (BRASIL, 2004). No entanto, em face ao grande número de desempregados, de moradores sem moradia, de negros desvalo- rizados e humilhados, caracterizando a paisagem cruel e desumana do Brasil, tais ordenações jurídicas perdem o seu valor, como jus- tifica-se na afirmação abaixo: [...] há até mesmo uma crise de legalidade, uma vez que nem sequer esta é cumprida, bastando, para tanto, ver a inefetividade dos dispositivos da Constituição. Com efeito, passados doze anos desde a promulgação da Constituição, parcela expressiva das re- gras e princípios nela previstos continuam ineficazes (STRECK, 2004, p. 05, grifo do autor). Esta negação de direitos e garantias faz com que uma gran- de parte da população, os excluídos, permaneçam à margem do desenvolvimento e dos benefícios da sociedade. Segundo Costa (1997), a criança trabalha desde cedo, desenvolve atividades sem qualificação, não tem instrução nem acesso a eventos culturais, não desfruta de saneamento básico e, às vezes, nem de um teto. Às crianças abandonadas na rua, de décadas atrás, sucede uma ge- ração de crianças de rua, geradas sem família e sem moradia. Ali- mentam-se irregular e precariamente, vivem na indigência e são vítimas da violência policial. Didatismo e Conhecimento 2 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS/Assistente Social Em virtude das afirmações acima, salienta-se que os opera- dores e as instituições jurídicas precisam urgentemente “saber” da inoperância das normas constitucionais e internacionais e re- fletirem sobre o preço e/ou as conseqüências da violação desses direitos. Nesse sentido, assevera Leal (2000, p. 27) que [...] embora a Constituição Brasileira de 1988 assevere que os Direitos Humanos são objeto de proteção nacional; entretanto, operadores jurídicos e das instituições oficiais (especialmente da tutela do Estado), por diversas razões e, principalmente, porque inexiste no universo reflexivo dos operadores do direito uma her- menêutica que leve em conta os seus significados multifacetados e sua importância social. Torna-se de grande valia também mencionar que a negação de direitos, a falta de espírito crítico em relação a esta temática e, tragicamente, toda a condição desumana em que vivem vários seres humanos que estão à margem desses direitos e do mundo globalizado e capitalista (violência estrutural). Por outro lado, a perversidade desta situação concretiza-se por estar apresentar de forma sutil, como algo natural, pré-configurado, sem questiona- mentos sobre suas